SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.15WORK-ASSOCIATED HEMATOPOIETIC CANCERGUIA TÉCNICO Nº 3 author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online

Print version ISSN 2183-8453

RPSO vol.15  Gondomar June 2023

https://doi.org/10.31252/rpso.11.03.2023 

Artigo de Revisão

CANCRO DA BEXIGA ASSOCIADO AO TRABALHO

WORK-ASSOCIATED BLADDER CANCER

M Santos1  , seleção do tema, pesquisa, seleção de artigos, redação, validação final
http://orcid.org/0000-0003-2516-7758

A Almeida2  , seleção de artigos, redação, validação final
http://orcid.org/0000-0002-5329-0625

C Lopes3  , seleção de artigos, redação, validação final

1Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online; Técnica Superiora de Segurança no Trabalho; Doutorada em Segurança e Saúde Ocupacionais e CEO da empresa Ajeogene Serviços Médicos Lda (que coordena os projetos Ajeogene Clínica Médica e Serviços Formativos e 100 Riscos no Trabalho). Endereços para correspondência: Rua da Varziela, 527, 4435-464 Rio Tinto. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com.

2Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária, com Competência Acrescida em Enfermagem do Trabalho. Doutorado em Enfermagem; Mestre em Enfermagem Avançada; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Professor Auxiliar Convidado na Universidade Católica Portuguesa, Instituto da Ciências da Saúde - Escola de Enfermagem (Porto) onde Coordena a Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@porto.ucp.pt.

3Licenciada em Enfermagem, desde 2010, pela Escola Superior de Saúde Vale do Ave. A exercer funções na área da Saúde Ocupacional desde 2011 como Enfermeira do trabalho autorizada pela Direção Geral de Saúde, tendo sido a responsável pela gestão do departamento de Saúde Ocupacional de uma empresa prestadora de serviços externos durante sete anos. Atualmente acumula funções como Enfermeira de Saúde Ocupacional e exerce como Enfermeira Generalista na SNS24. Encontra-se a frequentar o curso Técnico Superior de Segurança do Trabalho. 4715-028. Braga. E-mail: catarinafflopes@gmail.com


RESUMO

Introdução/enquadramento/objetivos:

O cancro da Bexiga é razoavelmente prevalente, sendo que, em alguns casos, poderá haver relação com as características do trabalho. Seria relevante que a generalidade dos profissionais tivesse alguns conhecimentos relativos ao que está publicado sobre este tema.

Metodologia:

Trata-se de uma Revisão Bibliográfica, iniciada através de uma pesquisa, realizada em janeiro de 2022, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP.

Conteúdo:

O Cancro da Bexiga é o mais frequente ou o segundo mais prevalente entre as neoplasias genito-urinárias e o segundo mais mortal nesse contexto. Considerando todas as patologias oncológicas, está estimado que é o 7º ou 9º mais prevalente. Em função da divisão por sexos, é duas a quatro vezes mais frequente no sexo masculino.

Ele surge da interação entre fatores genéticos e ambientais, nomeadamente ocupacionais.

Alguns investigadores defendem que, nos países desenvolvidos, a exposição ocupacional é a principal causa, seguida do tabagismo; contudo, a maioria dos estudos afirma o oposto.

Os agentes químicos mais relevantes são as aminas aromáticas, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos e os pesticidas; bem como produtos de combustão/emissões diesel e metais pesados.

Discussão e Conclusões:

Existem alguns fatores de risco com associação suspeita ou comprovada em relação à etiologia do Cancro da Bexiga. É importante a divulgação dos mesmos para que as equipas de saúde e segurança ocupacionais possam tomar medidas de proteção coletiva e individual para atenuar esse perigo. Seria também interessante que se realizasse mais investigação sobre o tema, acrescentando evidência ao que já está publicado e/ou dando a perspetiva do estado da arte em Portugal.

Palavras-chave: cancro da bexiga; saúde ocupacional; medicina do trabalho e segurança no trabalho

ABSTRACT

Introduction/framework/objectives:

Bladder cancer is reasonably prevalent, and in some cases it may be related to work characteristics. It would be relevant for most professionals to have some knowledge of what is published on this topic.

Methodology:

This is a bibliographic review, initiated through a search carried out in January 2022 in the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina and RCAAP”.

