SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18La Adopción de PREP como Estrategia de Prevención del VIH en Colombia: Análisis Secundario de Datos CualitativosReabilitação Pós-Covid-19: Percepções dos Usuários Atribuídas a Oferta dos Serviços na Atenção Primária à Saúde índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


New Trends in Qualitative Research

versão On-line ISSN 2184-7770

NTQR vol.18  Oliveira de Azeméis out. 2023  Epub 30-Nov-2023

https://doi.org/10.36367/ntqr.18.2023.e897 

Artigo Original

Sistematização do Cuidado em Enfermagem no Envelhecimento

Systematization of Nursing Care in Aging

Kátia Terezinha Alves Rezende1 
http://orcid.org/0000-0002-9022-2680

Ione Ferreira Santos1 
http://orcid.org/0000-0002-2030-4541

Cassia Regina Fernandes Biffe Peres1 
http://orcid.org/0000-0002-8430-0400

Maria Cristina Martinez Capel1 
http://orcid.org/0009-0009-4675-9323

1 Faculdade de Medicina de Marília, Brasil


Resumo

Introdução. Ao compreender a enfermagem como ciência, tecnologia e arte em promover o cuidado individualizado, coletivo em suas singularidades, articulado com os outros profissionais, pressupõe que somente o conceito ampliado de cuidado é capaz de atender a complexidade do sujeito. Considerando esse contexto e os seus desafios, questiona-se quais são as diretrizes que possam orientar a sistematização do cuidado em enfermagem no envelhecimento na Atenção Primária à Saúde (APS). Objetivo. Analisar como os enfermeiros realizam o processo de enfermagem no cuidado às necessidades de saúde individuais no envelhecimento na Atenção Primária à Saúde. Métodos. Abordagem qualitativa. Participaram da pesquisa, enfermeiros da Estratégia Saúde da Família. A coleta de dados ocorreu em duas fases. Na 1ª fase realizou-se grupo focal, analisado pelo Discurso do Sujeito Coletivo. Na 2ª fase desenvolveu-se Oficina de Produção de Conhecimento e Resolução de Problemas. Resultados. O cuidado no processo de envelhecimento ainda está focado no idoso e nas doenças, porém, a depender da formação do enfermeiro, é possível promover o cuidado com olhar para promoção e proteção, no entanto se faz necessário o uso de protocolos para nortear essa prática. Questiona-se como o município está organizando a rede de atenção à saúde para promover a integralidade desse cuidado. É possível realizar esse utilizando o Prontuário Eletrônico do Cidadão, porém há profissionais que não realizam o registro, o que dificulta a continuidade do cuidado. A oficina de trabalho delimitou propostas para a construção do cuidado no envelhecimento na perspectiva da integralidade, focando na gestão compartilhada como forma de construção coletiva das mudanças na prática profissional e para as atividades junto à comunidade. Considerações Finais. A metodologia adotada permitiu promover reflexão sobre a prática profissional do enfermeiro na APS e seus desdobramentos frente ao processo de envelhecimento populacional.

Palavras-Chave: Processo de enfermagem; Envelhecimento; Atenção Primária à Saúde; Estratégia Saúde da Família.

Abstract

Introduction: By understanding nursing as a science, technology, and art in promoting individualized, collective care in its singularities, articulated with other professionals, it assumes that only the expanded concept of care is capable of meeting the complexity of the subject. Considering this context and its challenges, the question is: what are the guidelines that can guide the systematization of nursing care in aging in Primary Health Care (PHC). Objective: To analyze how nurses perform the nursing process in caring for individual health needs in aging in Primary Health Care. Method: Qualitative approach. The research participants were nurses from the Family Health Strategy. Data collection occurred in two phases. In first phase, a focus group was carried out, analyzed by the Discourse of the Collective Subject. In 2nd phase, a Knowledge Production and Problem-Solving Workshop was developed. Results: The care in aging process is still focused on the elderly and on disease; however, depending on the nurse's training, it is possible to promote care in a perspective focused on promotion and protection, but it is necessary to use protocols to guide this practice. The question is how the municipality is organizing the health care network to promote this care’s integrality. It is possible to do using the Citizen's Electronic Health Record, but there are professionals who do not perform the record, which hinders the continuity of care. The workshop delimited proposals for the construction of care in aging from the perspective of integrality, focusing on shared management as a form of collective construction of changes in professional practice and for activities with the community. Final Considerations: The methodology adopted allowed us to promote reflection on the professional practice of nurses in PHC and its developments in face of population aging process.

