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Revista de Investigação & Inovação em Saúde

versão impressa ISSN 2184-1578versão On-line ISSN 2184-3791

RIIS vol.6 no.1 Oliveira de Azeméis jun. 2023  Epub 30-Abr-2023

https://doi.org/10.37914/riis.v6i1.225 

Artigos de Investigação

Contributos na avaliação do grau de satisfação da pessoa em cuidados paliativos

Contributions in the assessment of the degree of satisfaction of the person in palliative care

Contribuciones en la valoración del grado de satisfacción de la persona en cuidados paliativos

1 PhD, em Educação Supervisão e Avaliação - Centro Hospitalar Baixo Vouga, Aveiro, Portugal.

2 MSc, em Cuidados Paliativos - Centro Hospitalar Baixo Vouga, Aveiro, Portugal.

3 MSc, em Cuidados Paliativos - Centro Hospitalar do Baixo Vouga, Aveiro, Portugal.


Resumo

Enquadramento:

o grau de satisfação é um importante indicador da avaliação da qualidade dos cuidados paliativos. A satisfação, sendo um conceito complexo, define as distintas reações que doente e família têm, no que respeita à experiência dos cuidados paliativos. O conhecimento do grau de satisfação do familiar é fator de benchmarking no que concerne ao planeamento, implementação e monitorização dos cuidados.

Objetivo:

aferir o grau de satisfação dos familiares de doentes da unidade de cuidados paliativos.

Metodologia:

no ano 2020 foi elaborado um projeto de melhoria contínua da qualidade através do estudo qualitativo, exploratório por meio de inquérito telefónico junto dos familiares de doentes internados na unidade de cuidados paliativos recorrendo a dimensões apresentadas em escala de likert.

Resultados:

da análise de dados verificou-se que 95% dos familiares de referência caraterizam o trabalho da equipa como excelente e 4,69% como muito bom. Os inquiridos consideraram-se muito satisfeitos 7,81% e com o resultado de 92,19%sentem-setotalmente satisfeitos.

Conclusão:

os cuidados paliativos promovem a satisfação das necessidades da pessoa em fim de vida. A promoção da dignidade e respeito pela vida humana é fruto de constante reflexão ao prestar cuidados de excelência tendo em consideração a avaliação do grau de satisfação.

Palavras-chave: cuidados paliativos; indicadores de qualidade em assistência à saúde; satisfação do paciente

Abstract

Background:

the degree of satisfaction is an important indicator of the evaluation of the quality of palliative care. Satisfaction, being a complex concept, defines the different reactions that patients and families have, with regard to the experience of palliative care. Knowledge of the degree of family satisfaction is a benchmarking factor regarding the planning, implementation and monitoring of care.

Objective:

to assess the degree of satisfaction of relatives of patients in the palliative care unit.

Methodology:

in 2020, a project for continuous quality improvement was elaborated through the qualitative, exploratory study through a telephone survey with the relatives of patients hospitalized in the palliative care unit using dimensions presented on a likert scale.

Results:

from the data analysis it was found that 95% of the reference family members characterize the work of the team as excellent and 4.69% as very good. Respondents considered themselves very satisfied 7.81% and with the result of 92.19% they felt totally satisfied.

Conclusion:

palliative care promotes the satisfaction of the needs of the end-of-life person. The promotion of dignity and respect for human life is the result of constant reflection in providing excellent care taking into account the assessment of the degree of satisfaction.

Keywords: palliative care; health care quality indicators; patient satisfaction

Resumen

Marco contextual:

el grado de satisfacción es un indicador importante de la evaluación de calidad de los cuidados paliativos. Satisfacción, al ser un concepto complejo, define diferentes reacciones que tienen los pacientes y familias, con respecto a experiencia de cuidados. El conocimiento del grado de satisfacción familiar es factor de referencia en planificación, implementación y seguimiento de atención.

Objetivo:

evaluar el grado de satisfacción de familiares de pacientes en unidad cuidados paliativos.

Metodología:

en 2020, se elaboró un proyecto de mejora continua de la calidad através del estudio cualitativo exploratorio con encuesta telefónica con familiares de pacientes internados en unidad de cuidados paliativos utilizando dimensiones presentadas en escala likert.

Resultados:

a partir del análisis de los datos se encontró que 95% de los miembros de la familia de referencia caracterizan el trabajo del equipo como excelente y 4,69% como muy bueno. Los encuestados se consideraron muy satisfechos 7,81% y con el resultado de 92,19% se sintieron totalmente satisfechos.

Conclusión:

los cuidados paliativos promueven la satisfacción de necesidades de persona al final de vida. La promoción de dignidad y respeto por la vida humana es resultado de reflexión en prestación de atención teniendo en cuenta la evaluación del grado de satisfacción.

Palabras clave: cuidados paliativos; indicadores de calidad de la asistencia sanitaria; satisfacción del paciente

Introdução

O grau de satisfação dos utentes é um importante indicador para a avaliação da qualidade dos cuidados de saúde prestados à população. Os resultados desta avaliação refletem o contributo para a melhoria contínua dos serviços dispensados pelas equipas de saúde demonstrando a eficácia das organizações. Para Capelas (2014), os cuidados paliativos são cuidados que melhoram a qualidade de vida dos doentes afetados por problemas de saúde que ameaçam a vida, e sua família, através da prevenção e alívio do sofrimento pela compreensão e identificação precoce, avaliação e controlo da dor e outros problemas físicos, psicológicos, sociais e espirituais. Estes constituem-se como uma importante necessidade de saúde pública, um direito humano, com a necessidade de peritos para lidar com estas situações, pela universalidade da morte, sendo a mesma associada a sofrimento normalmente evitável, pelo impacto nos sobreviventes, familiares e por questões socioeconómicas.

A comunicação desempenha um papel chave e, como pilar dos cuidados paliativos, constitui-se um instrumento essencial à transmissão de informação entre a pessoa, os seus familiares e/ou cuidadores e os diferentes profissionais de saúde (Reigada et al., 2021). O objetivo central para a consecução do estudo prende-se com o mapear perceção da satisfação do doente/família da prestação de cuidados de saúde. A equipa de cuidados desenvolve uma constante reflexão acerca dos conceitos de qualidade traduzidos pelo grau de satisfação da própria pessoa ou pessoa significativa. É de tal forma relevante aferir o sentimento de bem-estar como resposta ao cuidado representando a sensação subjetiva pela qual é encarada a vida e influenciada por aspetos de personalidade e fatores sociais, económicos, culturais, religiosos e espirituais. Similarmente, é identificada na conceção das necessidades, aspirações e conexão com o meio o equilíbrio que dita os níveis de qualidade e satisfação da pessoa. Os cuidados paliativos têm uma visão de ajuste de todas estas variáveis aproximando as aspirações do que é possível perante a condição da pessoa em fim de vida (Twycross, 2003).

Enquadramento/ fundamentação teórica

A satisfação do doente e da família em cuidados paliativos, apesar da complexidade inerente à perceção que lhe está consignada, é um dos indicadores dos cuidados prestados ao doente e a sua avaliação é fundamental. Cabe à família, enquanto pilar, ajudar o indivíduo a ultrapassar as dificuldades que surgem ao longo da vida, sendo que a doença não é exceção. Assim, para que a família desempenhe a sua função é essencial o correto acolhimento e avaliação das necessidades por parte dos profissionais, para que possa ser informada e ajustada as constantes mudanças recorrentes na situação de doença que termina quase sempre com a morte do seu doente, fator possibilitador de melhoria no que concerne ao planeamento, implementação e monitorização da prestação de cuidados (Almeida, 2014). Neto (2022) considera que a família também fica doente quando o seu familiar é acometido de uma doença irreversível abalando toda a sua estrutura social.

As perceções, apesar da sua eventual subjetividade, têm nos profissionais de saúde, médicos, enfermeiros e psicólogos, os melhores utilizadores para tomadas de decisão com os seus doentes e familiares (Areia et al, 2017). É na relação terapêutica que a família e sobretudo o familiar de referência assume o papel de ligação ao cuidado através do profissional de saúde. (Neto, 2022). Na concordância ideológica, de que faz parte, do papel dos enfermeiros percecionar e registar o sofrimento da pessoa em fim de vida é altamente recomendável a avaliação regular do grau de satisfação do doente e da família, em particular no que se refere às respostas às suas necessidades e à prestação de cuidados por parte da equipa.

A finalidade deste estudo, enquadrada num programa de melhoria contínua da qualidade, é aferir o grau de satisfação dos doentes e/ou familiares internados na unidade de cuidados paliativos de um centro hospitalar da região centro de Portugal. Com o desígnio desta finalidade é possível identificar possíveis aspetos a melhorar e contribuir para a introdução de indicadores de qualidade na área dos cuidados paliativos que ainda é insipiente. No decurso do desenvolvimento dos cuidados paliativos, tornou-se importante criar e aplicar ferramentas que permitam avaliar a qualidade dos serviços prestados. Assim, de acordo com as orientações do National Consensus Project for Quality Paliative Care e do National Quality Forum, e ainda de Capela (2014) existem oito domínios representativos dos principais indicadores de qualidade: Estrutura e processo do cuidar; Aspetos físicos do cuidar; Aspetos psicológicos e psiquiátricos do cuidar; Aspetos sociais do cuidar; Aspetos espirituais, religiosos e existenciais do cuidar; Aspetos culturais do cuidar; Cuidados ao doente em morte iminente; Aspetos éticos e legais do cuidar. Para efeitos desta, do estudo implementado, destacam-se os seguintes: satisfação dos doentes internados e sua família relativa a: atendimento/resposta às necessidades/problemas do doente; cuidado humano com que o doente foi abordado; metodologia de transmissão da informação; disponibilidade da equipa para falar com o doente e família; manutenção do doente e família informados acerca da situação clínica; coordenação dos cuidados; satisfação da família sobre a continuidade da informação transmitida acerca da evolução do estado clínico do doente e relativamente às abordagens terapêuticas para o controlo sintomático do doente, na fase de fim de vida.

Apesar de os estudos serem escassos, existe já um vasto leque de ferramentas para esta área de monitorização da qualidade. Como se verifica a escala CCFSS -Critical Care Family Satisfaction Survey e a escala FAMCARE destinam-se a avaliar os cuidados de saúde prestados ao familiar, enquanto a escala CADI - índice de avaliação de dificuldades do cuidador, a escala CASI - índice de avaliação da satisfação do cuidador e a escala ESC (escala de sobrecarga do cuidador de Zarit) pretendem avaliar a sobrecarga do cuidador informal e a sua satisfação como cuidador. No entanto não são frequentes estudos sobre a satisfação com os cuidados paliativos disponibilizados. Pretende-se com os resultados desta investigação apoiar não só as tomadas de decisão da gestão hospitalar, mas também de todos os profissionais da unidade, de forma a aumentar o contato com os doentes e seus familiares e conhecimento das suas perceções e expetativas sendo desidrato de aumentar a satisfação destes e consequentemente a qualidade dos serviços de saúde (Capelas, 2014).

Metodologia

A metodologia implementada segue a linha de orientação dos projetos de melhoria contínua da qualidade deste centro hospitalar que nesta unidade se inicia em 2020 avaliando por trimestres. Optou-se por um estudo exploratório descritivo com base na fenomenologia compreensiva da realidade da unidade de cuidados paliativos com o exemplo do último trimestre de 2020 (Vilelas, 2020). Propôs-se o inquérito telefónico como técnica, com as dimensões que considerámos importantes para o estudo. Esta técnica foi a escolhida porque nos dava a continuidade de uma aproximação prévia existente com o familiar significativo do doente e a quem informamos que iria ser contatado posteriormente. Este familiar era sempre o escolhido pelo doente ou, na sua impossibilidade cognitiva, aquele que seria o nosso contato durante o internamento para a gestão do regime terapêutico. A amostra destes familiares foi construída de forma aleatória, tendo o seu número por base o total de internamentos/altas por trimestre realizando escolha de 25% desse total, repartidos por cada mês até à saturação.

Foram excluídos doentes com óbito ocorrido até às 48 horas de internamento visto que os contatos com o familiar/pessoa significativa era baixo na introdução de um plano individual de cuidados. Neste inquérito eram conhecidos dados prévios e gerais do doente como a idade e género, para sua caraterização, familiar/pessoa significativa para a realização do contato, diagnóstico e motivo de internamento, presença de familiar no momento do óbito e perceção do enfermeiro sobre o sofrimento no momento com recurso ao Score da Escala de Edmonton com a informação se estaria sobre efeito de sedação. Estes dados foram recolhidos em ambiente de documentação clínica digital. As questões colocadas ao familiar foram a identificação, por parte destes, dos sintomas (físicos, sociais, emocionais e espirituais) que se encontravam descompensados e grau de melhoria até ao óbito; grau de satisfação sobre a adequação da informação e disponibilidade dos profissionais em comunicar; grau de satisfação sobre as condições das instalações e grau de satisfação sobre o trabalho da equipa. A informação dada pelo familiar era revertida em escala de Likert de 1 a 5, de “nada satisfeito” a “totalmente satisfeito”.

No final do inquérito havia espaço para outras afirmações que a pessoa gostaria de transmitir. As questões éticas do estudo tiveram como ponto de partida a proteção da pessoa. Respeitaram-se os valores éticos dentro da instituição, nomeadamente o respeito pelos direitos e dignidade do doente e da pessoa significativa, no âmbito da prestação de cuidados de saúde e no que diz respeito ao comportamento dos prestadores. A prática de investigação e temas do exercício clínico alocada ao desenvolvimento desta pesquisa, que envolveram pessoas tiveram incidência nos princípios éticos por que se regem a sociedade e as organizações profissionais de saúde, refletindo-se à luz dos princípios do Regulamento Geral de Proteção de Dados de 2019 para investigações no âmbito dos cuidados de saúde. De ressalvar que existiu um pedido à comissão ética do hospital, bem como, a não utilização de dados biográficos identificativos da população em estudo. As classificações por idade, género e grau de parentesco entre o doente e a pessoa significativa/familiar de referência, foram definidas de forma a enquadrar e classificar grupos na análise dos dados. A componente ética foi também salvaguardada em termos de registo de concordância em responder no momento da chamada telefónica de forma voluntária. Os participantes receberam informação completa sobre o inquérito (objetivos, métodos, utilização dos dados). As questões de confidencialidade e anonimato foram explicadas. Do ponto de vista estatístico optou-se por uma análise quantitativa dos dados, na medida em que esta permite realizar uma análise de frequência das respostas, assim como uma análise descritiva. Para as expressões usadas no texto livre recorremos à análise de conteúdo segundo Bardin (2011).

Resultados

Os resultados aqui apresentados referem-se ao último trimestre de 2020 e estão divididos em duas áreas. A primeira prende-se com o processo de recolha e o segundo com os resultados do inquérito propriamente dito. O dado mais significativo prende-se com o número de inquéritos que são utilizados para análise, 64, ou seja 25% do total dos doentes internados e com óbito neste trimestre em apreço. Os telefonemas foram realizados entre as 4 e 6 semanas após o óbito do doente. A maioria respondeu na primeira chamada. Estas chamadas foram realizadas entre as 9 e as 19 horas em dias escolhidos pelos investigadores dentro do prazo previsto de quatro a seis semanas após a alta/óbito. Os doentes que tiveram alta vieram a falecer na sua casa. O número de doentes falecidos e que os familiares responderam ao inquérito acompanha a percentagem de óbitos do trimestre de 71,8%. Seguidamente procedeu-se à caraterização dos doentes pelo seu género, dos quais 31 pertenciam ao género feminino e 33 ao género masculino. A distribuição dos doentes por grupo etário fez-se num intervalo entre 31 e 95 anos, onde encontramos a maior faixa de doentes nos grupos 66 - 70 anos com oito doentes, 71- 75 com 10 doentes e 81- 85 anos com 13 doentes. O limite menor de doentes enquadrou-se na faixa etária de 31-35anos com um doente e, na faixa etária de 91-95 anos, com três doentes. Verifica-se que o familiar de referência, em maioria dos casos, é a filha em 28 situações identificadas, seguida de marido/esposa em 12 casos e de seguida o filho em oito casos em estudo. Outros graus de parentesco são a nora, irmão, mãe e um caso em que o contato foi estabelecido com a instituição onde residia. Para percebermos o impacto do diagnóstico que leva ao internamento, colocámos o principal referido em diário clínico e/ou ao que validava a presença de sintomas/motivo de internamento. Deste modo como diagnóstico de admissão foram identificadas 92% de situações oncológicas como, 10 pessoas com tumores do Colon/Reto, sete situações de tumores de Mama e sete Hematológicos, seis de Pulmão e também de Gástrico, cinco de Próstata, quatro de Pâncreas, com três casos cada identifica-se a Demência, Hepático, Laringe e AVC/TCE grave, com a designação de cerebral e ovário/útero apresentaram-se dois casos e apenas um caso de tumor ósseo. São vários os motivos de internamento, sendo a maioria de controlo de sintomas. Na organização de cuidados com 14 situações descritas como o descanso do cuidador, com o organizar os cuidados para o cuidador poder continuar a colaborar com o seu familiar doente. Em 34 situações identificou-se a dor como motivo de internamento, a dispneia e a agitação/confusão em 14 casos e as náuseas/vómitos em 10. Outro motivo foi o de cuidados em fim de vida para 13 casos. Com menor expressão motivos como anorexia, astenia, prurido, tosse, febre, hemorragia, insónia, ferida maligna, ascite, oclusão intestinal e dois casos de sialorreia. Apesar do constrangimento da Pandemia e que coloca a necessidade de diminuir/controlar/evitar visitas aos doentes, foram identificados oito familiares que estiveram presentes no momento do óbito do seu doente. Ainda sete familiares vieram ao serviço no momento da alta para eventual acompanhamento do doente que vieram a falecer num curto espaço de tempo em casa.

Os enfermeiros são os profissionais que maioritariamente acompanham o doente e seus familiares no momento da alta ou do óbito. Por tal desejámos saber a perceção destes profissionais quanto à existência de sofrimento nestes momentos. Assim a perceção do sofrimento no doente na alta ou óbito é de 100% “sem sofrimento”, pela Escala de Edmonton de onde se associa a não existência de sintomas de desconforto. Para esta interpretação pode ajudar o facto de 29 doentes se encontrarem sob efeito de medicação de infusão subcutânea de fármacos indutores de sedação e o Score médio da Escala de Edmonton foi de 25. Verifica-se a perceção do familiar de referência, ou pessoa significativa acerca dos sintomas físicos que a pessoa apresentava, sendo os três sintomas mais prevalentes na imagem do familiar, a dor citada por 50 pessoas, sintomas de agitação, 21 e vómitos 16. Entre os sintomas intermédios na perceção dos familiares temos a dispneia e o estertor/farfalheira. Os sintomas com menor incidência de referência pelo familiar são a obstipação/diarreia e a secura da boca. Em 20 resultados o familiar não sabe/não responde/outros. Os resultados para a perceção dos sintomas psíquicos, emocionais e sociais, como sendo a tristeza verificaram-se 21 situações de sensibilidade por parte dos familiares e a ansiedade 19 situações.

Os menos expressivos remetem-se à revolta, à negação e à resignação. Em 10 casos a perceção do familiar não foi apresentada. Ao traduzir os resultados da perceção dos sintomas religiosos e espirituais visualiza-se aspetos de descrença em dois casos, inexistência de sentido, cinco casos e sobretudo o mal-estar, 10 casos, ou mesmo mau estar com Deus em sete. De referir que 40 pessoas desconhecem ou não respondem acerca dos sintomas religiosos e espirituais dos seus familiares. O grau de satisfação do familiar de referência perante os sintomas acima mencionados, denota como causa o desconforto ou sofrimento à pessoa. De referir que é apresentada a quantificação do sofrimento como muito desconforto, 6,25% e intenso desconforto em 93,75%. A observação da perceção do familiar acerca de se “os sintomas apresentados foram aliviados pelos cuidados prestados pela equipa” foi de 1,56% da amostra referem que em nada existiu alívio após cuidados. Em oposição para 14,06% foram muito aliviados e 84,38% concordam que existiu um alívio da totalidade dos sintomas e desconforto. No que diz respeito ao aspeto da perceção do conceito de serenidade, largamente usado como terminologia na fase final de vida, é investigado pelo que um familiar compreende que em nada foi sereno no internamento. Enquanto para cinco pessoas fica a sensação de muita serenidade e finalmente para cinquenta e oito obteve-se o completamente serena. Sobre a clareza de transmissão de informação por meio de comunicação que poderá ter-se desenvolvido presencial ou telefonicamente, analisamos a clareza dessa transferência em 91,31% dos inquiridos. E em 4,69% as pessoas referem que não sentiram clareza da informação. Em relação à disponibilidade dos profissionais para ouvir e informar, 84,38% sentiram que os profissionais foram presentes e em 15,62% dos casos apresentam como resposta negativa para a disponibilidade de escuta e informação. Deste modo a classificação sobre a comunicação por parte da equipa é evidenciada como sendo, muito adequada em 6,25% dos casos e 93,75% como completamente adequada.

No que diz respeito às infraestruturas, instalações e condições de prestação de cuidados de saúde, os familiares avaliaram como completamente adequadas o local de internamento em 92,19% dos casos. No âmbito da avaliação da satisfação pelo trabalho da equipa perante a pessoa que esteve internada na perspetiva do familiar/pessoa significativa é tido como muito bom em 4,69% e como excelente em 95,32% dos casos de resposta. Em suma, o valor do estudo que reflete a satisfação do familiar/pessoa significativa na globalidade dos cuidados prestados, numa escala quantitativa em que se abordam intervalos de “nada satisfeito” até ao “totalmente satisfeito”, situam-se como muito satisfeitas em 7,81% e como totalmente satisfeito em 92,19% dos casos observados. No final do inquérito propôs-se que desse alguma informação que traduzisse o seu sentimento e que apoiasse a melhorar a atividade clínica. Destacam-se as manifestações que terminaram com o inquérito realizado ressalvando que existiram uso de expressões aqui traduzidas em texto livre, durante a entrevista telefónica que tenham sido importantes para o familiar, pode entender-se como um momento de alívio no pós-internamento, nomeadamente no período de luto pela perda da pessoa. Assim sendo existe grande conteúdo emocional que serão refletidas com a precaução e dignidade implícitas ao contexto de término de vida da pessoa, as quais ficam evidentes na Tabela 1.

