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Gazeta Médica

versão impressa ISSN 2183-8135versão On-line ISSN 2184-0628

Gaz Med vol.10 no.3 Queluz set. 2023  Epub 30-Set-2023

https://doi.org/10.29315/gm.v1i1.619 

Artigo de Revisão

A Pessoa com Alteração na Deglutição

The Person with Deglutition Changes

1. Hospital CUF Descobertas, Lisboa, Portugal.


Resumo

A deglutição é um processo complexo, podendo ser comprometido por fatores neurológicos, obstrutivos, degenerativos ou de origem cognitiva. A disfagia é definida como a sensação de impedimento à passagem de material líquido ou sólido quando este é deglutido.

Perante as lacunas existentes na nossa prática de cuidados, foi criado um grupo de trabalho no serviço, para fazer face às necessidades sentidas. O grande objetivo é dar uma resposta eficaz na avaliação dos doentes que apresentam sinais e sintomas de disfagia, tendo em vista a sua referenciação à equipa multidisciplinar.

Decidimos procurar respostas quanto a outros métodos de avaliação não invasiva da disfagia, diferentes do nosso, através desta revisão de literatura, por forma a encontrar as diferenças que existem entre os vários métodos e testar a sua fiabilidade e eficácia comparativamente ao método de avaliação que utilizamos neste momento.

Concluímos que existem dois outros métodos de avaliação da deglutição: o TOR-BSST e a Escala de GUSS, sendo estes dois métodos de alta fiabilidade.

Palavras-chave: Perturbações da Deglutição/diagnóstico; Perturbações da Deglutição/enfermagem; Perturbações da Deglutição/etiologia; Perturbações da Deglutição/reabilitação

Abstract

Deglutition, usually compromised, is a cognitive or complex, obstructive, degenerative process in origin. Dysphagia is defined as the sensation of holding liquid or solid material when it is swallowed.

In view of the gaps in our care practice, a working group was created in the service to address the needs felt. The main objective is to provide an effective response in the evaluation of clients who present signs and symptoms of dysphagia, with a view to referring them to the multidisciplinary team.

We decided to research the non-invasive responses of dysphagia, the assessment different from ours, through this literature review, in order to find the differences that exist between various methods and test their reliability and other attempts compared to the evaluation method we use at the moment.

We conclude that there are two other methods of swallowing assessment: the TOR-BSST and the GUSS Scale, both of which are highly reliable.

Keywords: Deglutition Disorders/diagnosis; Deglutition Disorders/etiology; Deglutition Disorders/nursing; Deglutition Disorders/rehabilitation

Introdução

O acidente vascular cerebral (AVC) continua a ser a primeira causa de morte em Portugal. Perante isto, o AVC constitui um verdadeiro flagelo para o país.1

A pessoa com antecedente de AVC após período de hospitalização pode ficar com sequelas físicas e emocionais, que podem ser comprometedoras da capacidade funcional, autonomia e independência, podendo igualmente ter efeitos sociais e económicos que afetam todos os aspetos da vida.2

A organização mundial de saúde3 define o AVC como o desenvolvimento rápido de sinais clínicos de distúrbios focais (ou globais) da função cerebral, com sintomas que podem perdurar por período superior a 24 horas ou conduzir à morte, sem outra causa aparente que a de origem vascular. As causas são a trombose, a hemorragia, a embolia e a isquemia cerebral transitória, sempre associados aos fatores de risco que podem não ser modificáveis, como o género, a idade, a raça e a história familiar de doença arterial coronária; e modificáveis como a dislipidemia, a diabetes mellitus, sedentarismo, hipertensão arterial, tabagismo, obesidade e stress.

A disfagia consiste numa alteração da deglutição com sinais e sintomas muito específicos que se reflete em qualquer etapa ou entre as etapas da dinâmica da deglutição. O ato de deglutir é uma função vital para os seres humanos, aparentemente parece um processo simples e fisiológico, mas ele é um processo altamente complexo e dinâmico, que envolve um conjunto de órgãos e sistemas. A deglutição orofaríngea dita normal é um procedimento dinâmico e rápido que envolve um conjunto de estruturas interdependentes conduzidas pelo sistema nervoso, e tem como função satisfazer as necessidades nutricionais e de prazer do indivíduo.

