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Acta Portuguesa de Nutrição

versão On-line ISSN 2183-5985

Acta Port Nutr  no.6 Porto set. 2016

https://doi.org/10.21011/apn.2016.0602 

ARTIGO ORIGINAL

Análise Qualitativa de Ementas em Escolas do Rio de Janeiro

Qualitative Analysis of Menus in Rio de Janeiro Schools

Margareth Xavier da Silva1*; Margarida Liz Martins2,3; Anna Paola Trindade da Rocha Pierucci1; Cristiana Pedrosa1; Ada Rocha2,3

1 LabDAFEE/DNBE, Instituto de Nutrição Josué de Castro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

2 LAQV@REQUIMTE, Rua Dr. Roberto Frias, 4200-465 Porto, Portugal

3 Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto, Rua Dr. Roberto Frias, 4200-465 Porto, Portugal

Endereço para correspondência

 

RESUMO

Introdução: O Programa Nacional de Alimentação Escolar, existente no Brasil determina que todas as escolas públicas ofereçam refeições adequadas e gratuitas aos alunos, no período letivo, para manter os alunos corretamente alimentados no período de aulas. A fim de assegurar a qualidade das ementas das refeições escolares, estão documentados, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, os alimentos restritos e os permitidos.

Metodologia: Utilizou-se neste estudo, para análise qualitativa das ementas oferecidas nas escolas, o instrumento de Avaliação Qualitativa das Preparações do Cardápio, que possibilita a verificação de aspetos referentes à qualidade nutricional e sensorial e analisou-se todas as ementas implementadas durante o ano letivo de 2013, das escolas públicas do município de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil. As preparações foram categorizadas, de acordo com as recomendações do Programa, em dois tipos: alimentos recomendados, que devem ser oferecidos de 80 a 100% e alimentos controlados que devem ser utilizados até 20%.

Resultados: Observou-se que os alimentos recomendados, nas seguintes categorias: carne, pescado e ovos; leguminosas; hortícolas; frutas e laticínios foram oferecidos nas ementas em quantidades adequadas. Entretanto, as saladas foram oferecidas entre 20-60% abaixo do que é indicado e os alimentos integrais, apesar de recomendados, foram pouco oferecidos. Alguns alimentos excederam o percentual máximo indicado para uso nas ementas, tais como: alimentos com adição de açúcar; industrializados semiprontos, enlatados e desidratados; cereais de pequeno-almoço e biscoitos.

Conclusões: As ementas destinadas aos alunos das escolas públicas municipais de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil, apresentaram vários aspetos positivos com oferta da maioria grupos de alimentos recomendados, adequadamente. Contudo, alguns produtos controlados, foram oferecidos em excesso, e poderiam ser substituídos ou reduzidos para a melhoria da qualidade do almoço fornecido aos alunos matriculados nestas escolas.

Palavras-Chave: Análise qualitativa, Ementa, Escola, Refeições

 


 

ABSTRACT

Introduction: The National School Feeding Program, existing in Brazil sets that all public schools provide adequate and free meals to students during the school year, to keep students properly fed into the class period. In order to ensure the quality of school menus a list of food allowed and restricted are registered with the National Fund for Education Development.

Methodology: It was used in this study the Qualitative Assessment tool for the qualitative analysis of schools menus, which enables the verification of aspects related to nutritional and sensory quality. All menus implemented during the school year 2013 in public schools in the municipality of Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brazil were analyzed. Food preparations were categorized according to the program’s recommendations, into two types: recommended foods that must be provided 80 to 100% and controlled food, with maximum use of 20%.

Results: It was observed that the recommended foods in the following categories: meat, fish and eggs; beans; vegetables; fruits and milk and milk products were offered in adequate amounts. However, the salads were offered 20-60% below recommendations, and have not been offered whole foods in spite of being recommended for school meals. Some foods exceeded the maximum percentage indicated for the menus, such as foods with added sugar; industrialized semi-ready, canned and dehydrated; breakfast cereals and biscuits.

