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1.Introdução
A importância da divulgação científica (DC) é cada vez mais evidente, principalmente em função da atual pandemia de COVID-19, que aproximou cientistas e a mídia de forma sem precedentes. Com isto em voga, reiterou-se uma demanda de longa data de formar profissionais oriundos das carreiras científicas capazes de dialogar sobre assuntos específicos com públicos não especializados, a fim de minimizar a perpetuação de informações equivocadas (World Health Organization, 2020). Reforçando o papel da DC no âmbito educacional, parte das habilidades do século XXI para o ensino de ciências incluem o desenvolvimento da comunicação, alfabetização informacional e domínio das mídias e tecnologias (National Research Council, 2012; Organisation for Economic Co-operation and Development, 2018). No Brasil, as diretrizes para os cursos de química estabelecem uma formação superior de caráter generalista, isto é, que articule tanto o desenvolvimento de habilidades técnicas quanto humanísticas, visando à atuação de um futuro profissional consciente de sua contribuição social e capaz de resolver problemas reais (Brasil, 2001). A inclusão de práticas de DC nos currículos de ciências naturais, apesar de desejável, ainda é incipiente. A área de química, em particular, enfrenta desafios relacionados tanto à complexidade de compreensão de determinados conteúdos científicos por audiências leigas, popularmente conhecida como “químicafobia”, quanto a subrepresentatividade dentre iniciativas já existentes de DC (Hartings & Fahy, 2011; MacKenzie, 2019). Em carreiras que apostam nessa abordagem, é constatado o desenvolvimento de habilidades críticas, comunicativas e de senso de comunidade (Sotério et al., 2019). Além disso, formar cientistas para suprir a falha comunicativa existente perpassa o simples oferecimento da informação. Faz-se necessário alçar práticas que considerem os aspectos sócio-históricos inerentes à ciência e tecnologia, a fim de estabelecer uma comunicação eficiente com públicos não-especialistas (Lewenstein, 2010). Dessa forma, a disciplina de Comunicação e Expressão em Linguagem Científica I, oferecida aos calouros de um curso de bacharelado em química de uma universidade pública brasileira, propiciou a discussão e o exercício das habilidades supracitadas, promovendo uma formação que não abrange somente a comunicação entre pares, mas também com o público não-especialista. Para tal, foi simulado o ambiente de uma revista de DC, na qual os estudantes, no papel de jornalistas de ciência, foram convidados a elaborar textos de divulgação científica (TDC) sobre química e COVID-19. Esses materiais foram examinados a partir da Análise de Conteúdo, a qual propiciou a caracterização dos TDC na perspectiva dos elementos comumente presentes nesse tipo textual, conforme o Quadro Analítico de Ferreira & Queiroz (2011), detalhado a seguir. Tendo em vista o exposto, o presente trabalho objetiva, analisar as potencialidade e fragilidades dos TDC sobre COVID-19 produzidos pelos estudantes diante da escrita de temas científicos para públicos não-especializados, a fim de contribuir com a ampliação de atividades desta natureza no contexto do ensino de ciências naturais.
Quadro Analítico de TDC
Tendo em vista a complexidade dos TDC, Ferreira & Queiroz (2011) propuseram um Quadro Analítico para a investigação dos elementos comumente presentes no conteúdo e forma destes tipos textuais, com enfoque nos temas de química (vide figura 1), usualmente aplicadas à análises de produções oriundas de revistas de DC. Este instrumento de análise, adaptado da proposta de Salém & Kawamura (2001) para o ensino de física, já foi empregado metodologicamente em outras pesquisas na área de ensino de ciências naturais e exatas. À título de exemplo, Silva et al. (2021) se basearam no instrumento supracitado para a caracterização da obra “Trinity, a história em quadrinhos da primeira bomba atômica” na perspectiva de um TDC, a qual subsidiou a discussão de questões sociocientíficas no contexto de um curso de licenciatura em química. Dias et al. (2017), por sua vez, empregaram as categorias do Quadro para caracterizar TDC da Revista “Ciência Hoje” e correlacionar os achados com os pressupostos curriculares da disciplina de matemática da educação básica.