Tabela1 Expressão do familiar, pessoa significativa sobre os cuidados prestados 

Expressão do familiar, pessoa significativa sobre os cuidados prestados
É pena só ter ido para vós só naquele momento. Acho que era melhor ter ido mais cedo Só lamento que tenham forçado tanto a alta do meu pai Pensei em tirá-lo daí mas vi depois que vocês trabalham bem; o hospital… não disse nada que ia mandá-lo para aí, é triste Não tenho palavras para dizer o que senti e o que sinto por todos vocês. Estão sempre no meu coração Nestes tempos tão difíceis vocês foram diferentes para melhor Nós queríamos visitar mais vezes mas vocês não deixaram… paciência A minha esposa está cada vez melhor graças ao vosso trabalho Vocês devem melhorar a conversa que têm ao telefone Ao fim de um ano de sofrimento ela encontrou a paz convosco aí Têm de melhorar só a sinceridade Podia ter ficado mais uma semana para compensar melhor os sintomas Foi o melhor que podia ter acontecido ao meu pai A minha mãe ainda hoje fala do vosso carinho para ela e se ela tiver que partir que seja aí O que faz o psicólogo que nunca o vi apesar das vossas promessas? Precisava saber mais sobre a evolução que teve, o que lhe fizeram pois resolveu muito dos males que tinha Estou e estarei eternamente agradecido a essa equipa Só queria saber melhor os motivos porque puseram a minha mãe a dormir Nunca pensei que algum dia iria encontrar profissionais com o vosso excelente nível A informação que me deram foi muito subtil e podiam ser mais abertos e honestos Esteve tempo demais no hospital … e logo se soube do mal devia ter ido para aí Devem ter mais atenção em ter a família mais próxima do doente quando ele está a morrer Só tenho a dizer bem de vós. Ele esteve em vários sítios a sofrer. Nem o IPO vos chega aos calcanhares Graças a vós morreu em paz mas deviam ter-me deixado entrar para me despedir ou dar um beijinho Infelizmente esteve pouco tempo convosco, mas sinto que foi muito mimada Sofreu demais e devia estar convosco muito antes mas sei que o hospital … não deixou Teve alta e foi morrer sozinho na urgência. Isso não se faz O hospital de … não fez em tantos dias que lá esteve o que vocês fizeram em meia dúzia de dias que a minha mãe esteve aí Só precisava de saber mais pormenores porque é que ele morreu Tenho a melhor imagem da minha mulher que estava confortável até ao momento final Só tenho pena que tenha demorado tanto a ir para o vosso hospital Apesar de pouca informação que me deram foram os únicos a serem sinceros comigo Não deixem de ser quem são Só acho que devem falar com as pessoas. Ligava e diziam-me que estava na mesma A minha mãe que está no céu agora diz-me que vos tenho de ficar agradecia para sempre Só dou um conselho, falem mais com as pessoas ou melhor, com as famílias. De resto vocês são fantásticos Tirando algum pormenor sobre as informações que dão de resto estão excecionais a tratar das pessoas A minha maior angústia foi de não me terem dito como morreu, se sofreu ou não

Recorrendo à análise de conteúdo, segundo Bardin (2011) identificam-se as seguintes categorias com a justificação das unidades de registo na tabela 1: referenciação tardia em que a opinião do familiar é que deveria ter ido para a unidade mais cedo; alta não negociada em que sentiram que o familiar deveria estar mais tempo internado; défices na comunicação/informação com falta de disponibilidade por parte dos profissionais; agradecimento pelo trabalho desenvolvido louvando a atitude dos profissionais; qualidade do cuidado desenvolvido diferentes de outras unidades onde o seu doente esteve internado; visitas dificultadas mas que compreendem pelo facto de se estar em situação de pandemia; comparação positiva com outros serviços de saúde onde as instalações e qualidade dos profissionais é diferente pela positiva; défices de recursos humanos onde acreditam que se houvesse mais profissionais a qualidade das dimensões em análise poderiam ser mais significativas.

Discussão

A reflexão que agora se propõe ajuda às conclusões mais pragmáticas a desenvolver na unidade de cuidados paliativos deste centro hospitalar em termos do seu programa de melhoria contínua de qualidade. Retém-se a ideia de que os números carecem sempre de uma análise mais contextual e tendo em consideração todas as variáveis possíveis. No caso, aborda-se uma área complexa da prestação de cuidados de saúde (Barbosa & Neto, 2016; Neto, 2022). As preocupações residem na satisfação dos familiares dos doentes internados relativa a: atendimento/resposta às necessidades/problemas do doente; cuidado humano com que o doente foi abordado; condições que lhes foram oferecidas; coordenação da informação disponibilizada; metodologia de transmissão da informação; disponibilidade da equipa para falar com o doente e família; manutenção do doente e família informados acerca da situação clínica; respeito pelas preferências terapêuticas do doente (Capelas et al, 2019, p.16). Na maioria das repostas obtidas o resultado do processo de cuidados levou à morte da pessoa num total de quarenta e seis óbitos e as restantes dezoito pessoas tiveram com resultado a alta do internamento e que como desfeche vieram a falecer em casa. Este resultado conjuntamente com a faixa etária dos internamentos no decurso desta discussão pode ser explicado pelo envelhecimento progressivo da população, com uma esperança média de vida que tem uma tendência crescente (Neto, 2022).