Conclusions: The menus for public schools in Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brazil, showed several positive aspects by offering properly the most groups of recommended foods. However, some controlled products were offered in excess, and could be replaced or reduced to improve the quality of the meals provided to students enrolled in these schools.

Keywords: Qualitative analysis, Menus, School, Meals

 


 

INTRODUÇÃO

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), existente no Brasil, é uma política governamental nacional, que integra o Programa de Segurança Alimentar e Nutricional. Todas as escolas públicas devem oferecer a alimentação escolar, que inclui a totalidade das refeições oferecidas gratuitamente, aos alunos da educação básica (educação infantil, jovens e adultos; ensino fundamental e médio). O objetivo principal deste programa é manter o aluno corretamente alimentado durante o período letivo, satisfazendo 20% das necessidades nutricionais diárias, quando oferecida apenas uma refeição, 30% se forem servidas duas refeições e 70%, para período integral de permanência na escola. A alimentação escolar deve contribuir para a formação de bons hábitos alimentares, além de favorecer a aprendizagem no espaço escolar, por isso, é importante garantir a sua aceitação pelo público ao qual se destina. O PNAE determina que as ementas das escolas sejam planeadas por nutricionistas com utilização de géneros alimentícios básicos, respeitando-se os hábitos alimentares, a cultura e a tradição alimentar do local (1, 2).

Independentemente do nível social a que as crianças pertencem, a escola apresenta sempre grande relevância na formação dos seus hábitos, nomeadamente, hábitos alimentares, podendo influenciar as preferências alimentares dos alunos contribuindo para escolhas saudáveis, no futuro (3). A fim de assegurar a qualidade das ementas das refeições escolares, estão documentadas, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) no Brasil, as orientações que deverão ser seguidas, assim como os alimentos que deverão ser restritos. Desse modo, fica estabelecido o que deve ser permitido ou controlado nas ementas. O FNDE é o principal órgão de execução de políticas educacionais no Brasil e está responsável por transferir recursos financeiros e prestar assistência técnica aos estados, municípios e ao Distrito Federal, para garantir educação universalizada de qualidade (2).

O presente estudo analisou os aspetos qualitativos das ementas utilizadas durante o ano letivo de 2013, nas Escolas Públicas Municipais de Duque de Caxias, a fim de verificar a qualidade das refeições oferecidas aos alunos ao pequeno-almoço e almoço. Para análise qualitativa das ementas oferecidas nas escolas, utilizou-se o instrumento de Avaliação Qualitativa das Preparações do Cardápio – AQPC (4), que é um programa largamente utilizado para avaliar planos de ementas de Unidades de Alimentação e Nutrição, destinados a diferentes populações. Esta ferramenta permite a verificação de aspetos referentes à qualidade alimentar e sensorial de acordo com as recomendações do PNAE, cujas orientações poderão favorecer o aumento da aceitação das refeições escolares pelos alunos (4).

Duque de Caxias, local onde se realizou a aplicação das ementas analisadas neste documento, é um município integrante da Região Metropolitana da cidade do Rio de Janeiro. O Censo Demográfico, no Brasil, é realizado a cada dez anos pelo IBGE, e o mais próximo ao ano em que as ementas deste estudo foram aplicadas é o de 2010, que indicou que Duque de Caxias é o terceiro município mais populoso do Rio de Janeiro e o décimo oitavo do Brasil, com 855046 habitantes (5). O Censo Escolar é realizado anualmente e mostrou que esse município possui 261 escolas de ensino pré-escolar, com 13014 crianças matriculadas; 369 escolas de ensino básico, com 131810 alunos e 104 estabelecimentos de ensino médio, com 36447 alunos (6). Todos estes estabelecimentos têm implementado o PNAE (1).