Content:

Bladder Cancer is the most frequent or the second most among genito-urinary neoplasms and the second most deadly in that context. Considering all oncological pathologies, it is estimated that it is the 7th or 9th most prevalent. By sex, it is two to four times more frequent in males.

It arises from the interaction between genetic and environmental factors, namely occupational.

Some researchers argue that, in developed countries, occupational exposure is the main cause, followed by smoking; however, most studies claim the opposite.

The most relevant chemical agents are aromatic amines, polycyclic aromatic hydrocarbons and pesticides; as well as combustion products/diesel emissions and heavy metals.

Discussion and Conclusions:

There are some risk factors with suspected or proven association with the etiology of Bladder Cancer. It is important to disclose these, so that occupational health and safety teams can take collective and individual protection measures to mitigate this. It would also be interesting for these companies to carry out more research on the subject, adding evidence to what has already been published or providing an overview of the state of the art in Portugal.

Keywords: bladder cancer; occupational health; occupational medicine and safety at work

INTRODUÇÃO

O cancro da Bexiga é razoavelmente prevalente, sendo que, em alguns casos, poderá haver relação com as características do trabalho. Seria relevante que a generalidade dos profissionais tivesse alguns conhecimentos relativos ao que está publicado sobre este tema.

METODOLOGIA

Em função da metodologia PICo, foram considerados:

  • -P (population): trabalhadores eventualmente expostos a fatores de risco com capacidade para desenvolver cancro da bexiga.

  • -I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre fatores de risco do trabalho que possam implicar maior probabilidade de desenvolver patologia oncológica vesical

  • -C (context): saúde ocupacional

Assim, a pergunta protocolar será: Quais as caraterísticas e/ou fatores de risco laboral que poderão implicar uma maior probabilidade de desenvolver cancro de bexiga?

Foi realizada uma pesquisa em janeiro de 2022, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.

No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados.

Quadro 1: Pesquisa efetuada 

Motor de busca Password 1 Password 2 e seguintes, caso existam Critérios Nº de documentos obtidos Nº da pesquisa Pesquisa efetuada ou não Nº do documento na pesquisa Codificação inicial Codificação final
RCAAP Cancro da Bexiga -título e/ ou assunto
34 1 sim
EBSCO (CINALH, Medline, Database of Abstracts and Reviews, Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Nursing & Allied Health Collection e MedicLatina)
Bladder cancer -2012 a 2022
-acesso a resumo
-acesso a texto completo
6758 2 não
occupational 132 3 sim 2
3
4
6
7
8
9
10
11
12
13
15
16
17
19
20
21
22
23
27
28
29
36
46
57
78
82
86
92
93
95
96
97
100
102
103
105
107
108
116
CB1
CB2
CB3
CB4
CB5
CB6
CB7
CB8
CB9
CB10
CB11
CB12
CB13
CB14
CB15
CB16
CB17
CB18
CB19
CB20
CB21
CB22
CB23
CB24
CB25
CB26
CB27
CB28
CB29
CB30
CB31
CB32
CB33
CB34
CB35
CB36
CB37
CB38
CB39
CB40
2
-
-
-
12
8
13
22
6
3
4
15
9
30
14
19
20
1
16
31
5
18
7
23
11
24
25
32
-
33
27
28
10
26
21
29
-
-
-
-

CONTEÚDO

Incidência/ Prevalência

O Cancro da Bexiga (CB) é o mais frequente (1) (2) (3) (4) ou o segundo mais prevalente entre as neoplasias génito-urinárias e o segundo mais mortal nesse contexto (5).

Considerando todas as patologias oncológicas, está estimado que é o 7º (6) ou 9º mais prevalente (1) e, na maioria dos casos, o diagnóstico ocorre na sexta e sétima décadas de vida (4).

Em função da divisão por sexos, é duas (4) a quatro vezes mais frequente no sexo masculino (5) (7) (8). Estima-se que seja dos mais frequentes nos homens (8) (9) (10) e o 9º mais mortal para este sexo (8), embora também seja elevada a prevalência no sexo feminino (7) (8) (9) (10).

Analisando a questão étnica, 80% dos casos ocorrem em caucasianos (9), dos quais 92 a 99% são uroteliais e na parede vesical, respetivamente (1).

