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Media & Jornalismo

Print version ISSN 1645-5681On-line version ISSN 2183-5462

Media & Jornalismo vol.22 no.40 Lisboa June 2022  Epub June 30, 2022

https://doi.org/10.14195/2183-5462_40_0 

Apresentação

Apresentação Media & Jornalismo nº40

Liziane Soares Guazina1  2 
http://orcid.org/0000-0002-4765-6918

Isabel Ferin Cunha3 
http://orcid.org/0000-0001-8701-527X

Gianpietro Mazzoleni4 

1 Universidade de Brasília. Brasil.

2 Universidade de Turim. Itália; liziane.g@uol.com.br

3 ICNOVA, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Portugal. barone.ferin@gmail.com

4 Università degli Studi de Milano. Itália; mazzoleni@unimi.it


A invasão da Rússia à Ucrânia, no dia 24 de fevereiro de 2022, deu uma nova visibilidade à temática deste número, pois tornam ainda mais urgentes, de forma dramática e terrível, as questões que envolvem a luta pela liberdade e a democracia. O crescimento das autocracias e do populismo no mundo, como vem assinalando há mais de dez anos a ONU, Freedom House, Repórteres sem Fronteiras e outras instituições internacionais, têm vindo a colocar em causa a paz, a equidade e a prosperidade mundial. Os constrangimentos crescentes colocados à globalização, num movimento protagonizado por grandes potências mundiais com vista à desglobalização, fazem crescer o receio da implosão do mundo em que vivemos. O cerceamento à liberdade de expressão, o fechamento da internet, o policiamento e polarização das redes, associados à desinformação de todo tipo e discursos de ódio fazem prever a consolidação de um reordenamento do ecossistema social e político pautado por grande violência simbólica e física. Estudar estes fenómenos tornou-se nossa obrigação.

Desde 2019 que um grupo de investigadores, portugueses e brasileiros, reunidos no Observatório do Populismo do século XXI, vinham a desenvolver atividades de pesquisa, no sentido de aprofundar o estudo do Populismo. Com esse objetivo foram organizados seminários (ICNOVA, janeiro de 2020) e conferências (online, ao longo do ano de 2021) e criado o site (https://observatoriodopopulismo.com/).

O número 40, vol. 22 da Revista Media & Jornalismo, publicado pelo Instituto de Comunicação da Universidade Nova de Lisboa (ICNOVA) é dedicado, exclusivamente, à temática Media e Populismo. A sua organização contou com a parceria de Liziane Soares Guazina (Universidade de Brasília, professora visitante da Universidade de Turim, Itália), Isabel Ferin Cunha, professora aposentada da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e investigadora do ICNOVA e Gianpietro Mazzoleni (Università degli Studi de Milano). A chamada nacional e internacional para este número da revista teve uma adesão surpreendente, demonstrada pela receção de cinquenta e seis artigos (56), o que exigiu uma seleção rigorosa dos artigos a publicar. Os critérios adotados tiveram em conta a pertinência e originalidade dos artigos, a sua qualidade científica, nomeadamente teórica e conceitual, o quadro metodológico evocado, os resultados obtidos, assim como a contribuição para o avanço do conhecimento na temática. Para avaliação e seriação dos textos contou-se com a colaboração de cerca de trinta e cinco colegas que, de forma voluntária e generosa, apreciaram e contribuíram para a organização deste número.

O êxito desta chamada deve-se, no nosso entender, a quatro fatores primordiais:

1) o crescimento das manifestações populistas em Portugal, que até à XIV Legislatura (2019), não tinha deputados afectos a este espectro político; 2) a presidência populista de Jair Bolsonaro no Brasil (2019); 3) o papel dos media, mainstream e redes sociais, na explosão deste fenómeno político; 4) as implicações do populismo na gestão da pandemia Covid-19.