Keywords: Nursing process; Aging; Primary Health care; National Health Strategies

1. Introdução

O envelhecimento da população brasileira trouxe mudanças no perfil demográfico e epidemiológico, o qual requer respostas das políticas sociais envolvendo o Estado e a sociedade, implicando novas formas de cuidado. Porém, no Brasil, o envelhecimento ativo e saudável não tem sido o enfoque das políticas públicas, valorizando a promoção da saúde, bem como, a aprendizagem no modo de como lidar com as situações do processo saúde doença, ao longo da vida. Durante a pandemia, o grupo dos idosos não teve seus direitos e demandas acolhidos, uma vez que as escolhas economicistas determinaram a exclusão dos mais idosos aos serviços de saúde (Brasil, 2014; Kalache et al., 2020).

Para Sulzbach et al. (2020), o uso de ferramentas como a avaliação multidimensional, acolhimento, Projeto Terapêutico Singular (PTS), para ampliar o acesso e tecer uma rede de cuidado, pautada na humanização, é imprescindível para a promoção do cuidado ao idoso com a Atenção Primária à Saúde (APS) fortalecida e ordenadora da atenção. Desta forma, há necessidade de construção e planejamento de atividades por meio de educação permanente em saúde (EPS); de instigar a discussão no âmbito do controle e mobilização social, em busca de condições de envelhecimento mais dignas e justas para a população brasileira; de elaboração de ações, serviços e redes que proporcionem à pessoa idosa o cuidado na direção da integralidade; e, de uma formação acadêmica comprometida com a realidade social e que vislumbre o envelhecimento, como um direito de todo cidadão brasileiro, a partir do fortalecimento do SUS.

Transformar a lógica do cuidado, no Brasil, é um grande desafio e, também, uma necessidade, destaca-se a atenção à saúde de pessoas em situações de maior vulnerabilidade, como é o caso dos idosos. O modelo defendido privilegia o cuidado integral e a prevenção mediante o monitoramento contínuo das condições de saúde e coordenação de cuidados em todas as instâncias de atenção (Veras, 2020).

Neste contexto, o enfermeiro, ao fazer parte da equipe que atua na APS, realiza o cuidado de forma sistematizada, precisando de planejamento na dimensão individual e coletiva, o que é previsto pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEn), na Resolução COFEn nº 358/2009, como Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), devendo ocorrer em todas as instituições de saúde, públicas ou privadas, a fim de nortear o trabalho do enfermeiro e atender os princípios do SUS (Resolução COFEn 358, 2009).

Essa resolução descreve a SAE como instrumento que organiza o trabalho profissional quanto ao método, pessoal e instrumentos, tornando possível a operacionalização do Processo de Enfermagem (PE). Barros et al. (2022) referem que os conceitos de SAE e PE são distintos do ponto de vista teórico-conceitual e operacional. Desta forma, entendem ser apropriado pensar que a Resolução COFEN nº 358/2009 carece de revisão, de modo a atualizá-la em consonância ao conhecimento atual.

Sendo assim, o mais apropriado seria empregar apenas o conceito de PE, conforme ocorre mundialmente. De forma alternativa, seria necessário ampliar o conceito da SAE, com detalhamento de sua definição, formas de aplicação e apresentação da explícita diferenciação do PE (Barros et al., 2022).

Neste sentido, há necessidade de debate sobre como os enfermeiros estão atuando, a partir desse processo de envelhecimento populacional e como sua prática está estruturada.

