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Revista Lusófona de Estudos Culturais (RLEC)/Lusophone Journal of Cultural Studies (LJCS)

versão impressa ISSN 2184-0458versão On-line ISSN 2183-0886

RLEC/LJCS vol.8 no.2 Braga dez. 2021  Epub 01-Maio-2023

https://doi.org/10.21814/rlec.3477 

Artigos Temáticos

Tematização da Deficiência na Literatura Infantil - Olhares Sobre as Personagens

Renata Junqueira de Souza1 
http://orcid.org/0000-0003-2227-2544

Sílvia de Fátima Pilegi Rodrigues2 
http://orcid.org/0000-0002-0109-4593

1Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, São Paulo, Brasil

2Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal de Rondonópolis, Rondonópolis, Brasil


Resumo

O presente estudo se propõe a problematizar a representação de personagens com deficiência física em obras de literatura infantil. A discussão é relevante visto que a temática vem se colocando em livros produzidos para a infância no Brasil, principalmente a partir de 2008, com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva ( nº 6.571, 2008). Embora a questão já aparecesse em algumas obras literárias em períodos anteriores, geralmente com uma abordagem estereotipada. As editoras de literatura infantil, diante de várias políticas e programas institucionais, acharam um filão no tema das necessidades especiais. Indubitavelmente, pressões sociais e políticas de inclusão interferem nas produções literárias e sua inserção também no contexto escolar. Neste sentido, analisar obras que não reforcem estereótipos ou remetam a deficiência como superação heroica, resignação e aceitação do destino, colocando as personagens em condições de subalternidade e/ou que inspirem piedade ou von tade divina, pode colaborar para a ampliação de olhares acerca do que é estigmatizado como deficiência e os limites e possibilidades do ser humano em diferentes condições e potencialidades. Comparar livros infantis que trazem esses dois aspectos - superação e aceitação do real versus resignação e superação heroica - pode ajudar leitores e crianças a compreender a deficiência dentro de uma normalidade e abrir boas perspectivas de discussão sobre a temática com esses leitores em formação.

Palavras-chave: deficiência física; literatura infantil; inclusão; compreensão textual

Abstract

This study aims to discuss characters with physical disabilities in children’s literature. The discussion is relevant once the theme has been placed in books produced for children in Brazil, especially since 2008, with the National Policy for Special Education in the Inclusive Perspective (Decreto nº 6.571, 2008). Although the issue had already appeared in some literary works in earlier periods, usually with a stereotyped approach. Children’s literature publishers, faced with various institutional policies and programs, found a lode in the topic of special needs. Undoubtedly, social and political pressures for inclusion interfere in literary productions and their insertion in the school context. In this sense, analysing works that do not reinforce stereotypes or refer to disability as heroic overcoming, resignation and acceptance of fate, placing the characters in conditions of subordination and/or that inspire pity or divine will, can collaborate to broaden perspectives on what it is stigmatised as a disability as well as the limits and possibilities of the human being in different conditions and potential. Comparing children’s books that bring these two aspects - overcoming and accepting the real versus resignation and heroic overcoming - may help readers and children to understand the disability as part of normality and open good perspectives for discussion on the subject with these readers under training.

Keywords: physical disability; children’s literature; inclusion; text comprehension

Introdução

Os conhecimentos com letramento literário são importantes para o desenvolvimento de crianças e jovens. Quando discorremos sobre experiências com textos literários, estamos evidenciando uma literatura que é arte e que, segundo Coelho (2000), é sinônimo de criatividade que representa o mundo, o humano, a vida, através da palavra. O contato da criança com textos literários pode beneficiar a sua compreensão do mundo, garantindo que a literatura reflita adequadamente a diversidade de suas experiências, bem como um sentimento de pertencer a um ambiente social e real.

Price et al. (2016) reforçam que atividades como a leitura de um texto literário infantil ajudam a construir o vocabulário, a linguagem oral e habilidades de comunicação do leitor. Nessa perspectiva, Sonnenschein e Munsterman (2002) afirmam que a leitura impacta não só o letramento e a aquisição vocabular, mas também apoia outras áreas de desenvolvimento, como o pessoal, social e emocional das crianças. Além disso, entendemos que a leitura de literatura infantil permite que as crianças aprendam coisas novas sobre o mundo, lembrem-se de eventos que elas já conhecem e relacionem suas experiências pessoais com fatos ou episódios compartilhados nos livros. Da mesma maneira, esses pequenos e jovens leitores podem aprender sobre relacionamentos e discutir sobre a diversidade e as diferenças.

Para que isso aconteça o mercado livreiro está abarrotado de livros, com diversas materialidades, gêneros e temáticas que seduzem crianças e jovens.

Com relação à materialidade, alguns livros são ricos nas capas e nos paratextos, que mostram ao leitor pequenos segredos da obra, garantindo a interação do leitor. Souza e Bortolanza (2012) defendem que o livro “cumpre sua função humanizadora insubstituível e indispensável para o desenvolvimento integral de sua personalidade” (p. 69), referindo-se à personalidade do leitor mirim.

Uma outra questão que pode atrair à leitura é a diversidade textual que podemos encontrar nas estantes de livrarias e bibliotecas escolares e públicas. Os textos e os discursos podem ser percebidos a partir dos usos e das funções que adquirem nas situações comunicativas. Segundo Machado (2014), a literatura infantil contemporânea inspirou-se em variadas fontes da tradição literária, incluindo as orais e, por isso, a importância de identificá-las.

Por ser literatura infantil o adjetivo que especifica o seu endereçamento, por muito tempo ela foi tomada como um “gênero”, o que, de certa forma, ocultava a heterogeneidade de gêneros que a constituía. ( … ) textos que nomeamos como “literatura infantil” possui uma gama variada de gêneros literários que confirma essa heterogeneidade: fábulas, poemas, contos, lendas, entre outros. (Machado, 2014, s.p.)