Dando exemplos específicos por países, no Irão, o CB é o terceiro mais prevalente no sexo masculino (11), enquanto em Itália atinge 11% dos casos oncológicos da população masculina e 3% da população feminina, ou seja, 45,4 e 8,2 casos por 100.000, respetivamente (1). Nos EUA, é o sexto mais frequente globalmente (81.400 casos em 2020) (12) e no Reino Unido, ainda que a prevalência se tenha alterado, é o sexto cancro mais mortal (7). Em Espanha, a incidência aumentou desde 1950, por vezes na ordem dos 50% (2).

Analisando apenas os países desenvolvidos, é o quarto mais comum (2), sendo o quarto e décimo segundo cancro mais frequente nos sexos masculino e feminino, respetivamente (13); é consensual que as zonas industrializadas parecem ter valores superiores (14).

A nível mundial as estatísticas afirmam que se trata do nono cancro mais prevalente (16) e o oitavo cancro mais mortífero, correspondendo a 3% da patologia oncológica total (3), cuja incidência anual variou, nos últimos anos, entre os 73.510 (5) e os 400.000 (17) casos, cifrando-se a mortalidade anual entre os 14.880 (5) e os 150.000 mortos (17).

Sintetizando, o CB parece ser mais prevalente no sexo masculino (4:1), na etnia caucasiana e, como na maioria das doenças oncológicas, idade mais avançada, bem como tabagistas (50% nos homens e 30% das mulheres) (5).

Fatores de Risco

O CB surge da interação entre fatores genéticos e ambientais (15), nomeadamente ocupacionais (12). O sexo masculino está mais exposto por questões profissionais (e considera-se que cerca de 7,1% dos casos têm origem ocupacional) e devido ao consumo de tabaco (8).

A etiologia mais frequente é então o tabagismo (1) (2) (4) (6) (7) (8) (9) (10) (11) (14) (18) (19) (justifica mais de metade dos casos) (2) (20), aumentando o risco (2) uma a duas vezes (12), sobretudo se ativo (8). Alguns autores acreditam que este justifica cerca de 66% dos casos em homens e 30% das mulheres (16), nos países desenvolvidos (8) (16), com um Odds Racio (OR) de 3,14 (8). No tabaco, os principais agentes implicados são as aminas aromáticas (como a benzidina) (11)- aumentado o risco nomeadamente duas a quatro vezes mais (9), 4-aminobifenil, beta-naftilamona e 4-cloro-o-toluidina (11). A cessação tabágica poderá diminuir o risco de recorrência (4), mas nem todos os investigadores concordam (20).

Alguns também mencionam o café (2) (8) (pouco consensual); para além disso, o consumo deste está razoavelmente associado ao do tabaco, pelo que a associação poderá estar enviesada (2).

Outros autores também realçam algum papel para uma alimentação com poucos vegetais (1) (8), infeções do trato urinário (1)- por exemplo por shistosomíase (12) (18) (20)- mais relevante em África (4) (8) e Médio Oriente (4), radiações ionizantes, alguns produtos desinfetantes inseridos na água (1) (9), idade mais avançada (2) (12), sexo masculino e a exposição ao arsénio (por exemplo, também na água ingerida), retenção urinária crónica (12), álcool (8) (não consensual), pouco aporte de vitamina E, água potável de pouca qualidade no global e alguns procedimentos médicos.

Outro artigo publicou que o risco também pode ser modulado pela utilização de suplementos antioxidantes (1,52), obesidade (1,1), exercício intenso (0,86), níveis elevados de selénio (0,61) e vitamina D (0,75); bem como ingestão de carne processada (1,22), vitamina A (0,82), vitamina E (0,02), ácido fólico (0,84) e fruta (0,77) (8).

A carne processada pode conter nitratos (usados para preservar melhor a cor e o sabor/aroma); estes podem combinar-se com aminas, formando nitrosaminas, que são cancerígenas para a bexiga. A carne cozinhada a temperaturas muito elevadas (por exemplo, em churrasco) também pode produzir aminas aromáticas. Alguns investigadores também mencionam o álcool, mas sem consenso (8) e/ou o consumo de AINEs. Para além disso, os antidiabéticos (como as tiazolinedionas) também podem estar associadas, mas também sem consenso robusto (4).

O folato pode proteger devido à sua modulação na síntese e reparação do DNA. A ingestão abundante de água dilui todas as substâncias presentes na bexiga, incluindo os carcinogéneos. Contudo, se a água contiver arsénio ou cloro, o risco aumenta (8).

A atividade física moderada tem um efeito protetor modesto, por mecanismo não conhecido na totalidade (8).