Facilmente se compreende que a função de deglutir é o percurso, em segurança, do bolo alimentar até ao estomago, então a complicação imediata da disfagia é a entrada dos alimentos na via aérea.

Segundo a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE), "deglutição é um tipo de digestão com as seguintes características: passagem de líquidos e dos alimentos fragmentados, pelo movimento da língua e dos músculos, da boca para o estômago através da orofaringe e esófago".4

A disfagia no pós-AVC afeta muitas pessoas de diversas formas, tais como, ordem biológica, psicológica e social. A enfermagem necessita de adquirir competências para realizar a avaliação da disfagia do doente, demonstrando conhecimento sobre as suas complicações e garantindo a educação do doente, do cuidador e da família, conquistando para o doente uma alimentação segura, prevenindo as consequências da mesma.

Atualmente, o método de avaliação usado no serviço é o Método de Exploração Clínica Volume - Viscosidade (MECV-V)

Metodologia

Revisão de literatura, através de uma scoping review. Decidimos colocar a seguinte pergunta de partida da nossa pesquisa:

“Que outros métodos de avaliação não invasivos da disfagia são aplicados na pessoa com alterações da deglutição?”

A população que definimos são os clientes internados em uma unidade hospitalar, o seu conceito são métodos de avaliação da disfagia e o contexto refere-se aos clientes com alterações da deglutição.

Relativamente aos critérios de inclusão definimos o seguinte: (Tabela 1)

Tabela 1 Critérios de inclusão. 

CRITÉRIOS PARA SELEÇÃO CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
Tipos de Estudos Estudos Qualitativos e Quantitativos, em Inglês e Português, publicados entre 2010 e 2019
Tipo de Participantes (Clientes internados em unidade hospitalar) Doentes internados com idade igual ou superior a 18 anos, em uma unidade Hospitalar
Conceito Métodos de avaliação da disfagia, não invasivos

Foi elaborada pesquisa nas bases de dados CINAHL e MEDLINE, da plataforma EBSCOhost Integrated Search em dezembro de 2020. Após pesquisa, foram encontrados 10 artigos, sendo que após a aplicação dos critérios de inclusão reduziu-se para quatro. Apenas dois deles estavam em full-text, pelo que foram esses os escolhidos para análise. Após leitura dos resumos, selecionamos o artigo “Avaliação Clínica não invasiva de disfagia no AVC - revisão sistemática”, por consideramos ser o único a responder à nossa pergunta de partida.

Resultados

Scoping Review

No sentido de percebermos melhor a qualidade e fiabilidade do nosso método de rastreio de disfagia, decidimos perceber que outros métodos de avaliação da disfagia existem. Da análise do estudo, destacamos os dois métodos abordados pelos autores: Gugging Swallowing Screen (GUSS) e Toronto Bedside Swallowing Screening Test (TOR-BSST). O teste de GUSS é constituído na primeira fase pela avaliação inicial através de um teste com saliva ou spray substituto da saliva nos doentes que são incapazes de a produzir. A segunda fase compreende o teste de deglutição de forma direta. A primeira fase pretende avaliar a vigília, o reflexo voluntário de tosse, a deglutição da saliva e a disfonia. A segunda fase pretende avaliar diretamente as alterações da deglutição, sendo divido em três partes: a primeira parte inicia-se a avaliação com semi-sólidos (consistência de pudim), a segunda parte com líquidos (3, 5, 10, 20, 50 mL de água) e a última e terceira parte com sólidos, nomeadamente pedaços de pão embebidos em água. Na classificação final do teste, a pontuarão de 0 a 9 corresponde a disfagia severa, 10 a 14 disfagia moderada, 15 a 19 disfagia fraca, 20 deglutição sem alterações. Quanto ao teste de TOR-BSST os autores referem que é constituído por cinco itens de avaliação: voz prévia, movimentos da língua, sensibilidade faríngea, deglutição da água e voz posterior. Os autores do artigo mencionam que qualquer um destes dois instrumentos de avaliação tem elevados valores de sensibilidade para doentes agudos e para doentes em processo de reabilitação. Mais concretamente, concluem que nenhum doente submetido ao teste GUSS com disfagia, foi avaliado como não a tendo, e que no caso de TOR-BSST, em muito poucos casos essa situação aconteceu, o que leva a concluir que ambos os testes possuem uma alta fiabilidade. A falha mais grave encontrada em ambos os testes, são os falsos positivos, ou seja, doentes sem disfagia, mas que são avaliados como tendo disfagia. Também é evidenciado no estudo que o TOR- BSST é o método de avaliação da deglutição que melhor resultado traz na avaliação dos doentes com disfagia.

