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Revista Lusófona de Estudos Culturais (RLEC)/Lusophone Journal of Cultural Studies (LJCS)

versão impressa ISSN 2184-0458versão On-line ISSN 2183-0886

RLEC/LJCS vol.9 no.1 Braga jun. 2022  Epub 01-Maio-2023

https://doi.org/10.21814/rlec.3765 

Varia

Comunicação Política Digital na Lusofonia: Plataformização e Engajamento

1Departamento de Ciencias da Comunicación, Facultade de Ciencias da Comunicación, Universidade de Santiago de Compostela, Santiago de Compostela, Spain


Resumo

Este artigo oferece uma análise exaustiva das estratégias emergentes de comunicação política digital numa área pouco estudada: a lusofonia. Mediante revisão bibliográfica e análise de conteúdo, foram estudados um total de 25 partidos políticos de cinco países e três continentes diferentes. Os resultados confirmam, por um lado, tendências emergentes comuns a outras áreas geográficas analisadas recentemente, como a inovação nas narrativas digitais, a plataformização e a tendência para o engajamento como interação comunicativa. No entanto, são observadas novas tendências como o uso de mensagens instantâneas, o podcasting, a segmentação de audiência e o engajamento vinculado à neutralização de notícias falsas.

Palavras-chave: comunicação; comunicação política; digital; engajamento-audiência- partido político; português; lusofonia; redes sociais

Abstract

This article provides an exhaustive analysis of the emerging digital political communication strategies in a seldom-studied area: the Portuguese-speaking world. Through a literature review and content analysis, 25 political parties from five countries and three different continents are studied. The results confirm emerging trends common to other recently analyzed places, such as innovation in digital storytelling, platformization and the trend towards engagement as communicative interaction. However, there are new trends toward instant messaging, podcasting, audience segmentation and engagement linked to the fight against fake news.

Keywords: communication; political communication; digital; engagement-audience- political-party; Portuguese; Lusophone; social networks

1. A Comunicação Política Digital

O uso intensivo da tecnologia (Enli & Moe, 2013) está a reconfigurar a esfera pública (McNair, 2017) e, portanto, a conjuntura e a estrutura de um dos principais atores: os partidos políticos. Durante as 3 últimas décadas, têm estado imersos em modificações tecnológicas (mudança de estratégias, influência crescente das principais empresas de tecnologia, surgimento de novos atores políticos ou da desinformação) que, ocasionalmente, questionam a distribuição do poder e a vida cívica. Estas modificações têm sido significativas na comunidade com outros atores e potencializadas durante a época da pandemia (Landman & Splendore, 2020) com consequências incertas para a democracia (Grossman et al., 2020; Webler & Tuler, 2018).

Após os primeiros anos em que a comunicação digital se limitava a servir para publicar na rede mensagens elaboradas na realidade offline, rapidamente os partidos po líticos descobriram a relevância das estratégias digitais nos resultados eleitorais e adotaram estratégias híbridas que combinavam velhos e novos meios na relação com os seus públicos (Chadwick, 2013). Nesse caminho, procuraram inovação nas linguagens e narrativas que, embora inicialmente primassem pela sobreposição de conteúdos nos diferentes média, nos últimos anos, avançaram para discursos crossmedia, transmédia e, inclusive, realidade imersiva (García-Orosa, 2019).

Destaca-se o uso intensivo das redes sociais (Popa et al., 2020) apoiado pelo big data que adquire especial relevância na campanha eleitoral como veículo de comunicação, mas também de previsão.

O uso quase acrítico das redes sociais esteve intimamente ligado a um dos principais anseios dos partidos políticos: a adesão ou engajamento dos seus públicos. A ponto de alguns autores descreverem a era atual como a era do engajamento (Morehouse & Saffer, 2018). Dentro desta evolução, destacam-se estratégias que buscam engajamento do recetor. Ora, como desejo de democratização da participação e deliberação democrática. Ora, simplesmente, como fonte de recursos económicos (García-Orosa, 2018).