O Egito, por exemplo, apresenta prevalência muito elevada de CB, sobretudo no sexo masculino, devido à frequência aumentada de tabagistas e da infeção por shistossoma na população geral; aqui o quociente homem/mulher é de 4:1 (6).

Etiologia Ocupacional

Alguns investigadores defendem que, nos países desenvolvidos, a exposição ocupacional é a principal causa de CB, seguida do tabagismo (13); contudo, a maioria dos estudos afirma o oposto (8). 1 a 8% (1) ou até 10% dos casos no global (1) (9) e/ou 21 a 27% e 11% dos CB em homens e mulheres têm origem profissional, respetivamente (3). Contudo, o resultado dependerá da interação do tabagismo e exposição ocupacional (21) (22), bem como da via de contato e agente químico específico (21). Postos de trabalho onde se impeça ou dificulte o acesso à casa de banho, por exemplo, também potenciam o risco (8). Outros mencionam que a segunda etiologia mais relevante é justamente a ocupacional (4) (10) (14) (20), oscilando entre os 5 a 7% (7) até 20% dos casos (11).

O risco é superior nos seguintes setores profissionais:

  • ➢ produção de tintas (5) (9) (11) (16) (29)

  • ➢ cabelagem (5) (11)

  • ➢ têxtil (5) (11) (16) (20)

  • ➢ couro (5) (11)

  • ➢ alumínio (5) (9) (16) (20) (23)/ metalurgia (3) (9) (11) (20) (6 vezes mais) (11)

  • ➢ petroquímica, produção de alcatrão (5) e gás (11)

  • ➢ borracha (5) (11) (15) (18)

  • ➢ agricultura (3) (8) (11), jardinagem (8), trabalho florestal (8) (11)

  • ➢ pesca (11)

  • ➢ construção civil (3) (11) (18) (até 4 vezes mais) (11)

  • ➢ cozinha (5)

  • ➢ eletricistas (5)

  • ➢ cabeleireiros/barbeiros (3) (5) (9) (11) (16)

  • ➢ mineiros (5)

  • ➢ motoristas/transporte de mercadorias (5) (devido ao diesel) (11) (20)- até 6 vezes mais (11)

  • ➢ mecânicos (5)

  • ➢ forneiros (5)

  • ➢ limpeza a seco (5) (16)

  • ➢ limpeza de chaminés (5) (8)

  • ➢ produção de tabaco (8)

  • ➢ produtores de aminas aromáticas (11) (20)

  • ➢ indústria farmacêutica (nomeadamente com destaque para a clornafazina, ciclofosfamida), sobretudo nas formas mais artesanais (9)

  • ➢ indústria automóvel, devido à auramina, anilina, aminas aromáticas, magenta, toluidina, poliuretanos e óleos minerais ou de refrigeração (9).

Assim, os agentes químicos mais relevantes são as aminas aromáticas (8) (13) (21) (24), hidrocarbonetos aromáticos policíclicos-HAPs (2) (8) (10) (11) (24)- por vezes com período de latência que pode ser de trinta anos (10) (sendo que estes podem justificar cerca de 5 a 25% dos casos no mundo ocidental) (24). E ainda os pesticidas (2) (18); bem como produtos de combustão/emissões diesel (8) (9) e metais pesados (8), como o arsénio inorgânico (14).

Locais de trabalho com radiações ionizantes também aumentam o risco (9).

A exposição a arilaminas, como a benzidina e a beta-naftilamona (12) (17), aumenta o risco oncológico até cerca de cem vezes, tornando estas substâncias os cancerígenos humanos globais mais potentes; contudo, os danos concretos dependem de alguns polimorfismos genéticos; por este motivo estas substâncias foram proibidas nos EUA, na década de 70. Elas existem/existiram na produção de tintas para papel, indústria têxtil e do couro (12). Algumas delas formam adutos com o DNA, levando a mutações e à produção de espécies reativas de oxigénio, alterando a capacidade de reparação, apoptose e ciclo celular (12) (21). Dentro das aminas aromáticas destacam-se ainda a beta-naftil-amina (3), 4-aminofenil (3) (17) e 4-cloro-orto-toluidina (3) (13) (17), existentes nos setores químicos, pintura, plástico, pecuária, borracha, tintas e produção de fungicidas; a exposição mais importante a nível ocupacional é aos produtos de combustão de veículos motorizados (3). As exposições a toluidina a anilina aumentam 6,5 vezes o risco de CB, de forma dose-dependente; aliás estima-se um aumento de 27 vezes com mais de dez anos de trabalho. A indústria da borracha pode implicar exposição a toluidina, anilina e nitrobenzeno (25). Alguns derivados da toluidina são usados na produção de tintas, conhecidos carcinogénios a nível da bexiga (26). Para além disso, algumas aminas estão presentes no tabaco e várias estão oficialmente reconhecidas como cancerígenas, nomeadamente a nível da bexiga também (17).

Os HAPs associam-se a CB; eles existem na indústria do alumínio, fundições e nos pavimentadores de ruas (27), por exemplo.

Outros agentes considerados relevantes são os pesticidas, com toxicidade superior nos tabagistas, até porque parte dos seus metabolitos é excretada por via urinária, neste contexto podem destacar-se o benzaton, bromoxinil, diclorofopmetil, cloraben e o DDT (13); alguns pesticidas também contêm arsénico, conhecido carcinogénio para a bexiga (24). O aumento da incidência desta patologia pode estar associado a um aumento da utilização destes produtos, pelos menos até serem proibidos (2). A exposição domiciliária a estes agentes, através do cônjuge que trabalhe na agricultura também poderá ocorrer, potenciando o risco de CB, sobretudo em sociedades em que a esposa assume as tarefas de cuidar das roupas (6). Para além disso, os agricultores também estão expostos a aminas aromáticas e a HAPs, que também aumentam o risco de CB. O risco associado aos pesticidas é dose-dependente, mesmo após ajustar variáveis como tabagismo e a infeção por shistossoma (18).

Alguns agentes presentes nas atividades dos bombeiros aumentam o risco, ainda que, ao longo dos anos, com a evolução das medidas de proteção, se tenha atenuado a exposição (28).

Os asbestos (12) associam-se ao CB e existem na construção civil e naval, bem como indústria do vidro (29), por exemplo. A sílica e os asbestos, por exemplo, têm de se depositar na bexiga, por disseminação após contato pulmonar (12), para poderem causar o problema.

O dinitrotolueno aumenta o risco de CB. Ele é usado, por exemplo, na mineração do cobre, produção de tintas e solventes, indústria de explosivos e produtos de impermeabilização (30). Contudo, o risco também varia com a existência ou não de EPIs e o seu uso correto (11).

O risco em indivíduos que trabalham a nível forense com armas de fogo e explosões parece ser superior ao dos colegas da mesma instituição que não têm essas tarefas, devido à exposição a aminas aromáticas e HAPs (combustão incompleta), sobretudo na fase da limpeza, ainda que o risco seja modulado pelas medidas de proteção adotadas (31), tal como em qualquer outro setor profissional.

Trabalhadores da indústria da borracha parecem ter uma incidência de CB mais elevada. A IARC (Internacional Agency for Research on Cancer) classificou este setor como sendo carcinogénio para humanos (grupo 1), com destaque para a 2-naftilamina, acrilonitrilo, 1,3-butadieno e o estireno (a nível de aminas aromáticas) (10).

Os funcionários que limpam chaminés apresentam maior incidência, sobretudo nas condições que estes trabalhavam no passado. A justificação incide no contato com HAPs, metais (arsénio, crómio, cádmio, níquel e chumbo), gases secundários à combustão (dióxido de enxofre e monóxido de carbono) e asbestos. A incidência parece aumentar proporcionalmente ao tempo de trabalho e naqueles que trabalham antes de 1951 (32).

IARC

Nesta instituição é usada a seguinte escala básica para classificar o risco oncológico:

  • grupo 1- carcinogénico para humanos

  • grupo 2- provavelmente carcinogénico para humanos

  • grupo 2b- possivelmente carcinogénico para humanos

  • grupo 3- não se sabe (19).

A indústria da borracha, por exemplo, está classificada como sendo do grupo 1, com destaque para o CB (por estudos da década de cinquenta), sobretudo para funcionários que começaram a trabalhar antes da década de sessenta (33).

A IARC classificou várias profissões como sendo globalmente carcinogénicas; no grupo 1 incluiu a pintura, indústria da borracha, produção de alumínio e de tintas; como provavelmente cancerígena para humanos (grupo 2b) inseriu a limpeza a seco, impressão e indústria têxtil. Outros investigadores destacaram concretamente as aminas aromáticas e os HAPs, neste contexto (1).