Os autores salientam a importância de os enfermeiros serem responsáveis pela supervisão das refeições dos doentes. O que se torna importante na nossa opinião, para uma correta avaliação e processo de reabilitação da pessoa com alterações na deglutição, assim como para a prevenção de complicações associadas às alterações na deglutição.

MECV-V

Após a realização do teste de disfagia, o resultado do mesmo é sempre reportado ao médico assistente e nutricionista, independentemente de o doente apresentar ou não alterações na deglutição. Se o doente apresentar alterações na deglutição, a consistência dos líquidos e sólidos é ajustada de imediato para que o cliente se consiga hidratar e alimentar com segurança. Nas situações em que isso não é possível (disfagia severa), a situação é reportada ao médico assistente e o doente fica em pausa alimentar, até ser avaliado pelo otorrino.

Os resultados que obtivemos de 2019 até ao momento em 2020 com este método de exploração, são muitos similares. Constatamos que em ambos os anos, nenhum doente que tenha sido submetido ao teste, e que tivesse disfagia foi avaliado como não tendo, assim como nenhum doente que não tivesse disfagia, tenha sido avaliado como tendo. Verifica-se também que existem maior predominância de doentes positivos no teste de disfagia com patologia respiratória do que com qualquer outra patologia. Não foi registado qualquer caso de Pneumonia por aspiração adquirida em contexto de internamento, pelo que consideramos este dado como um fator de melhoria com a implementação deste programa de avaliação.

Relativamente aos resultados de 2020, do total de doentes avaliados, 54% deram positivo no teste a nível da segurança e eficácia da deglutição. Desses doentes, foi ajustada a consistência dos alimentos e viscosidade dos líquidos em 84,21% dos casos, ficando estes doentes a alimentar-se e hidratar-se com segurança, sendo que 15,78% careceram de serem entubados nasogastricamente de imediato ou após evolução negativa, por não oferecerem condições de segurança para continuarem a se alimentar e hidratar com segurança.

A nível patológico, ao contrário do que nos diz a evidência científica mais atual, de que existe uma clara predominância de um doente sofrer alterações da deglutição após um AVC, isso não se verifica na nossa realidade, já que de todos os doentes avaliados por apresentarem sinais e sintomas de disfagia em 2020, apenas 11,4% sofreram um AVC, e desses apenas 8,57% deram positivo para disfagia no teste. As patologias mais prevalentes foram as do fórum respiratório, representando 40% do total de avaliações efetuadas. Desses, 78,57% deram positivo para disfagia no teste.

Discussão

Revisão Teórica

O mecanismo de deglutição envolve várias interações coordenadas entre ambas, efetuadas por um conjunto de mecanismos coordenados pelo córtex cerebral, tronco cerebral e nervos encefálicos. Envolve todo o sistema nervoso central. Ocorre quando acontece uma coordenação adequada entre as capacidades sensitivas, a atividade motora da cavidade oral e suas estruturas, e a função conjunta de cinco pares cranianos. Tem uma duração estimada de cinco a dez segundos, sendo controlada por ações do fórum sensitivo, motor e do sistema nervoso central. O mecanismo de deglutição compreende várias fases, nomeadamente as fases oral preparatória e oral, consideradas fases voluntárias; e as fases faríngea e esofágica, consideradas involuntárias ou reflexas.5-9

Na fase oral preparatória os alimentos são introduzidos na cavidade oral onde se misturam com a saliva. Os alimentos são assim preparados para a deglutição, através dos movimentos de mastigação e movimentos da língua. O músculo bucinador vai contrair-se de maneira a que o bolo alimentar fique no centro da boca. Os lábios mantem-se encerrados durante os movimentos de mastigação. Nesta fase os recetores sensoriais desempenham um importante papel, porque determinam a posição dos líquidos e alimentos dentro da boca, o que evita traumatismos da cavidade oral. As vias aéreas permanecem abertas e mantem-se a respiração nasal em todo o processo.5-9