Conforme exposto na Figura 1, a Análise Geral do Conteúdo de um TDC pode ser caracterizada em três subcategorias. A primeira, relativa à Química, diz respeito à abordagem de temas que são previstos na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para a área de ciências da natureza, tais como os conceitos que permeiam o ensino de modelos atômicos (Brasil, 2018a). Os temas transversais, por sua vez, são aqueles que permeiam diferentes disciplinas e, ao mesmo tempo, não são específicos de nenhuma delas, tais como a nanotecnologia e a cidadania. Já os temas de fronteiras são aqueles oriundos de áreas que tecem intersecções com a química, como a física e a biologia. A Análise Específica do Conteúdo se direciona a outros elementos do TDC. A subcategoria da temática, por exemplo, indica o enfoque do texto - isto é, a perspectiva em que determinado assunto é abordado. A subcategoria das características da atividade científica pontua os aspectos comuns à práxis científica, tais como o trabalho em equipe, a experimentação, a análise de dados, entre outros. As abordagens e contexto são concernentes ao meio em que o conteúdo do TDC está inserido, dentre os quais se destacam aspectos científicos, conceituais, sociais, políticos, econômicos, ambientais, polêmicos, educacionais, etc. Na perspectiva da forma de um TDC, são dispostas outras três subcategorias. A primeira, referente a estrutura, permite a classificação dos textos dessa natureza de acordo com a diagramação em que estão inseridos, com destaque para o emprego ou não de tópicos e subdivisões ao longo do material. A segunda subcategoria abrange o uso de recursos linguísticos recorrentes nos TDC para a disseminação da mensagem científica, tais como as figuras de linguagens (analogias, metáforas, comparações etc.) ou mecanismos como a interlocução direta, inserção de falas de especialistas, conceituações, entre outros, contribuindo também com o apelo à atenção do leitor. Por fim, os recursos visuais e textuais são intrínsecos à distribuição espacial das informações, podendo se referir ao uso de boxes explicativos, ilustrações, fotografias, títulos em destaque, entre outros.
2.Contexto da Pesquisa
As atividades realizadas foram pautadas na simulação de uma revista de DC e desenvolvidas na disciplina Comunicação e Expressão em Linguagem Científica I, de caráter obrigatório. Esta disciplina, que possui 2 créditos aula e 1 crédito trabalho, foi oferecida de forma remota e síncrona via Google Meet no primeiro semestre de 2021 aos estudantes ingressantes do bacharelado em química da Universidade de São Paulo. O conteúdo do curso é usualmente ministrado por dois docentes - cada um em um momento da disciplina e ofertado em dois blocos: a introdução e caracterização de documentos científicos e bases de dados; e o uso da plataforma Google for Education. Ainda, foram oferecidas monitorias semanais com 1 hora de duração para o auxílio na resolução das atividades. Neste contexto, foi solicitado aos estudantes, no papel de jornalistas de ciência, que redigissem TDC sobre um tópico de sua escolha, correlacionando a pandemia de COVID-19 com a química. Dos 64 matriculados na disciplina, 58 participaram de todo o processo de elaboração dos textos. O tópico de saneantes foi o mais recorrente (31 TDC) e constitui o enfoque da presente análise.
3.Análise de Conteúdo
Segundo Moraes (1999), a Análise de Conteúdo é uma metodologia pautada primariamente (mas não somente) em uma análise qualitativa de cinco etapas: preparação das informações, unitarização, categorização, descrição e interpretação. Cabe ressaltar que a Análise de Conteúdo, na perspectiva do autor, é sujeita à leitura do analista, que sempre será uma interpretação permeada por sua experiência prévia. Ademais, um mesmo enunciado, além de abrir espaço para diferentes leituras, também pode expressar sentidos os quais nem mesmo seu enunciador tenha ciência, mas que se revelam diante do olhar do pesquisador. No caso deste trabalho, tal metodologia se aplica ao estudo do conteúdo dos TDC sobre saneantes e COVID-19 elaborados pelos estudantes. O detalhamento de sua aplicação é exposto no Quadro 1, discutido na sequência.
Quadro 1: Etapas da Análise de Conteúdo e sua aplicação na escrita de TDC sobre saneantes e COVID-19.