Percebe-se que ainda há barreiras, quanto ao processo de trabalho do enfermeiro, ao se constituir sua autonomia na tomada de decisão, ocorrendo a implicação da subordinação ao trabalho do médico, em alguns países, sendo necessária a superação do modelo biomédico para o da prática interprofissional, requerendo incentivo e propósito na formação (Busca et al., 2021). Também, mostra-se importante trabalhar com o cuidado, junto aos estudantes de graduação, por meio de simulação e atividades nos cenários de prática, para que possam desenvolver significado e capacidades envolvendo atitudes, crenças dos indivíduos e construção de empatia para atuar no processo de envelhecimento (Bamakan et al., 2021; Zeydani et al., 2021).

Segundo Ferreira et al. (2021), a formação do enfermeiro necessita se adequar à mudança do perfil demográfico da população. Compreendem que a saúde do idoso é ampla e complexa, uma vez que aborda aspectos específicos, quanto às mudanças do processo saúde-doença do sujeito, bem como, suas capacidades, necessidades e expectativas.

Para Dias et al. (2020), na realidade brasileira, o debate sobre educação interprofissional e trabalho colaborativo deve incorporar novos elementos teórico-conceituais e metodológicos, em torno do diálogo necessário, entre as diversas áreas de conhecimento e de práticas para o enfrentamento de problemas e necessidades de saúde complexos, numa dinâmica social, que, também, precisa de múltiplos olhares e ações.

Ao reconhecer necessidades de saúde, cuidados diferenciados são produzidos e articulados pelos enfermeiros, que podem ser construídos, tanto na prática clínica do enfermeiro, quanto na interprofissionalidade no contexto da APS, na Estratégia de Saúde da Familia (ESF) (Rodríguez et al., 2020).

O percurso cuidativo-educativo dialógico sobre envelhecimento ativo, desenvolvido com os profissionais de saúde da APS, foi realizado no Círculo de Cultura, como etapa da Pesquisa Convergente Assistencial (PCA). Este processo explicitou os conceitos incipientes de envelhecimento, diversidade de conceitos sobre o envelhecimento ativo e escassez de sistematização para o cuidado ao idoso. Por meio do diálogo e reflexões, transformaram-se em conhecimento crítico, acerca da complexidade, que envolve a saúde dos idosos (Labegalini et al., 2020).

Atualmente, a realidade da enfermagem mostra-se em múltiplas dimensões, desde a formação, que tem sido permeada por novos conceitos, decorrentes das preposições contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). Ao compreender a enfermagem como ciência, tecnologia e arte em promover o cuidado individualizado, coletivo em suas singularidades, articulado com os outros profissionais, pressupõe que somente o conceito ampliado de cuidado é capaz de atender a complexidade do sujeito, o qual está em constante processo de auto-organização para viver melhor (Resolução CNE/CES nº 3, 2001).

Acredita-se que a sistematização do cuidado de Enfermagem tem sido realizada para cumprimento de normatização do COFEn/COREn, sem que ocorra a sistematização para favorecer um cuidado integral, no envelhecimento, no qual ocorra coparticipação do profissional e usuário em sua construção.

Os enfermeiros necessitam ter diretrizes instituídas pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS), para que possam implementar o cuidado de forma integral, em equipe e promovendo o planejamento e a operacionalização de forma compartilhada com o usuário, a família e a equipe.

Dessa forma, questiona-se, como os enfermeiros brasileiros estão realizando a sistematização do cuidado na APS, no processo de envelhecimento.

2. Objetivo

Analisar como os enfermeiros realizam o processo de enfermagem, no cuidado às necessidades de saúde individuais no envelhecimento, na Atenção Primária à Saúde.

3. Método

Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, do tipo exploratória, a qual foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da [omitido para não identificação], com CAAE 47771621.2.0000.5413 e Parecer no 4.884.751.