Também Radbruch et al (2020), numa reflexão sobre uma nova visão dos cuidados paliativos aponta que o final de vida é perfeitamente expectável, sendo este preparado para cuidar a pessoa e família em situação de fim de vida com as respostas de saúde mais eficazes e eficientes do sistema de saúde. É de frisar a ideia da possibilidade de adaptar as necessidades e os problemas de pessoas em extrema vulnerabilidade ao recurso de uma medicina e enfermagem especializada em paliar (Neto, 2022). No que diz respeito a variáveis de caraterização da amostra estas apresentam resultados de género de proximidade e que acompanham largos indicadores de saúde no geral em Portugal. Foram cuidados um total de quarenta e oito doentes com idades superiores a 65 anos e um conjunto de dezasseis doentes com idades inferior ou igual a 65 anos, pelo que se influi um número maior de doentes com o avançar de idade adulta e encaminhando-se para a terceira ou mesmo quarta idade. Uma das mais importantes variáveis identificadas para o decurso do estudo prende-se com a identificação do familiar de referência, nomenclatura utilizada para a pessoa significativa para o doente que pode ser familiar desta ou não.

A maior expressão do familiar de referência posiciona-se no seio familiar, como alguns autores (Fonseca, Peres & Scalia, 2020) também denominam de cuidador informal, ainda espaço para a presença vestigial de instituições que assumem este papel de prestador de cuidados, deste modo, no estudo subsistiu a identificação de uma instituição no papel de familiar de referência. É essencial referir que o familiar de referência será identificado como o principal cuidador sendo a ponte de ligação aos cuidados de saúde e a pessoa que mais próximo tem acompanhado o evoluir da doença. Muitas vezes é tido com processos de capacitação até por parte dos profissionais de saúde para assumir cuidados à pessoa principalmente quando esta aumenta o seu grau de dependência com a possibilidade de alta ou mesmo no aproximar do final de vida. O ato de cuidar é sempre um desafio exigente que visa responder as necessidades da pessoa e cuja perceção do estado físico, psicológico, social e espiritual abarca o conceito de satisfação para as respostas que foram dadas por parte dos serviços de saúde (OPCP, 2018). Foram identificados vários familiares de referência, cuja maior expressão identifica o papel da filha num total de 28 pessoas, seguido pela figura de marido/esposa. Tais resultados são espelho do acompanhamento social da família identificados em estudos como DenHerder et al (2017) Fonseca, Peres & Scalia (2020).

Como diagnóstico na admissão é importante refletir acerca dos resultados que demonstram a maioria dos doentes com necessidades de cuidados paliativos provêm do grande grupo correspondente a doenças oncológicas. Olhando para os registos internos deste centro hospitalar consegue-se assumir uma continuidade destes dados. Existe maior incidência para neoplasias de colon e reto seguidas do cancro da mama e grupo das neoplasias hematológicas. O motivo de internamento define a necessidade pela qual levou a pessoa à procura de cuidados paliativos, sendo analisados três grandes grupos: controlo de sintomas (discriminados de forma individualizada), organização de cuidados e apoio em fim de vida podendo coexistir dois ou mesmo três motivos para intervenção da equipa. De acordo com o estudo a maioria dos doentes necessitavam de controlar a dor, um dos sintomas com maior descrição e prevalência no âmbito dos cuidados paliativos e dos que gera maior incapacidade e angústia não só à pessoa, mas também à família (Capelas et al, 2018) e dados mais anteriores sobre a dor conforme achados em Ferris et al (2007). Para além da dor como sintoma que leva ao internamento e à intervenção da equipa de cuidados paliativos destaca-se a dispneia e a agitação/confusão. A ferida maligna apesar de não representar um sintoma necessário “per si” de controlar, pode levar à presença de hemorragia, dispneia e astenia, para além de abarcar um conjunto de problemas que interferem com o bem-estar e autoimagem da pessoa.

Toda a sintomatologia descrita nesta investigação segue as possibilidades de sintomatologia que leva ao sofrimento inscritas nos vários manuais de cuidados paliativos dos quais destacamos o de Barbosa & Neto (2016) pela vivência do contexto. O apoio em final de vida foi descrito e infere especificamente já que as pessoas com morte iminente necessitam de uma intervenção intensiva por parte da equipa e cujo desfecho apesar de expectável, requer um cuidado de presença ativa e atenta para o doente e família com gestão de condição física, mas também de questões psicológicas e espirituais rigorosas. A complexidade da pessoa em fim de vida e o seu grau de exigência faz aumentar o feixe de intervenções e a qualidade das mesmas, tendo por base a existência de protocolos bem definidos e atualizados. No que concerne à organização de cuidados, acompanhar e ajudar a pessoa e familiar para colaborarem na qualidade de vida do seu doente, espera-se que tenha culminado na resolução ou estabilização de sintomas físicos e na preparação social da família/instituições para que se tivesse procedido à alta hospitalar, não existindo, contudo, informação que possa confirmar este raciocínio.

É essencial refletir sobre a presença de um trabalho em equipa, da sua relevância entre profissionais que complementam as suas intervenções em prol da situação de complexidade do doente e família. As dificuldades sociais encontradas nesta pesquisa acompanham outros resultados e que apontam para a necessidade de uma intervenção mais sustentada de apoio da comunidade para que a pessoa possa fazer as suas despedidas no seu espaço de conforto, ou mesmo a morte ocorrer em casa (Baquet-Simpson et al., 2019; Seow & Brainbridge, 2018). Para Barbosa & Neto (2016) e Neto (2022) a família é um pilar fundamental para colaborar no processo de negociação de cuidados. Em relação à presença do familiar no momento da alta ou óbito a inferência coloca a tónica no contexto de pandemia vivenciada no trimestre de análise muito diferente de outros momentos no passado em que a presença da família era frequentemente efetiva em 24 horas. É de realçar cada vez mais a necessidade de se favorecer a presença do familiar. Num estudo sobre as necessidades da família no acompanhamento do seu doente em Cuidados Paliativos, Areia et al (2017) afirmam: “Contudo, é relevante salientar que muitos cuidadores conseguem retirar ganhos positivos do acompanhamento do doente terminal (e.g., atribuição de maior sentido à vida).” (2017, p.144).