As abordagens na literatura para crianças e jovens são variadas e depende muito da época em que os textos foram escritos, ou seja, há uma relação temática com a história política e social do país em que a obra foi lançada. No Brasil, por exemplo, os primeiros escritos para infância, fins do século XIX e início do século XX, tiveram como tema o ufanismo e a criança ideal - aquela comportada, quieta, educada. Depois disso, Monteiro Lobato (1882-1948) inseriu temáticas mais próximas da infância e colocou as personagens infantis no centro de seus textos.

Atualmente, encontramos livros infantis sobre qualquer assunto. Paiva (2008) cita a “realidade como aposta” do mercado editorial, ou seja, livros que retratam temas como a morte, o medo, a separação, as questões raciais, os sentimentos - assuntos considerados como temas delicados e polêmicos. Segundo a autora, textos que exploram esse eixo temático, aproveitam-se dos contextos e cenários do cotidiano infantil, possibilitando que as crianças se vejam na história ao associarem suas experiências ao enredo, utilizando, assim, seu conhecimento prévio, mas ainda ampliando as possibili dades de compreensão e significação de mundo, dos outros e de si mesmas.

Nesta mesma perspectiva teórica, Kirchof et al. (2013) notam que

no Brasil, desde meados da década de 1990, mas especialmente nos anos 2000, o crescimento do interesse por temas ligados às diferenças tornou-se perceptível no panorama social mais amplo, com reflexos também em uma gama considerável de produções endereçadas às crianças. (p. 1045)

Assim, a literatura infantil passa a tematizar diferenças raciais, étnicas, etárias, de deficiência, de orientação sexual, de conformação corporal, de gênero.

Neste artigo, abordaremos a deficiência física e a maneira como personagens com deficiência são representadas em algumas obras destinadas às crianças.

Inclusão e Deficiência - Breve Histórico Sobre os Marcos Legais

Há na história de pessoas com deficiência um longo caminho para que a sociedade as respeitem e as insiram nos contextos sociais, educacionais, políticos. A inclusão é compreendida por Freire (2008) como um movimento educacional, mas também social e político, que vem defender o direito de todos os indivíduos participarem, de uma forma consciente e responsável, na sociedade de que fazem parte, e de serem aceites e respeitados naquilo que os diferencia dos outros (p. 5). No contexto educacional, vem, também, defender o direito de todos os alunos desenvolverem e concretizarem as suas potencialidades, bem como de apropriarem as competências que lhes permitam exercer o seu direito de cidadania, através de uma educação de qualidade, que foi talhada tendo em conta as suas necessidades, interesses e características (Freire, 2008, p. 5).

Assim, o conceito defende a universalização dos direitos humanos, despontando como perspectiva norteadora de políticas públicas. Aqui interessa-nos expor algumas ações internacionais voltadas para a inclusão da pessoa com deficiência. Para tanto traçamos um pequeno histórico sobre os marcos legais a respeito da educação inclusiva.

No Brasil, a Constituição Federal estabelece a igualdade como direito:

a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (Constituição da República Federativa do Brasil art. 205)

De entre seus princípios educacionais, a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola está explicitado no Artigo 206.º, Inciso I (Constituição da República Federativa do Brasil art. 206, §I). Já o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência é citado no Artigo 208.º, Inciso III, como obrigação do Estado e deve ser efetivado preferencialmente na rede regular de ensino (Constituição da República Federativa do Brasil art. 208, §III).

Em 2010, por meio da Emenda Constitucional nº 65, o Artigo 227.º recebeu nova redação, mantendo o combate à discriminação e a promoção da igualdade como um dever de todos. Nesse mesmo artigo, dentre seus preceitos, consta:

II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. (Emenda Constitucional nº 65, 2010, Art. 227, §II)

Internacionalmente também houve movimentos de combate à exclusão social e aos altos índices de analfabetismo. Nessa direção, sob a coordenação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), foram realizadas conferências e convenções a partir das quais foram publicados importantes documentos.

No Brasil, pautada na Constituição Federal e nas declarações internacionais, foi publicada a Portaria do Ministério da Educação nº 1.793, que recomendava, em seu Artigo 1.º, a “inclusão da disciplina ‘Aspectos ético-politicoeducacionais da normalização e integração da pessoa portadora de necessidades especiais’, prioritariamente, nos cursos de Pedagogia, Psicologia e em todas as Licenciaturas” (Portaria nº 1.793, 1994).

É importante ressaltar que a maior parte dos mencionados cursos não atendeu a essa recomendação por motivos variados que não serão tratados neste artigo.

Em dezembro de 1996, entrou em vigor a Lei nº 9.394 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que trata, no Capítulo V, especificamente sobre educação especial, entendendo-a como “modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação” (Art. 58).

O Decreto nº 3.298 (1999) define “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano” (Art. 3º,§I). Isso impactou o âmbito escolar pois, pela força da lei, passou a obrigar os sistemas educacionais (públicos e privados) a receberem os alunos que buscassem a instituição para se matricularem. Houve reação por parte dos profissionais que argumentavam não terem sido preparados para trabalhar com esse “novo” perfil de alunado. Além disso, a “inclusão” ocorreu sem prover a maior parte dos estabelecimentos com infraestrutura, equipamentos, acessibilidade e outras necessidades básicas para o acolhimento dos estudantes que requeriam/requerem atendimento especializado.

Em consonância com essa política, em 2001 foram publicadas as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica por meio da Resolução CNE/ CEB n º 2 (2001). Aqui se afirma que os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas a organização para o atendimento dos que apresentarem necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade.

Assim, tem-se como princípio a valorização e o reconhecimento das potencialidades e diferenças da pessoa com deficiência, buscando na formação e orientação dos profissionais da educação apresentar caminhos para a inclusão, ainda que muito mais em termos legais do que na viabilização concreta das condições de acesso e permanência daqueles que necessitavam/necessitam de atendimento especializado e diferenciado.