A maioria dos pesticidas organofosforados são classificados pela IARC como inseridos no grupo 2b, ou seja, possivelmente carcinogénicos para humanos (2).

Ela publicou uma lista de quinze agentes considerados cancerígenos para a bexiga (apenas os cancros do pulmão e do sangue apresentam valores superiores). Talvez se justifique pelo facto de que, com excreção urinária, alguns agentes contatam mais tempo com as células vesicais, versus outras estruturas do organismo (9).

Genética

Alguns genótipos podem modular a suscetibilidade do indivíduo desenvolver ou não CB, mediante a exposição a alguns agentes químicos (5).

A exposição a pesticidas implica um maior risco de CB, sobretudo para alguns tipos histológicos, ainda que com modulação por alguns polimorfismos genéticos, que interagem com a proteção para o stress oxidativo e, assim, poderão influenciar o surgimento ou não da patologia oncológica (18).

Várias substâncias cancerígenas para a bexiga são metabolizadas pela GST (glutationa s- transferase), muito relevante na defesa antioxidante, nomeadamente os HAPs, aminas aromáticas e hidrocarbonetos halogenados. Logo, alguns polimorfismos a este nível podem também modular a suscetibilidade ao CB (2) (5).

DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO

Existem alguns fatores de risco com associação suspeita ou comprovada em relação à etiologia do Cancro da Bexiga. É fundamental que os profissionais do setor adquiram conhecimentos mínimos relativos ao que a bibliografia descreve, de forma a ser possível implementar medidas de proteção coletiva e individual que consigam atenuar o risco. Seria também interessante que algumas equipas a exercer em empregadores com um grande número de funcionários expostos a estas condições de trabalho, conseguissem investigar o tema, lançando para a bibliografia dados inovadores e/ou mais completos dos que o que estão presentemente publicados, incluindo dar uma a perspetiva da situação em Portugal.

AGRADECIMENTOS

Nada a declarar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 CB18. Cavallo D, Casadio V, Bravacani S, Iavicoli S, Pina E, Romano C et al. Assessment of DNA damage and telomerase activity in exfoliated urinary cells as sensitive and noninvasive biomarkers for early diagnossis of Bladder Cancer in ex-workers of a rubber tyres industry. BioMed Research International. 2014; 370907: 1-8. DOI: 10.1155/2014/370907 [ Links ]

2 CB1. Sciannamco V, Carta A, Errico A, Girardo M, Fasarelli F, Ariei C et al. New insights on occupational exposure and bladder cancer risk: a pooled analysis of two italian case-control studies. International Archives of Occupational and Environmental Health. 2019; 92: 347-359. DOI: 10.1007/s00420-018-1388-2 [ Links ]

3 CB10. Boada L, Henríquez-Hernandéz L, Zumbado M, Almeida-Gonzálçez M, Alvarez León E, Navarro P et al. Organochlorine pesticides exposure and bladder cancer: evaluation from a gene environment perspective in a hospital-based case-control studt in the Canary Islands (Spain). Journal of Agromedicine. 2016; 21(1): 34-42. DOI: 10.1080/105992x.2015.1106374 [ Links ]

4 CB11. Farzaneh F, Mehrparvar A, Lofti M. Occupations and the risk of Bladder Cancer in Yazd provinve: a case-control study. International Journal of Occupational and Environmental Medicine. 2017; 8(4): 191-198. DOI: 10.15171/ijoem.2017.1085 [ Links ]

5 CB21. Miyazaki J, Nishiyama H. Epidemiology of urothelial carcinoma. The Japanese Urological Association. 2017: 730-734. [ Links ]

6 CB9.Matic M, Corie V, Savic-Radojevic A, Bulat P, Pljesa-Ercegovac M, Dragicevic D et al. Does occupational exposure to solvents and pesticides in association with the glutathione s-transferase A1, M1, P1 and T1 polymorphims increase the risk of bladder cancer? The Belgrade case-control study. PLOS ONE. 2014; 9(6), e99448: 1-8. DOI: 10.1371/jornal.pone.0099448 [ Links ]

7 CB23. Jackson S, George D, Loffredo C, Amrs S. Nonoccupational exposure to agricultural work and risk of urinary bladder cancer among Egyption women. Archives of Environmental & Occupational Health. 2017; 72(3): 166-172. DOI: 10.1080/1933244.2016.1169155 [ Links ]