A perceção dos profissionais sobre o momento da alta ou óbito é tida como sem sofrimento do doente, associado ao valor da Escala de Edmonton, qualquer que tenha sido o resultado do internamento e ainda é referido o dado importante que vinte e nove pessoas se encontravam sob sedação ou perfusão intensiva para gestão e controlo de sintomas. Na avaliação da dor enquanto sintoma geral, pode ser o profissional a perceber o seu grau. Num estudo sobre a perceção do cuidado, Silva (2014) identifica uma forte proximidade entre as referências dos profissionais, dos cuidadores e dos doentes. Assim sugere-se que, com o recurso à Escala de Edmonton com o seu resultado por Score, se possa ir aferindo, ao longo dos trimestres de avaliação da qualidade, a consideração da perceção dos profissionais como nota importante. Por outro lado, a perceção do familiar, e até do doente, em alguns casos, sobre o alívio do sofrimento é encarado como uma medida de extrema importância para aferir o cuidar (Capelas, (2014).

Neste estudo realçam-se os aspetos indagados ao familiar de referência no que diz respeito à sua perceção em relação a sintomas físicos, psíquicos/emocionais/sociais e religiosos/espirituais da pessoa. Dos aspetos de perceção emocionais destacam-se a tristeza e ansiedade. A ideia que o sofrimento físico é mais facilmente observado e avaliado por parte da família do que questões emocionais e sobretudo as questões espirituais que ficam para segundo plano é corroborada pelos resultados deste estudo. A reflexão acerca da perceção do familiar sobre os sintomas que causam desconforto e/ou sofrimento à pessoa obtêm-se resultados de elevado sofrimento. Os cuidados prestados pela equipa aliviaram este sofrimento na totalidade, chegando a que acreditam na total serenidade da pessoa. Estes resultados confirmam já anteriores estudos para uma visão mais integral do cuidado paliativo descritos na obra de Hasselar & Payne (2016).

No contexto de final de vida a informação altera, muitas vezes, a perspetiva de vida da pessoa e família em relação ao seu futuro, de forma negativa e drástica com necessidades de adaptação a realidades em constante mudança. O ato humano de comunicar reveste-se de pontos de respeito, dignidade, sensibilidade e empatia. Requer em última instância treino constante e o conhecimento de protocolos para que se desenvolva de forma natural e humanizada. Em relação aos resultados obtidos nos pontos do estudo “Clareza de informação” refere-se que a equipa foi capaz de veicular informação clara que respondeu as questões e necessidades do familiar acerca do estado, diagnóstico ou evolução da situação clínica da pessoa internada, sendo completamente adequada, levando a equipa a refletir mais uma vez acerca da importância de se posicionar no que é a estratégia dos cuidados paliativos. Um dos aspetos de satisfação dos doentes e seus familiares prende-se com a informação e conhecimento que detém sobre a sua doença, para que possam exercer o seu princípio de autonomia em relação a aceitar ou recusar intervenções propostas e adequadas à sua melhor qualidade de vida e conforto (Calado, 2014).

Sobre os nossos achados relacionados com a comunicação temos que: “Para eles, quanto maior a comunicação, informações precisas e bom atendimento pela equipe domiciliar menor será a sobrecarga no cotidiano com o paciente oncológico. Dessa forma surgiu a proposta de um cuidado multiprofissional, pois o cuidador sente-se, muitas vezes, despreparado para lidar com uma doença terminal, necessitando tanto de apoio em relação à prática dos cuidados como de um suporte emocional.” (Fonseca et al. 2020, p.80). Tal foi observado que no que diz respeito à disponibilidade de ouvir e informar o familiar, mas preocupa a opinião dos profissionais que não demonstraram essa disponibilidade. Para o trabalho da equipa multidisciplinar, os familiares de referência caraterizam como excelente. E assim o grau de satisfação do familiar perante os cuidados que a pessoa recebeu na unidade demostra que perante as expetativas de satisfação 7,81% foram de muita satisfação e para 92,19% foi excelente. Este resultado vai ao encontro das expetativas do indicador proposto por Capela (2014) que é de 90%. Também para Pinto et al (2022) a satisfação dos doentes e famílias com os cuidados paliativos prestados é indicador (processo e/ou resultado) de monitorização, que se repercutirá na qualidade dos cuidados em contexto paliativo. A expressão do familiar demonstra emoções, sensações e sendo sugestivas de interpretações diversas. Sem emitir qualquer juízo de valor apenas destacamos alguns conceitos que no âmbito dos cuidados paliativos têm fortes sentidos e que gravam memórias doces ou acres da prestação de cuidados a pessoas na sua vulnerabilidade e próximas da sua finitude.