No entanto, o engajamento ainda carece de um modelo teoricamente sólido (Shen & Jiang, 2019). As definições, oriundas de diferentes áreas do conhecimento, vão desde a assimilação do compromisso com a interatividade até conceitos ligados ao compromisso psicológico e à filosofia com a construção de comportamentos com diferentes níveis de atividade hierárquica que vão desde o consumo de mensagens passivas até a conversação bidirecional ativa online, participação e recomendação (Men & Tsai, 2013; Taylor & Kent, 2014). Dhanesh (2017) propõe duas conceptualizações principais de engajamento:

(a) como interação comunicativa, manifestada em cliques, gostos, visualizações, partilhas, comentários, tweets, recomendações e outros conteúdos gerados pelo utilizador; e (b) as noções dicotómicas de engajamento como controlo baseado em modos de comunicação transacionais (informação pública, assimetria bidirecional, difusão de mensagens organizacionais) e engajamento como colaboração online baseada em modos participativos de comunicação (diálogo, cocriação de conteúdo, etc.).

Na prática, os partidos políticos procuram continuamente a participação e o engajamento do público de várias maneiras. Até agora, registava-se uma dissonância entre o discurso e a prática da participação e a ausência de um verdadeiro incentivo à partici pação cidadã, atribuindo ao utilizador um papel de redistribuidor sem reivindicar o seu envolvimento ou praticamente nunca respondendo às suas interações (García-Orosa, 2018). No entanto, nos últimos anos, diante da incapacidade de controlar as mensagens da audiência nas redes sociais, os partidos buscam colaboração na disseminação de argumentos comuns por meio de diferentes estratégias de atração de voluntários digitais paralelamente à tradicional procura de apoiantes, membros e doadores. Este foi o caso de partidos estadunidenses desde 2018, como o Partido Republicano com os seus ativistas digitais que recebem tarefas no meio online (seguir o partido nas redes e partilhar as suas mensagens nos perfis de utilizadores e ajudar a crescer a equipa de ativistas digitais) e convencional (registando novos eleitores e recebendo eventos), ou o Partido Democrata, cuja ação incluía um diretório, várias causas e um guia passo a passo para telefonar ao representante republicano correspondente e convencê-lo.

Paralelamente, os cidadãos procuravam novas formas de participação política, como grupos de eleitores em Espanha ou intervenção na comunicação e na esfera pública.

Mas, nesse caminho, surgiram também os riscos de transformar a comunicação política digital em comunicação monótona e propagandística, com pouca atenção para funções de deliberação cívica ou debate democrático. Entre as mais recentes, destaca-se a intervenção nas campanhas eleitorais de alguns novos atores: as plataformas digitais. Daniel Kreiss e Shannon C. McGregor (2018) analisaram como Facebook, Twitter, Microsoft e Google foram assessores de partidos políticos e moldaram a estratégia digital, o conteúdo e a execução dos conteúdos da campanha através do desenvolvimento de estruturas organizacionais e padrões de pessoal adaptados à dinâmica da política estadunidense.

São muitas as dinâmicas estabelecidas. Mas, como foi observado, muitos dos estudos realizados até o momento trabalham com sistemas políticos europeus e americanos. Este artigo apresenta uma análise comparativa de países de três continentes pouco estudados na literatura anterior.

Do ponto de vista da comunicação, o período analisado faz parte da quarta onda da comunicação política digital, que se caracteriza por: (a) plataformas digitais como atores políticos, que participam em todas as fases da comunicação; (b) o uso intensivo de inteligência artificial e big data em todas as fases, mas principalmente na campanha eleitoral; (c) a validação da mentira como estratégia política (entre outras, notícias falsas e fenómenos pós-verdade); (d) a combinação de elementos hiperlocais com supranacionais; (e) determinismo tecnológico acrítico; (f) a busca de engajamento com públicos e processos de coprodução; e (g) três tendências com riscos para a democracia: polarização de opiniões, câmaras de eco e bolhas de filtro (García-Orosa, 2021).

2. O Estudo da Comunicação Política na Lusofonia

Como se pode observar na bibliografia supracitada acerca do avanço no conhecimento científico, a lusofonia está mal representada apesar de ter registado um aumento relevante nos últimos anos (Gradim et al., 2018).

Este artigo situa-se na perspectiva dos estudos realizados nas últimas décadas sobre a lusofonia como “figura de interesse geoestratégico e cultural e os média digitais como objeto de análise” (Martins, 2015, p. 27). No caso deste artigo, essa perspectiva será utilizada para analisar outros atores relevantes na esfera pública: os partidos políticos.

A comunidade lusófona tem mais de 250.000.000 de falantes com pouca consciência de pertencer a uma comunidade. Como lembrou o Martins (2016), é um lugar sem voz, sem conhecimento ou reconhecimento das semelhanças neste vasto espaço geográfico, cultural e mediático (ideia também partilhada por Góes & Antunes, 2017; Seixas, 2016).

Essas limitações também se refletem no campo académico da comunicação com 25 entradas na base de dados Web of Science feitas maioritariamente a partir do Brasil e de Portugal (52% e 56% respectivamente), em 2021. Além disso, apenas 8% das pesquisas têm origem nas ciências da comunicação (em comparação com 26% das humanidades ou 24% da linguística). A evolução por anos é bastante irregular, influenciada pelo número reduzido de artigos.

Dentro da comunicação política, os estudos dividem-se em três: os que adotam uma perspectiva histórica (Gaudin, 2020; Izquierdo, 2017), os que realizam análises comparativas entre um país lusófono e outros de fora, e os que analisam as eleições de 2018 no Brasil fundamentalmente focados numa tecnologia específica. No segundo caso, destaca-se García-Orosa et al. (2017), que incluem Portugal numa análise de narrativas digitais em países europeus, e Ituassu et al. (2019), que comparam as eleições nos Estados Unidos (2016) e no Brasil (2018). Finalmente, no último caso, destaca-se Canavilhas et al. (2019) com uma abordagem inovadora que analisa o uso do WhatsApp durante a campanha presidencial brasileira e destaca que 60% das publicações continham informações total ou parcialmente falsas. Os achados corroboram a existência de um círculo de desinformação entre os utilizadores do WhatsApp.

Para este estudo, são analisados: Portugal, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique.

Além de permitir observar as transformações que a tecnologia, entre outros fatores, provoca na comunicação política em realidades pouco estudadas, esta análise é considerada pertinente porque permite incorporar casos de diferentes continentes para além dos trabalhados maioritariamente centrados na Europa e na América.

3. Metodologia

O objetivo principal é estudar a comunicação política digital dos partidos políticos. São estudados os principais partidos políticos com representação parlamentar em 2021 em Portugal (Partido Socialista, Partido Social Democrata, Partido Comunista Português, Bloco de Esquerda, CDS - Partido Popular, Pessoas-Animais-Natureza), no Brasil (Partido dos Trabalhadores, Partido Social Liberal, Progressistas, Movimento Democrático Brasileiro, Partido Liberal), Cabo Verde (Movimento para a Democracia, União Cabo-verdiana Independente e Democrática, Partido Africano da Independência de Cabo Verde), Guiné-Bissau (Movimento para a Alternância Democrática, Partido da Renovação Social, Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau, Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) e Moçambique (Frente de Libertação de Moçambique, Resistência Nacional Moçambicana, Movimento Democrático de Moçambique).

Em primeiro lugar, pretende-se conhecer a autodefinição de comunicação digital proposta pelos partidos; quais são as estratégias que fundamentam as ferramentas online e qual é a conceção de público. Foi realizada uma revisão de documentos online contendo a missão e os princípios. Foram ainda estudados os estatutos e as declarações de intenções de cada um dos partidos políticos.

Em seguida, as suas estratégias digitais foram analisadas. As variáveis foram elaboradas ad hoc para esta pesquisa com base naquelas usadas em estudos recentes semelhantes (García-Orosa, 2018; Keller & Klinger, 2019; Landman & Splendore, 2020) para fazer um raio-X dos média digitais na comunicação política:

  • link do site do partido político;

  • conceção de comunicação digital e relacionamento com o público;

  • segmentação específica do público;

  • indicadores explícitos de presença da lusofonia;

  • idiomas e perspectivas internacionais;

  • inovação nas formas de contar e narrativas (multimédia, transmédia, crossmedia, podcast, 360°);

  • estratégias de verificação;

  • inteligência artificial;

  • gamificação;

  • redes sociais;

  • sistemas de mensagens instantâneas;

  • novos perfis profissionais;

  • engajamento com o público;

  • comunidade (pertencimento a uma comunidade, comunidade restrita a militantes);

  • adaptação à COVID-19

4. Resultados e Discussão

Dentro da tendência de reconfiguração da esfera pública pelo uso da tecnologia (McNair, 2017), os partidos políticos analisados também são, em menor ou maior medida, intensivos no seu uso, especialmente das redes sociais e mensagens instantâneas. A internacionalização das plataformas unifica a sua utilização, os seus tempos de implementação e até as percentagens de utilização de cada uma delas em todo o campo da comunicação. O processo de plataformização também é percetível na amostra analisada com a homogeneização do uso de redes sociais e mensagens instantâneas e a influência na práxis da comunicação política.

Em consonância com estudos anteriores, a distribuição da mensagem dos partidos políticos é maioritariamente crossmedia, isto é, feita simultaneamente através de diferentes canais, mas sem grandes adaptações na linguagem ou discurso. Há uma aposta intensa no audiovisual, fundamentalmente através do YouTube. Destaca-se a aposta no áudio tanto nos podcasts como na utilização de plataformas como o SoundCloud.

As fórmulas híbridas são especialmente destacadas no Partido Social Democrata de Portugal, que combina a função de repositório de documentos, que ganha grande destaque, e a apresentação online de uma revista impressa tradicional com um podcast e um canal de televisão.

A definição de engajamento, entendida como um compromisso entre o público e o partido, verifica-se como a tradicional ligação do cidadão com o partido, fundamentalmente por meio de filiações e doações feitas através de formulários. A definição implícita de cidadão nos sites é a de colaborador do partido no seu financiamento e na distribui ção e circulação de mensagens, mas em quase nenhum caso na elaboração das mensagens ou na definição da política que será veiculada. Portanto, trata-se principalmente de uma comunicação unidirecional e assimétrica (exceto em contatos ocasionais por meio de redes sociais e de mensagens instantâneas) que não afeta a essência da política ou a produção da mensagem.

Portanto, o recetor, neste caso, cidadão, como produto da representação, uma entidade imaginada do discurso que se expressa através da enunciação de outro (Ducrot, 1980/1986) influenciada pela lógica dos média e do público na construção da sua imagem, revela-se um público maioritariamente definido pelos partidos políticos como recetores de mensagens e com um compromisso unicamente definido pela continuidade e fidelidade da receção (newsletters) e colaborador económico do funcionamento do partido.

O envolvimento com o público é unidirecional e também está ligado ao recebimento de doações (Partido Social Democrata, Portugal) ou à adesão, que se destaca em muitas ocasiões (Bloco de Esquerda, CDS - Partido Popular - Portugal; Partido dos Trabalhadores - Brasil). Noutras ocasiões, a participação é equiparada à presença em eventos (Pessoas-Animais-Natureza, Portugal)

No entanto, a amostra de partidos apresenta algumas peculiaridades em relação a estudos anteriores. Primeiro, a segmentação do recetor. A segmentação mais tradicional (militante, simpatizante como no Partido Socialista de Portugal) combina-se com algumas fórmulas que se adaptam à realidade de cada contexto e aos principais objetivos de cada partido. Mas, em nenhum caso, são partilhadas ou comuns à zona lusófona. Assim, destaca-se a segmentação por “jovens” e “mulheres” no Bloco de Esquerda (Portugal), Partido Social Liberal (Brasil), Progressistas (Brasil) e Movimento Democrático Brasileiro. Além disso, no Bloco de Esquerda (Portugal), há um grupo de pessoas com mais de 60 anos e outro da comunidade lésbicas, gays, bissexuais, transgénero, queer e intersexo. Chama a atenção a divisão de espaços para a comunidade afro (Progressistas - Brasil e Movimento Democrático Brasileiro) e também para a diáspora no Movimento pela Democracia em Cabo Verde. Em todos os casos, a segmentação permanece, mais uma vez, num modelo tradicional de comunicação unidirecional e assimétrico, que apenas segmenta para oferecer informações que possam ser de especial interesse para esses grupos. É importante, porém, destacar uma exceção, a comunidade criada sob o nome de “Central de Combate às Fake News em Sua Cidade” do Partido dos Trabalhadores, no Brasil, na qual o sindicato não está vinculado às características do público que recebe a informação, mas, sobretudo, a uma finalidade atual e concreta da realidade em que o partido político atua. Portanto, a interação estabelecida com o utilizador é seletiva.

Não são detetados passos relevantes para o engajamento baseado em modos de comunicação transacionais (em vez de assimetria bidirecional) e afasta-se do engajamento entendido como colaboração online baseada em modos participativos de comunicação, como diálogo e cocriação de conteúdo, entre outros (Dhanesh 2017).

Este estudo não deteta sinais de procura de engajamento que vão além da perspectiva tecnológica e é abordado como mais um elemento do processo de comunicação que permite ao utilizador participar em todas as fases do processo de produção e influenciar o conteúdo, com algumas exceções, além do uso de big data para adaptar a informação ao comportamento e sentimentos dos utilizadores. A busca pelo comprometimento com o destinatário é, sobretudo, uma importante fonte de comercialização e circulação de informações e pouco relevante na essência e no processo de comunicação dos partidos políticos.

