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e-Pública: Revista Eletrónica de Direito Público

versão On-line ISSN 2183-184X

e-Pública vol.3 no.2 Lisboa nov. 2016

 

DIREITO PÚBLICO

Breves reflexões sobre a Responsabilidade Civil das Entidades Reguladoras: em especial, o caso do Banco de Portugal.

Brief considerations regarding Civil Liability of Regulatory Authorities: in particular, the case of Banco de Portugal.

 

Edmilson Wagner dos Santos CondeI

IFaculdade de Direito da Universidade de Lisboa - Alameda da Universidade, 1649-014 Lisboa. e-mail: edmilson_conde@hotmail.com

 

RESUMO

É no domínio da supervisão que se colocam os principais problemas relacionados com falhas de controlo da actuação bancária. Assim, o presente trabalho tem como objectivo analisar a possibilidade de se responsabilizar civilmente o Banco de Portugal, os titulares dos seus órgãos ou, até, em última análise, o Estado quando através de acções ou omissões, o Banco de Portugal provoque danos a terceiros.

Palavras chave: Responsabilidade civil do Banco de Portugal, culpa, ilicitude, nexo de causalidade, beneficiários de indemnização por actuação lesiva do Banco de Portugal.

 

ABSTRACT

The monitoring failures are one of the main problems related with Banking activity. Thus, the present work has as main object the analysis of the possibility of Bank of Portugal, holders of the boards, or, ultimately, the State of Portugal, being civilly liable when through actions or omissions, Bank of Portugal causes losses to third Parties.

Key words: Civil liability of Bank of Portugal, guilt, unlawful, causal link, beneficiaries of compensation due to harmful conduct of Bank of Portugal.

 

Sumário: 1. Introdução; Delimitação do problema: o Banco de Portugal no contexto do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas e o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, 2. Excurso comparatístico: a responsabilidade civil das autoridades supervisoras na Europa a) Exclusão total da Responsabilidade Civil à Autoridade Supervisora b) Aplicação restritiva da Responsabilidade Civil à Autoridade Supervisora c) Admissibilidade de aplicação da Responsabilidade Civil à Autoridade Supervisora, 3. A aplicabilidade do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas e do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras ao Banco de Portugal , 4. O âmbito dos beneficiários de uma indemnização resultante de actuação lesiva do Banco de Portugal , 5. Conclusões.

 

1. Introdução; Delimitação do problema: o Banco de Portugal no contexto do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas e o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

O fenómeno da regulação 1 desempenha um papel fundamental no Direito Administrativo contemporâneo, com especial ênfase no fenómeno da supervisão financeira – que se destina a regular a actividade desenvolvida no sector bancário. Em Portugal, essa tarefa é assegurada pelo Banco de Portugal (doravante, BP)2 .

Num Estado Regulador, como o nosso, é imperioso que as autoridades administrativas independentes, especialmente as criadas como o intuito de regular determinados mercados, prossigam fins que (i) garantam o controlo da economia de mercado, corrigindo e colmatando as suas falhas, (ii) determinem a redução das “externalidades negativas” e (iii) desempenhem uma tarefa protectora dos consumidores, depositantes e accionistas. Em Portugal, acresce ainda um quarto fim a ser prosseguido pelo BP e que se traduz em (iv) preservar a estabilidade do sistema financeiro 3 , prevenindo a ocorrência de eventuais riscos sistémicos 4 .

Ora, é precisamente no domínio da supervisão que se colocam os principais problemas relacionados com falhas de controlo da actuação bancária. Consideramos por isso fazer todo o sentido analisar a possibilidade de se responsabilizar civilmente o BP, os titulares dos seus órgãos ou, até, em última análise, o Estado quando através de acções ou omissões, o BP provoque danos a terceiros. Assim, o objecto central deste trabalho passa por uma análise ao problema de saber como é que o Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado (doravante, LRCEE) e o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (doravante, RGICSF) respondem perante estes casos.