A investigação ocorreu em um Município de médio porte do Centro Oeste do Estado de São Paulo, Brasil, considerado referência estadual em saúde, possuindo cinco hospitais e uma maternidade. A Atenção Primária à Saúde é composta por 44 equipes Saúde da Família (eSF), oito Unidades Básicas de Saúde (UBS), além de uma Policlínica e dois Pronto Atendimento (PA), uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), entre outros serviços de atenção secundária (Prefeitura Municipal de Marília, 2021).

Há no município 52 enfermeiras atuando nas ESF e UBS, distribuídas nas regiões norte, sul, leste e oeste. Nesta investigação, focou-se no cuidado em enfermagem na ESF.

A escolha dos participantes foi por meio da escolha intencional dos mesmos. Considerando-se como critérios de inclusão, as diferentes regiões do Município (norte, sul, leste, oeste e rural) e o tempo de contrato. Assim, selecionou-se duas enfermeiras por região, sendo uma com mais tempo de contratação e outra com menos tempo, totalizando 10 participantes. Os critérios de exclusão aplicados foram estar ausente por férias, licenças ou outros motivos, no período de coleta de dados.

A coleta de dados ocorreu em duas fases, realizadas, presencialmente, no melhor dia e local para os participantes. Na primeira fase foi realizado um grupo focal com todos os participantes da pesquisa, no dia 10 novembro de 2021, durante o período de pandemia da COVID-19, com duração de uma hora e trinta e cinco minutos, com a intencionalidade de captar os desafios da realização da Sistematização do Cuidado em Enfermagem, frente ao contexto da pandemia. O encontro foi conduzido por um coordenador, com experiência na técnica de grupo focal, e um observador, que registrou as notas de campo, durante a coleta. Foi gravado em áudio e transcrito na íntegra pelas pesquisadoras para posterior análise.

Os dados foram analisados pela técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), a qual tem como referencial a Teoria das Representações Sociais (TRS) (Lefèvre, 2017).

Assim, a análise ocorreu mediante o processamento das informações, em matriz elaborada no aplicativo Word, com a identificação das Expressões chave (ECH), seguida pela Ideia Central (IC), e, por fim, agrupou-se estas para a construção do DSC. Os DSCs foram elaborados e numerados de acordo com sua respectiva IC, ou seja, DSC 1 correspondendo a IC 1.

A segunda fase da investigação foi realizada por intermédio de Oficina de Produção de Conhecimento e Resolução de Problemas, esta constitui-se em espaço em que, dialogicamente, se ensina, se aprende, se socializa e se constrói conhecimento, numa relação fecunda, entre o pesquisador e os sujeitos do campo da prática (Campos et al., 2010).

Nas oficinas, o pesquisador se apresenta como facilitador do processo de reflexão sobre a prática, que dá sustentação para a construção do conhecimento. Busca a construção de produto fazendo uso da criação coletiva, que responde aos objetivos propostos pelos pesquisadores. Esta estratégia está ancorada no referencial de Planejamento Estratégico Situacional (PES), elaborado por Carlos Matus (Tancredi et al., 1998).

Foram realizados três encontros com participação de nove enfermeiras, no primeiro e segundo encontros e oito no terceiro, com duração de duas horas cada um. Utilizou-se como instrumento de trabalho a matriz contendo problemas, causas, propostas de intervenção e estratégias de como desenvolver as propostas.

A partir da sistematização dos dados do grupo focal, realizado na primeira fase da investigação, as pesquisadoras identificaram os problemas e suas causas.

No primeiro encontro, esses foram apresentados ao grupo de enfermeiras, foi feita a leitura e validação dos mesmos, modificando-se e acrescentando-se outros problemas e causas, durante a oficina.

O segundo encontro, teve início, a partir da seleção das causas, que foram eleitas como nós críticos, considerando os critérios, ser um centro de ação; ser politicamente oportuna e que tivessem tecnologias para sua resolução.

No terceiro encontro, definiu-se as propostas de intervenção e estratégias de como poderiam ser desenvolvidas.6 mm.