Destaca-se o uso das redes sociais, embora ainda sem uma estratégia comum, que seria muito importante nos próximos anos para o desenvolvimento de estratégias adaptadas a cada situação (Linke & Oliveira, 2015). A necessidade de uma estratégia integrada nas redes sociais para um público diferente começa a ser sentida, como já aconteceu com sucesso em outras áreas.

O facto diferencial nesta ocasião é marcado pelo uso de mensagens instantâneas com Telegram e Skype (4% cada em ambos os casos) e WhatsApp (20% das partes utilizam; Figura 1).

Figura 1 Mensagens instantâneas destacadas em pesquisas anteriores sobre lusofonia e podcast 

Excepto pelo uso proeminente do Flick em Portugal e do Instagram em Portugal e no Brasil mais do que nos outros países analisados, não se detectam tendências específicas nos países analisados (Tabela 1), pelo contrário, respondem principalmente a tendências observadas em estudos realizados em diversos lugares do mundo.

Tabela 1 Redes sociais por partidos políticos 

Por fim, os suportes e as inovações técnicas vão-se adaptando às circunstâncias, especialmente no que diz respeito aos telemóveis e ao uso de newsletters para distribuição, enquanto a automatização, as narrativas imersivas e as estratégias transmédia continuam a destacar-se como técnicas emergentes e subutilizadas. Assim, os médias apresentam fluxos comunicacionais fundamentalmente assimétricos e assíncronos, com avanços nas narrativas e poucas comunidades, como ocorre em outras áreas recentemente estudadas (Serrano et al., 2020).

Portanto, os partidos políticos controlam a ação comunicativa e política e utilizam o público como um destinatário bastante passivo (exceto pela opção de interação em redes sociais e mensagens instantâneas).

Nesse sentido, como é comum na maioria dos resultados dos estudos de comunicação política em partidos nos últimos anos, destacam-se duas redes sociais: Twitter e Facebook, com 76% e 64% de uso, respectivamente, como pode ser observado na Figura 1. Como também ocorreu em estudos realizados noutras realidades, Instagram e YouTube ocupam o segundo lugar (44%).

O engajamento é delineado como uma interação comunicativa, que se manifesta na forma de cliques, gostos, visualizações, partilhas, comentários, tweets, recomendações e outros conteúdos gerados pelos utilizadores, longe das noções de engajamento como controlo baseado em modos transacionais de comunicação (informação pública, assimetria bidirecional, disseminação de mensagens organizacionais) e engajamento como colaboração online baseada em modos participativos de comunicação (diálogo, cocriação de conteúdo, etc.) indicados por Dhanesh (2017).

A vinculação com a tecnologia está ligada à estratégia de marketing destacada em secções específicas, nos seus princípios fundadores e na implementação das tecnologias de informação e comunicação, sobretudo nas redes sociais.

Por fim, salvo o uso de uma língua comum, não há indícios da criação de uma comunidade lusófona no discurso ou nas tendências da comunicação política que os diferencie de outros recentemente estudados para além dos assinalados acima.

5. Conclusões

Este estudo partiu de uma convicção relativa à importância da comunicação digital não só como processo de comunicação, mas também como detetor de fenómenos políticos (Braga et al., 2017) num momento de grandes mudanças como a quarta onda da comunicação política digital. O objetivo era analisar esta realidade na lusofonia. Confirmam-se tendências emergentes comuns a outras áreas geográficas recentemente analisadas, como a inovação nas narrativas digitais, a plataformização e a tendência para o engajamento como interação comunicativa. No entanto, novas tendências podem ser observadas para o uso de mensagens instantâneas, podcasts, segmentação da audiência ou engajamento vinculado à neutralização de notícias falsas. Algumas destas questões estão resumidas abaixo.

A relação entre atores públicos e plataformas digitais, denominada “plataformização” (Smyrnaios & Rebillard, 2019), é cada vez mais próxima e assimétrica em partidos políticos em diferentes áreas do mundo. A implementação das redes sociais é homogeneizada e as suas lógicas de produção e de comunicação que influenciam a essência do partido e a relação estabelecida com os recetores. Assim como foi detetado nos estudos citados acima e realizados principalmente com partidos políticos estadonidenses e europeus, o Twitter e o Facebook fazem parte da maioria dos sites e, portanto, das narrativas dos partidos políticos. A tendência detetada nos últimos anos para o audiovisual também se confirma neste estudo com uma alta implementação do Instagram e do YouTube.

Subjacente à implementação homogénea e quase acrítica das redes sociais, está a necessidade de se aproximar de um destinatário cada vez mais distante e de criar com ele um compromisso de longo prazo. No entanto, os resultados obtidos descrevem fluxos comunicacionais fundamentalmente assimétricos e assíncronos, com avanços nas narrativas e poucas comunidades, como ocorre noutras áreas recentemente estudadas (Serrano et al., 2020). A definição de engajamento, entendido como um compromisso entre o público e o partido, verifica-se como a tradicional ligação do cidadão com o partido fundamentalmente por meio de filiações e doações feitas através de formulários. A definição implícita de cidadão, nos sites, é a de colaborador do partido no seu financiamento e na distribuição e circulação de mensagens. No entanto, em quase nenhum caso há colaboração na elaboração das mensagens ou na definição da política que será veiculada.

Como indicado, há mudanças nas narrativas para crossmedia, mas não para transmédia ou realidade virtual.

Entre as peculiaridades da amostra analisada, destaca-se o uso de mensagens instantâneas, o podcast, a segmentação da audiência ou o engajamento vinculado à neutralização de notícias falsas. A segmentação está sempre ligada às características do destinatário, não à sua relação no processo de comunicação, em poucas ocasiões, conversas ao vivo.

De qualquer forma, é um avanço para estratégias de comunicação híbridas, com uma interação exclusivamente seletiva que não modifica as estruturas de poder dos partidos políticos, não permite a participação do cidadão na configuração da organização da sua formação e apenas permite a modificação imposta pelas plataformas tecnológi cas nas limitações e homogeneização das formas e conteúdos da comunicação.

6. Limitações do Estudo

O estudo oferece dados inéditos sobre um campo não estudado anteriormente, mas os seus resultados devem ser ampliados com estudos longitudinais nos próximos anos. Da mesma forma, este trabalho será complementado com a análise de outros atores políticos como os cidadãos ou os média e com estudos comparativos com outras comunidades linguísticas.

Agradecimentos

Este artigo resulta de uma estadia de investigação na Universidade do Minho. Sem esta inestimável ajuda, este trabalho seria impossível. Além disso, foi elaborado no âmbito do projeto Cibermedios Nativos Digitales en España: Formatos Narrativos y Estrategia Móvil (RTI2018-093346-B-C33), do Ministério da Ciência, Inovação e Universidades, assim como Radón en España: Percepción de la Opinión Pública, Agenda Mediática y Comunicación del Riesgo (RAPAC) do Conselho de Segurança Nuclear (SUBV-13/2021).

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Recebido: 11 de Janeiro de 2022; Aceito: 16 de Fevereiro de 2022

Tradução: Elaine Trindade

Berta García-Orosa é bacharel em ciências da comunicação, bacharel em ciências políticas e administrativas e doutora em ciências da comunicação pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha). É professora catedrática da Universidade de Santiago de Compostela e estuda comunicação e política há mais de 20 anos. Ela colaborou em mais de 50 projetos de pesquisa e redes internacionais de pesquisa, cujos resultados foram publicados mais de 100 vezes em bases de dados como Scopus e Journal Citation Reports e editoras como Springer, McGraw Hill e Thomson. Completou visitas de pesquisa e estágio na Universidade do Minho (Portugal), México, Costa Rica, Brasil, Cuba e Uruguai. O Ministério da Educação de Espanha concedeu-lhe três mandatos de pesquisa de 6 anos. Além da sua pesquisa, orientou teses de doutoramento e mestrado, bem como projetos de conclusão de graduação, e ministrou cursos de graduação em jornalismo e comunicação audiovisual, bem como cursos de mestrado em ciência política, ciências da comunicação e estudos hispânicos. Desde 2009, coordena o ensino de inovação em inovação na aprendizagem da comunicação digital. Em termos de experiência administrativa, atuou como secretária de departamento, vice-reitora, coordenadora de licenciatura e mestrado e coordenadora do programa de mobilidade Sistema de Intercâmbio entre Centros Universitários Espanhóis. Email: berta.garcia@usc.es Morada: Facultade de Ciencias da Comunicación, Avda de Castelao, s/n. Campus norte, 15782, Santiago de Compostela

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