De ressalvar que abordagem a tempos difíceis, de distanciamento social, que, foram vivenciados pela equipa prestadora de cuidados, limitando as presenças dos familiares, as despedidas foram mantidas dentro do possível, renovando-se o caráter inovador de ideias de aproximação com recurso a videochamadas e visitas pelo exterior ou mesmo presencialmente para as necessárias despedidas a quem está próximo do seu fim de vida. Ainda assim, o distanciamento foi sentido e manifestado pela família como um aspeto menos positivo, causador de angústia e sofrimento. Como limite do estudo pode emergir para além das questões éticas, no tratamento e análise de dados, como a subjetividade do mesmo pela análise do observador, pelo que, este inquérito e todo o desenvolvimento metodológico foi efetuado por dois profissionais e revisado por um terceiro em fase posterior. De acordo com a relevância e consideração dos dados, estes apresentaram aportes da equipa e necessidade de medidas corretivas ou evolutivas decorrem com o continuo do cuidado e das posteriores avaliações do grau de satisfação por trimestre. A necessidade de informação já refletida ao longo deste trabalho é mais uma vez objeto de analise pela relevância das pessoas obterem informação, a necessidade do saber com sinceridade, abertura, pormenor, assertividade e honestidade: “Para a satisfação do serviço na opinião de pacientes e cuidadores fazem necessário: comunicação mais aberta; escuta ativa; médico presente e mesma equipe clínica; controle efetivo de sinais e sintomas; identificação de prioridades para pacientes e cuidadores; amenização do sofrimento físico e mental; reforçar a importância de resolver conflitos, realização de despedidas e valorização da família presente.” (Fonseca et al, 2020, p.85).

A tradução das expressões textuais livres, fazem parte da análise de conteúdo deste estudo e permitem a manifestação do que possa ter marcado de forma positiva ou negativa, os cuidados e a comunicação durante a prestação dos cuidados. Para sua análise é essencial percecionar o momento de vulnerabilidade do familiar que as profere e sem julgamento de valor ético compreender que a expressão de gratidão é parte do processo recíproco de cuidar (Neto, 2022). Os achados nesta área tão sensível, a palavra proferida por quem ainda poderá estar a atravessar o seu momento de luto, ajuda a compreender e intervir num próximo futuro. Indo ao encontro das histórias contadas por Neto (2022), as expressões de agradecimento com menções ao conforto das pessoas cuidadas, de reencontro da paz traduzem o sentimento de importância inegável dos cuidados paliativos.

Conclusões

O estudo contribui para a descrição da satisfação pelos cuidados prestados aos doentes internados em cuidados paliativos, sob a perspetiva de dois observadores: o familiar/cuidador e o profissional que cuida. A qualidade em cuidados paliativos carateriza-se pela centralidade dos cuidados ao doente/família, gestão dos serviços, desempenhando a equipa um papel fundamental. Um plano individual de cuidados deve garantir a continuidade e qualidade de cuidados, assumindo o doente e família um papel central, participativo para as distintas tomadas de decisão num ambiente de constante colaboração interprofissional. É fundamental que se monitorize os níveis de satisfação do doente e família no sentido da melhoria contínua. O reconhecimento da qualidade dos cuidados paliativos através de um programa de melhoria contínua da qualidade permite conhecer um pouco melhor a prática clínica no sentido do desenvolvimento de programas que respondam às reais necessidades de cada doente/família em particular. Os resultados obtidos devem ser interpretados com cautela, uma vez que este estudo não é isento de limitações.

No entanto, apesar da sua pequena dimensão, insere-se numa área do conhecimento ainda pouco explorada e pretendeu-se contribuir para a análise e avaliação da qualidade dos cuidados prestados, no processo de acompanhamento do doente e seu familiar significativo perante a vivência de uma doença incurável, progressiva e que leva inevitavelmente à morte. Devem ser tidas em conta as limitações do nosso estudo no que diz respeito à generalização dos resultados. Devido às condições de acesso à unidade estudada não foram incluídas as famílias que poderiam estar presentes 24 sobre 24 horas com os seus doentes. Podemos afirmar que a implementação de pressupostos científicos na prestação de cuidados altamente especializados e intensivos no que concerne ao âmbito dos cuidados paliativos contribui para o aumento da satisfação da família (nomeadamente da figura do familiar de referência) relativos aos cuidados de saúde prestados pela equipa. Tendo em conta os domínios representativos dos principais indicadores de qualidade podemos concluir que: a identificação e caraterização do familiar de referência são essenciais para que possa ser avaliado o grau de satisfação do mesmo; o desfecho do internamento pode influenciar a perceção do cuidado e o grau de satisfação do familiar de referência; os processos comunicativos, indo ao encontro de um dos pilares dos cuidados paliativos, são estruturantes de todo o plano de cuidados; existe uma valorização dos sintomas físicos em detrimento dos sintomas psico-emocionais e espirituais na perceção do familiar. Em congruência com os resultados serem positivos, ao considerar que os familiares de referência se encontram satisfeitos com os cuidados, é importante percecionar que a qualidade e a capacitação dos profissionais como deve continuar um foco de investimento, uma prioridade para que se normalizem as práticas no objetivo da melhoria e/ou manutenção dos resultados.

A visão final dos autores procura de forma clara e sustentado o espelho da prática especializada de cuidar em fim de vida. Carece de maior base de estudos similares e validados no contexto atual e nacional da ação dos profissionais no campo comunicacional e relacional para futuras inferências de satisfação do doente e família.

O resultado deste trabalho tem como objetivo para além do mapear de todos os aspetos anteriormente mencionados, sobretudo a reflexão por parte de todos dos conceitos globais do cuidar e da comunicação não causadora de dano ao doente e família, como em particular uma outra reflexão individual que sustente este plano de melhoria contínua da qualidade. Acreditamos que, para um futuro breve, este trabalho possa também contribuir para a constituição de um conjunto de indicadores de qualidade na área dos cuidados paliativos para um acompanhamento sistemático da sua evolução em Portugal.

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Recebido: 03 de Março de 2022; Aceito: 05 de Abril de 2023

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