No contexto poliforme enunciado, este número da revista tem o mérito de se aproximar de um Estado da Arte sobre os estudos do populismo, em Portugal e no Brasil. Ao mesmo tempo, promove o mapeamento dos objetos de análise que preocupam os pesquisadores, bem como regista a literatura científica que assiste aos enquadramentos bibliográficos que suportam essas investigações. Embora os critérios de seleção tenham privilegiado a qualidade da exposição e a originalidade dos pontos de vista adotados, não é de estranhar que, ao longo da leitura dos catorze artigos, haja convergências na bibliografia citada, assim como nos objetos analisados por muitos dos autores. A diversidade dos meios analisados é, também, um fator a enfatizar, na medida em que os artigos elegem como corpora jornais impressos, ou online, jornais televisivos, materiais de Youtube ou do Twitter. O volume do material empírico, que sustenta as análises dos textos que constituem este número é, deste modo, uma amostra muito significativa das circunstâncias, acontecimentos e cenários que rodeiam as manifestações do populismo, principalmente no Brasil e em Portugal. Metodologicamente, observa-se que os trabalhos empíricos utilizam análises quantitativas e qualitativas, respetivamente com base na análise dos discursos e narrativas ou de conteúdo, recorrendo a softwares especializados. Uma leitura transversal da composição do material utilizado nos artigos que compõem este número da revista revela condicionamentos relativos ao acesso e captura dos dados empíricos nas redes sociais, especialmente no que diz respeito a ampla utilização de softwares, assim como competências interdisciplinares que permitam análise mais

amplas e transversais.

Apresenta-se, em seguida, os textos que compõem a revista Media & Jornalismo dedicada ao Populismo, ressaltando que se respeitou a variação linguística do Português e as suas nuances, presente nos textos dos autores participantes.

O artigo “Populismo”: uma tripla perspetiva analítica” de Rui Pereira, Isabel Babo e Luís Miguel Loureiro, discute o conceito de “populismo” com base em três dimensões: exclusão e segmentação social, oportunismo político e a sua relação com os media. Os autores assinalam que há uma retroalimentação entre populismo e media e ilustram esta afirmação recorrendo a exemplos da campanha eleitoral presidencial portuguesa de 2021. Trata-se de um artigo de natureza conceitual e reflexivo que permite introduzir sincrónica e diacronicamente conceitos e teorias sobre o populismo. O segundo artigo, intitulado “News media and populism: a systematic literature review” de autoria de Carlos Santos e João Miranda, objetiva mapear e caracterizar a produção académica sobre o populismo e o jornalismo, utilizando para tal a ferramenta PRISMA. O artigo faz um balanço das citações e bibliografia mais utilizada, até junho de 2021, nos estudos sobre o populismo. Os resultados deste trabalho permitem identificar a matriz destes estudos, tais como as datas de publicação, autores, revistas, categorias e domínios científicos, recortes regionais, fenômenos analisados, opções metodológicas e abordagens conceituais relativas à interação entre populismo e mídias noticiosas.

Estrela Serrano é a autora do artigo “A pandemia Covid-19 enfraqueceu o populismo? O caso do partido populista português” que analisa a evolução do discurso político do líder do partido populista português, André Ventura, após a sua eleição como deputado em 2019 e nos anos de 2020 e 2021, marcados pela pandemia Covid-19 e pelas eleições presidenciais. Os resultados mostram a inconsistência e volatilidade do seu discurso e as posições ambíguas sobre a pandemia Covid-19, bem como a sua aproximação aos designados “negacionistas” o que, hipoteticamente, condicionou a expansão do populismo em Portugal.

No texto seguinte “O populismo no Brasil: as estratégias utilizadas por Bolsonaro para chegar ao poder”, André Melo Mendes e Terezinha Silva analisam a trajetória política do populista de direita Jair Bolsonaro, antes de se tornar presidente do Brasil. O objetivo central do artigo é discutir um certo consenso presente nos media e na academia sobre a incapacidade do atual presidente assumir uma atitude tático-política. Para leitores, principalmente portugueses, menos familiarizados com o percurso político do presidente Bolsonaro, o texto é uma contribuição importante.

O quinto texto “Despolitização e populismo: as estratégias discursivas de Trump e Bolsonaro” de Érica Anita Baptista visa analisar o discurso político de Donald Trump e Jair Bolsonaro, embora enfatize que se tratam de duas lideranças políticas distintas. Tomando como corpus as comunicações dos dois presidentes no Twitter, durante as campanhas eleitorais, realiza uma análise qualitativa interpretativa. Os resultados apontam para a utilização, nos discursos dos dois candidatos, de uma retórica populista e nacionalista que tende à despolitização do debate público.