Em 2008, foi a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva cujo objetivo era “assegurar a inclusão escolar de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, orientando os sistemas de ensino para garantir: acesso ao ensino regular, com participação, aprendizagem e continuidade nos níveis mais elevados do ensino” (Decreto nº 6.571, 2008,p. 14). Em julho, o Decreto Legislativo nº 186 (2008) aprovou o texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e o protocolo facultativo, assinados em Nova Iorque (30/03/2007). O decreto apresenta a seguinte definição de discriminação:

discriminação por motivo de deficiência significa qualquer diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, com o propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o desfrute ou o exercício, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais nos âmbitos político, econômico, social, cultural, civil ou qualquer outro. Abrange todas as formas de discriminação, inclusive a recusa de adaptação razoável. (Decreto Legislativo nº 186, 2008, Art. 2)

De entre os pontos fundamentais contra o preconceito e toda e qualquer forma de discriminação, várias ações impactaram na produção de materiais voltados para esse segmento. Um exemplo pode ser verificado na pesquisa de Barros (2015), que analisou 150 livros infantis, editados nas décadas de 1970 até 2010 no Brasil, que retrataram a deficiência (Figura 1).

Fonte. De “Quarenta Anos Retratando a Deficiência: Enquadres e Enfoques da Literatura Infantojuvenil Brasileira”, de A. S. Barros, 2015, Revista Brasileira de Educação, 20(60), p. 171 (https://doi.org/10.1590/S1413-24782015206009). CC BY-NC.

Figura 1 Livros infantis que tematizam a deficiência versus ano de lançamento da primeira edição 

O gráfico corrobora o argumento de que, apesar de algumas sinalizações anteriores, é notadamente a partir de 2003, com o estabelecimento de políticas sociais e econômicas, que verificamos ações afirmativas e inclusivas em maior número. O impacto na produção editorial é um exemplo disso. Uma possível justificativa para o decréscimo a partir de 2008 é a sinalização do Ministério da Educação na interrupção de compras de livros para as escolas públicas brasileiras, o que de fato acontece a partir de 2013.

Diante do exposto, em 2014 foi aprovado o Plano Nacional de Educação (PNE 2014/2024), nele há 20 metas e estratégias, voltadas especificamente para a educação especial:

universalizar, para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados. (Lei nº 13.005, 2014, p. 55)

Em 2015, foi aprovada a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (estatuto da pessoa com deficiência; Lei nº 13.146, 2015), que toma como base, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que deve ser inclusiva e de qualidade em todos os níveis de ensino; garantir condições de acesso, permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de serviços e recursos de acessibilidade.

Ao longo do período que apresentamos como recorte temporal (1988-2018) é possível constatar mudanças na legislação e o aumento na publicação de leis, planos e ações voltados para a educação inclusiva. É necessário reafirmar que as declarações e relatórios internacionais foram e são importantes no processo de fortalecimento, com vista à garantia dos direitos das pessoas com deficiências e no combate ao preconceito e à discriminação.

Esses mesmos direitos devem ser expressos em livros literários destinados às crianças, se partirmos do pressuposto de que a literatura forma o sujeito para respeitar as diferenças e compreendê-las. Dessa maneira, é importante verificarmos como tais personagens são representadas na literatura para crianças e jovens.

As Personagens com Deficiências Físicas e a Literatura Infantil

Já afirmamos que a literatura infantil pode ajudar no desenvolvimento do leitor. De acordo com Price et al. (2016), ela pode fornecer um contexto para entender as normas e comportamentos sociais, auxiliar as crianças a aprenderem como se adaptar à sociedade e facilitar o desenvolvimento de habilidades socioemocionais. Além disso, as crianças podem obter informações de textos, aprenderem a relacionar palavras e imagens e também compreenderem sobre perspectivas que podem diferir das suas próprias (Sipe, 2012). É importante notar que a literatura é um modo central através do qual as crianças “veem o mundo” (Flynn, 2001). Os livros infantis são um meio poderoso para promover a identidade das crianças e a compreensão das várias culturas, e essa mesma literatura pode levar seus leitores à compreensão e à aceitação de indivíduos que são diferentes (Adomat, 2014). Os temas sensíveis ou polêmicos em livros de literatura infantil têm tomado boa parte de pesquisas acadêmicas em vários países. Discussões sobre a representação do gênero, o tamanho do corpo, os indivíduos de diversas culturas e comunidades linguísticas e os sujeitos com deficiência são recorrentes em livros infantis (Price et al., 2016).

De acordo com os autores (Price et al., 2016), tais temas começam a ser inseridos na literatura infantil e analisados com mais ênfase a partir do século XXI. Embora as personagens com deficiência tenham protagonizado narrativas em vários países desde o século XIX, são poucos os estudos empíricos que se concentram em como são retratadas em livros infantis (Prater, 1999).

O estudo de Dowker (2013) analisa personagens com deficiência. Os resultados mostraram que frequentemente essas personagens são retratadas como limitadas em personalidade e sem profundidade. Segundo Price et al. (2016), “as representações de personagens com deficiência nestes livros de histórias eram em grande parte imprecisas. Por exemplo, protagonistas com deficiências foram muitas vezes retratadas como tendo recebido curas milagrosas” (p.564). Estudos empíricos também examinaram como deficiências específicas são retratadas na literatura. Por exemplo, crianças com insuficiência intelectual foram apresentadas principalmente em papéis de apoio e não como personagens principais (Prater, 1999).

Estudos, especialmente ingleses, mostram que, a partir de 1990 e início de 2000, há uma tendência positiva na identificação das personagens com deficiência, pois elas aparecem em configurações mais inclusivas. Price et al. (2016) afirmam que “nesses livros, as personagens com deficiência se envolvem em atividades típicas do dia a dia, incluindo interações positivas e significativas com seus pares e suas deficiências não são o foco da história” (p. 564). Pesquisadores (Dyches & Prater, 2005) descobriram que crianças com deficiência intelectual são muitas vezes retratadas em papeis de ajuda ou como “protetores” e suas deficiências não são realçadas.