3.1 Etapa I: Preparação das Informações
Esta etapa consiste na identificação das amostras do material a serem analisadas. Para isto, foi necessário realizar uma extensa atividade de leitura crítica dos TDC, que constituem o material de análise, e de seleção dos textos cujo enfoque foram os saneantes (produção mais recorrente, com 53,5%), alvo de investigação deste trabalho. Este delineamento dos objetivos de análise resultou no levantamento geral dos tópicos escolhidos pelos estudantes, a saber: medicamentos (17,2%), Fake News (6,9%), ensino remoto de química (5,2%), químicos e atuação profissional durante a pandemia (5,2%), o vírus Sars-CoV- 2 (5,2%), consequências ambientais da pandemia (5,2%), vacinas (1,7%) e máscaras (1,7%).
3.2 Etapa II: Unitarização
A unitarização é pautada na definição e identificação da “unidade de análise” (UA) a partir dos dados coletados. Neste caso, definimos a natureza das unidades de análise como sendo cada frase escrita ao longo dos textos - isto é, a “construção que encerra um sentido completo, podendo ser formada por uma ou mais palavras, com ou sem verbo, ou por uma ou mais orações; pode ser afirmativa, negativa, interrogativa, exclamativa ou imperativa” (Oxford Languages, 2021). Na sequência, definiram-se as “unidades de contexto” (UC), de caráter mais amplo e que estipula limites textuais para a compreensão das UA. No trabalho em questão, compreendemos as UC como o TDC em sua totalidade.
3.3 Etapa III: Categorização
A categorização, na perspectiva de Moraes (1999), é uma atividade de síntese, na qual o material de análise é organizado segundo critérios que evidenciam suas semelhanças. Estas categorias, que podem emergir da análise ou serem pensadas de antemão, devem obedecer a cinco principais requisitos: (i) serem significativas e coerentes com os objetivos da pesquisa; (ii) englobarem todo o conteúdo significativo; (iii) serem homogêneas ao submeterem os dados ao mesmo critério de avaliação; (iv) garantirem que os elementos analisados não se repitam em diferentes categorias; (v) e serem objetivas. Neste caso, as categorias antecedem a análise, uma vez que emergem do Quadro Analítico de TDC proposto por Ferreira & Queiroz (2011). Nesse sentido, o critério empregado foi o da análise semântica, que diz respeito à interpretação das frases e resultam em classificações temáticas. Por se tratar de uma única dimensão de análise - consistente para todos os dados significativos - a metodologia cumpriu com seu propósito de homogeneidade e objetividade. A validade das classificações, por sua vez, é corroborada diante da adequação dos objetivos analíticos dos TDC, à natureza do material disponível - que é composto por recursos verbais e não-verbais - e por se utilizar de um instrumento de análise validado pela comunidade científica. Ainda, toda UA foi classificada em apenas uma categoria, reforçando seu caráter exaustivo e objetivo.
3.4 Etapa IV: Descrição
O caráter descritivo da Análise de Conteúdo diz respeito à comunicação dos resultados encontrados. Na pesquisa de caráter qualitativo, esta etapa conecta-se com a síntese do conteúdo, munida do emprego de citações diretas. No caso do presente trabalho, cada uma das categorias identificadas foi previamente descrita de acordo com as principais ideias sintetizadas no Quadro Analítico de Ferreira & Queiroz (2011).
3.5 Etapa V: Interpretação
A Análise de Conteúdo, para ser fundamentada, deve alcançar a etapa da interpretação dos dados. Na pesquisa de caráter qualitativo, esta etapa se relaciona com a busca pela compreensão dos dados diante de uma teoria previamente definida ou da teoria que emerge do conteúdo analisado. Neste trabalho, a análise realizada forneceu indícios sobre as potencialidades e fragilidades da escrita de TDC por bacharelandos em química a partir de diferentes aspectos. Tais percepções foram investigadas e relacionadas com os trabalhos dispostos na literatura sobre o assunto.
4.Resultados e Discussão
A Análise do Conteúdo dos TDC produzidos pelos bacharelandos em química sobre saneantes e COVID-19 é detalhada a seguir, de forma a discutir as potencialidades e fragilidades encontradas. Os resultados são apresentados na perspectiva do Conteúdo e Forma, categorias descritas no Quadro Analítico anteriormente mencionado, e interpretados em consonância com a literatura vigente.
4.1 Conteúdo dos TDC
No que tange à Análise Geral do Conteúdo, todos os textos foram caracterizados como temas de química uma vez que o tema de saneantes diz respeito ao funcionamento específico de agentes como o álcool, sabão, soluções cloradas, sais quaternários de amônio, entre outros - e transversais, já que estes se inserem no contexto de uma pandemia e têm como intuito informar diferentes nichos da população sobre medidas profiláticas e o cuidado com a saúde. No que diz respeito à Análise Específica, em particular sobre a Temática dos TDC, foi identificado um enfoque didático e instrucional, especialmente sobre a composição e funcionamento dos saneantes da perspectiva da ciência moderna. De fato, Zamboni (2001) destaca a presença da didaticidade no discurso da divulgação científica em três níveis: situacional, no qual há um enunciador detentor do conhecimento e um destinatário leigo; formal, associado a procedimentos de exemplificação, denominação e classificação, que permitem vislumbrar as lacunas que os enunciadores imaginam que seus destinatários possuam; e funcional, relativa ao modo de transmissão de determinado saber, que elucida os motivos de tais performances didáticas. A citação (1), a seguir, exemplifica esta relação verticalizada em que o estudante, enquanto autor do TDC, se coloca no papel de um instrutor em um contexto distante de seu leitor que, na sua perspectiva, constitui um grupo homogêneo e não possui conhecimento suficiente acerca dos saneantes
Porém, quando surgem vírus ou bactérias novas, as pessoas ficam assustadas e não sabem como se protegerem, como foi o caso do coronavírus.
Essa postura é recorrente na trajetória da DC, sendo muitas vezes associada ao Modelo Deficitário de Comunicação Pública de Ciência e Tecnologia. Neste, existe um esforço de preencher uma lacuna informacional que emana da sociedade e, ao mesmo tempo, ignora as raízes sociais por trás de uma audiência que não produz as respostas esperadas pela ciência moderna (Lewenstein, 2003). Apesar de criticado, este modelo é constantemente reproduzido sob a alegação de restaurar a confiança pública na ciência (Wynne, 2006). As Caracterísitas da Atividade Científica, por sua vez, foram recorrentes em todos os TDC mediante a utilização de recursos diversificados, tais como a referenciação à pesquisas, trabalho em equipe, descrição de metodologias, interpretação de resultados, formulação de hipóteses, aplicações, patentes, entre outros, como ilustrado em (2).
Em suma, Semmelweis sugeriu que tal cuidado poderia evitar os casos de febre entre mulheres que tinham acabado de dar à luz, quando observou que as mãos dos médicos e estudantes que transitavam da sala de autópsia até a ala obstétrica poderiam estar carregando “partículas cadavéricas” devido ao seu mau odor. Em maio de 1847, o médico insistiu que lavassem as mãos com uma solução clorada após as autópsias e antes de examinarem as pacientes da clínica obstétrica. Posteriormente, a taxa de mortalidade materna caiu drasticamente e continuou baixa nos anos seguintes.
A menção a tais aspectos contribuiu para evidenciar o caráter científico dos TDC. Este tipo de abordagem se mostra positiva, uma vez que favorece a disseminação de uma visão mais realista e, portanto, menos distorcida do trabalho científico (Pérez et al., 2001). Ademais, por terem ingressado em um curso de química, os estudantes demonstraram propriedade na descrição de procedimentos e domínio das informações sobre saneantes. Justamente, Dudo (2015) destaca o potencial de cientistas em serem mais críticos quanto à informação científica diante da escrita destes conteúdos para públicos não- especializados. Em relação às Abordagens e Contexto dos TDC, identificou-se a seguinte frequência, cujos resultados não são excludentes: 100% Científico; 80,7%Cotidiano; 71,0% Instrumental; 29% Conceitual; 12,9% Social; 6,5% Polêmica; 3,2% Econômica; 3,2% Ambiental. Os aspectos Científicos, Cotidianos e Sociais estiveram atrelados à própria natureza da temática, que objetivou aproximar o conhecimento sobre saneantes com a pandemia de COVID-19, a qual impactou a dinâmica social de forma sem precedentes. De fato, fornecer indícios para que o leitor identifique a informação científica em seu cotidiano social evidencia a preocupação dos estudantes em contextualizar o conteúdo textual, recurso que revela os traços de laicidade (relativo à contextualização) do discurso da DC (Zamboni, 2001). Outras abordagens também facilitaram a contextualização das informações, tais como o quesito Polêmico, registrado em TDC que resgataram desinformações disseminadas sobre os saneantes diante da pandemia. Em menor frequência estiveram TDC de ordem Econômica e Ambiental, os quais comentaram sobre o mercado de saneantes e direcionaram a atenção do leitor para a o descarte irregular de matérias- primas