Após esta fase, seguir-se-á a fase oral, onde o bolo alimentar ficará posicionado entre a língua e o palato duro para ser levado ou conduzido até à faringe, através dos movimentos de propulsão da língua. Estes movimentos que são ântero-posteriores e ondulatórios, permitem que o bolo alimentar fique posicionado no sulco central e que deslise até à base da língua, onde desencadeia posteriormente o reflexo da deglutição pela estimulação do pilar amigdalino anterior. Nesta fase a respiração nasal é interrompida pela subida do palato mole que vai bloquear a nasofaringe. Dura em média um segundo e é controlada pelos pares cranianos V, VII E XII. Esta fase inicia-se quando a língua empurra o bolo alimentar para a orofaringe e termina com o disparo do reflexo de deglutição.5-9

A fase faríngea caracteriza-se pela entrada do bolo alimentar na faringe. Aquando do disparo do reflexo de deglutição, origina-se a proteção das vias aéreas através do encerramento da nasofaringe, com a elevação do complexo hilofaríngeo, o encerramento das pregas vocais e a consequente descida da epiglote. Esta fase caracteriza-se inicialmente pelo deslocar do bolo alimentar através da língua, para a porção posterior da faringe. Em seguida o palato mole eleva-se o que permite o encerramento da faringe e impede o refluxo nasal. O bolo vai progredindo pelos movimentos de peristaltismo faríngeo e o complexo hilofaríngeo desloca-se para a frente. A epiglote inverte-se para proteger as vias aéreas e prevenir a aspiração de alimentos e líquidos para vias aéreas. Este conjunto de processos permite em conjunto com a pressão exercida do bolo alimentar o relaxamento do esfíncter cricofaríngeo. Leva posteriormente à passagem do bolo alimentar para o esófago. Esta fase é controlada pelo nervo glossofaríngeo que envia os impulsos nervosos para o cento da deglutição, que se localiza no tronco cerebral. Os V, VII, X, XII pares cranianos, transportam os impulsos motores que originam o reflexo de deglutição. Os músculos constritores faríngeos vão auxiliar o transporte do bolo alimentar, pelos movimentos peristálticos, associados à gravidade e ao músculo cricofaríngeo. A duração desta fase compreende aproximadamente um segundo.5-9

Por último, a fase esofágica vai envolver a propulsão do bolo alimentar ao longo de todo o esófago até ao destino final, o estômago, através de movimentos peristálticos. Esta fase inicia-se com o relaxamento do esfíncter cricofaríngeo e termina com a entrada do bolo alimentar no estômago. Tem a duração aproximada de oito a vinte segundos.5-9

Neurofisiologia da Deglutição

O nervo laríngeo superior (ramo do nervo vago), é responsável pela sensibilidade laríngea. Desencadeia o reflexo da deglutição. O nervo laríngeo superior divide-se em dois ramos. O ramo mais externo que é motor, compreende, no entanto, uma componente sensorial. É responsável pela sensibilidade abaixo das pregas vocais, nomeadamente na região da membrana cricotiróideia. O ramo mais interno, por outro é na sua maioria sensorial, sendo responsável pela sensibilidade laringofaríngea acima das pregas vocais. Pode-se então subentender que a disfagia pode ser causada por fatores motores, sensoriais, anatómicos ou mistos.10,11

A estimulação do córtex cerebral e do tronco cerebral podem desencadear diversos fenómenos envolvidos na deglutição. O córtex cerebral vai influenciar a função motora e sensitiva da laringe e faringe. Já o tronco cerebral vai coordenar as fases reflexas da deglutição, bem como inibir a respiração na fase faríngea. Aqui também se encontram os pares cranianos que influenciam a deglutição.7

Na fase oral, os pares cranianos que tem influência são o trigémio (V par); facial (VII par); glossofaríngeo (IX par) e grande hipoglosso (XII par). O trigémio a nível motor, incide a sua intervenção nos músculos da mastigação. Sensitivamente, a sua intervenção incide na sensibilidade da língua nos 2/3 anteriores, no palato e na posição temporomandibular. O facial tem intervenção motora nos músculos da mimica facial e no encerramento dos lábios. A nível sensitivo a sua influência incide no paladar, nomeadamente nos 2/3 anteriores da língua e no nervo da corda do tímpano e nervo lingual. O glossofaríngeo influencia a nível motor os músculos intrínsecos e três músculos extrínsecos da língua, que são o genioglosso, hipoglosso e estiloglosso. Este par não tem qualquer inervação sensitiva.7,9

Na fase faríngea, os pares cranianos que tem influência são o trigémio (V par); glossofaríngeo (IX par); vago (X par) e grande hipoglosso (XII par). O trigémio que apresenta apenas função motora nesta fase da deglutição, inerva o músculo tensor do véu palatino, influência o movimento do músculo milo-hióideo para cima e para a frente, o que permite colocar a porção mais baixa da laringe, a laringofaringe, abaixo da raiz da língua. O glossofaríngeo a nível motor influencia a elevação da laringofaringe e proporciona dilatação da faringe. A nível sensitivo o glossofaríngeo inerva a parte posterior da língua (os ramos linguais), a faringe (plexo faríngeo), os pilares amigdalinos e o palato mole. O vago inerva a nível motor o músculo elevador do véu palatino, promove a constrição da parede posterior da faringe, promove os movimentos laríngeos como a queda da epiglote e subida da faringe, e enerva os músculos cricofaríngeos. A nível sensitivo enerva a faringe, nomeadamente o plexo faríngeo, e a laringe no nervo laríngeo superior e ramo laríngeo interno. Por último, o grande hipoglosso, inerva a nível motor o movimento da língua, nos seus ramos musculares. Mais uma vez, este par não apresenta inervação sensitiva.7,9

Assim, depreende-se que em perante a situação de uma lesão unilateral, ou seja, que ocorra em um hemisfério cerebral, como um AVC, pode desencadear-se um processo de alteração da deglutição, porque os músculos da cavidade oral e os músculos da laringe, faringe e esófago, estão ambos representados nos hemisférios cerebrais. Sendo que os da cavidade oral são simétricos e os da laringe, faringe e esófago são representados assimetricamente (Antunes et al). Numa situação de AVC, podem ocorrer diversos compromissos em uma ou mais fases da deglutição, pelo que se conclui a existência de uma elevada percentagem, de um cliente desenvolver disfagia após ter sofrido um AVC.

Segundo Kotechi et al,12 do total de pessoas que sofrem um AVC, 45% dos casos desenvolve alterações da deglutição. Desses 45%, 50% aspiram conteúdo sólido e/ou líquido e 33% vão desenvolver uma pneumonia por aspiração. A disfagia poderá ser revertida durante duas semanas no pós-AVC, daí a importância do início da reabilitação precoce do cliente (8 Os clientes que sofrem de disfagia apenas após seis meses da ocorrência do AVC, apresentam uma taxa entre os 9% e os 13%.

Disfagia

Como base no referido anteriormente, a deglutição é um processo complexo que pode ser originado por fatores neurológicos, obstrutivos, degenerativos ou mesmo de origem cognitiva. Assim, por exemplo, após um AVC (lesão cerebral), desencadeiam-se diversos compromissos nas fases da deglutição, o que resulta na disfagia.9 O tipo de disfagia e a sua complexidade é determinado não só pela extensão, mas também pela gravidade das lesões e antecedentes pessoais de doença do próprio cliente.

A Organização Mundial de Gastroenterologia13 define a disfagia como a sensação de um impedimento à passagem de material líquido ou sólido (ou ambos), quando este é deglutido. Inclui a dificuldade em iniciar a deglutição, o que é característico da disfagia orofaríngea, assim como a perceção de que os líquidos e/ou sólidos ficam retidos, na sua transição da boca até ao estômago, característico da disfagia esofágica. Na disfagia orofaríngea o cliente sente dificuldade em iniciar a deglutição. Os sintomas mais frequentes são a regurgitação nasal, tosse, diminuição do reflexo de tosse, fala nasalada e engasgamento.13 Na fase oral denota-se alterações quanto ao encerramento labial, alterações na mobilidade da língua e sensibilidade oral. Na fase faríngea, as alterações mais evidenciadas são a falta ou atraso do reflexo de deglutição, a subida da laringe de forma assimétrica, a alteração da sensibilidade da câmara faríngea, ou o encerramento das cordas vocais de forma anormal.8

Na disfagia esofágica, o cliente sofre de uma disfunção cricofaríngea, que é devida a um atraso na abertura do esfíncter esofágico, a uma abertura efetuada de forma incompleta ou ao encerramento prematuro do esfíncter.8

A Tabela 2 apresenta os sinais e sintomas de disfagia.

Tabela 2 Sinais e sintomas de disfagia. 

SINAIS E SINTOMAS DE DISFAGIA
Dificuldade em gerir a quantidade de secreções/ perda involuntária de saliva Acumular de alimentos nas partes laterais da boca (bochechas)
Ausência/ abolição do reflexo de tosse de forma voluntária Descoordenação entre a mastigação e deglutição
Alteração no tom de voz Deglutições múltiplas
Diminuição/ abolição dos movimentos da boca e língua Regurgitação nasal e/ou oral
Presença de “restos” de comida de refeições anteriores Infeções respiratórias de repetição
Perda ponderal de peso Voz rouca ou molhada
Aumento do tempo necessário para a refeição Apresentar espirros ou tosse durante a refeição e / após o fim
Alterações do padrão respiratório durante a refeição Sucessivas tentativas de “limpar” a garganta

Adaptado de Joanna Briggs Institute. Identification and Nursing Management of Dysphagia in Adults with Neurological Impairment. Best Practice: Evidence Based Practice Information Sheets for Health Professionals. Adelaide: JBI; 2000.14

Depreende-se assim, com base na evidencia científica aqui demonstrada, que a alimentação e hidratação de forma segura constitui um ganho para a qualidade de vida do doente. Não só na questão da satisfação metabólica do organismo, mas também como fator de relacionamento e interação social e pessoal. Daí que as consequências que podem advir para o doente sejam mais do que malnutrição ou desidratação. Uma pessoa que sofra de disfagia pode sofrer de isolamento social, afastando-se ela própria de atividades com outras pessoas, o que poderá levar também à depressão.

Conclui-se que esta problemática, que leva à dependência na necessidade humana básica de comer e beber, pode desencadear alterações nas outras necessidades básicas, como apresentamos na Tabela 3.

Tabela 3 Alterações nas restantes necessidades fundamentais, consequentes da alteração da necessidade de comer e beber. 

Necessidades Fundamentais Problemas de Enfermagem
Respirar Perturbação potencial das trocas gasosas associadas a um aporte alimentar insuficiente consecutivo a vómitos ou anorexia
Eliminar Obstipação resultante do consumo inadequado de fibras alimentares. Alteração da eliminação urinária associado a uma insuficiência de líquidos
Mover-se e manter uma boa postura Intolerância à atividade secundária a um aporte alimentar insuficiente
Dormir e repousar Perturbações dos hábitos de sono associados à dor secundária a hábitos alimentares incorretos
Vestir e despir Incapacidade parcial de se vestir, devido à obesidade ou emagrecimento
Manter a temperatura do corpo dentro dos limites normais Hipertermia potencial associada a uma insuficiência de líquidos
Estar limpo, cuidado e proteger os tegumentos Potencial compromisso de integridade da pele associado à secura. Compromisso da integridade da mucosa oral associada a deficiente higiene oral ou estomatite
Evitar perigos Incapacidade parcial de se alimentar associada à dificuldade de se abastecer de alimentos. Risco de acidente associado a um défice sensorial ou astenia consecutiva a anorexia
Comunicar com os seus semelhantes Alteração das perceções sensoriais associadas a fatores como desequilíbrio eletrolítico e/ou nutricional
Agir de acordo com as suas crenças e valores Angústia espiritual associada a um conflito entre as crenças religiosas e a prescrição de um regime alimentar especial
Ocupar-se tendo em vista a autorrealização Intolerância à atividade associada a uma transferência de oxigénio insuficiente em consequência de malnutrição
Divertir-se Ausência de ocupação dos tempos livres associada a perda ou aumento de peso ou a desinteresse em relação a tudo o que está relacionado com alimentação
Aprender Não adesão associada com a complexidade de uma dieta especial

Adaptado de: Berger L, Poirier D. Pessoas Idosas: Uma abordagem global. Loures: Lusodidacta; 1995.15

Avaliação da Deglutição

A Tabela 4, resume os aspetos importantes na avaliação prévia da deglutição.

Tabela 4 Avaliação prévia da deglutição. 

O que avaliar? Descrição
Informação clínica História clínica, familiar, antecedentes pessoais
Estado mental/funções cognitivas Estado de consciência, orientação, atenção, memória, comportamento, perceção e funções executivas
Pares cranianos (V, VII, IX, X, XI, XII) Músculos da mastigação/sensibilidade da face; simetria facial (lábios e músculos bucinadores) /paladar 2/3 anteriores da língua; sensibilidade e motricidade da úvula e palato mole/paladar 1/3 posterior da língua; tom de voz; movimentos da cabeça; movimentos da língua
Reflexos Deglutição; tosse; velopalatino; faríngeo
Avaliar também quanto à linguagem, postura/controlo da cabeça na posição de sentado; aparência da mucosa oral (coloração, estado de hidratação), estado nutricional da pessoa, peças dentarias presentes e sua condição, tempo que demora a iniciar a deglutição após ser pedido que o faça, o padrão respiratório (incluindo as saturações periféricas de oxigénio), capacidade para a pessoa faze apneia de forma voluntária, verificar se a pessoa consegue ou não fazer tosse eficaz, observar se existe movimento faríngeo quando é deglutida a saliva, observar se consegue deglutir a saliva ou secreções.

Após a avaliação prévia da deglutição, se esta for considerada como segura para a realização do teste de disfagia, progredimos então para a segunda etapa da avaliação. Torna-se importante que possamos garantir um ambiente calmo para não ocorrerem distrações, garantir que a pessoa se encontra corretamente sentada, garantir que temos o material de aspiração a funcionar caso seja necessário, assegurar que o doente compreende todas as instruções que lhe vamos dando e efetuar o teste sempre com água e recurso a espessante caso seja necessário. No nosso contexto profissional, encontramo-nos neste momento a desenvolver um projeto em articulação com outros profissionais de saúde, para a avaliação do doente com sinais e sintomas de disfagia e sua referenciação à equipa multidisciplinar, para posterior vigilância e acompanhamento. O projeto, iniciou-se em março de 2018, numa fase de teste, e foi implementado em janeiro de 2019.

O método de avaliação da disfagia da orofaringe que utilizamos é o Método de Exploração Clínica Volume - Viscosidade (MECV-V), desenvolvido pelo Dr. Pere Clavé Civit em colaboração com a Dra. Viridiana Arreola Garcia, numa colaboração com a Nestlé Espanha, S.A. A sua tradução para versão portuguesa foi efetuada e adaptada pela Dra. Susana Mestre e Dr. Adriano Rockland. O método de exploração inicia-se primeiro com a consistência de segurança (Néctar) em que se adiciona 4,5 g de espessante em 100 mL de água. O procedimento inicia-se com a colocação de 5 mL na boca do cliente. Posteriormente pedimos para que encerre a boca (observamos o encerramento labial e se existe escape anterior de alimento). De seguida pedimos que engula. Posteriormente observamos a língua e a cavidade oral para detetar se há resíduos. Pedimos ao cliente de seguida que diga um “A” de forma continua para observar a qualidade vocal (molhada, soprada...). Perguntamos ao doente se sente algum resíduo na garganta para despistar a presença de resíduos faríngeos. Por fim, ao comprovarmos que o bolo alimentar foi engolido numa única deglutição, perguntamos se sente vontade de tossir, ou observamos se apresenta tosse ou engasgo. Caso não se verifiquem alterações da deglutição com 5 mL, progredimos para os 10 mL, com o mesmo procedimento e se não existirem novamente alterações, progride-se para os 20 mL, sempre com o mesmo procedimento anterior. Se aos 20ml de “Néctar” não existirem sinais de disfagia, então o teste progride para a consistência “Líquido”, com água à temperatura ambiente, e o procedimento anterior recomeça da mesma forma. Se existissem sinais de alteração da deglutição, em qualquer uma das anteriores consistências (néctar ou liquido), a consistência passaria imediatamente para “pudim”, e repete-se então novamente o teste anterior, com os mesmos procedimentos. Para a consistência “pudim”, adiciona-se a 100 mL de água, 9 g de espessante. Se na consistência “pudim” persistirem as alterações de eficácia e de segurança, a exploração termina nesta fase, e é comunicado ao médico assistente, e efetuada referenciação para ORL, ficando o doente em pausa alimentar até decisão clínica. Por fim, regista-se em folha própria, os resultados do teste, a avaliação feita, recomendações e eventual encaminhamento para outros profissionais de saúde.16-19

Conclusão

Relativamente ao instrumento de avaliação da disfagia que aplicamos no nosso contexto profissional, o MECV-V, verificamos que o instrumento de avaliação GUSS também inicia a sua exploração através da ingestão de água com alteração da consistência, sendo este um método mais semelhante a nível de fiabilidade e aplicabilidade, comparativamente ao que atualmente é utilizado. Os resultados obtidos permitem-nos concluir que o instrumento é o adequado não só pela sua alta fiabilidade, mas também pela facilidade com que pode ser aplicado.

A realização deste trabalho veio demonstrar a importância deste grupo de trabalho na avaliação e posterior recuperação do doente que sofre de disfagia. Os dados obtidos são geradores do empenho colocado ao longo do ano de 2019 e 2020, e a articulação dos membros em uma equipa multidisciplinar, demonstrando assim ganhos em saúde para o doente e família. Os dados obtidos permitem-nos também perceber que contrariamente ao que nos diz a evidência científica mais atual, não se verificou neste estudo uma clara predominância de um doente sofrer alterações na deglutição após um AVC.

Podemos ainda concluir, tendo por base a análise dos artigos consultados, que a reabilitação desde a fase inicial é fundamental para evitar complicações da disfagia, estabilizando o estado nutricional e eliminar o risco de aspiração: pneumonia por aspiração.

Este trabalho reforça a importância da participação da enfermagem na reabilitação do doente que apresenta disfagia. As alterações na deglutição encontram-se associadas a elevados índices de morbilidade e mortalidade, pelos riscos que lhe estão associados: desidratação, desnutrição, pneumonia por aspiração e morte. Um diagnóstico precoce e uma avaliação eficaz, previne as aspirações alimentares por via oral, levando a um internamento mais curto e uma recuperação mais rápida da pessoa. Dotado de conhecimentos diferenciados, o grupo de enfermagem da disfagia assume a avaliação, planeamento e monitorização do doente com disfagia, promovendo a melhor funcionalidade da pessoa, a sua independência e máxima satisfação, preservando a autoestima e o bem-estar, objetivando a sua qualidade de vida.

Os resultados obtidos permitem que esta equipa consiga justificar a sua atuação, de forma a manter este grupo de trabalho no futuro, adequando a prática de cuidados e melhorando o seu desempenho no sentido de promover os ganhos em saúde ao cliente e à família. Em planeamento, está a criação de um grupo transversal com elos de outros clusters do grupo, a uniformização do procedimento de avaliação da disfagia com a elaboração da respetiva instrução de trabalho e a formação em serviço aos restantes membros da equipa.

Como limitações ao estudo, salientamos o pouco tempo para reunião entre os membros do grupo de trabalho, o que por vezes dificultou a partilha de ideias/ experiência individual de cada elemento.

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Declaração de Contribuição/Contributorship Statement

TS: Pesquisa, conceção do artigo e escrita

HS e TA: Pesquisa e conceção do artigo

TS: Research, article design and writing

HS and TA: Research and article design

Responsabilidades Éticas

Conflitos de Interesse: Os autores declaram não possuir conflitos de interesse.

Suporte Financeiro: O presente trabalho não foi suportado por nenhum subsídio ou bolsa.

Proveniência e Revisão por Pares: Não comissionado; revisão externa por pares.

Ethical Disclosures

Conflicts of Interest: The authors have no conflicts of interest to declare.

Financial Support: This work has not received any contribution grant or scholarship.

Provenance and Peer Review: Not commissioned; externally peer reviewed.

Recebido: 01 de Maio de 2022; Aceito: 17 de Agosto de 2023; : 15 de Setembro de 2023; Publicado: 30 de Setembro de 2023

*Autor Correspondente/Corresponding Author: Tiago Pereira Santos [tiago_santos.enf@sapo.pt] ORCID iD: 0009-0006-6963-0571

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