4. Resultados e Discussão

Participaram da pesquisa nove enfermeiras da equipe Saúde da Família (eSF), dentre estas, seis são incluídas nas equipes das unidades e duas substituem as ausências das enfermeiras, nas equipes de saúde. No momento da coleta duas participantes estavam inseridas em unidades de atendimento aos pacientes sintomáticos respiratórios, com suspeita de COVID-19 e as outras oito em unidades, que atenderam pacientes assintomáticos respiratórios.

Todas participantes são enfermeiras, com idade entre 29 e 47 anos, com média de 39 anos; seis enfermeiras possuem pós-graduação, uma com mestrado e outra com doutorado. O tempo de atuação delas, na ESF, está entre nove meses e 22 anos, com média de 12 anos.

Entre as participantes, sete realizam preceptoria a estudantes de graduação e/ou residentes multiprofissionais, durante suas atividades na eSF.

4.1 Apresentação do Discurso do Sujeito Coletivo e propostas de intervenção frente ao problema identificado nas oficinas de trabalho

4.1.1 Construção do cuidado no envelhecimento

Percebe-se que o cuidado às pessoas em processo de envelhecimento, destacando o idoso, está focado na doença e não em ações de promoção e proteção à saúde, sendo que o desenvolvimento destas ações é considerado um desafio para os enfermeiros.

Outro desafio apontado está relacionado com a ausência de protocolo e diretrizes para nortear a prática do cuidado, mais especificamente, a coleta de dados e os objetivos a serem alcançados. Fazem referência que há uma base científica para o cuidado, que, entretanto, pode ser limitada, dependendo da formação inicial de cada profissional.

Os enfermeiros têm um olhar e desenvolvem ações buscando a integralidade do cuidado ao idoso. Entretanto, considerando o referencial do envelhecimento ativo, bem como a pandemia da COVID-19, algumas parcerias se desfizeram, o que prejudicou o cuidado e o acompanhamento do envelhecer.

Mencionam que é possível realizar o cuidado integral, registrar no PEC e compartilhar com os outros profissionais, dando continuidade ao cuidado. Por outro lado, há profissionais da equipe que desconhecem essa forma de sistematizar ou não fazem o registro no PEC, sendo necessário que o enfermeiro retome as informações com as pessoas atendidas.

Os profissionais da saúde precisam ter uma formação para trabalhar com o sistema, sendo sinalizada, também, a importância da educação permanente, a qual não ocorreu durante a pandemia da COVID-19.

Quadro 1 Ideias centrais (IC) e Discurso do sujeito coletivo (DSC) sobre o processo de enfermagem no envelhecimento, Marília, 2023. 

Fonte: autores

Os dados dos DSCs sinalizam que na APS, ainda há dificuldades em se organizar o cuidado de forma interprofissional, utilizando também o registro do PEC, como uma das possibilidades de continuidade no cuidado. Sinaliza-se, também, que esse cuidado teria condições de estar ancorado na integralidade, mas há diversidade na formação dos profissionais e, consequentemente, múltiplas formas de processar as demandas e necessidades das pessoas.

Para que o modelo de cuidado seja operacionalizado na perspectivada integralidade, a gestão, também, precisa estar ancorada neste princípio.

No DSC 2, questiona-se como o Município organiza as suas propostas, no ciclo de vida e estratégias para intervir nos problemas, incluindo o período pandêmico, que desdobrou em necessidades para essas pessoas. Destaca-se que houve fechamento de serviços de saúde, o que dificultou o atendimento dessas necessidades, uma vez que não houve mobilização do gestor nesse sentido.

A transição demográfica brasileira representa uma conquista e uma obrigação para os gestores públicos e para a sociedade. É resultado de um crescimento econômico desigual e pelos consequentes desequilíbrios regionais.

A redução das taxas de mortalidade e fecundidade está permeada por mudanças estruturais e institucionais, tanto em nível micro, como macro, afetando as relações intergeracionais e de gênero. A construção de políticas de saúde, educação, mercado de trabalho e seguridade social precisa considerar essas mudanças demográficas, caso contrário, se afastará dos objetivos de desenvolvimento econômico sustentado na redução das desigualdades sociais (Travassos et al., 2020).