METODOLOGIA

Neste estudo foram avaliadas qualitativamente as 200 ementas utilizadas, durante o ano letivo de 2013, nas escolas públicas municipais de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil, que servem alunos do ensino básico, com idades de 8 aos 15 anos de idade, no período em que utilizaram a cantina escolar e consumiram o pequeno-almoço e o almoço. As preparações das ementas foram categorizadas conforme as indicações do PNAE, em dois tipos: alimentos recomendados e alimentos controlados, que devem ser utilizados até o máximo de 20% dos dias em que os alunos recebem alimentação escolar (1). A recolha de dados foi realizada por meio das ementas disponibilizadas pela nutricionista da Secretaria de Educação de Duque de Caxias, no setor da Alimentação Escolar, que é responsável pela sua elaboração. Foram preenchidas as tabelas do Programa AQPC Escola, conforme as etapas descritas a seguir: 1- proceder a análise da ementa por refeição; 2- considerar a classificação dos ingredientes que compõem as preparações e a forma de preparação; 3- seguir para o próximo item da tabela, ao finalizar a refeição de um dia, até a análise de todos os dias da semana; 4- realizar a análise até concluir todas as semanas do mês; 5- finalizar, com o somatório do número de vezes que cada item aparece na semana, e 6- calcular as percentagens, de acordo com o número de dias analisados (4).

Considerou-se as seguintes categorias: categoria de alimentos recomendados: frutas in natura; hortícolas não amiláceos; cereais, pães, massas e hortícolas amiláceos; carne, pescado e ovos; leguminosas e laticínios; categoria de alimentos controlados: preparações/produtos concentrados em açúcar; industrializados, enlatados ou conservas; alimentos desidratados, concentrados; cereais de pequeno-almoço, bolos e biscoitos; alimentos flatulentos (leguminosas, hortícolas folhosos, ovo cozido, por exemplo); alimentos gordurosos. Esta categorização está de acordo com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, Conselho Deliberativo que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no Programa Nacional de Alimentação Escolar, PNAE (1).

ASPETOS BIOÉTICOS

O presente estudo foi realizado em sua totalidade com respeito às normas contidas na resolução n.º 196/96 (Conselho Nacional de Saúde) que regulamenta as práticas de pesquisas envolvendo seres humanos. Todos os envolvidos na pesquisa, pessoas físicas ou jurídicas, foram devidamente informados sobre os procedimentos da pesquisa, e o consentimento formalizado por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias, sendo uma do pesquisador e a outra do sujeito ou das instituições, neste caso, a Secretaria de Educação de Duque de Caxias- RJ, as escolas indicadas pela Secretaria de Educação e os responsáveis pelos alunos menores de idade. Os pesquisadores responsáveis pela condução da pesquisa permaneceram à disposição para esclarecimento de dúvidas e atendimento em caso de necessidade, conforme informado no TCLE. Esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PARECER 79/2009 - PROCESSO: 0026.0.239.000-09; 16/2009).

RESULTADOS

As Tabelas 1, 2 e 3 referem-se às três ementas rotativas utilizadas nas Escolas Públicas Municipais de Duque de Caxias durante o ano letivo de 2013. Na Tabela 4 é feita a descrição e apresentada a frequência de oferta dos alimentos recomendados pelo PNAE, que foram oferecidos aos alunos. É recomendado pelo Programa a utilização de 100% de frutas in natura, hortícolas não amiláceos; cereais, pães, massas e hortícolas amiláceos; leguminosas e laticínios, pelo que a oferta destes grupos de alimentos deve ser diária. Os alimentos recomendados pelo PNAE estão nas ementas das escolas avaliadas neste estudo nas seguintes proporções: frutas in natura entre 80 a 90%; hortícolas não amiláceos de 60 a 90%; cereais, pães, massas e hortícolas amiláceos de 95 a 100%; carnes e ovos 100%; leguminosas 95 e 100% e leite e derivados 80 e 100% da recomendação. As preparações de saladas foram oferecidas nas ementas com uma frequência de apenas 20 a 60%, estando abaixo do que é indicado, e os produtos integrais, que foram pouco oferecidos nas ementas, quando o ideal é que sejam regularmente oferecidos, nas refeições escolares.