8 CB6. Cumberbatch M, Windsor-Shellard B, Carro J. The comtemporary landscape of occupational bladder cancer within the United Kingdom: a meta-analysis of risks over the last 80 years. BJU International. 2017; 119: 100-109. DOI: 10.1111/bju13561 [ Links ]

9 CB13. Al-Zalabani A, Stewart K, Wesslius A, Schols A, Zeegers M. Modifiable risk facts for the prevention of Bladder Cancer: a systematic review of meta-analyses. European Journal of Epidemiology. 2016; 31: 811-851. DOI: 10.1007/s10654-016-0138-6 [ Links ]

10 CB33. Otelea M, Jinga V, Rascu A, Plesea I, Petrescu A, Mitrache L et al. Occupational exposure to urinary bladder cancinogens- risks factors, molecular mechanisms and biomarkers. Romarian Journal of Morphology and Embryology. 2018; 59(4): 1021-1032 [ Links ]

11 CB25. Khoubi J, Pourabdian S, Mohebbi I, Tajvidi M, Zaroorian O, Giahi O. Association between the high risk occupations and Bladder Cancer in Iran: a case-control study. International Journal of Occupational Medicine and Environmental Health. 2013: 26(2): 205-213. DOI: 10.2478/s13382-013-0103-5 [ Links ]

12 CB5. Kolli R, Xu Z, Panduri U, Taylor J. Different gene expression in bladder tumors from workers occupationally exposed to arylamines. BioMed Research International. 2021; 2624433: 1-7. DOI: 10.1155/2021/262 [ Links ]

13 CB7. Koutros S, Silverman D, Alavanja M, Andreotti G, Lerro C, Heltshe S et al. Occupational exposure to pesticides and bladder cancer risk. International Journal of Epidemiology. 2016: 792-805. DOI: 10.1093/ije/dyv195 [ Links ]

14 CB15. Jacquez G, Shi C, Meliker J. Local Bladder Cancer clusters in Southeastern Michigan Accounting for risks facts, covariates and residential mobility. PLOS ONE. 2015; 10(4), e0124516: 1-16. DOI: 10. 1371/jornal.pone.01224516 [ Links ]

15 CB12. Vlaanderen J, Strail K, Ruder A, Blair A, Hansen J, Lynge E et al. Tetrachloroethyleno exposure and Bladder Cancer risk: a meta-analysis of dry-cleaning-worker studies. Environmental Health Perspectives. 2014; 122: 661-66. DOI: 10.1289.ehp.1307055 [ Links ]

16 CB19. Pesh B, Taeger D, Johnen G, Gawrych K, Bonberg N, Schwentner C et al. Screening for Bladder Cancer with urinary tumor markers in chemical workers with exposure to aromatic amines. International Archives of Occupational Environmental Health. 2014; 97: 715-724. [ Links ]

17 CB9. Matic M, Corie V, Savic-Radojevic A, Bulat P, Pljesa-Ercegovac M, Dragicevic D et al. Does occupational exposure to solventes and pesticides in association with the glutathione s-transferase A1, M1, P1 and T1 polymorphims increase the risk of bladder cancer? The Belgrade case-control study. PLOS ONE. 2014; 9(6), e99448: 1-8. DOI: 10.1371/jornal.pone.0099448 [ Links ]

18 CB22. Wilcox A, Silverman D, Friesen M, Locke S, Russ D, Hyun N et al. Smoking status, usual adult occupation and risk of recurrent urothelial baldder carcinoma: data from the Cancer Genome Atlas (TCGA) project. Cancer Causes Control. 2016; 27: 1429-1435. DOI: 10.1007/s10552-016-0821-7 [ Links ]

19 CB16. Porru S, Pavanello S, Carta A, Arici C, Simeone C, Izzotti A et al. Complex relationships between occupation, environment, DNA adducts, genetic polymorphisms and bladder cancer in a case-control study using a stuctural equation modeling. PLOS ONE. 2014; 9(4), e94566: 1-8. DOI: 10.1371/jornal.pone.0094566 [ Links ]

20 CB17. Amr S, Dawson R, Saleh D, Magder L, Mikhail N, George D et al. Agricultural workers and urinary Bladder Cancer risk in Egypt. Archives od Environmental & Occupational Health. 2014; 69(1): 3-10. [ Links ]

21 CB35. Maltseva, Serra C, Kogenivas M. Cancer risk among workers of a secondary aluminnnium smelter. Occupational Medicine. 2016; 66: 412-414. DOI: 10.1093/occmed/Kqw054 [ Links ]

22 CB8. Boulanger M, Tual S, Lemarchand C, Guizard A, Velten M, Marcotullio et al. Agricultural exposure and risk of bladder cancer in the agriculture exposure and cancer cohort. International Archives of Occupational and Environmental Health. 2017; 90: 169-178. DOI: 10.1007/s00420-016-1182 [ Links ]

23 CB24. Amr S, Dawson R, Saleh D, Magder L, George D, El-Daly M et al. Pesticides, Gene Polymorphisms and Bladder Cancer among Egiptian Agricultural workers. Archives of Environmental & Occupational Health. 2015; 70: 19-26. DOI:10.1080/19338244.2013.853646 [ Links ]

24 CB26. Hanley K, Viet S, Hein M, Carreón J, Ruder A. Exposure to o-toluidine, aniline and nitrobenzene in a rubber chemical assessment update. Journal of Occupational and Environmental Hygiene. 2012; 9: 478-490. DOI:10.1080/15459624.2012.693836 [ Links ]

25 CB27. Okuno T, Gi M, Fujioka M, Yukimatu N, Kakehashi A, Takeuchi A et al. Acetoaceto-o-toluidine enhances cellular proliferative activity in the urinary bladder of rats. Toxicological Sciences. 2019; 169(2): 456-464. DOI: 10.1093/toxsci/Kfz051 [ Links ]

26 CB34. Rota M, Bosetti C, Boccia S, Boffeta P, Vecchia C. Occupational exposures to polyciclic aromatic hydrocarbons and respiratory and urinary tract cancers: an updated systematic review and a meta-analysis to 2014. Archives of Toxicology. 2014; 88: 1479-1490. DOI: 10.1007/s00204-014-12965 [ Links ]

27 CB31. Casjens S, Bruning T, Taeger D. Cancer risks of firefighters: a systematic review and meta-analysis of secular trends and region specific differences. International Archives of Occupational and Environmental Health. 2020; 93: 839-852. DOI: 10.1007/s00420-020-01539-0 [ Links ]

28 CB32. Magnani C, Silvestri S, Angelini A, Ranucci A, Azzolina D, Cena T et al. Italian pool of asbestos workers cohorts: asbestos related mortality by industrial sector and cumulative exposure. Annali del Istituto Superiore di Sanitá. 2020; 56(3): 292-302. DOI: 10.4415/ANN.20.03.07 [ Links ]

29 CB36. Seidler A, Bruning T, Taeger D, Mohner M, Gawrych K, Bergman A et al. Cancer incidence among workers occupationally exposed to dinitrotoluene in the cooper mining industry. International Archives of Occupational and Enviromental Health. 2014; 87: 117124. DOI: 10. 1007/s00420-012-0842-9 [ Links ]

30 CB14. Davis S, Tao X, Bernacki E, Alfriend A, Dolowery M. Evaluation of a Bladder Cancer cluster in a population of criminal investigators with the bureau of Alcohol, Tobacco, Firearms ans Explosives- part 2: the association of cancer risks and fire scene investigations. Journal of Environmental and Public Health. 2013; 986023: 1-10. DOI: 10.1155/2013/986023 [ Links ]

31 CB20. Hogstedt C, Jansson C, Hugosson M, Tinnerberg H, Gustausson P. Cancer Incidence in a cohort of swedish chimney sweeps, 1958-2006. American Journal of Public Health. 2013; 103(9): 1708-1714. DOI: 10.2105/AJPH.2012.300860 [ Links ]

32 CB28. Fukai K, Kojimohara N, Hoshi K, Toyota A, Tatemichi M. Combined effects of occupational exposure to hazardous operations and life-style- related factors on cancer incidence. Cancer Science. 2020; 111: 4581-4593. DOI: 10.1111/cas.14663 [ Links ]

33 CB30. Boniol M, Koechlin A, Bloyle P. Meta-analysis and risk of cancer. International Journal of Epidemiology. 2017: 1940-1947. DOI: 10.1093/ije/dyx146 [ Links ]

Recebido: 04 de Março de 2023; Aceito: 07 de Março de 2023; Publicado: 11 de Março de 2023

CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS

Nada a declarar.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons