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Revista de Investigação & Inovação em Saúde

versão impressa ISSN 2184-1578versão On-line ISSN 2184-3791

RIIS vol.6 no.2 Oliveira de Azeméis dez. 2023  Epub 31-Dez-2023

https://doi.org/10.37914/riis.v6i2.258 

Artigos de investigação

Fatores que influenciam a procura de ajuda dos serviços de aborto em Moçambique

Factors influencing help-seeking process of abortion services in Mozambique

Factores que influyen en la búsqueda de ayuda para los servicios de aborto en Mozambique

Mónica Frederico1 

Carlos Arnaldo2 

1MSc, em Desenvolvimento Rural no Centro de Estudos Africanos; Investigador Assistente do Centro de Estudos Africanos (CEA) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), Moçambique

2PhD, em Demografia - Centro de Estudos Africanos; Diretor do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), Moçambique


Resumo

Enquadramento:

a procura de ajuda pressupõe um comportamento de busca ativa de informação, aconselhamento, tratamento ou suporte para responder a um problema reconhecido.

Objetivo:

perceber o processo de busca de ajuda para a interrupção da gravidez pelas adolescentes e jovens, as fontes de ajuda, e os fatores influenciadores.

Metodologia:

abordagem qualitativa baseada em entrevistas semiestruturadas às enfermeiras dos Serviços de Saúde Amigos dos Adolescentes e Jovens, das urgências de ginecologia e das maternidades de 8 unidades sanitárias das cidades de Maputo e Quelimane; foram entrevistadas igualmente 14 adolescentes e jovens que induziram aborto. Aos dados, foi feita uma análise de conteúdo.

Resultados:

a procura de serviços de aborto iniciou com a confirmação e reconhecimento da gravidez. As amigas e as irmãs constituíram as fontes iniciais e estímulos para a identificação do provedor para a interrupção da gravidez, depois de analisados os custos e benefícios de continuar ou terminar a gravidez; não perceção da suscetibilidade de ter uma gravidez precoce e a gravidade das suas consequências. Não conhecimento das fontes de ajuda e das leis; medo de exposição pública; falta de recursos financeiros; e o comportamento dos provedores serviram de barreiras neste processo.

Conclusão:

Há necessidade de uma maior divulgação dos serviços de saúde sexual e reprodutiva disponíveis, bem como promoção da educação sexual, para escolhas saudáveis.

Palavra-chave: Moçambique; adolescentes; jovens; gravidez; aborto

Abstract

Background:

help-seeking behaviour implies an active search for information, counselling, treatment or support to respond to a recognized problem.

Objective:

to understand the help seeking process for abortion services by adolescents and young women, sources of help and, the influencing factors.

Methods:

a qualitative approach was applied using semi-structured interviews with nurses from Adolescents and Young People Friendly Health Services, gynaecology emergency services and, maternity services of 8 health facilities in Maputo and Quelimane cities; 14 adolescents and young women who induced abortion were also interviewed. The data was analysed using content analysis approach.

Results:

the help seeking process for abortion services started with confirmation and recognition of the pregnancy. Friends and sisters were the initial sources of information and stimuli for the identification of the provider of abortion services, after analysing the costs and benefits of keeping the pregnancy or inducing abortion; non-perception of the susceptibility and the severity of having an early pregnancy. Non-awareness of sources of help and laws; fear of public exposure; lack of financial resources; and providers’ behaviour served as barriers in this process.

Conclusion:

dissemination of available sexual and reproductive health services is recommended, as well as promotion of sex education for healthy choices.

Keywords: Mozambique; adolescent; young women; pregnancy; abortion

Resumen

Marco contextual:

la búsqueda de ayuda implica un supuesto de búsqueda activa de información, asesoramiento, tratamiento o apoyo para responder a un problema reconocido en instituciones formales o informales.

Objetivo:

processos el processo de búsqueda de ayuda para la interrupción del embarazo por parte de adolescentes y jóvenes, las fuentes de ayuda y los factores que influyen.

Métodos:

un enfoque cualitativo basado en entrevistas semiestructuradas con enfermeras de los Servicios de Salud Amigos de Adolescentes y Jóvenes, de lprocesso s ias processo s gía y de las maternidades de 8 unidades de salud de las ciudades de Maputo y Quelimane; se entrevistaron 14 adolescentes y jóvenes que se provocaron el aborto. Se realizó un análisis de contenido de los datos utilizando NVivo versión 11.

Resultados:

la búsqueda de servicios de aborto se iniccomcon la confirmación y reconocimiento del embarazo. Amigos y hermanas fueron las fuentes y estímulos iniciales para la identificación del prestador de servicios de interrupción del embarazo, después de analizar los costos y beneficios de continuar o interrumpir el embarazo; la no percepción de la susceptibilidad y de la gravedad de tener un embarazo precoz. El desconocimiento de las fuentes de ayuda y de las leyes; el miedo a la exposición pública; la falta de recursos financieros; y el comportamiento de los proveedores sirvieron como barreras en este proceso.

Conclusión:

se recomienda la difusión de los servicios de salud sexual y reproductiva disponibles, así como la promoción de la educación sexual para elecciones saludables.

Palabras clave: Mozambique; adolescentes; jóvenes; embarazo; aborto

Introdução

O presente estudo aborda os fatores e o processo de procura de serviços de aborto pelas adolescentes e jovens das cidades de Maputo e Quelimane, em Moçambique. A adolescência é marcada por mudanças nos aspetos físico, psicológico e biológico, que assinalam a transição para a vida adulta (Fatusi & Hindin, 2010). É uma fase considerada frágil, em que os adolescentes precisam de ajuda para enfrentar os riscos a que estão expostos e que podem ameaçar a sua saúde e bem-estar em geral (Fatusi & Hindin, 2010). Dados de inquéritos demográficos realizados entre 2005-2012 mostram que a primeira relação sexual, que normalmente ocorre entre os 16 e 18 anos de idade, tende a ser uma relação não protegida, o que expõe as raparigas a um maior risco de infeções sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV e a gravidez precoce e indesejada (UNFPA, 2014). Relativamente à gravidez, a evidência indica que das 10.2 milhões de gravidezes indesejadas que ocorrem anualmente em adolescentes entre os 15-19 anos, nos países em desenvolvimento, 5.6 milhões resultaram em abortos, dos quais 3.9 milhões são inseguros (Darroch et al., 2016).