Na Tabela 5 faz-se a descrição e apresenta-se a frequência de oferta dos alimentos controlados pelo PNAE, oferecidos aos alunos, nas ementas do ano letivo de 2013. Estes alimentos deverão ser fornecidos até o limite de 20% do total de refeições durante o ano letivo. As preparações com açúcar adicionado ou produtos com açúcar foram oferecidos entre 55 a 60% nas ementas do pequeno-almoço, nomeadamente sob a forma de geleia, pão doce com creme, pão de coco e biscoito rosquinha de coco, e nas sobremesas do almoço: goiabada e doce de leite.

Os embutidos, produtos cárneos industrializados foram oferecidos em 10% das refeições, sendo exemplos a carne seca, estando dentro do limite de 20% indicado para os alimentos controlados.

Os alimentos industrializados semiprontos ou prontos foram fornecidos entre 50 e 60%, sendo exemplos as bebidas lácteas, vitaminas, mingaus e suco de uva ao pequeno-almoço; Os enlatados, nomeadamente o extrato de tomate e ervilha em lata, foram disponibilizados em 60 a 80% das ementas. Todos acima do limite máximo recomendado pelo programa (1).

Verificou-se que os cereais matinais bolos e biscoitos são oferecidos em 40 a 45% dos pequenos-almoços em substituição de alternativas mais equilibradas.

Os alimentos flatulentos e de difícil digestão como os feijões, alguns hortícolas (bertalha, brócolis, couve, talos, repolho), o ovo cozido e a melancia são disponibilizadas em 90 a 100% das ementas. Positivamente, as bebidas de baixo valor nutricional não estão presentes nas ementas das escolas.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A avaliação da oferta dos alimentos recomendados evidenciou que no grupo das frutas in natura, a utilização satisfez o total de 80 a 90%, embora em dois dias da ementa de fevereiro a abril houvesse repetição de banana ao pequeno-almoço e almoço. As saladas foram oferecidas abaixo da percentagem recomendada, entre 20 e 60%, embora as preparações com hortícolas tenham sido oferecidas regularmente, estando presentes nas ementas em mais de uma preparação na mesma refeição. Estes alimentos têm um efeito protetor contra as doenças crónicas não transmissíveis, como a obesidade, dislipidemia, diabetes, hipertensão e cancro, que tem sido associado ao seu alto teor em nutrientes, como as fibras, antioxidantes, vitaminas e minerais. Segundo dados da Pesquisa do Orçamento Familiar (5), correspondente aos anos de 2014/2015, as frutas e hortícolas correspondem apenas a 2,8% das calorias totais ingeridas, cerca de um quarto das recomendações para o consumo desses dois grupos de alimentos, cujo mínimo deveria ser de 9% a 12% do valor energético total de uma dieta de 2 000 kcal diárias ou, aproximadamente, 400 gramas diários (8).

O consumo de frutas e/ou de hortícolas é considerado protetor contra as doenças cardiovasculares, e outras doenças crônicas não transmissíveis (9). Os dados disponíveis são preocupantes, pois mostram que apenas 25,2% das crianças brasileiras entre os dois e os cinco anos de idade e 38,3% das crianças entre os cinco e os dez anos consomem frutas e hortícolas na sua alimentação diária, enquanto que 26,6% das crianças nesta faixa etária declaram consumir rebuçados, biscoitos recheados e outros doces, cinco a sete vezes por semana (9,10,11,12). No estudo de Leal et al. (2010) foi avaliado o consumo alimentar de 640 alunos do 5º ano do Ensino Básico e Ensino Médio, com idades entre 10 e 15 anos. Recorrendo ao questionário às 24 horas anteriores foi demonstrado que os alimentos menos consumidos eram os que pertencem ao grupo dos hortícolas e frutas, evidenciando o risco potencial para carências nutricionais (13).

A escola é um local onde as crianças passam a maior parte do seu dia e onde estabelecem relações de amizade e confiança, sendo reconhecida como o ambiente ideal para a divulgação de vários conhecimentos e promoção de comportamentos saudáveis. O horário das refeições também é um momento de aprendizagem, desse modo, a maior oferta de frutas e hortícolas, além de incentivar o consumo destes alimentos, pode reforçar a ideia entre os alunos, de que são alimentos saudáveis que devem fazer parte da alimentação diária (13, 14).