para a produção do sabão caseiro, como é o caso do óleo. Com efeito, a temática da química protagonizou episódios em que o desconhecimento acerca de informações acuradas sobre sanenantes levaram às catástrofes, tais como a morte de indivíduos por ingestão desses compostos (Soltaninejad, 2020). A questão Econômica e Ambiental também foram relevantes no contexto pandêmico, especialmente no âmbito das políticas públicas e a decisão por medidas não farmacológicas de contenção da doença, como o distanciamento social (Nouvellet et al., 2020). Os aspectos instrumentais estiveram intrinsecamente relacionados com TDC que ressaltaram questões metodológicas, tais como uso correto de saneantes e técnicas de higienização, enquanto que a recorrência de abordagens mais Conceituais esteve relacionada aos TDC dedicados à tecer relações com o conteúdo teórico de química de forma mais evidenciada, como a produção textual que se dedicou a dialogar sobre o conceito de teor alcoólico. Este recurso, no entanto, pode favorecer textos que dificultem a compreensão por exigir um determinado nível de conhecimento aprofundado de química. De fato, revistas de DC que, por vezes, optam por empregar corpos editoriais mais especializados, acabam por afastar leitores com menor domínio do assunto (Weigold, 2001).
4.2 Forma dos TDC
A Estrutura comumente adotada pelos estudantes foi a do texto fragmentado a partir do uso de intertítulos, recurso bastante recorrente no jornalismo. Ao mesmo tempo, 9,7% das produções se pautaram no emprego de conteúdos não-fragmentados, o que impactou a estética textual negativamente. Isto pode ser justificado pelo fato de que o emprego de títulos e a objetividade do texto considerando sua dimensão espacial - representam uma das principais formas de capturar a atenção do leitor (Vieira, 2007). Em relação à subcategoria da Linguagem, verificou-se o emprego de diferentes recursos para a contextualização da informação, com destaque para o uso de comparações (3), interpelação (4), aspeamento (5), aposto e nomeação (6), definição por conceituação (7), entre outros.
Já as moléculas hidrofílicas, como ímãs, atraem-se mais fortemente devido aos seus dipolos e cargas eletrônicas.
Mas por que o álcool em gel é mais utilizado que o líquido?
Na área da química, costuma-se dizer: “Semelhante dissolve semelhante”.
O Sars-CoV-2, nome científico do novo coronavírus, é um vírus que se espalha por meio de gotículas expelidas quando tossimos ou respiramos, as quais se aderem com facilidade a várias superfícies.
Ele é um composto orgânico que possui um grupo hidroxila (-OH) ligado a um carbono da cadeia.
Os TDC que empregaram uma varidade de recursos linguísticos para a contextualização da informação, dispunham, consequentemente, de uma linguagem mais acessível para o público-alvo pretendido. Isto se deve ao fato de que os estudantes estão mais próximos do público não-especializado. De fato, o bacharelado de química na Universidade de São Paulo, em seu período ideal, passa a ofertar recorrentemente disciplinas específicas da área a partir do 3º semestre do curso. Ainda, grande parte do exercício da DC no cenário brasileiro se encontra nas atividades de extensão universitária (Moreira & Massarani, 2002) as quais são, inclusive, previstas por lei para serem levadas à cabo de forma instituicionalizada no ensino superior, ocupando, no mínimo, 10% da carga horária dos cursos (Brasil, 2018b). Estas atividades, cotidianamente, são praticadas com grande assiduidade por estudantes de graduação. Por outro lado, os TDC que pouco empregaram os recursos linguísticos supracitados resultaram em conteúdos com demasiado uso de jargões - fato que é notoriamente um desafio aos cientistas diante da escrita de conteúdos sobre ciência para públicos leigos (Bueno, 2010; Dudo, 2015). A linguagem adotada nestes TDC demonstra o alcance de um horizonte mínimo de interpretação das respectivas fontes originais de pesquisa por parte dos estudantes, uma vez que, nestes casos, parafrasearam estes conteúdos científicos de forma recorrente (Marchuschi, 2008). Por fim, em relação à subcategoria de Recursos Visuais e Textuais, destacaram-se o emprego de boxes, esquemas explicativos, imagens e títulos de impacto em cores chamativas, como o exemplo da Figura 2, intitulado “A Guerra Microscópica: entenda como os saneantes combatem o Covid-19”. Cabe ressaltar que todos os TDC dispuseram de recursos visuais e que tal recorrência no material analisado esteve em parte associada ao contexto digital instaurado com a pandemia da COVID-19, que já foi necessária uma reformulação das aulas presenciais para o ensino remoto a partir do emprego de tecnologias digitais de informação e comunicação (Brauweiler & Yerimpasheva, 2021; United Nations, 2020) - o que sugere uma adaptação a tais tecnologias também por parte do corpo estudantil.
Os estudantes buscaram traçar conexões com a provável audiência de seus textos por meio de imagens cotidianas e recursos de atenção, como representações de produtos de limpeza, da estrutura viral e de mecanismos de transmissão da doença. Ainda, foram identificados elementos de cultura pop por meio da menção à personagens heróicas de ficção-científica ou aficionadas por limpeza, todas oriundas de séries, cuja inserção apela para o discurso lúdico e se diferencia da grande maioria das comunicações institucionais. Por outro lado, foram registrados TDC com artifícios que remetiam à comunicação entre pares, especialmente no que diz respeito às fórmulas moleculares de diferentes saneantes. Segundo Vieira (2007), na DC, deve-se evitar o emprego de fórmulas químicas, físicas e matemáticas, comuns ao ensino tradicional e à linguagem científica, e empregar ilustrações que sejam de fácil interpretação e que agreguem à mensagem veiculada.
5.Considerações Finais
A Análise de Conteúdo dos TDC produzidos pelos bacharelandos em química permitiu observar as potencialidades e fragilidades dos mesmos perante a escrita de conteúdos científicos para públicos não- especializados, com destaque para a sua atuação enquanto articuladores da DC, visto sua proximidade tanto da comunidade acadêmica, já que se situam no contexto universitário, quanto do público não- especialista. As potencialidades deste processo emergiram da contextualização das informações, especialmente presente na categoria de Abordagens e Contexto; do apelo à atenção do leitor por meio do emprego de Recursos Visuais e Textuais; e da riqueza de detalhamento das Características da Atividade Científica, que demonstraram visões não-distorcidas do trabalho científico. Por outro lado, a Temática revelou traços de uma comunicação verticalizada autor-leitor, enquanto que a análise da Linguagem evidenciou que TDC com menor emprego de recursos linguísticos resultaram em abordagens mais técnicas e conceituais, o que pode dificultar o acesso à informação por públicos menos especializados. A metodologia qualitativa de AC permitiu correlacionar os resultados deste estudo com a literatura sobre o tema de forma padronizada, uma vez que empregou a mesma categorização sugestionada pelo Quadro Analítico de TDC, consolidada pela comunidade científica, e evidenciou sua aplicabilidade ao contexto das experiências didáticas. Esta ferramenta analítica se torna especialmente relevante frente à complexidade de TDC existentes e a incipiência de instrumentos que permitam um estudo aprofundado de seus conteúdos e formas, o que é mitigado a partir do direcionamento proporcionado pelas categorias de análise pré-estabelecidas. Ainda, a aplicação de uma ferramenta de AC no contexto relatado contribui para uma análise mais aprofundada de conteúdos de química de DC, já que esta é uma área do conhecimento frequentemente subrepresentada nas iniciativas de comunicação pública de ciência e tecnologia e que enfrenta desafios relacionados à “químicafobia”. Ademais, esta análise permitiu explorar particularidades da escrita de TDC elaborados por estudantes a partir de ferramentas digitais, o que foi propiciado pelas virtualizações ocasionadas pela pandemia de COVID-19. Espera-se que futuras iniciativas possam dar continuidade à AC de TDC produzidos por estudantes de química, com enfoque nas particularidades associadas à circulação destes textos nos ambientes web e sua relação com as categorias sugestionadas pela ferramenta analítica utilizada.