Em Moçambique, o início da atividade sexual acontece por volta dos 16 anos, em média (Ministério da Saúde & Instituto Nacional de Estatistica, 2018), uma idade considerada precoce, na qual os adolescentes ainda não possuem informação adequada sobre as medidas de prevenção para uma vida sexual e reproductiva saudável. Muitas raparigas têm a menarca sem que tenham tido uma informação prévia sobre este fenómeno, o que aumenta o risco de engravidarem precocemente, ou mesmo de contrair infeções de transmissão sexual (Ibitoye et al. 2017; Belayneh & Mekuriaw, 2019). O Inquérito de Indicadores de Imunização, Malária e HIV/SIDA em Moçambique (IMASIDA) de 2015, indica que 76.0% das adolescentes de 19 anos de idade já ficaram grávidas pelo menos uma vez na vida e cerca de 24.0% das gravidezes que ocorreram nos dois anos anteriores ao inquérito eram indesejadas (Ministério da Saúde & Instituto Nacional de Estatistica 2018). O IMASIDA mostra também que 7.8% das adolescentes e jovens entre os 15 e os 24 anos de idade declararam já ter tido infeções de transmisão sexual (Ministério da Saúde & Instituto Nacional de Estatistica, 2018). Frederico et al. (2020) encontraram que, no conjunto das adolescentes e jovens entrevistadas, 5.8% já haviam induzido um aborto. Um estudo qualitativo, recente, sobre o aborto voluntário entre jovens crentes das religiões Protestante e Católica da cidade de Maputo, refere que há algumas jovens destas congregações religiosas que já induziram aborto (Faduco, 2021). Embora os dados sejam escassos, eles dão uma indicação de que o aborto em Moçambique é uma prática comum entre adolescentes e jovens é comum em Moçambique e coloca em risco a sua saúde.

A existência de instituições de apoio e aconselhamento em saúde sexual e reprodutiva, pode contribuir para uma preparação adequada da entrada à atividade sexual para os adolescentes e jovens. No entanto, isto por si só não garante ajuda se estes serviços não forem procurados pelos adolescentes. A procura de ajuda pressupõe um comportamento de busca ativa de informação, aconselhamento, tratamento ou suporte para responder a um problema reconhecido e que pode ser partilhado com outra pessoa (Rickwood et al., 2005). A procura de ajuda baseia-se nas relações sociais interpessoais e pode ser informal, quando a ajuda é procurada em amigos ou na família, ou formal, quando a procura é feita junto de profissionais capazes de ajudar e aconselhar (Rickwood et al., 2005; Cakar & Savi, 2014). Rickwood et al. (2005) refere ainda que os adolescentes tendem a não procurar ajuda em profissionais e, os poucos que procuram, fazem-no depois de terem procurado uma fonte informal, onde os amigos são a primeira fonte e os pais, a fonte alternativa. A família é a unidade social responsável pela socialização e orientação dos adolescentes e jovens onde, os mais novos aprendem com os adultos, compartilham as crenças e comportamentos relativos à doença e saúde, influenciando assim o uso mútuo de cuidados médicos (Segrin & Flora., 2011). Contudo, os adolescentes e jovens, na tentativa de busca de ajuda dentro da família, nem sempre encontram a resposta ou encontram-na tardiamente (Cakar & Savi, 2014).

Este artigo aborda os fatores e o processo de procura dos serviços de aborto pelas adolescentes e jovens. Pretende-se perceber o processo de busca e a interação entre as adolescentes e as suas fontes de ajuda e os fatores que influenciaram este processo. Assim, o estudo busca informação com potencial para influenciar ou orientar aos decisores para a formulação de políticas e programas de prevenção dos riscos à saúde dos adolescentes e jovens. Em concreto, o estudo tem como objetivo examinar as motivações e os fatores que influenciam o processo de procura de ajuda dos serviços de aborto pelas adolescentes e jovens nas cidades de Maputo e Quelimane, Moçambique.

Enquadramento/ fundamentação teórico

A procura de ajuda é um ato de busca de solução, sendo, por isso, um processo resultante da necessidade de responder a um problema em que o indivíduo, por si só, não pode solucionar, e a interação com terceiros torna-se imperiosa.

O comportamento de busca de ajuda tende a ser analisado em dois prismas: o primeiro olha para o comportamento de busca de cuidados médicos e o segundo analisa o comportamento de busca de saúde de forma mais integrada, identificando os fatores que permitem ou impedem as pessoas de fazerem escolhas saudáveis, no que respeita ao estilo de vida ou ao uso de cuidados e tratamentos médicos (Mackian et al., 2004). Apoiando-se no modelo de Barker (2007) e de Champion & Skinner (2008), o presente estudo enquadra-se no segundo prisma, pois procura perceber os fatores influenciadores da procura de ajuda em serviços de aborto.

Na teoria sobre a busca de ajuda um dos pontos iniciais e determinantes é a perceção do problema ou da necessidade de ajuda. Segundo Barker (2007) e Divin et al. (2018), o reconhecimento do problema e da necessidade de ajuda conduz à perceção do mesmo e, por sua vez, dita o tipo de ajuda necessária, definindo-se assim a motivação para a sua procura. Contudo, a procura de ajuda pode ser influencia por fatores internos e por fatores externos. Os fatores internos podem ser o conhecimento das fontes de ajuda e das normas sociais; a perceção sobre os outros, o acolhimento das instituições prestadoras de ajuda e a capacidade pessoal de resolver o problema; a experiência anterior de procura de ajuda e a habilidade de identificar ou articular as necessidades. Os fatores externos podem ser a distância, a disponibilidade e os custos dos serviços; a recetividade e o conhecimento das preocupações dos adolescentes pelos provedores; a existência de serviços amigos do adolescente, os valores culturais sobre a interação adolescente-adulto, e o contexto legal das políticas (Barker, 2007; Champion & Skinner, 2008; Divin et al., 2018).