No entanto, apesar de tais pesquisas mostrarem resultados que caminham para além dos estereótipos, com relação ao tema da deficiência física, ainda há escassez de livros infantis, sejam eles ingleses, norte-americanos, portugueses ou brasileiros, que retratem positivamente personagens com tais deficiências.

Diante do exposto, é importante ressaltarmos que no Brasil, constituíram-se, nos últimos anos, segundo Kirchof et al. (2013), “importantes núcleos de pesquisa sobre literatura infantil que colocam em discussão a temática das diferenças” (p. 1048). Um desses grupos - Núcleo de Estudos Currículo, Cultura e Sociedade (NECCSO) - coordenado por Rosa Maria Hessel Silveira tem recolhido livros infantis cuja temática é a diferença. A lista feita pelo NECCSO no período de 2013 e 2016 tem mais de 700 títulos que perpassam por temas como: surdos, gordos, cegos, cadeirantes, morte, gênero e sexualidade, velhos, entre outros.

Quando nos debruçamos sobre os textos que trazem cadeirantes e pessoas com deficiência física, encontramos nos títulos do NECCSO somente 29 obras, incluindo traduções vindas da Europa e da América do Norte. Esse baixo número somente reforça o que os pesquisadores afirmaram nas pesquisas até aqui expostas.

Para analisar os livros infantis, buscamos os critérios e as representações de deficiência a partir de uma discussão elaborada por um grupo de pesquisadores norte-americanos (Price et al., 2016) que observaram cada uma das obras como entidades específicas de qualidade dos retratos de deficiência expostos nos livros.

Quicke (1985) enfatiza a importância da representação da aparência física e os comportamentos das personagens, criando um tom geralmente otimista através de histórias que refletem o realismo (Dyches & Prater, 2005). Temas de caracterização, relações com outras personagens, o nível em que as personagens crescem e se transformam, e as características de boas práticas no campo da educação especial formaram a base para outras análises (Altieri, 2008; Dyches & Prater, 2005).

Escritos de Altieri (2008) e outros pesquisadores (Price et al., 2016; Quicke, 1985), declaram que ao selecionar um livro é importante questionar a terminologia usada nas descrições da deficiência e se a deficiência da personagem é rapidamente resolvida ou se é explicada como um desafio contínuo. Além disso, os investigadores sugerem verificar dinâmicas de poder nos relacionamentos entre as personagens e quem funciona como “herói” em cada história (Curwood, 2013).

Embora cada pesquisador apresente ideias específicas e se concentre em temas literários, podemos obter um consenso sobre o que separa um retrato positivo da deficiência de um que é desfavorável. Os textos que contêm estereótipos das representações de deficiência são designados como “inapropriados” (Beckett et al., 2010). De acordo com o modelo cultural de deficiência, os retratos negativos também podem enfatizar barreiras biológicas da deficiência.

De acordo com Beckett et al. (2010), as personagens com deficiência são geralmente vitimadas, dependentes ou sujeitos que carecem de piedade e, nesse sentido, o leitor crítico pode considerar os diversos perfis das personagens com deficiência. Elas também podem servir apenas como exemplos de perseverança. A tendência para as personagens atuarem como líderes, solucionadoras de problemas, modelos e heróis continuamente relega aqueles com deficiência como inferiores (Hughes, 2012).

Outra característica comum dos retratos negativos é que para as personagens com deficiência são concedidos atributos quase sobre-humanos, aparentemente em uma tentativa de compensar suas deficiências (Yenika-Agbaw, 2011). Vários profissionais também concordam que é inadequado para uma personagem com deficiência ser restaurada através de uma cura milagrosa (Dowker, 2013).

Além de listar os elementos da história que formam representações negativas de deficiência, os pesquisadores (Beckett et al., 2010) nomearam atributos que contribuem para caracterizações positivas. A qualidade mais comumente notada das personagens é a complexidade; é essencial que as personagens tenham a dignidade da profundidade e a liberdade de evoluir. Em retratos positivos, as personagens com deficiências são descritas como indivíduos com personalidades e interesses únicos (Hughes, 2012) e não são determinadas pela deficiência (Beckett et al., 2010). Investigadores insistem que os livros infantis sobre deficiência devem ser realistas para serem aceitáveis (Beckett et al., 2010).

Muitos pesquisadores também valorizam a qualidade e precisão das ilustrações, assim é essencial que as imagens das personagens com deficiência sejam livres de estereótipos e acompanhadas de descrições físicas positivas no texto (Wopperer, 2011). Personagens com deficiência devem desempenhar diversas funções, servindo como líderes, solucionadores de problemas, ajudantes e heróis (Dyches & Prater, 2005; Wopperer, 2011). Textos incluindo caracterizações positivas mostram personagens com deficiência independentes, fazendo escolhas e demonstrando autodeterminação. As histórias devem retratar a apropriada inclusão desses sujeitos na sociedade; eles precisam receber todos os direitos de cidadãos e encontrar atitudes de aceitação das outras personagens e da comunidade.

Considerando o propósito deste artigo - apresentar algumas personagens com deficiência, verificando como essas são retratadas - evidenciaremos a seguir alguns critérios que nos ajudaram a montar um quadro com diretrizes para as análises (Tabela 1).

Tabela 1 Definições e critérios de análise 

Fonte. Adaptação de Price et al., 2016

A Deficiência e Suas Representações

Quando puxamos pela memória de uma personagem da literatura infantil brasileira que foi apresentada como tendo deficiência física, imediatamente nos vem O Patinho Aleijado (Pimentel, 1952), uma compilação e adaptação de Figueiredo Pimentel para o conto de Andersen O Patinho Feio. Há nesse abrasileiramento do conto dinamarquês uma linguagem rebuscada, que se distancia do leitor real e que demonstra claras intenções de nacionalização do acervo europeu (Zilberman & Lajolo, 1993).