Hébely da Silva Rebouças, Débora Silva Costa, Larissa Sousa Silva, Janayde de Castro Gonçalves e Adannick Fontes Nascimento são os autores do sexto artigo intitulado “Lula e Bolsonaro populistas? A visão de populismo dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo em alusão aos dois presidentes brasileiros”. O artigo objetiva investigar a aplicação do termo populista, pelos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, quando se referem a Bolsonaro e a Luiz Inácio da Silva (Lula). Com este objetivo analisam 41 editoriais e concluem que diferentemente da Folha, o Estadão utiliza mais vezes o conceito de populismo, referindo-se sobretudo a um estilo pessoal/político.

No texto “Populismo Autoritário e Meio Ambiente: Enquadramentos do discurso antiambiental de Jair Bolsonaro em editoriais nacionais e internacionais” Bruno Araújo e Fernanda Safira Soares Campos centram-se na análise dos enquadramentos produzidos pelos meios de comunicação de referência, brasileiros e internacionais, sobre a política ambiental de Jair Bolsonaro. Os resultados apontam para diferenças de enquadramento nos meios brasileiros e internacionais, embora em ambos prevaleçam categorias do populismo-autoritário na interpretação mediática de Bolsonaro. Hélder Prior no artigo intitulado “Populismo de Direita Radical em Portugal: enquadramentos informativos nas Eleições Presidenciais de 2021” aborda o fenómeno do populismo, a partir de um estudo qualitativo dos enquadramentos atribuídos à candidatura de André Ventura, líder do partido político Chega, durante o período eleitoral das Presidenciais Portuguesas de 2021. Os resultados apontam para diferenças de enquadramento entre a imprensa de referência e a imprensa tablóide, com esta última a enfatizar os valores do conflito e de dramatização, caros à comunicação populista.

No texto “Presidenciais portuguesas de 2021 e o populismo” Isabel Ferin Cunha, Ana Cabrera e Carla Martins debruçam-se sobre as eleições presidenciais portuguesas de 2021. As autoras sublinham o carácter inédito destas eleições numa situação de pandemia e com um candidato anti sistema. O estudo aponta para elementos de comunicação política que oscilam entre o registo populista e o popular, em quase todos os candidatos advindos de espectros políticos diferentes.

No artigo décimo “Crisis in Mexico: the effect of the president’s discourse on state-level government communication about Covid-19 on Twitter “António Corona analisa a relação entre o discurso do presidente mexicano sobre o Covid-19 e o uso do Twitter por funcionários estaduais no início da pandemia. Os resultados apontam para que o discurso cético do presidente sobre o Covid-19 influenciou o uso do Twitter pelos funcionários do partido durante este período, o que, na perspetiva do autor, demonstra como o discurso populista dos chefes de governo pode prejudicar a comunicação entre as instituições e os cidadãos.

Sara Machado, Vasco Ribeiro e Raquel Meneses no texto intitulado It speaks to me: the influence of Covid-19 and the rise of far-right populism on youth voter turnout” objetivam explorar a influência dos temas da Covid-19 e do populismo e extrema-direita na participação eleitoral dos jovens. Os resultados apontam para um forte poder de mobilização dos jovens decorrente da vontade de expressar a oposição ao populismo e à extrema-direita por meio do voto. Pelo contrário, a Covid-19 não parece ser um tema que apaixona e mobiliza os jovens, mas tem influência no momento eleitoral de duas formas: a nível negativo, na dificuldade ou impossibilidade de votar e, a nível positivo, no reforço da atenção à campanha eleitoral.

No artigo intitulado “Populismo, desinformação e Covid-19: comunicação de Jair Bolsonaro no Twitter”, os autores Claudio Penteado, Denise Goya, Patrícia Santos e Luíza Jardim, analisam a comunicação no Twitter de Jair Bolsonaro, durante a pandemia da Covid-19. O presidente brasileiro posicionou-se contra as medidas de isolamento social e fez a defesa de medicamentos sem eficácia para o tratamento da Covid-19. Os resultados da pesquisa indicam que as mensagens assentes na desinformação, na expressão de emoções e raiva tendem a gerar mais compartilhamentos. O artigo “Liberais ao estilo populista: A argumentação do MBL no YouTube” de Pedro de Souza Lima Brodbeck e Kelly Cristina de Souza Prudencio discute o papel do MBL (Movimento Brasil Livre) na recomposição da Direita no Brasil e a sua ligação ideológica à Alt-Right americana. O estudo empírico debruça-se sobre vídeos do YouTube que tratam de dois temas que movimentaram a cena política brasileira: a decisão do Supremo Tribunal Federal de revogação de obrigatoriedade de prisão em segunda instancia (o que poderia beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assim obteve o direito de sair da prisão e recorrer das sentenças que o levaram a ser preso) e a reforma da Previdência. Os resultados indicam que a maior parte dos argumentos utilizados nos vídeos produzidos pelo MBL apresenta elementos tanto técnicos quanto populistas, que se combinam para fins de dramatização, polarização e convencimento das audiências.