A perceção do risco tem sido explicada através do modelo de crenças em saúde (HBM) (Champion & Skinner, 2008). Este modelo desenvolvido por psicólogos dos Serviços de Saúde Pública dos Estados Unidos de América, nos anos 1950, visava explicar a razão pela qual as pessoas não se preveniam corretamente de certas doenças para as quais já havia testes e vacinas (Champion e Skinner, 2008). O modelo foca em quatro dimensões, nomeadamente: (i) a suscetibilidade de contrair uma doença e gravidade das suas consequências, neste caso de ter uma gravidez indesejada, (ii) benefícios/custos (iii) estímulos e (iv) barreiras percebidas, explorando, por exemplo, as perceções do indivíduo sobre a ameaça representada por um problema de saúde, em termos de sua suscetibilidade de contrair uma doença, e gravidade que esta pode ter sobre si (Champion & Skinner, 2008). Esta teoria explica ainda que mesmo que a pessoa perceba a sua suscetibilidade de contrair uma doença, a mudança de comportamento é influenciada pelas crenças que tem em relação aos benefícios de agir para a prevenção e barreiras existentes. No contexto da procura de ajuda para a interrupção da gravidez, este modelo é útil para identificar e analisar as barreiras que limitaram as adolescentes e jovens que tiveram uma gravidez precoce e indesejada, de procurarem ajuda junto das pessoas ou instituições de saúde qualificadas para tal.

Tratando-se de um estudo sobre a interrupção de uma gravidez, torna-se necessário abordar o contexto legal do aborto em Moçambique, desde a independência à 2017, altura em que foram publicadas as linhas orientadoras para a provisão do aborto seguro nas unidades sanitárias. A legislação herdada da administração colonial e que vigorou até aos anos 80 era restritiva em relação a interrupção da gravidez (Agadjanian, 1998). Entretanto, o aumento do número de pacientes com complicações resultantes dos abortos inseguros, despertou a consciência de se estar perante um problema, o que levou o Ministério da Saúde a autorizar a realização de abortos em alguns hospitais, mediante uma solicitação por escrito (Agadjanian, 1998). De acordo com Ustá et al. (2008), antes da nova lei do aborto de 2014, as condições prévias para ter acesso a estes serviços incluíam uma carta de solicitação, identificação da mulher, a foto do parceiro e um valor aproximado de 621.6MZN (cerca de 10 dólares americanos ao câmbio médio de 2022. De acordo com estes autores a cobrança deste valor constituía uma barreira para muitas mulheres obterem estes serviços. Em 2014, uma lei de aborto mais liberal foi aprovada em Moçambique - Lei nº 35, 2014, e as suas diretrizes foram disponibilizadas em 2017-Diploma Ministerial 2017, (Moçambique, 2014; Moçambique, 2017). De acordo com esta lei, as mulheres podem solicitar e fazer o aborto legalmente dentro das primeiras 12 semanas de gestação; dentro das primeiras 16 semanas, se a gravidez resultar de violação sexual ou incesto; e durante as primeiras 24 semanas, se a saúde física ou mental da mulher estiver em risco ou em casos de doença ou anomalia do feto. Mulheres, menores de 16 anos de idade ou mulheres que não são capazes de decidir precisam do consentimento dos pais ou das pessoas responsáveis por elas (Moçambique, 2014; Moçambique, 2017).

Metodologia

Este estudo é qualitativo e faz parte de um grande estudo designado Pregnancy During Adolescence and youth: Analysis of the Factors Influencing Abortion Decision-Making and Utilization of Reproductive Health Services in Maputo and Quelimane cities, Mozambique. A recolha de dados foi feita através de entrevistas semi-estruturadas aplicadas às enfermeiras de saúde materno-infantil e de histórias de vida de adolescentes e jovens (15-24 anos) que em algum momento das suas vidas induziram um aborto. Este grupo foi selecionado por ser um grupo que apresenta limitações não só em perceber a transformação que ocorrem durante a transição para a fase adulta, mas também na busca dos serviços de saúde sexual e reprodutiva devido a questões culturais e à falta de informação e maturidade, o que coloca em risco a sua saúde sexual e reprodutiva. Compreendendo os fatores e as motivações pode ajudar a influenciar na formulação de políticas que contribuam para intervenções que reduzam o risco de saúde neste grupo da população. Para além das adolescentes e jovens, participaram do estudo enfermeiras. Isto deveu-se ao facto de no decurso da pesquisa ter se notado que a atitude destes provedores contribuiu na definição do tipo de aborto (seguro ou inseguro) tido pelas adolescentes e jovens (cf. Frederico et al., 2018). Desta forma, tornou-se importante explorar a perceção das mesmas sobre este processo. Não foram entrevistados enfermeiros porque, nos sectores das unidades sanitárias incluídas no estudo, não haviam provedores do sexo masculino.

Seleção da amostra e recolha de dados

Foram entrevistadas 26 participantes sendo 12 enfermeiras e 14 adolescentes e jovens com idades entre os 15 e 24 anos. As enfermeiras foram selecionadas em 8 unidades sanitárias que prestam Serviços Amigos dos Adolescentes e Jovens (SAAJ), urgências de ginecologia e maternidade, nas cidades de Maputo e Quelimane. A seleção das enfermeiras foi intencional e por conveniência. Para tal, primeiro foi contactado o chefe de cada uma das unidades sanitárias visitadas e, depois de obter o aval deste, a equipa de pesquisa foi apresentada às provedoras que, após a explicação dos objetivos da pesquisa e dos procedimentos éticos anuíram em participar da mesma. A anuência em participar resultou no agendamento da hora mais conveniente para a entrevista. A seleção foi feita nos sectores de ginecologia e obstetrícia e SAAJ por serem estes os setores que atendem adolescentes e jovens que procuram serviços de saúde sexual e reprodutiva. Os critérios de inclusão usados foram: ser enfermeira afeta ao setor de ginecologia e obstetrícia ou ao Setor do SAAJ. A entrevista às enfermeiras tinha como foco a experiência no atendimento a adolescentes e jovens, o tipo de serviços solicitados, a fase em que se apresentam na unidade sanitária e a perceção das enfermeiras sobre a saúde da adolescente e procura de ajuda. As adolescentes e jovens foram identificadas através de resposta afirmativa à pergunta se alguma vez tinham induzido um aborto, num inquérito realizado no âmbito do grande estudo já referido acima, que foi desenhado como um estudo misto que, para além do questionário aplicado a 1657 mulheres em idade reprodutiva, das quais 816 tinham idades entre 15 e 24 anos, incluiu também uma parte qualitativa, cujos dados foram a base deste estudo (Frederico et al., 2020). As adolescentes e jovens entrevistadas foram informadas, durante o inquérito, que poderiam ser convidadas novamente a participar numa segunda entrevista para clarificação de alguns aspetos. No contacto para este estudo, as participantes foram questionadas sobre o seu interesse em participar e, em caso afirmativo, foi agendado um local e hora mais convenientes para a entrevista. Antes da entrevista, cada participante foi explicada das razões pelas quais foi convidada pela segunda vez a participar no estudo. As participantes também foram informadas sobre os procedimentos da entrevista, confidencialidade e anonimato nos dados recolhidos, bem como a possibilidade de se retirar da entrevista a qualquer momento.