O conto narra a história de uma velha pata que chocava alguns ovos, depois que os patinhos nasceram, “só faltava o ovo grande que, no entanto, nem sinal dava de estar picado” (Pimentel, 1952, como citado em Zilberman & Lajolo, 1993, p. 25). Embora as comadres patas asseveraram que aquele ovo deveria ser de um outro bicho e que esse nascendo e crescendo poderia comer os patinhos, a mamãe pata não abandonou o ninho.

Sete dias depois de sair o último patinho, a velha pata viu o ovo grande picado, e apareceu um bicho, parecido com pato, é verdade, mas todo torto, escuro e aleijado.

Depressa a pata se arrependeu de ter chocado um bicho tão feio. Mas, como era boa, e não querendo dar o braço a torcer, mostrando-se aborrecida de ter na sua ninhada um pato desgracioso, repugnante, nada falou as comadres. (Pimentel, 1952, como citado em Zilberman & Lajolo, 1993, p. 26)

Além da deficiência física do patinho, o texto evidencia em seu desfecho que ele, desde seu nascimento, sofreu com as “caçoadas, remoques, debiques, vaias dadas por todo plumitivo bando” (Pimentel, 1952, como citado em Zilberman & Lajolo, 1993, p. 26). Poderíamos afirmar que, já em 1896, a personagem sofre bullying. Neste conto, a deficiência física é tratada de maneira preconceituosa, até pela pata mãe, que por conta da rejeição de seu filho pela comunidade de patos, “começou a odiar o aleijado” (p. 26).

A personagem “aleijada”, no entanto, não tem os mesmos atributos d’O Patinho Feio, de Andersen, mas Pimentel encerra a narrativa destacando uma qualidade da personagem: nadava melhor que todos os outros. Ou seja, embora se destacasse por nadar bem, provavelmente vivia sozinho, pois não era aceite pelo bando que o rechaçava. Há ainda sinais de preconceito quando o autor atribui ao patinho a cor “escura” e a característica “torto”.

Assim, concordamos com Dowker (2013) ao afirmar que “o modo como a deficiência era representada na ficção do século XIX é bastante complexo. Algumas personagens são retratadas de forma plana, como vilões ou mais frequentemente, como sujeitos dignos de pena” (p. 1054). E esse é o caso de O Patinho Aleijado (Pimentel, 1952).

A pergunta que fazemos a seguir é se a representação das personagens no século XXI mudou. Como as personagens com deficiências físicas são retratadas na literatura infantil brasileira da contemporaneidade?

Para tanto, analisaremos seis livros, sendo que cinco deles estão na lista do NECCSO e somente um não faz parte dessa lista. No entanto, todos, independentemente de sua qualidade estética, foram encontrados em uma biblioteca infantil escolar. As obras foram selecionadas cumprindo apenas um parâmetro: ter sua primeira edição a partir de 2000, ou seja, ter sido produzida e editada no século XXI (Tabela 2).

Tabela 2 Livros analisados 

Desses livros infantis, o único título que desempenha uma função pedagógica explícita é Caminhando com Paulo (2010), pois a personagem cadeirante é o mote de um material que ensina sobre acessibilidade. No livro, um narrador em terceira pessoa evidencia vários problemas enfrentados por Paulo, enquanto cadeirante: calçadas sem rampas, locais com escadarias, carros estacionados em vagas para pessoas com deficiência, portas estreitas em cinemas, banheiros sem barras de apoio, entre outros.

Neste sentido, há um descompasso entre o texto verbal e o visual, pois as ilustrações só repetem aquilo que o texto diz. Por exemplo:

eu me indignei com a situação de Paulo e de outras com mobilidade reduzida. No dia seguinte, chamei um grupo de amigos. Juntos organizamos uma mobilização. Cartazes, faixas e discursos. Queremos chamar a atenção para a questão de acessibilidade de nossa cidade.

As imagens em página dupla mostram três cadeirantes à frente, um deles é Paulo, e várias pessoas segurando cartazes e faixas, com expressões faciais de raiva e revolta.

A narrativa termina com Paulo feliz, comemorando com amigos, pois a acessibilidade melhorou em sua cidade. E, nas palavras de Paulo, agora sujeito do discurso: “isso prova que unidos podemos conseguir mudanças e evitar qualquer tipo de discriminação”. O livro possui ainda duas páginas com atividades sobre acessibilidade para leitores comprovarem o que aprenderam: “caminhando com Paulo - atividade para o aluno” e alguns artigos da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência são apresentados nas últimas duas páginas dessa obra.

Percebemos a função de Paulo, apenas como uma personagem utilizada para divulgar os problemas do dia a dia de pessoas com deficiências físicas, que moram em cidades sem planejamento para eles. Paulo não é protagonista, a terceira voz da narrativa, um narrador mal elaborado, pois o leitor não sabe quem ele é, mas percebe que ele se apieda do cadeirante e resolve ajudá-lo. Há, portanto, uma função explícita em mostrar problemas de acessibilidade e uma tentativa de conscientizar o leitor para ter noção desses problemas.

Com relação aos critérios elencados na Tabela 1, poderíamos dizer que Paulo é uma personagem estereotipada, contudo, não desempenha um papel de liderança e nem é ele quem resolve o problema de acessibilidade da cidade onde mora; julgamos, ainda, que a história não poderia ser narrada se a personagem não fosse portadora de deficiência física. Embora Paulo seja um coadjuvante, são seus problemas com acessibilidade, que fazem o livro Caminhando com Paulo possível.

