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Revista Portuguesa de Enfermagem de Reabilitação

versão impressa ISSN 2184-965Xversão On-line ISSN 2184-3023

RPER vol.4 no.2 Silvalde dez. 2021  Epub 03-Dez-2021

https://doi.org/10.33194/rper.2021.179 

Artigo original reportando investigação clínica ou básica

Lazer: um contributo da enfermagem de reabilitação na autonomia da pessoa com dpoc

Leisure: a contribution of rehabilitation nursing in the autonomy of person with copd

Ocio: una contribuición de la enfermería de rehabilitatión en la autonomía de la persona con epoc

Maria Fernanda Rodrigues1 
http://orcid.org/0000-0002-4207-2817

Goreti Marques2 
http://orcid.org/0000-0002-1342-4916

Glória Couto2 

Raquel Marques1 
http://orcid.org/0000-0002-6748-7242

Maria João Mar1 
http://orcid.org/0000-0003-3285-1371

Ana Isabel Araújo1 

1Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho, EPE, Vila Nova Gaia, Portugal

2Escola Superior de Saúde Santa Maria, Porto, Portugal


RESUMO

Introdução:

É amplamente conhecido o impacto das doenças respiratórias na saúde física e mental da pessoa. O Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação sempre foi sensível a esta problemática, sendo foco de intervenção nos seus cuidados a definição de estratégias adaptativas.

Para a pessoa com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica, o contexto atual da situação pandémica trouxe consequências aos vários níveis entre as quais: redução da atividade física, isolamento social e aumento da ansiedade.

Este contexto veio reforçar a importância de uma reflexão acerca da adoção de estratégias adaptativas que promovam a redução da intolerância à atividade da pessoa com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica na execução das Atividades de Vida Diárias nomeadamente as atividades no domínio do “lazer”.

Este estudo teve como objetivo avaliar o impacto de um Programa de Reabilitação Respiratória na realização das Atividades de Vida Diárias no domínio do “lazer”, medido pela escala London Chest Activity of Daily Living.

Metodologia:

Efetuou-se um estudo retrospetivo correlacional, que incluiu utentes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica admitidos no Programa de Reabilitação Respiratória, sendo os resultados do domínio “Lazer” avaliados, através da escala London Chest Activity of Daily Living, antes e após o Programa de Reabilitação Respiratória. Foram incluídos 46 participantes, (67,39% do género masculino e 32,6% do género feminino). A idade dos participantes situou-se entre os 40 e os 89 anos, para uma média de idade de 63 anos (DP=10,5). A maioria dos participantes possui o 1º ciclo do ensino básico (52,2%).

Resultados:

Foram identificadas diferenças estatisticamente significativas (Z=-3,395, p=0,001) no domínio do “lazer” da escala London Chest Activity of Daily Living.

Conclusão:

Verificaram-se ganhos clínicos no domínio “lazer” da escala London Chest Activity of Daily Living após a realização do Programa de Reabilitação Respiratória.

DESCRITORES: Enfermagem de Reabilitação; Atividades de Vida Diárias; Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica; Programa de Reabilitação Respiratória; Lazer

ABSTRACT

Introduction:

The impact of respiratory diseases on a person's physical and mental health is widely known. The Rehabilitation Nursing Specialist has always been sensitive to this problem, and the focus of intervention in its nursing care plan is the definition of adaptive strategies.

For the person with Chronic Obstructive Pulmonary Disease, the current context of the pandemic situation has brought consequences at various levels, including a reduction in physical activity, social isolation and increased anxiety.

This context reinforced the importance of reflecting on the adoption of strategies that promote the reduction of intolerance to the activity of the person with Chronic Obstructive Pulmonary Disease to carry out Activities of Daily Living , namely in activities in the field of “leisure”.

This study aimed to assess the impact of a Respiratory Rehabilitation Program on the realization of Activities of Daily Living in “leisure” domain, measured by the London Chest Activity of Daily Living scale.

Methodology:

A retrospective correlational study was carried out, which included patients with Chronic Obstructive Pulmonary Disease admitted to the Respiratory Rehabilitation Program, the results of the Activities of Daily Living in the “Leisure” domain was evaluated using the London Chest Activity of Daily Living Scale, before and after the Respiratory Rehabilitation Program. 46 participants were included, (67.39% male and 32.6% female), with ages between 40 and 89 years, for an average age of 63 years old (SD = 10.5). Most patients had basic level education (52.2%).