Para iniciar a entrevista, cada participante foi convidada a contar a sua história de vida desde a puberdade até o momento em que induziu o aborto. Seguiu-se uma conversa onde foram gradualmente adicionadas perguntas de insistência que permitiram obter mais detalhes, seguindo um guião previamente discutido e testado pela equipa de estudo. Este procurou responder a seguinte questão: uma vez tomada a decisão de induzir o aborto, que fatores influenciam o processo de procura de ajuda dos serviços de aborto seguro, pelas adolescentes e jovens nas cidades de Maputo e Quelimane, Moçambique? O era explorar as fontes de ajuda, as barreiras para procurar ajuda e a perceção do risco/problema. Todas as entrevistas foram realizadas em português. As características das participantes deste estudo são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1 Características das participantes do estudo 

Categorias Mediana /Número
Adolescentes e jovens Provedores/Enfermeiras
Número de participantes 14 12
Idade
Intervalo de Idades 17-24 27-55
Idade Mediana 21
Idade Mediana na primeira relação sexual 15.5  
Níveis de escolaridade  
Primário 4 0
Secundário 8 10
Universitário 2 2
Religião    
Cristã 13 12
Islâmica 1 0
Ocupação
Estudante 5
Sem ocupação 8
Vendedor 1
Enfermeiras   SMI*
Anos de experiência    
Menos de 10 2
10-19 7
20-34   3
Aborto induzido 14  

*SMI- Saúde Materno Infantil

Análise de dados

A análise de dados seguiu três etapas: transcrição, leitura e codificação com o NVivo versão 11 (QSR International Pty Ltd., Doncaster, Austrália). Depois da transcrição aplicou-se a análise fenomenológica, seguindo-se a codificação aberta baseada na análise linha por linha para captar as informações mais mencionadas durante as entrevistadas. Depois foi feita a reanálise, criaram-se os códigos axiais dos quais emergiram os temas principais que depois foram classificados e agrupados de acordo com o modelo de procura de ajuda pelos adolescentes de Barker (2007) e de Champion & Skinner (2008). Este processo foi acompanhado por discussões entre os membros do grupo de pesquisa. Finalmente, os dados foram interpretados, e fez-se a sistematização das conclusões.

Questões éticas

Para a realização deste estudo foi obtida aprovação ética do Comité Institucional da Faculdade de Medicina da Universidade Eduardo Mondlane, e do Comité Nacional de Bioética para a Saúde do Ministério da Saúde (IRB00002657), e ainda do Comité de Ética do Hospital Universitário de Gent (PA 2015/043). Para além destas autorizações, o estudo obteve autorização administrativa do Ministro da Saúde e das autoridades locais a nível provincial e comunitário das áreas onde o estudo foi implementado.

Cada participante foi solicitada a assinar o consentimento informado depois de receber a explicação dos objetivos e procedimentos relacionados com a entrevista, especificamente que a sua participação era voluntária; que não era obrigada a responder perguntas que considerasse não adequadas para ela e que podiam suspender ou terminar a entrevista sempre que desejasse, sem consequências nenhumas para a sua vida. As participantes menos de 18 anos foram entrevistadas depois de se obter consentimento informado de um dos pais ou encarregado de educação e da sua aceitação. Para as participantes que não sabem escrever foram pedidas as impressões digitais.

As entrevistas decorreram em local e hora confortável para a participante, onde a privacidade fosse garantida. No caso da ausência de condições de privacidade, a entrevista era suspensa e só era retomada depois desta ser restabelecida. As participantes foram também informadas que todos os elementos que os poderiam identificar não seriam usados tanto na análise quanto na partilha dos resultados. O número de contacto do comité de bioética constava da folha de informação, para que a participante o pudesse contactar para denúncia ou por qualquer outro motivo relevante.

Resultados

Nos parágrafos que se seguem apresentam-se os resultados, iniciando pela descrição de suscetibilidade de ter uma gravidez indesejada e a gravidade das suas consequências; benefícios e custos de; estímulos para agir; barreiras enfrentadas, designadas como fatores que influenciaram a busca de ajuda de serviços de aborto. Estes aspetos estão sumarizados na tabela 2 e descritos nos resultados e no setor da discussão dos mesmos.

Suscetibilidade de estar grávida e a gravidade das consequências de ter uma gravidez indesejada.

A primeira ação do processo de procura de serviços de aborto pelas adolescentes e jovens, depois da perceção da gravidez, foi junto ao parceiro, irmã e/ou amiga. Neste contacto inicial as adolescentes e jovens informaram as suas fontes de ajuda sobre o seu problema - a gravidez. No entanto, a perceção da suscetibilidade de ter uma gravidez indesejada e a gravidade das suas consequências ainda não estava clara. Para algumas adolescentes e jovens entrevistadas, a perceção da suscetibilidade de ter uma gravidez envolveu a realização de um teste de gravidez, depois de aconselhadas pela fonte de ajuda, como elucidam as seguintes passagens das entrevistas: “Conversei com a minha irmã. A minha irmã disse que podia comprar teste de gravidez. Ela [a irmã] foi comprar esse teste [e fiz] e ela me disse, estás grávida. Como deixaste isso acontecer?” (jovem, 24 anos). “Fiquei muito tempo sem menstruar e fiquei preocupada. Antes de acabar o mês eu fui ter com as minhas amigas e deram-me um conselho de ir comprar o teste para ver se é gravidez. (...). Fui comprar o teste, fiz e deu positivo” (jovem 21 anos).