Em Igual e Diferente (2011), com ilustrações e texto de Arlene Holanda, a personagem cadeirante é coadjuvante de uma prosa poética em que se apresentam várias crianças com diferenças. Tais diferenças não são evidenciadas nas páginas iniciais do livro pelo texto verbal, mas sim pelo visual, pois a primeira menina é morena (pp. 2-3) e a segunda é negra (pp. 4-5). Podemos afirmar que o contexto de visibilidade das diferenças nessa obra infantil é marcado pelas ilustrações, que apresentam traços de nacionalidade, etnia, raça e também diversas deficiências: surdez, física e mudez. Essas afirmações somente são expressas no texto verbal a partir da página 8, ou seja, exatamente na metade do livro.

Clara tem pele pretinha/ E cabelo enroladinho/ Diego tem pele clara/ E cabelo bem lisinho/ Todo mundo tem beleza/ Cada qual do seu jeitinho. Tati precisa de ajuda/ Para poder caminhar/ João tem dificuldade/ Pra falar e escutar/ Todos gostam de carinho/De beijar, de abraçar. (pp. 8-11)

A obra distingue-se de Caminhando com Paulo por trazer somente nas últimas páginas a moralidade de forma explícita: “todo mundo tem direito/ à saúde e proteção/ pra poder crescer saudável/ sem qualquer complicação/ e é bom que todo adulto/ não esqueça essa lição!” (pp. 14-15). Há, portanto, uma mensagem que pretende alertar adultos para os direitos às diferenças. A maneira como Arlene Holanda faz isso em Igual e Diferente é, nas palavras de Kirchof et al. (2013), com um

viés “politicamente correto” (que) invadiu grande parte dos livros para crianças, sobretudo nos últimos anos, sendo as narrativas literárias tomadas como veículo para circulação de informações, para o estabelecimento de regras morais e de receituários de como agir em relação a esta ou aquela diferença. (p. 1048)

Não podemos afirmar que esses dois livros são de literatura infantil, pois embora essa apresente modalidades de processos verbais e visuais, as obras analisadas até aqui não oferecem ao leitor infantil possibilidades amplas de dar sentido ao que lê, pois afinal as compreensões estão prontas (Cadermatori, 2006).

O Giro da Bailarina (2008) conta a experiência de Ana Carina, uma garota tetraplégica, com o balé. A narrativa é composta em primeira pessoa, a protagonista não é estereotipada e na obra não se evidencia um problema. Ana Carina descreve com alegria e um sentimento de superação a maneira que começou a dançar e como gosta de se apresentar no palco. “Olá, sou Ana Carina e tenho dez anos. Fiquei aqui para falar um pouquinho da emoção que estou sentindo. Sabem, eu acabei de sair do palco, fiz minha primeira apresentação de balé. Foi como um sonho” (pp. 1-2); “eu não imaginava que poderia fazer aqueles movimentos tão leves, que só as bailarinas fazem. Mesmo assim, fiquei muito feliz!” (p. 8).

No livro, as ilustrações dialogam com o texto escrito, ampliando suas possibilidades significativas, pois a menina, sutilmente, expõe suas limitações, mas não as explici ta, o leitor é conduzido pela relação de Ana Carina com o balé até à página 15, quando a garota dança sentada em uma cadeira de rodas.

Por ser um texto descritivo na voz da protagonista, Ana Carina é representada como uma personagem “praticante”, pois é ela quem dança com a professora, o palhaço e suas amigas. Há também indícios que a personagem é aceite pelos outros por seu comportamento individual, o leitor verifica isso nas relações com a professora, “me senti como uma bailarina. Minha professora sorriu” (p. 5) e com as amigas “tenho outras amigas que, como eu, também giram sobre as rodas” (p. 20).

As personagens - Ana Carina, professora, amigas - são evidenciadas como modelos positivos e construtivos, a protagonista e as amigas, também cadeirantes, são felizes e superam as dificuldades e a professora aceita as diferenças.

Diante do exposto, percebemos um sentido de equidade, segundo Cury (2005), princípio fundamental da inclusão, pois no texto verbal as personagens não são tratadas de maneira discriminatória e há uma clara aceitação das suas limitações enquanto cadeirantes.

Da mesma maneira em O Grande Dia (2011), de Patrícia Secco, não menciona Rodrigo como uma pessoa com deficiência física. O leitor compreenderá isso somente pelo texto visual na última página. A obra é narrada por Rodrigo, um menino de 12 anos, que conta a história de como se tornou técnico de futebol do time da escola.

A narrativa mostra a habilidade do protagonista com jogos e estratégias. Sem citar que ele é uma personagem com deficiência física, o leitor não consegue inferir sobre essa condição através do verbal: “e como eu não podia correr nem tinha com quem jogar xadrez, ia assistir o jogo de futebol”. Já as ilustrações de toda obra sempre colocam Rodrigo atrás de um pequeno quadrado que pode ser compreendido como o encosto de uma cadeira de rodas.

O protagonista nesse livro não é mostrado em uma situação de superação de sua deficiência, como é o caso de Ana Carina em O Giro da Bailarina, mas é sua percepção dos problemas do time de futebol que o leva ao cargo de técnico. O desenrolar da narrativa apresenta os acontecimentos de maneira sequencial, pois após Rodrigo assistir ao jogo no recreio da escola, ele relata ao time os problemas: “os meus amigos eram muito desorganizados pareciam 11 meninos jogando sozinhos - correndo atrás da bola, cada um por si! Jogo que era bom, nada! Ninguém passava a bola” e é incluído no grupo como técnico.

A personagem é valorizada por sua habilidade de observação e estratégia e é isso que coloca o time na final do campeonato de futebol, ou seja, a valorização do trabalho em equipe e o respeito pelas pessoas. O texto se encerra na voz de Rodrigo: “e como é maravilhoso saber que, mesmo sem poder correr atrás de uma bola, minha participação foi decisiva para estarmos disputando essa final!”. A imagem que acompanha o texto verbal é similar àquelas fotografias tiradas no início dos jogos, quando o time se une em duas fileiras e pousa para a fotografia oficial do clube. Assim, há três meninos abraçados em pé e na frente deles, dois agachados e Rodrigo ao meio, sentado em sua cadeira de rodas, segurando a bola de futebol.

Dessa maneira, a inclusão de Rodrigo ao grupo é diferente das histórias analisadas nos livros anteriores. Acreditamos que a personagem não apresenta um estereótipo, pois seu desempenho na narrativa representa liderança. Portanto, Rodrigo é uma personagem praticante, é ele quem resolve o problema da narrativa, e é aceite pelo grupo por seu comportamento individual. É mostrado como modelo positivo, pois sua deficiência física não impede que a história seja contada. As ilustrações de Daniel Kondo desem penham um papel importantíssimo porque além de dialogar com o texto verbal, mobiliza o leitor para atribuição de sentidos que pode propiciar uma experiência de leitura autônoma.

A temática do futebol aparece novamente em Conquista Futebol Clube (2006), de Telma Guimarães. O livro possui 32 páginas e narra a história de Davi desde seu nascimento, quando o pediatra informa os pais que o menino nascera com uma má formação na coluna vertebral. Há na conversa inicial dos pais de Davi com o médico duas informações que movem a narrativa: a importância do estímulo para desempenhar todas as atividades; e a busca de meios para realizar várias tarefas.

A relação de Davi com os pais e o irmão mais velho, Felipe, é evidenciada pela convivência, pela busca de solução de pequenos impasses, como uma pia no banheiro da altura do menino. É na escola que problemas maiores serão apresentados: dificuldade em fazer a matrícula na mesma escola do irmão, pelo fato da instituição escolar não ter nenhum estudante com deficiência física; problemas de acessibilidade e, por fim, de aceitação da deficiência pelas outras crianças da sala de aula.

O grande conflito de Davi, na narrativa em terceira pessoa, é o fato de ele não poder jogar futebol nas aulas de educação física. Para resolver a questão, ele começa, às escondidas da família, a construir uma perna de madeira com um tênis na ponta, que lhe permite chutar a bola. Para testar sua engenhoca precisa de um time de futebol e é nesse momento que Davi observa outros colegas e percebe que eles também não participam da aula, um por ser obeso, outro por usar óculos, e por aí adiante. O time do menino é formado por várias crianças que de uma maneira ou de outra se sentiam excluídas, fosse por alguma diferença ou pelo bullying.

Davi, então, monta seu time - Conquista Futebol Clube - e as crianças começam a treinar aos sábados. Felipe, seu irmão, desempenha o papel de árbitro e a equipe chama atenção da diretora e dos outros alunos da escola. Como desfecho, a gestão escolar prepara a escola com rampas, banheiros acessíveis e aceita outros alunos com deficiência; as crianças do time são reconhecidas pelos outros alunos da escola, que passam a querer jogar futebol com eles.

Em Conquista Futebol Clube, o texto visual acompanha o texto verbal, repetindo os acontecimentos da narrativa em imagens. Como, por exemplo, no episódio que Davi vai conversar com a moça da cantina e sugere a ela que coloque uma placa com as comidas do dia, pois ele não conseguia enxergar o balcão. A ilustração disposta do lado direito da página ocupa metade do espaço em vertical e o leitor pode ver uma lanchonete muito alta, com a moça no balcão e Davi de cabeça e braços erguidos, não enxergando o interior da cantina.

O protagonista e sua família não são identificados como estereotipados, no entanto, as personagens que vão aparecendo e formando o time sim. Mathias, o menino obeso, é tratado por “Rolha”; João, o menino de óculos, conhecido como “Zoio”; Robervaldo e Giovaneusa eram excluídos por conta de seus nomes estranhos. Os recursos linguísticos utilizados para retratar essas características das personagens não fogem de estereótipos saturados, no entanto, alguns leitores poderão se identificar com esses problemas de bullying, tão comuns nas escolas.

Davi desempenha um papel de liderança e, por aceitar sua condição física e buscar formas para jogar futebol, realizando assim um desejo, é aceite pelo grupo, dessa maneira, não haveria a possibilidade de contar essa história sem evidenciar a deficiência do garoto. Portanto, outras crianças com deficiências poderão se perceber em Davi, que é mostrado como modelo positivo e construtivo de personagem.

Neste sentido, as características encontradas em O Grande Dia e Conquista Futebol Clube divergem das afirmações feitas por Price et al. (2016) que, em pesquisa exploratória com 102 livros infantis norte-americanos, afirmam que as personagens com deficiência muitas vezes não tinham papéis ativos na resolução de problemas e nem havia um claro equilíbrio entre as funções desempenhadas pelas personagens com ou sem deficiência.

O último livro Meu Irmão Não Anda, mas Sabe Voar!, cuja narrativa em primeira pessoa, conta a história de uma menina que um dia pediu um irmãozinho para sua mãe por se sentir muito só.

Então, no meu aniversário de sete anos, ganhei o melhor presente do mundo: mamãe falou que logo meu irmãozinho ia chegar. Achei muito estranho, porque a barriga dela nem tinha crescido! Como, então, o meu irmãozinho ia chegar? Foi mais estranho ainda quando ele chegou. Não era um bebê, não era pequeno, era maior do que eu! E não podia andar! (pp. 9-15)

A temática dessa obra discorre sobre a amizade entre a menina, que não tem nome, e João, seu irmão, perpassando por temas secundários como a adoção e a deficiência física. A narradora justifica o fato de o irmão não poder andar, dizendo: “mas descobri que pode voar!” (p. 16). Esse voo tem dois significados: o primeiro, atribuído à velocidade que ele pode dar à sua cadeira de rodas; e o segundo, um voo imaginário, descrito pela menina como: “ele diz que é nessa hora que vai mais longe” (p. 18). O texto verbal permite inferências sobre esse momento ser aquele em que João se imagina sem a deficiência física. No entanto, há uma quebra de expectativa na página seguinte quando a “viagem” leva os irmãos para mundos imaginários, com fadas, duendes e animais que falam.

Poderíamos dizer que, embora essa magia permaneça no “sonho” do garoto com deficiência, há na representação dessa personagem uma retomada ao século XIX quando, segundo Dowker (2013), “seus dons criativos, associados à sua sensibilidade emocional, recebe um destaque mais acentuado do que suas deficiências” (p. 1060).

João, o irmão da narradora em Meu Irmão Não Anda, mas Sabe Voar!, não é apresentado de forma estereotipada. Ele é uma personagem ativa, aceite por sua irmã, em uma narrativa que não evidencia um conflito, mas se utiliza do subterfúgio da imagina ção criativa para aceitar suas limitações.

Considerações Finais

A proposta deste artigo foi problematizar a representação de personagens com deficiência física em obras de literatura infantil. Trouxemos para a discussão, além de um referencial teórico, os livros analisados e a legislação vigente a respeito da educação inclusiva, também denominada como especial.

De acordo com o censo demográfico de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2012), o Brasil possui 45.606.048 pessoas com algum tipo de deficiência, ou seja, 23,90% da população. Esses brasileiros estão saindo da invisibilidade a que foram condenados por muitos anos e, juntamente com familiares, professores, pesquisadores, escritores e outras pessoas comprometidas com a causa, estão lutando para que não apenas sejam vistos e reconhecidos como pessoas de direito, como também estão em luta contra estereótipos, estigmatizações e toda forma de preconceito.

Assim, a temática da educação inclusiva e dos direitos das pessoas com deficiência tem recebido destaque em pesquisas, legislações e na produção de livros para a infância no Brasil, tanto em obras literárias, quanto paradidáticas e outras. Principalmente a partir de 2008, com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, houve um aumento na produção bibliográfica a esse respeito, embora a questão já aparecesse em algumas obras voltadas ao público infantil em períodos anteriores. As seis obras aqui analisadas datam do período de 2006 a 2013 e apresentam, como discutido no item anterior, diferentes abordagens acerca da deficiência.

Não há dúvidas de que pressões sociais e políticas de inclusão interferem nas produções literárias e sua inserção também no contexto escolar. Recentemente, o Brasil se viu diante de uma polêmica envolvendo o ministro da educação, Milton Ribeiro, que afirmou nas mídias sociais que há crianças com “um grau de deficiência que é impossível a convivência” (Alves, 2021), atrapalhando o aprendizado dos outros alunos. Sua declaração foi alvo de muitas críticas de todos os seguimentos da sociedade, o que fez com que Milton Ribeiro voltasse atrás e pedisse desculpas à população. Tal fato, evidencia a falta de informação de muitos brasileiros a respeito de deficiência e inclusão. Esse seria mais um motivo para editoras produzirem livros infantis sobre a temática e juntamente com pais e professo res fazerem campanhas de informação e esclarecimentos, para que a literatura infantil com personagens com deficiência estejam nas salas de aula e sejam discutidas entre os gestores, alunos e professores.

Diante do exposto, é relevante analisar obras que não reforcem estereótipos, colocando as personagens em condições de subalternidade e/ou que inspirem piedade, nem remetam à deficiência como superação heroica, resignação e aceitação do destino ou vontade divina. Assim sendo, ao problematizar a representação de personagens com deficiência física em textos voltados para a criança leitora, esperamos ter colaborado para a ampliação de olhares acerca do que é estigmatizado como deficiência e os limites e possibilidades do ser humano em diferentes condições e potencialidades.

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Recebido: 16 de Junho de 2021; Aceito: 04 de Outubro de 2021

Renata Junqueira de Souza é livre-docente em metodologia e prática de ensino de língua portuguesa. É professora de língua portuguesa e literatura infantil no curso de pedagogia da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP), câmpus de Presidente Prudente. É docente do programa de pós-graduação em educação da UNESP e colaboradora do programa de pós-graduação em letras da Universidade Federal da Paraíba. Tem pós-doutorados na área de literatura e ensino, fundou na UNESP o Centro de Estudos em Leitura e Literatura Infantil e Juvenil Maria Betty Coelho Silva -, local onde coordena o grupo de pesquisa Formação de Professores e as Práticas Educativas em Leitura, Literatura e Avaliação do Texto Literário (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Tem investigações na área de educação e nos seguintes temas: leitura, formação de leitores, literatura infantil, literatu ra e formação de professores, estratégias de leitura. Email: renata.junqueira@unesp.br Morada: Faculdade de Ciência e Tecnologia - Centro de Estudos em Leitura e Literatura Infantil e Juvenil - Rua Roberto Simonsen, 305 - Centro Educacional Presidente Prudente - SP, 19060-900

Sílvia de Fátima Pilegi Rodrigues possui graduação em letras e em pedagogia, mestrado em educação pela Universidade Federal de Mato Grosso e doutorado em educação: história, política, sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Realizou seus estudos de pós-doutoramento na UNESP - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Câmpus de Presidente Prudente. É professora na Universidade Federal de Rondonópolis e trabalha nos cursos de pedagogia e mestrado em educação. Sílvia tem experiência na área de educação, com ênfase em ensino e aprendizagem, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores, práticas e estratégias de leitura, literatura infantil e alfabetização. Ela é membro dos grupos de pesquisa Alfabetização e Letramento Escolar e Formação de Professores e as Práticas Educativas em Leitura, Literatura e Avaliação do Texto Literário. Sílvia é filiada à Associação Brasileira de Alfabetização e à Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Email: silvia.pilegi@ufr.edu.br Morada: Universidade Federal de Rondonópolis - Programa de Pós-graduação em Educação Avenida dos Estudantes, 5055 - Cidade Universitária, Rondonópolis - MT, 78736-900

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