Portanto, a construção de um modelo de cuidado, que atenda as necessidades desse processo de envelhecimento, requer práticas voltadas para o cuidado em rede, pautadas na integralidade e interprofissionalidade.

Na APS, a construção de níveis deste cuidado pode estar voltada para o acolhimento, ambulatório clínico, Centro Dia para idosos e atenção domiciliar (Veras & Oliveira, 2018).

Há necessidade, também, de se considerar na prática do enfermeiro. a carga horária excessiva de trabalho, a ausência de processos de formação constantes e a restrição da autonomia na prática como barreiras, que possam impedir o exercício pleno das suas atividades (Busca et al., 2021).

Num segundo momento da pesquisa, durante a oficina de trabalho, a partir da sistematização dos dados da coleta no grupo focal, delimitou-se o problema, frente ao cuidado no processo de envelhecimento, realizado pelos enfermeiros.

Refletiu-se sobre suas causas e foram elaboradas propostas e estratégias para sua operacionalização. No quadro 2, apresentam-se as causas, as propostas e as estratégias referentes ao problema “Cuidado não é realizado de forma integral considerando o envelhecimento”.

Quadro 2 Delimitação do problema, causas, propostas de intervenção e estratégias de operacionalização das propostas, Marília, 2023. 

Fonte: autores.

A oficina de trabalho sistematizou o problema por meio do PES, proporcionando reflexão sobre a prática profissional na APS e o modelo de gestão, para que se busquem outros caminhos na constituição do cuidado em enfermagem e no processo de envelhecimento na perspectiva do SUS.

Percebe-se que as propostas dos enfermeiros estão focadas na gestão compartilhada, como forma de construção coletiva das mudanças na prática profissional e para as atividades junto à comunidade.

No entanto, a constituição da cogestão requer equilíbrio entre os graus de autonomia e a responsabilidade sanitária, durante o planejamento, pactuação de metas e avaliação. Ressalta-se que, se as mudanças não forem problematizadas/processadas, permanentemente, com trabalhadores das equipes e usuários, podem produzir tensionamentos e até serem rechaçadas. Desta forma, a inclusão da proposta de EPS é essencial para os processos de mudanças, construindo um espaço para se dialogar sobre os vários modos de sentir/pensar/fazer (Slomp et al., 2019).

Percebe-se que as propostas dos enfermeiros estão focadas na gestão compartilhada, como forma de construção coletiva das mudanças na prática profissional e para as atividades junto à comunidade.

No entanto, a constituição da cogestão requer equilíbrio entre os graus de autonomia e a responsabilidade sanitária, durante o planejamento, pactuação de metas e avaliação. Ressalta-se que, se as mudanças não forem problematizadas/processadas, permanentemente, com trabalhadores das equipes e usuários, podem produzir tensionamentos e até serem rechaçadas. Desta forma, a inclusão da proposta de EPS é essencial para os processos de mudanças, construindo um espaço para se dialogar sobre os vários modos de sentir/pensar/fazer (Slomp et al., 2019).

5. Considerações Finais

Esta investigação permitiu captar, junto aos enfermeiros da ESF, os desafios e necessidades para se implementar o cuidado em enfermagem, na perspectiva da integralidade no envelhecimento e elaborar diretrizes e planos para promover o cuidado integral e compartilhado no envelhecimento.

Em relação a construção do cuidado no envelhecimento, percebe-se que este ainda está focado nas doenças, porém, a depender da formação do enfermeiro é possível promover o cuidado com olhar para promoção e proteção à saúde.

A investigação limitou-se a trabalhar com os enfermeiros da ESF, porém, há necessidade de se avançar neste diálogo e construção com a equipe, uma vez que o processo de cuidar é proposto de forma coletiva, a partir das necessidades do território, incluindo a comunidade em um movimento de cogestão.