Para outras, ainda não conscientes dos sintomas de gravidez, perceberam o seu problema através de outros, nomeadamente a mãe ou o parceiro: “A menstruação faltou só que eu achei que fosse algo normal porque a menstruação vinha e de repente parava. Descobri depois de 4 meses. Até porque quem descobriu foi a minha mãe porque eu não tinha noção de nada” (adolescente, 18 anos). “Eu não tinha noção. Eu não sabia o que estava a acontecer. Meu namorado é que me disse. Ele não me perguntou, ele me disse [que estou grávida]” (adolescente, 18 anos).

O reconhecimento da gravidez, levou a sessões de negociação para a definição do tipo de ajuda necessária para a solução deste problema, demostrando a perceção da gravidade que a gravidez precoce representava.

Benefícios e custos

Neste processo de procura de ajuda, os benefícios e custos de induzir um aborto ou de continuar com a gravidez até ao nascimento da criança foram tomados em consideração, tendo esta negociação, entre parceiros ou entre a adolescente grávida e sua família, sido marcada por momentos de avanço e de recuo por parte das raparigas grávidas (não interromper - interromper e vice e versa), ao pensarem que da gravidez poderia resultar o nascimento do seu único filho, mas, que mantendo a gravidez seria ignorado pelo parceiro e ainda poderia ser expulsa de casa, conforme o decurso da negociação: “(...) Pensei vou deixar porque pode ser o único filho. Eu deixei. Quando eu disse que estava grávida, ele primeiro disse para deixar e depois vamos ver o que fazer. (...) Ele depois viajou e ficou um mês, e já no segundo mês eu perguntei, e agora? Eu então disse, estou a ver que é melhor tirarmos porque eu descobri que ele não queria nada comigo” (jovem, 21 anos). “O moço que me engravidou negou. Então fui falar com a minha irmã mais velha, e ela disse tens que abortar porque o papá vai te mandar embora de casa e nós em casa não temos condições para cuidar dessa criança. A minha decisão era de deixar, mas tive medo de lá em casa” (jovem, 20 anos).

Estímulos

Segundo as adolescentes

O processo de busca de ajuda para induzir o aborto foi estimulado, para além das consequências negativas como poder ter um filho sem suporte do parceiro ou ser expulsa de casa, pelas fontes de informação. Estas fontes podem ser formais ou informais. No caso deste estudo, a fonte de informação de primeira instância consultada pelas adolescentes e jovens grávidas foi a informal, tendo sido os amigos a fonte chave. Entretanto, mesmo se na primeira instância a adolescente tivesse conversado sobre a gravidez com um membro da família, o recurso a uma amiga foi a chave para a indicação da fonte de ajuda definitiva: “Eu tinha uma amiga, não é, conversei com ela e eu disse eee, não estou a sentir-me bem, estou grávida. Ela disse que conhecia uma pessoa. Ela foi mostrar-me essa pessoa (…), e fiz tudo” (jovem, 20 anos). “Falei com a minha irmã mais velha, e ela disse, tens que abortar. [depois] fui ter com uma amiga que tem uma tia que trabalha no hospital e facilitou tudo. Depois fui fazer o aborto” (jovem, 20 anos).

Entretanto, algumas adolescentes recorreram às suas irmãs para poderem chegar a fonte de ajuda definitiva: “Eu falei com a minha irmã e ela também disse que conhece pessoas grávidas (...) e disse que estou. Eu queria ouvir dela, o que fazer porque eu não tinha ideia” (adolescente, 18 anos). “Quem descobriu foi a minha irmã. Ela chamou-me e perguntou: você viu o período este mês? Eu disse não, fazer três meses. Depois a minha irmã disse vamos ao hospital” (adolescente 18 anos).

A procura de fontes formais só ocorreu em casos extremos, como foi o seguinte caso: “(...) Depois de 1 mês, de novo comecei a sentir cólicas e dores de barriga. Fui ter com aquela senhora que me deu o comprimido e disse estou a sentir umas dores terríveis de parto. Ela disse vai para casa, toma chá e faz massagem no útero, se não passar volta. Saiu uma coisa tipo uma bola, comecei a sangrar muito. Então o meu parceiro decidiu, levar-me para a minha casa. Eu disse para casa não vou e em casa nem podem saber. Fomos ao hospital Mavalane. Eu já tinha desmaiado” (jovem, 21 anos).

Foram as fontes de informação procuradas na primeira instância que tiveram o papel de intermediação no processo de busca de serviços de aborto, estabelecendo o contato entre estas, raparigas grávidas e os provedores, bem como a negociação sobre a prestação de serviços: “A minha amiga disse-me que a tia que trabalha no hospital pode me ajudar e que era só arranjar dinheiro. Primeiro falamos via telefone e ela disse que podemos ir. A minha amiga me acompanhou para o hospital” (jovem, 20 anos). “(...) Então depois conseguimos [os comprimidos] numa das tias, de uma das minhas amigas, que trabalha no hospital. Um dia fomos para casa dela e ela introduziu os medicamentos, deu-me uma injeção e deu-me uns antibióticos e disse que era para eu tomar” (jovem, 22 anos).

Segundo as enfermeiras

Evidências de recurso às fontes informais são reforçadas pelas falas das enfermeiras, ao indicarem que as adolescentes e jovens procuram a sua ajuda depois de perceberem que a ajuda prestada (pelo provedor informal) não foi eficaz: “Muitas das vezes são abortos provocados. Umas vêm transferidas do banco de socorro das unidades sanitárias e outras vêm direto de casa para a maternidade. Geralmente são adolescentes, na sua maioria crianças de 14, 17 e 18 anos” (Enfermeira, 32 anos). “A maior parte das que aparecem são de aborto clandestino. Essas usam comprimidos. As meninas iniciam aborto fora e recorrem ao hospital para aspirar” (Enfermeira, 38 anos).

Fatores que influenciam a procura de ajuda entre as adolescentes

A decisão de procurar os serviços de saúde, não está somente dependente da perceção do problema e do reconhecimento da necessidade de ajuda, mas também de alguns fatores que contribuem para o avanço ou recuo na procura destes serviços pelas adolescentes e jovens grávidas.

A análise de dados identificou fatores individuais e interpessoais que influenciaram a procura de ajuda pelas adolescentes e jovens, depois de perceberem que estavam perante uma gravidez. Os parágrafos que se seguem descrevem esses fatores, primeiro do ponto de vista das adolescentes que tiveram uma gravidez precoce e induziram aborto e, depois, do ponto de vista das enfermeiras, ambos sumarizados na Tabela 2.

Tabela 2 Sumário de fatores que influenciaram a procura de ajuda 

Dimensões Categorias Características/Fatores Adolescentes e jovens Provedores de saúde
suscetibilidade, gravidade de ter uma gravidez Incapacidade de identificar o risco e a gravidade das consequências de ter uma gravidez precoce x x
benefícios/custos de terminar a gravidez poderia ser o único filho x  
de continuar a gravidez ser rejeitada pelo parceiro x
ser expulsa de casa pelos pais x  
estímulos para terminar a gravidez existência de fontes de informação/ aconselhamento sobre onde obter os serviços de aborto x  
barreiras e ou facilitadores para o acesso aos serviços de aborto Individuais Falta de conhecimento das leis e procedimentos para o acesso ao serviço de aborto e/ou a dificuldade de segui-los x
Não conhecimento das fontes de ajuda disponíveis (serviços de aborto) x
Medo de exposição pública x
Falta de recursos financeiros x
Externos Falta de diálogo/conversa na família   x
A forma como a conversa acontece (amigável e não amigável) x
Suporte da família x
Comportamento dos provedores (cobrança de dinheiro) x  

Fatores individuais

Segundo as adolescentes

A perceção do problema ou do risco faz parte dos fatores que motivam a procura de ajuda. As participantes deste estudo, na sua maioria, parecem não terem sido capazes de perceber que a atividade sexual expõe a mulher ao risco de engravidar e que esta gravidez tem efeitos negativos sobre as suas vidas. Esta incapacidade influenciou de forma negativa a busca de ajuda, tendo estas, não procurado a ajuda para prevenir a gravidez: “Comecei a namorar com 14 anos e foi com essa idade que também comecei a ter relações sexuais e não conhecíamos os perigos (…). Está a ver aquela idade, não sabia que podia engravidar. Porque a primeira que tive relações sexuais, não engravidei, então eu aaa é mesma coisa, não vou engravidar” (jovem, 21 anos). “Mas naquele tempo era ainda criança, não entendia nada, brincava muito prontos, daí eu com os meus 19 anos tive a minha primeira barriga [gravidez]” (jovem, 20 anos).

O não conhecimento das fontes de ajuda disponíveis, isto é, da possibilidade de realizar aborto seguro nas unidades sanitárias públicas do país teve impacto na procura de ajuda, e fez com que as adolescentes e jovens necessitadas dos serviços de aborto recorressem a fontes alternativas e menos seguras, existentes nas suas comunidades: “Bem, bem, não sabíamos que era legal irmos ao hospital fazer aborto. Então achamos melhor procurar alguém fora e fazer tudo fora” (jovem, 24 anos).

Falta de conhecimento das leis e dos procedimentos para o acesso ao serviço de aborto e/ou a dificuldade de segui-los, bem como o medo de exposição pública constituíram barreiras importantes para a busca de ajuda pelas adolescentes e jovens: “Eu só ouvia que no hospital, para interromper a gravidez é de borla. Mas naquele momento eu tive medo de como começar. Só ouvi que é necessário um requerimento, que as vezes, tem que ir com uma pessoa adulta para assinar (…). Eu tinha medo, não queria que as pessoas, mesmo de casa soubessem” (jovem, 20 anos)

A falta de recursos financeiros também foi mencionada como uma das barreiras que contribuiu para a busca de ajuda em fontes alternativas, embora elas não fossem gratuitas. “No ano passado [a indução do aborto] foi no hospital. Só este ano é que foi numa senhora particular (...). Não fomos ao hospital devido ao problema de dinheiro. Sai mais barato fora do que no hospital” (jovem, 22 anos). “Ela [amiga] disse que tinha uma tia que trabalha no hospital que pode me ajudar, só [devia] arranjar dinheiro. O dinheiro que eu tinha era pouco. Eu posso dizer que ela me ajudou” (jovem, 22 anos).

Segundo as enfermeiras

A incapacidade de perceber o risco é também evidenciada pelo discurso das enfermeiras, que indicam que as adolescentes e jovens frequentemente infetam-se e reinfectam-se devido ao não uso de meios de proteção: “A maior preocupação deles são as ITSs [infecoes de transmissão sexual]. Fala-se muito do preservativo, mas acredito que muitos não usam. Se usassem não estariam com ITSs, com frequência. A adolescente vem com corrimento e a gente trata, depois de algum tempo volta cá” (Enfermeira, 55 anos). “(...) Até aderem [pedem os preservativos], agora o que é feito não sabemos. É por isso que aparecem meninas com problemas sexuais e sempre dizem que o preservativo rompeu. Voltamos a explicar como usar o preservativo. E outra diz é por que já não estou com o meu namorado. Agora é outro e eu digo como é outro devias usar o preservativo” (Enfermeira, 53 anos).

Fatores interpessoais

Segundo as adolescentes

A falta de diálogo/conversa entre adolescentes e adultos dentro da família sobre questões de saúde sexual e reprodutiva e a forma como esta conversa acontece fazem parte de barreiras para a busca de ajuda adequada. Os excertos seguintes mostram quão distantes as adolescentes e jovens estão da família quando enfrentam um problema relativo à saúde sexual e reprodutiva devido a fraca e difícil forma de comunicação dentro da família: “Converso mais com [outras] pessoas adultas para aprender um pouco mais, porque com a minha tia a relação não era aberta em relação a essa questão. Já tentei uma vez e ela pôs-se calada. Por essa razão eu não insisto” (jovem, 21 anos). “Ela [mãe] não sabe falar connosco. Eu até posso tentar falar com ela mas ela não consegue. Ela já vai jogando pedras. Por isso eu nunca me abro com ela. Posso chegar em casa mal, como da outra vez que tinham me batido, mas eu não contei para ela” (adolescente, 18 anos). “Minha mãe é muito fechada. Raras vezes nós conversamos. Coisas que eu tenho para contar ela assim. (…) Aaa haa minha mãe‼? Hum hum!! eu as vezes quero ficar, conversar, contar o que se passa comigo, mas não há como. Eu posso chegar a contar a ela [algo] e ela depois dizer estás a contar-me [isso] para eu fazer o quê? Estás a perceber nem, i para ni xitira hine lecho” (jovem, 20 anos).