2. Excurso comparatístico: a responsabilidade civil das autoridades supervisoras na Europa

a) Exclusão total da Responsabilidade Civil em relação à Autoridade Supervisora

No ordenamento jurídico alemão, a entidade que exerce poderes no âmbito da supervisão bancária é a Autoridade Federal Financeira Supervisora 5 “Bundesanstalt für Finanzdienstleistungsaufsicht - BAfin”; a legislação que regula esta matéria encontra-se prevista no Acto Bancário “Kreditwesengesetz – KWG”.

O caminho percorrido até se chegar à solução legal actual, que prevê a imunidade da autoridade de supervisão por falhas de supervisão bancária que tenham provocado danos a terceiros, contudo, nem sempre foi linear. E isto porque a jurisprudência dos Tribunais alemães, em alguns dos seus arestos, se tem orientado em sentido contrário à solução que veio a ser expressamente consagrada na legislação germânica 6 .

A posição maioritariamente sufragada pela jurisprudência alemã até 1979 foi no sentido de considerar que, em face da legislação então em vigor – Kreditwesengesetz - KWG, de 1939 -, os poderes de supervisão bancária seriam exercidos apenas atendendo ao interesse público. Esta posição levou a um entendimento generalizado segundo o qual quaisquer terceiros que tenham sofrido danos em resultado de falhas de supervisão bancária não poderiam, por isso, reclamar qualquer tipo de indemnização à entidade supervisora e, em última análise, ao Estado.

Contudo, em 1979, duas decisões7 proferidas pelo Tribunal Federal Alemão “Bundesgerichtshof – BGH”, vieram colocar em crise tal entendimento. A posição assumida nestes arestos foi a de que, atendendo à lei bancária alemã de 1961 e às finalidades da supervisão bancária, o “Kreditwesengesetz -. KWG” teria, afinal, o propósito de proteger as pessoas com créditos bancários que, em virtude de uma qualquer falha de supervisão que lhes tenham causado um dano e, por isso, possam então reclamar uma indemnização.

No seguimento das decisões supra mencionadas, o Parlamento alemão veio, em 1984, aditar emendas ao “Kreditwesengesetz -. KWG”, acrescentando designadamente um novo paragrafo (3) ao então § 6 da respectiva lei, ficando agora expressamente determinado que o supervisor bancário quando actue no exercício das suas competências e em conformidade com o seu estatuto legal, ao fazê-lo, fá-lo exclusivamente em função do interesse público. Como se vê, o objectivo da lei foi, precisamente, o de afastar a possibilidade de terceiros poderem reclamar do supervisor uma indemnização, por danos que lhe foram causados, em resultado de falhas na supervisão bancária.8

b) Aplicação restritiva da Responsabilidade Civil à autoridade supervisora

O ordenamento jurídico do Reino Unido consagra, no Banking Act de 2013 9 , Capítulo 4, Secção 40, (14) sob a epígrafe “Exemption from liability in damages”, o afastamento da responsabilidade civil do Banco de Inglaterra e dos titulares dos seus órgãos relativamente a falhas de supervisão que tenham provocados danos a terceiros. Contudo, esta imunidade deixa de se aplicar quando o Banco de Inglaterra ou os titulares dos seus órgãos actuem dolosamente, i.e., com “bad faith”, ou em violação do que se dispõe na secção 6 (1) da Convenção dos Direitos Humanos 10 .

c) Admissibilidade de aplicação da Responsabilidade à autoridade supervisora

Em Portugal, a autoridade administrativa responsável pela supervisão bancária é o BP. No âmbito dos seus poderes de actuação supervisora devemos perguntar se existe algum regime legal que se aplique ao BP em virtude de actuações e/ou omissões suas que provoquem danos a terceiros. A esta questão o ordenamento jurídico português responde-nos da seguinte forma: o artigo 1.º, n.º 2, da LRCEE determina que, “as acções e omissões adpotadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo”. Esta solução normativa faz com que no seu âmbito de aplicação sujectiva caiba o BP, uma vez que é uma autoridade administrativa independente que actua no exercício de poderes públicos. Assim, aplica-se-lhe a LRCEE, com a particularidade de se lhe aplicar também o artigo 12.º, n. º 3, do RGICSF. Note-se que, em Portugal, não se encontra prevista na lei a existência de quaisquer provisões específicas destinadas a responder por danos indemnizáveis em virtude de falhas de actuação do supervisor11.