E, mais, considerando o referencial de envelhecimento ativo, questiona-se como o Município está organizando a rede de atenção à saúde, para promover a integralidade do cuidado no envelhecimento. Ainda, é apontado que com o uso PEC é possível realizar o cuidado de forma integral.

Dando continuidade à oficina de trabalho, delimitou-se, também, propostas para a construção do cuidado na perspectiva do envelhecimento, quais sejam, atualizar protocolos e validá-los, delimitando as competências do enfermeiro na APS; considerar o processo de envelhecimento, na delimitação do referencial teórico prático do cuidado em saúde, na perspectiva da integralidade; ter uma proposta contínua de formação no serviço, que possa construir o cuidado na perspectiva da integralidade; propor à gestão favorecimento de encontros para reflexão e construção/reconstrução coletiva das práticas em saúde; promover movimentos de cogestão na reconstrução das práticas e retomar os encontros, entre o nível central e os profissionais, que atuam nas unidades de saúde, promovendo discussão.

A pesquisa teve como limite a perspectiva do cuidado em enfermagem, necessitando-se ampliar a investigação, junto aos demais profissionais, que atuam na APS.

Por fim, a metodologia adotada na investigação foi potente para desvendar o problema, seus determinantes e elaborar propostas, na perspectiva da integralidade no cuidado e operacionalizá-la por meio da cogestão de coletivos. Pode promover reflexão sobre a prática profissional do enfermeiro na APS e seus desdobramentos frente ao processo de envelhecimento populacional.

6. Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - código de Financiamento 001, a qual agradecemos.

7. Referências

Prefeitura Municipal de Marília. (2021, 27 outubro). Plano Municipal de Saúde 2022-2025. https://www.marilia.sp.gov.br/arquivos/plano_municipal_de_saUde_2022_2025_04012531.pdfLinks ]

Bamakan, Z.M., Nasiriani, K., Madadizadeh, F., & Keshmiri, F. (2021). Effect of an aged wearing suit on nursing student’s knowledge and attitude. BMC Nursing, 20(145). 1-8. https://doi.org/10.1186/s12912-021-00668-2 [ Links ]

Barros, A. L. B. L. de, Lucena, A. de F., Morais, S. C. R. V., Brandão, M. A. G., Almeida, M. de A., Cubas, M. R., Chianca, T. C. M., Silva, V. M. da, Lopes, M. H. B. de M., & Santana, R. F. (2022). Nursing Process in the Brazilian context: reflection on its concept and legislation. Revista Brasileira de Enfermagem, 75(6), 1-5. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2021-0898 [ Links ]

Brasil. (2014). Diretrizes para o cuidado das pessoas idosas no SUS: proposta de modelo de atenção integral. XXX Congresso Nacional de Secretarias Municipais e Saúde. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_cuidado_pessoa_idosa_sus.pdfLinks ]

Busca, E., Savatteri, A., Calafato, T.L., Mazzoleni, B., Barisone, M., & Molin, A.D. (2021). Barriers and facilitators to the implementation of nurse’s role in primary care settings: an integrative review. BMC Nursing, 20(171), 1-12. https://doi.org/10.1186/s12912-021-00696-y [ Links ]

Campos, R.T.O, Miranda, L, Gama, C.A.P. da, Ferrer, A.L, Diaz, A.R, Gonçalves, L, & Trapé, T.L. (2010). Oficinas de construção de indicadores e dispositivos de avaliação: uma nova técnica de consenso. Estudos e Pesquisas em Psicologia. 10(1), 221-241. http://www.revispsi.uerj.br/v10n1/artigos/pdf/v10n1a15.pdfLinks ]

Dias, M.S.de A., Vieira, C.A.L., Freitas, C.A.L.S., Farias, M.R.de, Lira, R.C.M., Lomeo, R.da C., & Saraiva, M.J.G. (2020). Educação Interprofissional e práticas colaborativas em saúde. (E-book). Editora UVA. https://www.uvanet.br/edicoes_uva/gera_xml.php?arquivo=educacao_interprofissional_27112020Links ]

Ferreira, R., Derhun, F. M., Carreira, L., Baldissera, V. D. A., Radovanovic, C. A. T., & Mariano, P. P. (2021). Professional competency for elder care: perception among professors, nursing students, and nurses. Revista Brasileira de Enfermagem, 74(suppl 2), e20200446. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0446 [ Links ]

Kalache, A., Silva, A. da., Giacomin, K. C., Lima, K. C. de., Ramos, L. R., Louvison, M., & Veras, R. (2020). Aging and inequalities: social protection policies for older adults resulting from the Covid-19 pandemic in Brazil. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 23(6), e200122. https://doi.org/10.1590/1981-22562020023.200122 [ Links ]

Labegalini, C. M. G., Nogueira, I. S., Hammerschmidt, K. S. de A., Jaques, A. E., Carreira, L., & Baldissera, V. D. A. (2020). Educational and Care-Related Dialogical Pathway on Active Aging with Family Health Strategy Professionals. Texto & Contexto - Enfermagem, 29, e20180235. https://doi.org/10.1590/1980-265x-tce-2018-0235 [ Links ]

Lefèvre, F. (2017). Discurso do Sujeito Coletivo- nossos modos de pensar no eu coletivo. (1ª. ed.). Editora Andreoli. [ Links ]

Rodríguez, A. M. M. M., Mishima, S. M., Lettiere-Viana, A., Matumoto, S., Fortuna, C. M., & Santos, D. de S. (2020). Nurses’ work at Family Health Strategy: possibilities to operate health needs. Revista Brasileira de Enfermagem, 73(suppl 6). e20190704. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0704 [ Links ]

Resolução CNE/CES nº 3. (2001, 7 novembro). Institui Diretrizes Nacionais do Curso de Graduação em Enfermagem. Diário Oficial da União. http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES03.pdf. [ Links ]

Resolução COFEn 358. (2009, 15 outubro). Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem, e dá outras providências. Conselho Federal de Enfermagem. http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.htmlLinks ]

Slomp, H., Merhy, E. E., Seixas, C. T., Cruz, K. T. da ., Bertussi, D. C., & Baduy, R. S. (2019). Mágica ou magia? Colegiados gestores no Sistema Único de Saúde e mudanças nos modos de cuidar. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, 23. https://doi.org/10.1590/Interface.170395 [ Links ]

Sulzbach, C. C., Weiller, T. H., & Dallepiane, L. B. (2020). Acesso à Atenção Primária à Saúde de longevos: perspectiva de profissionais da Saúde da Família de um município do Rio Grande do Sul. Cadernos Saúde Coletiva, 28(3), 373-380. https://doi.org/10.1590/1414-462x202028030158 [ Links ]

Tancredi, F.B., Barrios, S.R.L., & Ferreira, J.H.G. (1998). Planejamento em Saúde. (1ª. ed). Editora Fundação Peirópolis Ltda. [ Links ]

Travassos, G. F., Coelho, A. B., & Arends-Kuenning, M. P. (2020). The elderly in Brazil: demographic transition, profile, and socioeconomic condition. Revista Brasileira de Estudos de População, 37, e0129. https://doi.org/10.20947/S0102-3098a0129 [ Links ]

Veras, R. (2020). A contemporary and innovative care model for older adults. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, 23(1), e200061. https://doi.org/10.1590/1981-22562020023.200061 [ Links ]

Veras, R. P., & Oliveira, M. (2018). Envelhecer no Brasil: a construção de um modelo de cuidado. Ciência & Saúde Coletiva, 23(6), 1929-1936. https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.04722018 [ Links ]

Zeydani, A., Atashzadeh-Shoorideh, F., Abdi, F., Hosseini, M., Zohari-Anboohi, S., & Skerrett, V. (2021). Effect of community-based education on undergraduate nursing students’ skills: a systematic review. BMC Nursing. 20(233), 1-12. https://doi.org/10.1186/s12912-021-00755-4 [ Links ]

Recebido: 30 de Março de 2023; Aceito: 30 de Setembro de 2023

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons