SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 issue21Trihalomethanes presence in the water: potencial risksFucoxanthin: a solution to obesity? author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Acta Portuguesa de Nutrição

On-line version ISSN 2183-5985

Acta Port Nutr  no.21 Porto Apr. 2020

https://doi.org/10.21011/apn.2020.2108 

ARTIGO DE REVISÃO

Microbiota intestinal e obesidade infantil – uma revisão narrativa

Intestinal Microbiota and Chid obesity - A review

Daniela Carvalho1*; Ana Faria1; Helena Loureiro1

1Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra do Instituto Politécnico de Coimbra, Rua 5 de Outubro - SM Bispo, Apartado 7006, 3046-854 Coimbra, Portugal

Endereço para correspondência

 

RESUMO

INTRODUÇÃO: A composição da microbiota intestinal tem sido cada vez mais apontada como um fator preponderante para a obesidade, nomeadamente a obesidade infantil, uma vez que a infância é um período crítico para o desenvolvimento das bactérias colonizadoras do intestino.

OBJETIVOS: O objetivo deste trabalho é realizar uma revisão narrativa, de forma a verificar as diferenças na composição da microbiota intestinal das crianças e adolescentes com excesso de peso/obesidade comparativamente às normoponderais, através da análise de artigos científicos, de intervenção e de observação, com foco no papel da microbiota intestinal na idade pediátrica.

METODOLOGIA: Foi efetuada uma recolha e análise de artigos, sendo que foram selecionados 14 artigos para comporem esta revisão.

RESULTADOS: O aumento do rácio firmicutes/bacteroidetes está associado ao aumento do peso/índice de massa corporal infantil. Verifica-se também que tanto a diversidade como a quantidade total de bactérias no intestino, variam de acordo com o peso corporal e que fatores como a dieta, suplementação em probióticos e antibióticos podem ter um papel preponderante na formação da microbiota intestinal infantil.

CONCLUSÕES: A informação analisada sugere que existe uma associação entre a composição da microbiota intestinal e o peso corporal. Contudo, ainda são poucos os estudos existentes para poder reconhecer de forma clara e precisa o papel da microbiota intestinal na etiologia da obesidade infantil.

 

Palavras-chave

Microbiota intestinal, Obesidade infantil

 


 

Abstract

INTRODUCTION: The composition of the intestinal microbiota has been increasingly pointed as a major factor for obesity, particularly in childhood obesity since childhood is a critical period for the development of colonizing bacteria in the gut.

OBJECTIVES: The aim of this study is to carry out a narrative review, in order to verify differences in the composition of the intestinal microbiota of children and adolescents with overweight/obesity compared to normal weight, through the analysis of scientific articles, interventions and observations, focusing on the role of intestinal microbiota in pediatric age.

METHODOLOGY: A selection and analysis of articles was performed, and 14 articles were selected to compose this review.

RESULTS: The group of bacteria most associated with weight gain / body mass index in children are bacteroidetes and firmicutes. It is also found that diversification and bacterial quantification of the intestinal microbiota vary according to body weight, and that factors such as diet, probiotic supplementation and antibiotics may have a major role in the formation of childhood intestinal microbiota.

CONCLUSIONS: The analyzed information suggests that there is an association between intestinal microbiota composition and body weight. However, there are still few studies to be able to clearly and precisely recognize the role of intestinal microbiota in the etiology of childhood obesity.

 

Keywords

Intestinal Microbiota, Childhood obesity

 


 

INTRODUÇÃO

A obesidade é atualmente considerada uma das maiores problemáticas da saúde pública, estando associada ao aparecimento de múltiplas patologias (1). Um fator bastante preocupante é o aumento da obesidade infantil, fator de risco para obesidade em idade adulta e, que tem aumentado nas últimas décadas (1).

Mais recentemente, algumas investigações clínicas têm apontado para diferenças significativas que ocorrem na composição da microbiota intestinal em crianças obesas e não obesas. A microbiota intestinal é o conjunto de microrganismos que habitam o trato gastrointestinal e que influenciam o balanço energético, produzindo ácidos gordos de cadeia curta (AGCC) a partir da digestão de polissacarídeos (1, 2). A composição dessa comunidade microbiana depende do hospedeiro, mas também pode ser modificada por fatores exógenos e endógenos. No que diz respeito ao hospedeiro, essas bactérias são simbióticas e desempenham um papel importante nos processos fisiológicos (ex.: digestão), ou podem intervir no metabolismo (podem aumentar a produção de energia a partir da dieta). Todos esses processos estão envolvidos na obesidade e distúrbios metabólicos (1).