Results:

Statistically significant improvements were identified (Z = -3.395, p = 0.001) in the “leisure” domain of the London Chest Activity of Daily Living Scale score after Respiratory Rehabilitation Program protocol completion.

Conclusion:

There was improvement in the leisure domain of London Chest Activity of Daily Living Scale score after the performance of the Respiratory Rehabilitation Program protocol.

DESCRIPTORS: Rehabilitation Nursing; Daily Living Activities; Chronic Obstructive Pulmonary Disease; Respiratory Rehabilitation Program; Leisure

RESUMEN

Introducción:

Es ampliamente conocido el impacto de las enfermedades respiratorias en la salud física y mental de los pacientes. El Enfermero Especialista en Enfermería de siempre ha sido sensible a este tema, y parte de su intervención es la definición de estrategias de adaptación.

Para la persona con Enfermedad Pulmonar Obstructiva Crónica, el contexto actual de la situación pandémica ha traído consecuencias a varios niveles, incluida la reducción de la actividad física, el aislamiento social y el aumento de la ansiedad.

Este contexto reforzó la importancia de reflexionar sobre la adopción de estrategias que promuevan la reducción de la intolerancia a la actividad de la persona con Enfermedad Pulmonar Obstructiva Crónica para realizar Actividades de la Vida Diaria, concretamente en actividades del ámbito del “ócio”.

Este estudio tuvo como objetivo evaluar el impacto de un Programa de Rehabilitación Respiratoria en la realización de Actividades de la Vida Diaria en el dominio del “ócio”, medido por la escala London Chest Activity of Daily Living.

Metodología:

Se realizó un estudio correlacional retrospectivo, que incluyó a pacientes con Enfermedad Pulmonar Obstructiva Crónica ingresados en el Programa de Rehabilitación Respiratoria, siendo los resultados del ámbito "ocio" evaluados a través de la Escala London Chest Activity of Daily Living, antes y después del Programa de Rehabilitación Respiratoria. Se incluyeron 46 participantes (67,39% hombres y 32,6% mujeres). La edad de los participantes fue entre 40 y 89 años, con un promedio de edad de 63 años (DE = 10,5). La mayoría de los participantes tenía la educación básica (52,2%).

Resultados:

Se identificaron diferencias estadísticamente significativas (Z = -3.395, p = 0.001) en el ámbito del “ocio” en la escala London Chest Activity of Daily Living.

Conclusión:

Se han comprobado ganancias clínicas en el dominio de “ocio” en la escala London Chest Activity of Daily Livin después de realizar la Programa de Rehabilitación Respiratoria.

DESCRIPTORES: Enfermería de Rehabilitación; Actividades de la Vida Diaria; Enfermedad Pulmonar Obstructiva; Programa de rehabilitación respiratoria crónica; ócio

INTRODUÇÃO

À medida que a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) progride, a perda de função pulmonar, as alterações das trocas gasosas e descondicionamento muscular periférico limitam a pessoa nas suas atividades de vida na interação familiar, social e profissional com graves repercussões na qualidade de vida. A incapacidade da pessoa em realizar determinada tarefa ou atividade física, com intensidade ou duração normalmente tolerada por uma pessoa sedentária e sem patologia associada, representa em termos clínicos a intolerância à atividade 1,2. Esta intolerância leva à adoção de estilos de vida mais sedentários na tentativa de evitar a dispneia e a fadiga com o esforço, resultando no agravamento do descondicionamento muscular e consequente diminuição da capacidade funcional levando as pessoas a percecionarem uma menor capacidade para realizar as Atividades de Vida Diárias (AVD), atividade profissional e social, com repercussão na sua condição física, emocional e social. Estas alterações desencadeiam quadros de ansiedade e depressão, conduzindo a sentimentos de tristeza, frustração, alterações do sono, dificuldades de concentração, preocupações somáticas e isolamento social. Neste sentido, a participação na sociedade fica limitada, com perda de qualidade de vida 3,4,5,6,7,8.

A Reabilitação Respiratória é uma intervenção global, multidisciplinar, destinada a pessoas com DPOC, com o objetivo de controlar os sintomas, melhorar a qualidade de vida física e emocional, aumentar a participação social nas atividades quotidianas, bem como diminuir os gastos em saúde mediante a estabilização ou regressão das manifestações da doença 4,9.

Os Programas de Reabilitação Respiratória (PRR) com integração de Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação (EEER) visam a capacitação da pessoa para melhor gerir a sua doença crónica. No âmbito da sua atividade intervêm em aspetos relacionados com o foco ventilação e intolerância à atividade no sentido de otimizar e melhorar a gestão da dispneia e promover a autonomia da pessoa com DPOC para as AVD 10,11,12. Estes programas incluem diferentes componentes: o Treino de Exercício, módulo de educação e apoio psicossocial, suporte nutricional e alteração comportamental 13,14,15.

A solidão e a falta de objetivos de vida associados às alterações patológicas da DPOC, levam a uma deterioração progressiva da qualidade de vida da pessoa. A avaliação do impacto cognitivo, emocional, comportamental e físico da doença nas atividades de vida é de extrema importância, quer na avaliação do estado de saúde, quer na conceção de cuidados de Enfermagem de Reabilitação. Sendo a DPOC uma doença crónica e progressiva, é frequente que a pessoa sinta que não controla a sua evolução, sendo comuns os sintomas de ansiedade e depressão, que podem levar a um maior isolamento social e uma redução da atividade física 16. Por sua vez, pode diminuir a motivação para adquirir conhecimentos e capacidades para o autocontrolo da doença e deste modo, poderá ser afetada negativamente a sua qualidade de vida. Estes são aspetos que tem merecido a atenção dos EEER e são trabalhados pelos mesmos durantes os PRR.

Estas foram as premissas que levaram à elaboração da questão de partida: qual o impacto das atividades desenvolvidas pelo EEER na capacidade da pessoa para realizar as AVD nomeadamente no domínio do “lazer”? Formulamos assim a seguinte hipótese de investigação: as pessoas com DPOC que realizaram o PRR apresentaram menos limitações na realização das AVD no que se refere ao seu “lazer”.

O EEER através de intervenções tais como: monitorização/supervisão do treino de exercício, técnicas de Reeducação Funcional Respiratória, controlo ventilatório, gestão de dispneia, capacitação para a gestão e otimização do regime terapêutico e ensino de técnicas de relaxamento para controlo do stress/ansiedade promove a autonomia da pessoa com DPOC nas suas AVD no domínio do “lazer” 4. Visto isto, ter melhor sensação de controlo da sua doença e realizar pequenas atividades de carácter social traduzem melhor qualidade de vida.

A realização deste estudo teve como propósito avaliar o impacto na realização das AVD, no domínio do “lazer”, das pessoas com DPOC submetidas a um PRR. Os objetivos delineados foram: caracterizar as pessoas com DPOC que integraram o PRR e comparar a capacidade dos mesmos para o desempenho nas AVD nomeadamente no domínio do “Lazer”.

METODOLOGIA

Realizou-se um estudo retrospetivo-correlacional de natureza quantitativa, tendo como objetivo avaliar o impacto do PRR nas AVD no domínio do “lazer” nas pessoas com DPOC. No presente trabalho, na avaliação da capacidade da pessoa com DPOC para a realização das AVD recorreu-se à escala London Chest Activity of Daily Living (LCADL) que no domínio do “lazer”, avalia aspetos relacionados com a capacidade da pessoa para caminhar dentro de casa, sair socialmente e falar/conversar.

O presente estudo incluiu pessoas com DPOC que integraram o PRR numa Unidade de Reabilitação de um Centro Hospitalar do Norte do País no período entre janeiro e dezembro de 2018. Utilizou-se o processo de amostragem por conveniência em que foram considerados os seguintes critérios de inclusão: pessoas com diagnóstico de DPOC; pessoas que realizaram a totalidade das sessões que integram o PRR e pessoas com avaliação inicial e final completa.

A recolha dos dados foi autorizada pelo Conselho de Administração e pela Comissão de Ética do Centro Hospitalar onde decorreu o estudo (Autorização nº 288/2019).

Consideraram-se no decorrer deste estudo os procedimentos éticos necessários. Foi garantido o anonimato e a confidencialidade bem como a exclusividade dos dados. Os dados foram recolhidos numa sala reservada, sendo garantida confidencialidade no manuseamento dos processos e só foram retirados os dados estritamente necessários. Neste sentido, foi criada uma base de dados numerada, sem nunca serem identificados os utentes, e a codificação dos dados foi efetuada unicamente pelo investigador e respetivos colaboradores, sendo assegurado o total sigilo.

Na análise estatística descritiva utilizaram-se frequências absolutas (n) e relativas (%); medidas de tendência central: média (M) bem como medidas de dispersão: mínimo (Min), máximo (Max) e desvio padrão (DP). O nível de significância (sig) para o tratamento estatístico foi de 5%. Na análise inferencial foi utilizado o Teste Wilcoxon para amostras emparelhadas.

Por forma a avaliar o nível de limitação das pessoas com DPOC na realização das AVD no domínio do “lazer”, utilizou-se como instrumento a escala LCADL aplicado às referidas pessoas, em dois momentos: antes e após o PRR.

O programa realizado pela amostra do presente estudo (quadro 1) foi constituído por 20 sessões, durante 10 semanas com a duração de 90 minutos cada sessão, sendo realizadas 2 sessões por semana em ambiente hospitalar.

Pela importância que o controlo ventilatório assume, nomeadamente quando se progride para o treino ao esforço, as técnicas de reeducação funcional respiratória revelam-se fundamentais para otimizar o utente na sua gestão de energia e definir estratégias para um melhor desempenho das suas AVD.

Quadro 1 Caracterização do Programa de Reabilitação 

Treino Tipologia/Modalidade Tempo/Duração/Intensidade
Técnicas de RFR Consciencialização e controlo da respiração
Expiração com lábios semicerrados
Reeducação diafragmática posterior
Abertura costal global
Mobilização escapulo-umeral
Reeducação costal global com faixa
15 repetições cada técnica (realizadas na posição de sentado em frente a espelho quadriculado)
Aquecimento Exercícios de mobilização global dos membros superiores e membros inferiores sem carga, para ativação global dos grupos musculares e mobilização articular global 5 minutos
Exercício aeróbio
Bicicleta
Passadeira
Cicloergómetro dos Membros Superiores
20 minutos
10 minutos
Entre 5 a 10 minutos
Progressão na intensidade com início a 50% até 80% da carga máxima
Treino de força muscular** Treino com halteres livres, bandas elásticas e caneleiras
• Bíceps e tríceps braquial
• Bíceps femoral, abdutores e gémeos
• Dorsais e quadríceps (realizados em máquina dorsais e de quadríceps na posição sentado)
Carga entre 0,5 e 3 kg *
10 a 15 repetições *
1-3 séries *
Duração:15minutos

Carga entre 2,5 e 25w*
10 a 20 repetições *
Alongamentos Exercícios de alongamento dos principais grupos musculas dos membros superiores e membros inferiores 5 minutos

*Carga, número de repetições e séries adaptadas à capacidade funcional de cada pessoa bem como a progressão das mesmas ao longo do programa.

**Durante os exercícios que são executados para o treino de força muscular são trabalhados simultaneamente aspetos relacionados com a flexibilidade e o equilíbrio.

O referido programa é composto por várias componentes: Reeducação Funcional Respiratória, Treino de Exercício e sessões de educação para a saúde. O EEER implementa as sessões educacionais, o programa de treino de exercício e efetua ensino e incentivo ao utente para dar continuidade ao programa no domicílio. Para garantir a efetividade do PRR e a adesão ao mesmo, o EEER define estratégias de adaptação para o domicílio, adequadas a cada pessoa de acordo com as suas características individuais e de acordo com os materiais/ equipamentos que cada pessoa possui em casa.

As sessões educacionais realizadas estão evidenciadas na tabela 1.

Tabela 1 Sessões educacionais 

Sessões educacionais Duração/frequência/Metodologia
Fisiopatologia da DPOC; Cada sessão tem a duração de 45 minutos, de 15 em 15 dias;
Expositiva/Participativa.
Gestão do regime terapêutico;
Técnica inalatória;
Técnicas da tosse/relaxamento/ controlo ventilatório;
Técnicas de gestão de energia;
Treino de AVD;
Adaptação do exercício para o domicílio;
Nutrição.

RESULTADOS/DISCUSSÃO

No período de janeiro a dezembro de 2018 foram admitidos para tratamento na unidade de reabilitação, 108 pessoas. Destas, 27 não apresentaram diagnóstico de DPOC, 20 não concluíram o PRR (3 por falecimento, 9 por agudização e 8 por motivo desconhecido) e as restantes 15 pessoas não apresentaram dados suficientes na avaliação inicial ou final. Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, a amostra ficou constituída por 46 pessoas com diagnóstico de DPOC, que integraram o PRR numa unidade de reabilitação de um Centro Hospitalar do Norte do País.

Tabela 2 Distribuição da amostra segundo as variáveis sociodemográficas. 

Variáveis n %
Género Masculino 31 67,4%
Feminino 15 32,6%
Grau de escolaridade Sem habilitações 1 2,2%
Básico (1º ciclo) 24 52,2%
Básico (2º ciclo) 12 26,1%
Básico (3º ciclo) 4 8,7%
Secundário 5 10,9%
Idade do utente [anos] 40-49 3 7%
50-59 16 35%
60-69 14 30%
70-79 11 24%
80-89 2 4%

A análise das características sociodemográficas (tabela 2) da amostra permite inferir que a maioria dos participantes com diagnóstico de DPOC é do género masculino (67,39%) e 32,6% do género feminino. A idade dos participantes situa-se entre os 40 e os 89 anos, para uma média de idade de 63 anos (DP=10,5). A maioria dos participantes deste estudo apresentam como nível de escolaridade o ensino básico. Os resultados alcançados corroboram outros estudos, particularmente um estudo que pretendia avaliar a confiabilidade do índice de autoeficácia adaptado para reabilitação pulmonar em utentes com patologia respiratória, o qual integrou 150 pacientes com uma idade média de 67 anos. Dos participantes, 46.7% tinham DPOC e 54% eram do sexo masculino 17. Num outro estudo, que visava avaliar o impacto da doença respiratória crónica nos autocuidados antes e após o PRR, foi considerada uma amostra de 38 participantes, sendo 71,9% do sexo masculino com uma idade média de 67 anos 1. Esta evidência foi também obtida na realização de um estudo que pretendia aferir os efeitos de um programa de reabilitação pulmonar na resposta fisiológica e no desempenho das AVD em pessoas com DPOC. Foram incluídas 31 pessoas, na sua maioria homens (71%), com idade média de 64,2 anos 18.

A idade média dos participantes permite refletir acerca da importância da realização de PRR nesta faixa etária, isto porque são utentes socialmente ativos. É importante o controlo desta doença e investir na capacitação destas pessoas para a gestão da sua doença crónica, aumentando a longevidade e a qualidade de vida. As guidelines têm vindo a reforçar cada vez mais que perante fatores de risco devem ser efetuados diagnósticos precoces, intensificando a relevância da gestão da doença e da atividade física, pelo que é fulcral realizar PRR em faixas etárias mais jovens 19.

No que diz respeito ao nível de escolaridade, no presente estudo 52,2% da amostra, possuía o 1º ciclo do ensino básico, 14 participantes concluíram o 2º ciclo do ensino básico (26,1%) e 4 participantes (8,7%) frequentaram o 3º ciclo do ensino básico. O ensino secundário foi frequentado por 5 participantes (10,9%). Estes achados estão em linha com outro estudo, onde os participantes, maioritariamente (55%), frequentaram o ensino básico 20.

O facto de a maioria dos participantes possuir o ensino básico remete para a necessidade de adequar os conteúdos das sessões de educação ao nível de compreensão e conhecimentos dos participantes.

Por forma a comparar a capacidade para o desempenho das AVD das pessoas com DPOC antes e após o PRR, compararam-se os resultados obtidos através da aplicação do instrumento LCADL em dois momentos distintos, antes e após o PRR (tabela 3).

Tabela 3 Escala LCADL (domínio “lazer”) antes e após o PRR 

n Mínimo Máximo Média DP Extremos possíveis
LCADL antes 46 6 53 25,07 10,53 0-75
após 46 9 50 19,57 9,25
Domínio “lazer” antes 46 0 10 4,50 2,32 0-15
após 46 0 10 3,52 2,14

Verifica-se que antes da realização do PRR a média do score total do instrumento LCADL é 25,07, sendo que o mínimo é 6 e o máximo 53 (DP=10,53). Após o PRR, a média do score total é de 19,57 tendo como mínimo um score de 9 e como máximo um score de 50 (DP=9,25).

Estes achados revelam uma redução da intolerância na realização das AVD dos participantes, considerando uma diminuição da média dos scores totais de 25,07 para 19,57, antes e após o PRR, respetivamente, sendo que a diferença mínima com significado clínico para a LCADL é de 4 unidades21, e no presente estudo essa diferença é de 5,5 unidades, considera-se que os resultados obtidos tem significado clínico. Os resultados do presente estudo seguem a evidência de outros estudos. Um deles incluiu 3608 pessoas com diagnóstico de DPOC, sendo o valor do score total da LCADL de 29,6 nas pessoas com DPOC grave e muito grave e 21,4 nas pessoas com DPOC moderada 22. Num outro estudo participaram 60 pessoas com DPOC e também foram demonstradas diferenças estatísticas nos diferentes domínios da escala LCADL 11.

Os resultados obtidos remetem para a importância do papel do EEER na capacitação do utente/ cuidador para as AVD, atenuando as limitações que os utentes ostentam, ajudando na gestão das incapacidades subjacentes à doença crónica.

No domínio “lazer” os participantes referem limitação nas AVD, com um score médio de 4,50. Após o PRR o score neste domínio diminuiu, com a média de 3,52.

Observando a tabela 4, comparando os resultados do domínio “lazer” antes e após o PRR, verificam-se através do teste não paramétrico de Wilcoxon para amostras emparelhadas diferenças estatisticamente significativas (Z=-3,395, p=0,001). Verifica-se aumento da autonomia para a realização das AVD no que se refere ao domínio do “lazer”, confirmando a hipótese de investigação inicialmente formulada.

Tabela 4 Teste Wilcoxon para amostras emparelhadas 

Z Sig.
Domínio “lazer” após PRR - Domínio “lazer” antes PRR -3,395 0,001
LCADL após PRR - LCADL antes PRR -4,935 <0,001

Estes resultados remetem para a importância da valorização das intervenções do EEER durante o PRR nomeadamente a capacitação da pessoa para a realização das AVD através de estratégias adaptativas que traduzem ganhos na capacidade para a execução das mesmas, promovendo a qualidade de vida. Este facto demonstra a importância de incluir no plano as atividades de lazer que a pessoa poderá continuar a realizar e ajudá-la a encontrar estratégias adaptativas para a sua continuidade, para que isto não resulte de um menor investimento da sua parte ou até mesmo um desinvestimento na sua realização levando a um maior isolamento.

O ERR tem um papel central no desenvolvimento e implementação destas terapêuticas, através da conceção, implementação e gestão das terapêuticas que visem o desenvolvimento na pessoa com DPOC de conhecimentos e capacidades para o autocontrolo da doença, e do seu impacto no quotidiano.

CONCLUSÃO

A finalidade deste estudo consistiu em aferir o impacto do PRR, realizado por EEER nas AVD das pessoas com DPOC nomeadamente no domínio do “lazer” da LCADL. Os resultados do mesmo demonstram ganhos clínicos após a realização do PRR, traduzidos na diminuição das limitações na realização das AVD, por avaliação da escala global.

A realização deste trabalho salienta o papel ativo que o EEER tem nos PRR, contribuindo ao nível da autonomia para as AVD, por um lado, na capacitação para a gestão da doença crónica e definição de estratégias adaptativas para as AVD, e por outro, na implementação dos programas de treino para melhorar a intolerância à atividade, mitigando um conjunto de alterações emocionais, afetivas e educacionais.

Podemos concluir que o PRR que integra este estudo contribui para a diminuição da limitação na realização das AVD, verificando-se melhoria estatisticamente significativa no domínio “lazer” da escala LCADL.

Sugere-se que os PRR tenham continuidade na comunidade onde já existem os PRR com EEER nas Unidades de Cuidados na Comunidade para manter a vigilância e acompanhamento destas pessoas, bem como a realização de estudos que associem a monitorização da tolerância ao exercício.

Agradecimentos

Os autores agradecem a todos quantos contribuíram para a realização deste trabalho.

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Financiamento: Este trabalho não recebeu nenhuma contribuição financeira ou bolsa.

Comissão de Ética: Estudo autorizado pela Comissão de Ética nº 288/2019

Declaração de consentimento informado: Não se aplica.

Recebido: 18 de Junho de 2021; Aceito: 22 de Outubro de 2021; Publicado: 02 de Dezembro de 2021

Autor correspondente: Maria Fernanda Rodrigues, nandarpaiva@gmail.com

Contribuição do(s) autor(es):

Conceptualização: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Metodologia: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Validação: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Análise formal: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Investigação: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Tratamento de dados: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Preparação do rascunho original: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Redação e edição: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Revisão: MFRR; GFSM; GMAC; MJMPC; AICAP; RMRM.

Todos os autores leram e concordaram com a versão publicada do manuscrito.

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