Verifica-se que o grupo de cereais, pães, massas e hortícolas amiláceos, nem sempre foi oferecido ao pequeno-almoço, como indicado pelo PNAE (1). Por outro lado, observou-se a substituição dos pães, ao pequeno-almoço, por cereais de pequeno-almoço e biscoitos doces ou salgados, caracterizados como alimentos controlados, por corresponderem a alimentos industrializados com maior teor de açúcar, sal e gordura trans (13,15). Kliemann et al.. 2015 identificaram, igualmente, no seu estudo uma elevada percentagem de alimentos industrializados cuja informação nutricional declarava não ter gordura trans, mas que a apresentava na lista de ingredientes, assim como os biscoitos presentes na ementa dos alunos. Este facto ocorreu, mesmo para produtos que seguem a porção recomendada pela legislação brasileira (13).

A presença de mais de uma fonte de hidratos de carbono na mesma refeição (16) pode ser considerada uso excessivo (1). Foram evidenciadas refeições contendo arroz, batata e farinha de mandioca simultaneamente em dois dias na ementa de fevereiro a abril e, por várias vezes ementas com arroz com farinha de mandioca, ou inhame, ou aipim, ou batata doce na mesma refeição. Em certos casos este aspeto contribui simultaneamente, para a monotonia de cor na ementa, com predomínio da cor branca, fator que torna a apresentação visual do prato menos atrativa ao utente, e pode interferir na aceitação, pois o primeiro contato da criança com o alimento é o visual e a monotonia de cores pode diminuir o interesse pelos alimentos (17, 18). Além disso, o excesso na oferta de alimentos fontes de hidratos de carbono nas refeições pode acarretar em doenças crônicas não transmissíveis (19). O fornecimento dos alimentos do grupo de carnes, pescado e ovos foi integralmente satisfeito, porém a oferta de carne seca poderia ser limitada na ementa escolar, por conter alto teor de sal e de gordura, embora faça parte dos hábitos alimentares do povo brasileiro (20, 21) e não tenha sido oferecida em excesso nas ementas. As leguminosas também foram oferecidas quase diariamente nas ementas, o que contribui para maior aporte de fibras, proteínas, vitaminas e minerais, como o ferro, importante nesta faixa etária, todavia (21), estão caracterizadas como alimentos flatulentos nas tabelas de alimentos controlados por conterem na sua composição, alguns oligossacarídeos, rafinose, estaquiose e verbascose (22). Este fornecimento apesar de estar muito acima do recomendado para os alimentos controlados justifica-se provavelmente por este grupo incluir o feijão, um dos alimentos base da alimentação no Brasil (22).

Os valores das capitações da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) indicam um menor consumo de feijão, saladas e hortícolas, em geral, por adolescentes quando comparados com os adultos e idosos, logo, a oferta diária na ementa escolar pode servir para incentivar o consumo deste alimento (1). O estudo de Levy- Costa et al. (2005), referência mais antiga do que a da POF do ano de 2009 já mostrava esse declínio no consumo do feijão por adolescentes com o aumento do orçamento familiar e o fenómeno da transição nutricional (23).

A oferta dos alimentos do grupo dos laticínios também foi satisfatória, embora sejam utilizadas preparações ao pequeno-almoço com produtos desidratados concentrados, para preparação de bebidas lácteas ou de vitaminas com sabor de fruta e mingaus, que embora otimize o trabalho das merendeiras, não possuem o mesmo valor nutricional das preparações elaboradas com a fruta in natura ou a farinha, e por conterem maior teor de açúcar de adição, seriam contraindicados na prevenção da obesidade. Esses alimentos devem ser restritos nas ementas escolares de acordo com as orientações do PNAE. O consumo regular de bebidas com adição de açúcar relaciona-se com níveis mais elevados de excesso de peso e risco de obesidade (2, 24).