Uma vez assente que a LRCEE e o RGICSF se aplicam ao BP, vejamos agora como é que estes regimes jurídicos respondem perante falhas de supervisão do BP de que resultem danos para terceiros susceptíveis de indemnização.

Em primeiro lugar, cumpre referir que, no domínio da função administrativa, o Estado assume exclusivamente a responsabilidade perante um dano, cometido com culpa leve12, resultante de actuações imputáveis aos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes13. Esta solução legal aplica-se a falhas de supervisão do BP que sejam lesivas para terceiros e como tal não podemos deixar de referir, em traços gerais, as críticas que lhe são apontadas e que se traduzem no seguinte:

i. Não se pode aceitar, sem mais, que todo e qualquer dano, cometido com culpa leve, seja imputado ao BP, sob pena de (a) poder vir a desencadear um efeito perverso para o BP, podendo esta instituição ver-se envolvida numa situação de litigância desmesurada, gerando, consequentemente, uma situação de perturbação do seu funcionamento14.

ii. Quando aplicada ao BP, esta solução, mostra-se desproporcionada e desequilibrada, uma vez que ignora “o risco e a complexidade que assume a regulação do sistema financeiro”15.

Em segundo lugar, a LRCEE consagra, nos seus n.os 3 e 4 do artigo 7.º, a chamada faute du service, que se traduz na responsabilização do Estado e demais pessoas colectivas de Direito Público, sem que, em concreto, tenha ficado demonstrada a culpa inerente à actuação lesiva do titular de órgão, funcionário ou agente, ou não se consiga provar a autoria pessoal da acção ou omissão. Assim, só se torna possível responsabilizar a Administração na medida em que se demonstre que a lesão se deveu a um serviço que, globalmente considerado, funcionou de forma anormal. A este propósito, a doutrina tem apontado algumas preocupações no momento de perspetivar a aplicação desta solução legal à luz da ocorrência de falhas de supervisão lesivas para terceiros; são elas as seguintes:

i. Considera-se que uma das causas que contribui para a ocorrência de falhas de regulação é o próprio modelo institucional de regulação, fazendo disso prova a mais recente crise financeira global que demonstrou, de forma cabal, as deficiências inerentes às estruturas regulatórias16;

ii. De igual modo, tem-se que o sector financeiro é pródigo na construção de novos produtos financeiros comercializáveis e que, embora movendo-se dentro da lógica da economia de mercado, colocam especiais desafios ao regulador, uma vez que a este último incumbe a tarefa de zelar pela estabilidade e segurança do sistema financeiro17;

iii. Por fim, aponta-se como uma das principais dificuldades do regulador o facto de ocorrer frequentemente uma escassez de meios técnicos e humanos que deem uma resposta cabal à missão de supervisão inerente à entidade supervisora18

No que diz respeito à aplicação do regime da responsabilidade por culpa do serviço a actuações do BP, FERNANDA MAÇÃS sugere a seguinte reflexão: “o que se questiona é se, sendo mais fácil cometer erros, não seria mais adequado, para evitar resultados demasiado gravosos, mitigar este regime de responsabilidade com elementos de subjectivação, limitando-se a imputação da entidade reguladora às situações de falta grave (faute lorde)”19. Tendemos, contudo, a não partilhar esta perspectiva. Senão vejamos: vivemos hoje numa sociedade altamente dependente do são funcionamento da actividade bancária, sob pena de ocorrência de danos de elevada escala que podem inclusive desencadear um «efeito dominó» à escala global, gerando uma crise global ao nível da escassez de liquidez. Assim, o legislador deve atender a esta realidade fáctica aquando do processo legislativo e, em Portugal, fê-lo, ao compreender na responsabilidade por culpa leve e no mau funcionamento do serviço a responsabilidade da entidade de supervisão bancária, devendo impender sobre esta um especial dever de garante que a obriga a estar, mais do que nunca, vigilante relativamente às actuações bancárias. Deste modo, a autoridade de supervisão bancária deve actuar com mais diligência, mais rigor, eficácia e assertividade no controlo da actividade bancária. É isto que a sociedade exige do supervisor, e é isso que se consegue se, sobre ele, imperar um sentido de diligência elevado quando esteja a exercer a actividade de supervisão, sob pena de saber que, falhando, e ainda que não se saiba quem falhou, lhe possam ser assacadas responsabilidades.