Entretanto, existem outras adolescentes que encontraram suporte em suas mães ao encaminhá-las a um provedor de saúde: “Ela [mãe] é que me acompanhou. Ela é que conhece o médico. Fomos ao hospital central, só que ele estava muito ocupado e disse para irmos a casa dele” (Adolescente, 17 anos). “Ela [mãe] disse, tu não estás bem. É quando fomos a unidade sanitária e confirmou-se que estava grávida. Daí fomos ter com uma parteira e deu-se o processo todo” (Jovem, 20 anos).

O comportamento dos provedores faz parte das barreiras na busca de ajuda adequada pelas participantes. A cobrança de dinheiro para o tratamento fez com a ajuda fosse procurada na farmácia ou em pessoas indicadas pelos amigos, em substituição da unidade sanitária, embora o acesso aos medicamentos ou tratamento nestes outros locais não fosse gratuito: “Cobraram-nos um valor que não tínhamos [cobrança ilegal]. As senhoras não queriam negociar nem nada. Acho que queriam 1200 se não estou em erro.” (Jovem, 22 anos).

Segundo as enfermeiras

Dificuldades de conversa dentro da família são também evidenciadas pelas falas das provedoras de saúde que mostram a atitude de algumas mães perante as filhas quando se apercebem que estas já têm relacionamentos amorosos. As mães, no lugar de conversar, usam métodos violentos, como por exemplo o teste de virgindade: “As vezes as mães aparecem com a menina para saber se ela é virgem. Eu me recordo de um caso em que a menina veio com a mãe e ela estava com um condiloma [verrugas genitais], mas ela dizia que era virgem. A mãe desconfiava que ela já fazia sexo e ela dizia que não. Depois da observação nós dissemos [a senhora] que devia conversar de boa maneira com a filha para que haja entendimento. E dissemos a menina para voltar [no dia seguinte] para o tratamento” (Enfermeira, 55 anos).

O discurso evidencia, também, que os pais veem os filhos como crianças apenas, esquecendo que eles também têm sentimentos e preocupações que se assemelham aos dos adultos. Ter amizade com as filhas é importante para ganhar confiança uma da outra e, no caso das mães, poderem acompanhar e guiar de maneira correta as meninas, como se ilustra: “Nós, nalgum momento podemos pensar que estamos a trabalhar com uma criança, mas é uma criança adulta. O problema que um jovem tem, um adulto também tem. Só que ele não tem onde expor essa preocupação dentro de casa, porque não são todas as famílias que encaram o jovem. Encaram-no como criança de verdade. É criança, sim, mas Precisa de ser escutada pela família. Precisamos [de ter] muita conversa com os pais. Uma e outra [adolescente] é que diz, eu sou amiga da minha mãe. Mas a maioria tem dificuldades de se abrirem com as mães” (Enfermeira, 50 anos). “Bom em relação ao trabalho da família é muito importante, só que nalgum momento há famílias que têm reservas para transmitir informação aos filhos. Primeiro, para você transmitir essa informação você precisa ter amizade e confiança para conversar com o seu filho. Se não tem amizade dificilmente vai sentar com o filho e explicar que quando fizer isto é errado” (Enfermeira, 42 anos).

Discussão

Este estudo procurou perceber o processo de busca de ajuda para a interrupção da gravidez, a interação com as fontes de ajuda e os fatores que influenciaram, à luz do modelo de crenças em saúde, no qual a suscetibilidade; a gravidade; benefícios/custos e as barreiras são dimensões nas quais este modelo busca a explicação sobre o comportamento de procura de ajuda em saúde. Neste estudo notou-se que a busca de serviços iniciou logo após a perceção clara do problema - a gravidez, através da realização de um teste ou confirmando-a através de outros, tais como irmã, mãe ou parceiro. Embora se trate de busca de serviços de saúde, que no geral deve ser procurada em instituições e provedores formais, no caso das adolescentes e jovens deste estudo, esta busca foi direcionada, em primeiro lugar, às fontes informais consideradas mais próximas e capazes de ajudar na solução do problema, as amigas. Mesmo a ajuda procurada junto aos provedores formais de saúde, foi também desencadeada de forma informal, e quase sempre depois da falha da ajuda formal. Este resultado assemelha-se ao que o estudo de Rickwood et al. (2005) referiu que as adolescentes e jovens recorrem em primeiro lugar à ajuda de instituições informais, contactando as instituições formais apenas se o problema não tiver tido solução a esse nível. Mesmo ao nível informal, a busca de ajuda só ocorre se a adolescente ou a jovem perceber que ela, por si só, não é capaz de resolver (Barker, 2007). Como foi mostrado pelas passagens, algumas raparigas grávidas, não percebiam o que se estava a passar. Neste caso assistiu-se em primeiro lugar, a procura de ajuda para perceber o problema, seguido pelas negociações para definir a solução, e onde buscá-la. Este fato de procura de ajuda para perceber o problema parece demonstrar que as adolescentes e jovens participantes deste estudo, ainda não percebiam a suscetibilidade de engravidar, facto elucidado, por exemplo, pela dificuldade que algumas adolescentes têm de perceber o risco de engravidar e a gravidade que as suas consequências representariam em suas vidas. A isso se alia a idade, não só do início da atividade sexual, mas também da ocorrência da gravidez. Em média, as entrevistadas iniciaram a atividade sexual aos 15.5 anos, uma idade relativamente próxima aos 15 anos indicada pelo UNFPA (2014). Segundo o modelo de crenças em saúde, a idade é um dos fatores que afetam a capacidade de perceber a suscetibilidade de ter uma doença e a gravidade das suas consequências. Nesta idade, aglutina-se um conjunto de barreiras tais como a falta de conhecimento sobre as mudanças que ocorrem no indivíduo, agravado pela falta de explicação sobre a sexualidade, e funcionamento do sistema reprodutivo no que concerne ao ciclo menstrual (Belayneh & Mekuriaw, 2019). Esta informação é importante para as adolescentes e jovens perceberem a sua suscetibilidade de engravidar, e poderem identificar os sintomas de uma gravidez.