No texto “Estratégias de visibilidade populista nos media on-line: um estudo sobre as declarações polêmicas de Jair Bolsonaro na campanha presidencial de 2018” Thais Barbosa de Almeida analisa a cobertura da campanha de Jair Bolsonaro, nas eleições presidenciais brasileiras de 2018, nos veículos on-line G1 e UOL. Os resultados apontam para estratégias argumentativas populistas, quer dos meios de comunicação quer do candidato.

No último texto intitulado “On the firing line: adversariness in the Portuguese investigative reporting of far-right populism”, Rui Alexandre Novais explora o nível de adversatividade da reportagem de investigação sobre o populismo de extrema-direita, em Portugal. O autor recorre a um método misto que combina a análise de conteúdo e a biografia reconstrutiva para concluir que as dinâmicas mediáticas relacionadas com a iniciativa jornalística e as particularidades da reportagem de investigação explicam tanto a frequência como a severidade das críticas endógenas e exógenas constantes no tratamento noticioso do partido Chega.

Com este número da Revista Media & Jornalismo dedicado ao Populismo pretende-se não só consolidar o estudo do Populismo, como contribuir para a reflexão do papel dos Media e das redes sociais na expansão dos discursos populistas e autocráticos. A guerra de informação que acompanha a terrível e impensável guerra na Ucrânia, convoca todos os cidadãos e pesquisadores a refletir sobre estes fenómenos globais.

Os coordenadores

Liziane Soares Guazina é professora visitante da Universidade de Turim, Itália.Professora do Programa de Pos-Graduação em Comunicação da UnB. Doutora em Comunicação pela Universidade de Brasília (2011). Líder dos Grupos de Pesquisa Observatorio do Populismo do Século XXI e Cultura, Mídia e Política. Membro da Rede Nacional de Observatórios da Imprensa (RENOI), da Asociación Latino Americana de Investigadores de la Comunicación (ALAIC), da International Association for Media and Communication Research (IAMCR), da Brazilian Studies Association (BRASA) e da Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica).

Ciência ID: B11C-5F26-B960

ORCID ID: https://orcid.org/0000-0002-4765-6918

Lattes ID: 6331316797695305

Scopus Author ID: 57202403232

Morada: Universidade de Brasília, Faculdade de Comunicação. ICC Ala Norte, Bloco A, Sala AT-651/16, Campus Universitário Darcy Ribeiro Asa Norte 70910900 Brasília, DF Brasil

Isabel Ferin Cunha é professora associada/agregação (aposentada) da Universidade de Coimbra. Fez o doutoramento e foi professora na Universidade de São Paulo, Brasil, da Universidade Católica Portuguesa e da Universidade de Coimbra. Coordenou Projetos da Fundação Ciencia e Tecnologia, em Portugal, no domínio dos Media, Política e Corrupção. Atualmente está integrada no projeto Observatório do Populismo. É investigadora integrada do Instituto de Comunicação da Nova (ICNOVA).

Ciência ID: B411-9FD4-B5FB

ORCID ID: https://orcid.org/0000-0001-8701-527X

Scopus ID: 56398491100

Morada: NOVA FCSH, ICNOVA. Av. de Berna, 26 C, 1069-061 Lisboa, Portugal

Gianpietro Mazzoleni foi professor de Sociologia da Comunicação e de Comunicação Política de 2002 a 2016 na Universidade de Milão e docente de Comunicação Política e Sociologia da Comunicação na Università degli Studi de Milão e é diretor da revista Comunicazione Politica (ComPol). Membro do European Journal of Communication (Sage), da International Communication Association e do Political Communication (Taylor &Francis), Mazzoleni é autor de várias obras. As suas àreas de investigação principais são Comunicação de Massas, Comunicação Política e Políticas dos Media.

Web: https://www.gpmazzoleni.it

Scopus ID: 36763188100

Adress: Department of social and Politial Sciences. University of Milan. Via Conservatorio, 720122 Milan (Italy)

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