Em terceiro lugar, temos os casos de responsabilidade por actuações ou omissões ilícitas cometidas por titulares de órgãos, funcionários e agentes que, com dolo ou culpa grave, tenham provocado danos20. Note-se que esta solução legal vem acompanhada de uma outra que se traduz na obrigatoriedade do exercício do direito de regresso pelo Estado e demais pessoas colectivas contra os titulares de órgãos, funcionários e agentes21. Sobre a operatividade desta solução legal à actividade de supervisão bancária desenvolvida pelo BP, consideramos fazer todo o sentido que este regime legal não se aplique ao BP, como aliás acontece, uma vez que esta entidade goza de um estatuto de independência inerente à actuação dos titulares dos seus órgãos e, por isso, é necessário assegurar-lhes a liberdade indispensável à tomada de decisões no âmbito da supervisão. De outro modo estar-se-ia a limitar a independência de decisão dos titulares dos seus órgãos, uma vez que, sobre eles, pairaria sempre o fantasma do exercício obrigatório do direito de regresso a ser acionado pelo Estado. Note-se também que nestas situações pode acontecer que os titulares dos órgãos do BP, ao verem exercido o direito de regresso obrigatório, poderiam encontrar-se perante uma situação em que o seu património passasse a estar totalmente onerado em virtude do exercício do direito de regresso22, o que, além do mais, teria como consequência reflexa o desincentivo ao aparecimento de interessados, com elevado grau de competência, que quisessem assumir esses cargos. Encontra-se assim perfeitamente justificada a consagração do regime especial destinado à regulação e à supervisão bancária que se encontra previsto no artigo 12.º, n.º 3 do RGICSF e que estabelece a regra segundo a qual a responsabilidade civil pessoal dos titulares dos órgãos do BP “ apenas pode ser efetivada mediante ação de regresso do Banco e se a gravidade da conduta do agente o justificar”. A regra é, portanto, a de que o BP assume exclusivamente a responsabilidade de actuações, danosas, dos seus titulares, podendo, caso queira, ou seja, facultativamente, exercer sobre eles o direito de regresso.23

Em quarto lugar, encontramos no artigo 10.º, n.º 3 da LRCEE a consagração da figura da responsabilidade in vigilando24.

Estão assim em vista as situações em que “a Administração se demite do seu dever de controlar certas condutas ou o exercício de determinadas actividades dos particulares e, em resultado de actuações ilícitas destes, são causados prejuízos a alguém”25.

Para que estejamos perante uma falha de supervisão relevante para efeitos de aplicação do artigo 10.º, n.º 3 da LRCEE, será necessário que se preencham todos os requisitos da responsabilidade civil, a saber: (a) facto, (b) ilicitude, (c) culpa, (d) nexo causal e (e) dano.

Para o que aqui releva desenvolveremos só o requisito do nexo de causalidade. O estabelecimento do nexo de causalidade das situações omissivas reveste especial complexidade, senão vejamos: no domínio das falhas de supervisão bancária estaremos em presença de dois potenciais agentes causadores do dano: (i) o supervisor, na medida em que tenha contribuído, com a sua omissão ilícita e culposa, para a ocorrência do dano para terceiros, e (ii) o supervisionado, na medida em que, actuando ilicitamente sobre a realidade concreta, provoque danos a terceiros dentro do âmbito da relação bancaria. Aqui, o problema central é o de saber se se pode assacar responsabilidades à entidade supervisora, no caso o BP, por danos que, em rigor, foram principalmente causados por um lesante principal distinto do regulador. Estamos assim perante um problema de concausa.

De modo a poder-se dizer que o supervisor é responsável civilmente pelos danos causados a terceiros será necessário averiguar a existência de um nexo causal que permita afirmar que a omissão de actuação do supervisor contribuiu, enquanto causa adequada, para a produção dos danos.