A falta de conhecimento sobre as leis e ou do lugar para onde recorrer, foi também verificada em Portugal por Brito et al., (2018) e na Inglaterra por Fortune et al., (2008). Embora os serviços de interrupção segura de gravidez, em algumas unidades sanitárias, especialmente hospitais gerais e centrais, tenham iniciado nos anos 80 (Agadjanian, 1998) e, legalmente permitidos em 2014 (Moçambique, 2014; Moçambique, 2017) pouco ou nada se sabe sobre a sua divulgação. Este fator em conjunto com o fator medo de ser julgado e do estigma podem ter contribuído para a busca de informação em fontes informais e alternativas (Barker, 2007), em detrimento do setor de ginecologia e obstetrícia. A frequência a este setor de saúde deixa transparecer uma vida sexual ativa, o que não é expetável numa adolescente ou jovem (Fortune et al., 2008). Na comunidade, o aborto é estigmatizado e as mulheres que experimentam este evento são atribuídas designações que as desvalorizam (Kumar et al., 2009; Sorhaindo e Lavelanet, 2022), e vistas como ameaça à continuidade da família (Kumar et al., 2009). É importante notar que embora a gravidez na adolescência não seja esperada e constitua vergonha para a família, o nascimento de um novo membro é sempre aceite. A questão de falta de recursos financeiros levou as adolescentes e jovens a optar pela ajuda de fontes alternativas. Entretanto, no nosso entender, esta opção, pode ter sido influenciada principalmente pela falta de conhecimento da lei e dos procedimentos, bem como o medo de exposição como já referido (Wakjira & Habedi, 2022). Embora os custos para o aborto fossem considerados altos, estimados em 24 dólares americanos (Ustá et al., 2008) no Hospital Central de Maputo, nessa altura, a busca de ajuda em fontes alternativas custou em média 81.1 dólares Americanos (46.3 a 115.8 dólares), de acordo com as entrevistadas. Este valor é 3 vezes o valor que era oficialmente aplicado nas unidades sanitárias. Outro fator que pode explicar a opção pelas fontes alternativas em detrimento das unidades sanitárias, é a crença de não poder ter a atenção desejada, uma vez que antes deste evento, as participantes tinham procurado ajuda na unidade sanitária por outros motivos mas, tal ajuda, foi percebida como inadequada (Ninsiima et al., 2021; Wakjira & Habedi, 2022; Mackian et al., 2004; Barker, 2007). A crença que o necessitado tem em relação a poder ter ou não a ajuda pode influenciar não só a motivação de procurar, mas também na determinação do tipo de fonte de ajuda. No caso das participantes deste estudo, a falta de ou a forma de condução do diálogo pode ter contribuído para a busca de ajuda em amigos em detrimento da família devido a perceção de que pouco ou mesmo de nada valeria tentar conversar com a mãe ou com um outro membro da família (Fortune et al.,2008). Estes autores constataram que as adolescentes que se auto mutilaram não procuraram ajuda, porque temiam que a ação praticada fosse considerada como um ato para “chamar atenção. A atitude reportada pelas participantes deste estudo face ao diálogo na família pode encontrar a sua explicação no que Janighorban et al. (2022) descreve como comportamentos repulsivos da família leva os pais/mães a ignorarem a saúde das filhas, especialmente a saúde sexual e reprodutiva, quando percebem que a adolescente viola as normas culturais e da família. Portanto na busca de ajuda de serviços de aborto as adolescentes e jovens grávidas balancearam os benefícios/custos, entre o manter uma gravidez que as poderia resultar numa expulsão de casa; assim como não ter o suporte do parceiro e, a vontade de manter a gravidez por desejo ou por pensar que poderiam terminar o que poderia ser o único filho, embora esta não tenha sido planeada. As fontes de informação consultadas na primeira instância ao aconselhá-las a induzir o aborto, em alguns casos, e ao referirem que conhecem provedores que poderiam ajudar a induzir o aborto e servirem de elo, constituíram um estímulo, no processo de busca de ajuda para induzir o aborto.

Conclusão

Este estudo procurou perceber o processo de busca de ajuda para a interrupção da gravidez, a interação com as fontes de ajuda e os fatores que influenciaram este processo, entre as adolescentes e jovens das cidades de Maputo e Quelimane. Através da aplicação do modelo de crenças em saúde, foi percebido que as adolescentes e jovens não percebiam a sua suscetibilidade de engravidar naquela idade e a gravidade das consequências dessa gravidez na sua vida. O processo de procura de ajuda, envolveu, para além dos provedores dos serviços de saúde, outras fontes de ajuda procuradas logo após a perceção do problema. Estas fontes, para além de fornecer a informação, serviram também de elo entre o paciente e o provedor, tornando-se num estímulo para a buca dos serviços de aborto, depois de avaliados os benefícios de manter ou terminar a gravidez no que diz respeito, nomeadamente, perder o único filho que poderia ter, ser expulsa de casa, assim como terminar a relação com o parceiro. Entretanto, ambos (o elo e o provedor) são fontes informais. A falta de conhecimento sobre as fontes de ajuda para a indução do aborto, e da lei do aborto; a falta de recursos financeiros; o medo e a vergonha de se expor são fatores que influenciaram, constituindo barreiras no processo de procura de serviços de aborto. Estes fatores apelam para um trabalho de divulgação, junto das comunidades, dos serviços de saúde disponíveis para a assistência em Saúde, especialmente à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes e jovens, bem como intervenção em educação sexual aos adolescentes e jovens. Esta educação deve ser parte das disciplinas escolares. A educação sexual deve incidir também sobre os adultos de modo a identificar a barreira na busca de ajuda pelos adolescentes e jovens.

Agradecimentos

Agradecimentos a todos colegas que direta ou indiretamente contribuíram nesta pesquisa, especialmente, a Eunice Remane Jethá, Emília Gonçalves, Beatriz Chongo e Cátia Taibo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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Recebido: 25 de Julho de 2022; Aceito: 12 de Julho de 2023

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