A avaliação dos alimentos controlados nas ementas do ano de 2013, demonstrou que a oferta de preparações concentradas em açúcar ultrapassou 55 a 60% o máximo recomendado, considerando-se as orientações do PNAE. Esta prática é reconhecida por vários autores como fator risco para obesidade na infância e prejudicial na formação de bons hábitos para a vida adulta (2,16,17). Foram utilizados produtos enlatados, industrializados e em conservas com oferta entre 60 e 70% acima do limite máximo tolerado pelo Programa, com a utilização quase diária de extrato de tomate, e esporádica de ervilha em lata, como também do suco de uva, ao pequeno-almoço. Embora o uso desses enlatados e suco industrializado facilitem o trabalho das funcionárias do serviço de alimentação escolar, estes deveriam ser substituídos por alimentos in natura, contribuindo para a redução do teor de sódio na alimentação dos alunos (2).

O estudo de Boaventura et al. (2013) utilizou do método AQPC para avaliar as ementas das escolas municipais da Grande São Paulo, obtendo resultados semelhantes ao estudo aqui apresentado, quanto à oferta suficiente de hortícolas, frutas e laticínios, assim como a identificação de monotonia de cor em algumas das grandes refeições (25). Veiros e Martinelli (2012), que elaboraram a ferramenta AQPC, encontraram ementas escolares com grande oferta de alimentos dos grupos dos cereais, ricos em hidratos de carbono simples e amido, contraindicados por apresentarem alto índice glicémico e favorecerem o aumento de peso (4, 26, 27). Sugeriram a substituição destes, por alimentos integrais, que além de promoverem a maior variedade de cores na apresentação do prato, fornecem simultaneamente maior quantidade de micronutrientes (4, 26, 27). Menegazzo et al. (2011) ao utilizarem o método AQPC para avaliar cardápios de Centros de Educação Infantil na Grande Florianópolis, Santa Catarina, estado do Sul do Brasil, observaram não haver monotonia de cor nos cardápios das grandes refeições, mesmo com pouca oferta de frutas e hortícolas nas ementas (17). Portanto, o método AQPC facilita a avaliação da qualidade nutricional dos cardápios e de algumas das caracteristicas sensoriais, fatores importantes para a aceitação das refeições, facilita ainda a identificação da necessidade de melhorias o que permite identificar as soluções a serem implementadas na revisão e adequação dos cardápios, de forma a assegurar as exigências nutricionais que garantem a manutenção da saúde dos alunos com a adequada oferta de nutrientes. (18, 28).

Limitações do estudo

Considerou-se como limitação do estudo não terem sido encontrados, durante a revisão bibliográficas, trabalhos de avaliação qualitativa de cardápios escolares por um ano letivo inteiro, o que dificultou a relação durante a redação deste documento.

CONCLUSÕES

As ementas destinadas aos alunos de todas as escolas públicas municipais de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, Brasil, no ano de 2013 apresentaram vários aspetos positivos ao seguir as indicações do Programa Nacional de Alimentação Escolar, com a oferta, em proporções recomendadas, da maioria dos grupos de alimentos sugeridos, contudo, alguns produtos contraindicados, foram oferecidos em excesso, e poderiam ser substituídos ou reduzidos, a fim de corroborar com as indicações do Programa e contribuir para a melhoria da qualidade das refeições fornecidas aos alunos matriculados nestas escolas.

AGRADECIMENTOS

Margareth Xavier da Silva agradece a bolsa CAPES do Programa de Doutoramento Sanduíche, recebida a partir de dezembro de 2014, processo número BEX 8287/14-7.

Agradecemos as Professoras Doutoras Marcela Boro Veiros e Suellen Secchi Martinelli pelo envio do Programa AQPC Escola. O artigo das referidas Professoras, e no qual foram baseados os “Métodos” deste documento, está citado na bibliografia.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência

Margareth Xavier da Silva

Av. Carlos Chagas Filho,

373 - Cidade Universitária,

Rio de Janeiro - Brasil,

21941-902

margarethx@gmail.com

 

Recebido a 22 de setembro de 2015

Aceite a 19 de agosto de 2016

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