A infância é um período crítico no desenvolvimento das bactérias colonizadoras do intestino, com um aumento gradual da colonização de Bacteroidetes a partir do momento do nascimento (3). A composição da microbiota intestinal é definida nesta altura e evolui até aos 3 anos de idade, permanecendo constante durante a vida, sendo que alguns fatores podem alterá-la temporariamente, como os antibióticos e a alimentação (2).

A maioria das bactérias presentes no intestino pertence a um dos seguintes filos: Bacteroidetes, Firmicutes, Actinobacteria, Proteobacteria e Verrucomicrobia. Os principais filos são os Firmicutes e os Bacteroidetes aos quais pertencem 90% das bactérias do intestino.

A composição da diversidade bacteriana aparenta mudar entre eutotróficos e obesos (1). Desta forma, o objetivo deste trabalho é realizar uma revisão acerca da associação entre a microbiota intestinal e o peso corporal.

 

METODOLOGIA

Foi realizada uma revisão da literatura através da base de dados Pubmed. O limite temporal para a pesquisa dos artigos científicos foi de 10 anos (artigos publicados desde abril de 2009 até abril 2019).

Tendo em conta o objetivo desta revisão, de forma a aumentar a eficiência da pesquisa e obter todos os sinónimos reunidos num só descritor, a pesquisa foi realizada recorrendo ao MeSH. Desta forma as palavras-chaves usadas foram: “Gastrointestinal Microbiome” e “Pediatric Obesity”, recorrendo ao operador booleano AND. No entanto, tendo em conta que artigos mais recentes que dão entrada na Pubmed podem ainda não ter termos MeSH atribuídos, foi realizada pesquisa (com limite temporal “último mês”) com as seguintes palavras chaves: “gut microbiota”, “gastrointestinal microbiota”, “intestinal microbiota”, “gut microbiome”, “gastrointestinal microbiome”, “intestinal microbiome”, “child obesity”, “infant obesity”, “adolescente obesity” e, para facilitar a pesquisa foram usados operadores lógicos booleanos como a truncatura (*) e o AND.

 

RESULTADOS

No total foram encontrados 38 artigos, sem duplicados, dos quais foram excluídos 24 por serem artigos de revisão e/ou artigos cujo objetivo não era a relação entre a microbiota intestinal e a obesidade infantil. Em suma, no final da pesquisa foram selecionados 14 artigos para compor esta revisão. A Tabela 1, apresenta uma síntese dos estudos incluído nesta revisão.

Dos 14 estudos, 3 foram de intervenção e os restantes de observação. Verifica-se que tanto a diversidade como a quantidade total de bactérias no intestino variam de acordo com o peso corporal e que fatores como a dieta, suplementação (probióticos) e antibióticos podem ter um papel na formação da microbiota intestinal infantil.

 

ANÁLISE CRÍTICA

A necessidade de clarificação do papel da microbiota intestinal no ganho de peso, nomeadamente desde a infância, tem motivado a realização de diferentes estudos nos últimos anos.

Nesta revisão, verificou-se que o grupo de bactérias mais associado ao aumento do peso/IMC infantil são os bacteroidetes (4–7) e os firmicutes (5, 7–9).

A presença de Lactobacillus foi associada a um maior IMC (5, 7, 10), exceto em um estudo (4), enquanto que a de Staphylococcus foi relacionado a um menor IMC (5). Quanto às Bifidobacterias, microorganismos reconhecidos pelo seu papel benéfico na microbiota intestinal, nos estudos que quantificaram este grupo, verificou-se um baixo nível nas crianças com excesso de peso/obesidade (11) (no entanto, num estudo (4) no processo de perda de peso houve uma diminuição deste grupo) e um aumento no estudo de Hou et al (12), no processo de perda de peso.

Alguns fatores de risco considerados para ganho de peso têm sido considerados. A suplementação com probióticos (10) demonstrou uma associação positiva entre o número de Bifidobactérias e peso corporal. Outro fator de risco considerado foi a toma de antibióticos que, segundo o estudo de Bai et al (10) diminui a diversidade bacteriana da microbiota intestinal.

Embora esta revisão forneça informações úteis sobre a microbiota intestinal e a obesidade na população pediátrica, como, por exemplo, verificar-se que a composição da microbiota intestinal difere de acordo com o peso corporal (crianças normoponderais versus crianças com excesso de peso/obesidade), são ainda poucos os estudos existentes nesta temática com uma amostra significativa para poder reconhecer de forma clara e precisa o papel da microbiota intestinal na etiologia da obesidade infantil.

 

CONCLUSÕES

Parece existir uma associação entre a composição da microbiota intestinal e o peso corporal e, que os filos bacterianos mais estudados e com maior evidência de associação com o excesso de peso/obesidade são os Firmicutes e os Bacteroidetes.

No entanto, dado o limitado número de publicações que avaliam esses filos completos e com amostras significativas, serão necessários mais estudos para compreender de forma precisa a relação entre a microbiota intestinal e a obesidade e mais ensaios clínicos de caráter intervencional.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  1. Castaner O, Goday A, Park YM, Lee SH, Magkos F, Shiow SATE, et al. The gut microbiome profile in obesity: A systematic review. Int J Endocrinol. 2018;2018.
  2. Oliveira RCS, Coelho PMB de S, Estevan M del CL. Does microbiota influence the risk of childhood obesity? Rev Esp Nutr Humana y Diet. 2018;22(2):157–68.
  3. Koleva PT, Bridgman SL, Kozyrskyj AL. The infant gut microbiome: Evidence for obesity risk and dietary intervention. Nutrients. 2015;7(4):2237–60.
  4. Santacruz A, Marcos A, Wärnberg J, Martí A, Martin-Matillas M, Campoy C, et al. Interplay between weight loss and gut microbiota composition in overweight adolescents. Obesity [Internet]. 2009;17(10):1906–15. Available from: http://dx.doi.org/10.1038/oby.2009.112.
  5. Bervoets L, Van Hoorenbeeck K, Kortleven I, Van Noten C, Hens N, Vael C, et al. Differences in gut microbiota composition between obese and lean children: A cross-sectional study. Gut Pathog. 2013;5(1):1–10.
  6. López-Contreras BE, Morán-Ramos S, Villarruel-Vázquez R, Macías-Kauffer L, Villamil-Ramírez H, León-Mimila P, et al. Composition of gut microbiota in obese and normal-weight Mexican school-age children and its association with metabolic traits. Pediatr Obes. 2018;13(6):381–8.
  7. Nirmalkar K, Murugesan S, Pizano-Zárate ML, Villalobos-Flores LE, García-González C, Morales-Hernández RM, et al. Gut microbiota and endothelial dysfunction markers in obese Mexican children and adolescents. Nutrients. 2018;10(12).
  8. Riva A, Borgo F, Lassandro C, Verduci E, Morace G, Borghi E, et al. Pediatric obesity is associated with an altered gut microbiota and discordant shifts in Firmicutes populations. Environ Microbiol. 2017;19(1):95–105.
  9. Stanislawski MA, Dabelea D, Wagner BD, Iszatt N, Dahl C, Sontag MK, et al. Gut Microbiota in the First 2 Years of Life and the Association with Body Mass Index at Age 12 in a Norwegian Birth Cohort. MBio. 2018;9(5):1–14.
  10. Bai J, Hu Y, Bruner DW. Composition of gut microbiota and its association with body mass index and lifestyle factors in a cohort of 7–18 years old children from the American Gut Project. Pediatr Obes. 2019;14(4).
  11. Gao X, Jia R, Xie L, Kuang L, Feng L, Wan C. Obesity in school-aged children and its correlation with Gut E.coli and Bifidobacteria: A case-control study. BMC Pediatr [Internet]. 2015;15(1):1–4.
  12. Hou YP, He QQ, Ouyang HM, Peng HS, Wang Q, Li J, et al. Human Gut Microbiota Associated with Obesity in Chinese Children and Adolescents. Biomed Res Int. 2017;2017.
  13. Smith-Brown P, Morrison M, Krause L, Davies PSW. Male-specific association between fat-free mass index and fecal microbiota in 2- to 3-year-old Australian children. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2018;66(1):147–51.
  14. Balamurugan R, George G, Kabeerdoss J, Hepsiba J, Chandragunasekaran AMS, Ramakrishna BS. Quantitative differences in intestinal Faecalibacterium prausnitzii in obese Indian children. Br J Nutr. 2010;103(3):335–8.
  15. Karlsson CLJ, Önnerfält J, Xu J, Molin G, Ahrné S, Thorngren-Jerneck K. The microbiota of the gut in preschool children with normal and excessive body weight. Obesity. 2012;20(11):2257–61.
  16. Xu P, Li M, Zhang J, Zhang T. Correlation of intestinal microbiota with overweight and obesity in Kazakh school children. BMC Microbiol. 2012;12.
  17. Hollister EB, Foster BA, Dahdouli M, Ramirez J, Lai Z. Characterization of the Stool Microbiome in Hispanic Preschool Children by Weight Status and Time. Child Obes. 2018;14(2):122–30.

 

Endereço para correspondência

Daniela Carvalho

Urbanização da Maligueira, lote 9 - 5ºC , 2415-341 Leiria, Portugal

dani.romina@hotmail.com

 

Recebido a 28 de janeiro de 2020

Aceite a 30 de junho de 2020

 

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License