Embora seja difícil, cremos ser possível estabelecer-se um nexo de causalidade entre o facto e o dano em sede de apuramento de responsabilidade para com a entidade reguladora. Entedemos que a actividade de supervisão bancária é um domínio de actuação em que a Administração se encontra envolvida em especiais deveres de garantia, traduzindo-se em obrigações de actuação que têm um fim de protecção do interesse público que se consubstancia, por um lado, na protecção do sistema financeiro e, por outro lado, visa impedir comportamentos ilícitos ou, mesmo, mitigar comportamentos potencialmente lesivos para os clientes bancários. Assim, face a omissões de supervisão que, em concreto, tenham contribuído de forma adequada para a produção do resultado lesivo ao terceiro podemos afirmar a possibilidade de imputação do facto ao dano, responsabilizando assim a autoridade supervisora. Acresce a isto a circunstância de os clientes bancários depositarem uma confiança legítima no funcionamento da supervisão bancária que deve ser alcançada através de actuações legalmente devidas no domínio da supervisão. Convém notar que o apuramento da responsabilidade do supervisor, nos casos de responsabilidade in vigilando, não é fácil de descortinar. É exigível que se apure, em rigor, a existência de um nexo causal adequado entre a falha de supervisão e o dano provocado a terceiros, ou seja, terá que existir uma omissão de um dever de actuação que tenha contribuído, com um enorme grau de certeza, para o resultado final danoso.

A existência de concausalidade na produção de um resultado lesivo para terceiros em consequência de actuações danosas por parte de instituições bancárias e à ocorrência de falhas de supervisão por parte do BP coloca o problema de saber em que medida estas entidades respondem perante aqueles. A LRCEE dá-nos a resposta a esse problema quando no seu artigo 10.º, n.º 4 prevê que nos casos em que haja pluralidade de responsáveis se aplica o disposto no artigo 497.º do Código Civil. Isso significa que, no plano das relações externas, todos os que tenham contribuído para a ocorrência do resultado final lesivo são considerados, nos termos da lei, civilmente responsáveis perante terceiros lesados, respondendo assim solidariamente perante estes.

No plano das relações internas o problema é mais complexo. Isto porque (i) não existe regra especial no RGICSF que preveja a possibilidade de exercício de direito de regresso por parte do BP relativamente a instituições bancárias aquando da ocorrência de um dano indemnizável a um terceiro lesado em virtude de uma actuação danosa praticada pela instituição bancária que afecte esfera jurídica daquele mesmo terceiro – pese embora haja a ocorrência de alguma falha de supervisão - e (ii) o RGICSF apenas prevê, no seu n.º 3 do artigo 12.º, a possibilidade do exercício do direito de regresso do BP em relação aos seus agentes relativamente a decisões que estes tomem na medida da gravidade da sua culpa, i.e., quando a gravidade da conduta do agente o justificar, salvo se a mesma constituir crime, ou seja, esta previsão normativa destina-se às situações típicas de ocorrência de actuações positivas, deixando de fora as situações omissivas. Contudo, sempre se poderá concluir que, em casos de falhas de supervisão cometidos por agentes que actuem no âmago do BP, esta última entidade sempre poderá exercer o direito de regresso relativamente àqueles agentes. Esta conclusão é retirada de uma interpretação conjunta do que se dispõe no n.º 3 do artigo 12.º do RGICSF com o disposto no n. º2 do artigo 497.º do Código Civil segundo o qual “o direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advieram (…)”. A conclusão inversa seria inverosímil, na medida em que não faria sentido o legislador prever o exercício do direito de regresso, em termos especiais, só para a ocorrência de actuações positivas e deixar de fora a ocorrência de actuações negativas que, mais das vezes, podem ser tanto mais graves que as actuações positivas. A solução aqui avançada permite fazer respeitar a função pedagógico-preventiva do princípio da responsabilidade pessoal por parte dos agentes que actuam na esfera do BP por falhas que estes tenham cometido. É essa, aliás, a interpretação conforme com a Constituição, com isso respeitando o que se dispõe nos n.ºs 1 e 4 do artigo 271.º da CRP.

Em quinto e último lugar, encontramos as situações em que a autoridade de supervisão bancária actue licitamente, dentro do quadro de poderes jurídicos conferidos por lei, e, ainda assim, provoque danos à entidade regulada.

Note-se que o BP dispõe de poderes amplos no domínio das suas competências de supervisão, o que, em muitas situações, pode provocar ingerências que, embora lícitas, afectem a posição jurídica substantiva das entidades reguladas. Basta pensar nos casos em que, por exemplo, se exerçam poderes sancionatórios ou inspectivos, ou quando seja necessário efectuar-se buscas em qualquer local onde se desenvolve a actividade bancária do supervisionado, ou até quando haja “a violação dos direitos de defesa, quando no caso de instrução de processo de contra-ordenação, seja necessário proceder à apreensão do documentos, apreensão de documentos, apreensão ou congelamento de valores, etc.”26 Através destes exemplos facilmente se pode notar que, por vezes, poderão vir a público informações que afectem a credibilidade, o bom nome, a reputação e, muitas vezes até, o volume de negócios desenvolvido pela entidade regulada afectada. Deste modo, a actuação da entidade reguladora terá que ser criteriosa, devendo obedecer ao indispensável e estritamente necessário ao cumprimento da sua actuação - devendo actuar com prudência e discrição -, sob pena de a sua actuação ser considerada desproporcional 27 28. Assim, encontramo-nos plenamente de acordo com a posição assumida por FERNANDA MAÇÃS, que considera que perante casos pontuais em que se verifique a violação manifesta do princípio da proporcionalidade “se pode questionar se a entidade de supervisão não deverá ser responsabilizada pelos danos decorrentes do cumprimento dos seus deveres funcionais quando destes resultem danos especiais e anormais, nos termos e para o efeito da verificação dos pressupostos da indemnização pelo sacrifício (artigo 16.º da LRCEE)”29.

4. O âmbito dos beneficiários de uma indemnização resultante de actuação lesiva do Banco de Portugal

Importa agora abordar a questão essencial relativa à delimitação do núcleo possível de beneficiários que possam ter direito a uma indemnização por danos que lhes tenham sido causados em virtude de erros ou omissões decorrentes de falhas de supervisão. De um modo geral, podemos apontar, nestas circunstâncias, a existência de quatro potenciais sujeitos indemnizáveis: (i) supervisionados, (ii) os depositantes (iii) investidores (iv) accionistas.

Relativamente aos supervisionados, é unânime na doutrina que estes podem ser indemnizados em virtude de actuções perpetradas pela entidade reguladora que, de forma ilícita e culposa, lhes provoquem danos. Temos aqui em vista os casos típicos de actuações pouco prudentes levadas a cabo pelo regulador, através das quais se causem lesões à entidade regulada, designadamente atentando contra a sua credibilidade, bom nome e reputação30.

Questão diferente coloca-se a propósito da tutela indemnizatória que, porventura, caiba aos depositantes e investidores, em virtude de falhas na supervisão que lhes tenham provocado danos. A questão é tanto mais relevante quanto estejamos perante actuações no domínio da supervisão prudencial 31. As normas que regulam este tipo de supervisão visam essencialmente proteger o interesse público da estabilidade, solidez e confiança do sector financeiro32. Nestes casos, contudo, não podemos deixar de concordar com GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA que prefiguram na norma constitucional que tutela o sistema financeiro33 uma dimensão protectora dos direitos dos depositantes e dos investidores34.

Por fim, e não menos controversa, surge a questão de saber se existe uma tutela indemnizatória que beneficie os accionistas nos casos em que tenham sido afectados patrimonialmente em resultado de uma falha de supervisão. Este é um problema que envolve a questão prévia de saber se os danos puramente patrimoniais são indemnizáveis35.

Relativamente, aos danos puramente patrimoniais, importa tomá-los como sendo “aqueles em que há uma perda económica (ou patrimonial) sem que tenha existido prévia lesão de uma posição jurídica absolutamente protegida (v. g. um direito de personalidade ou um direito real)” 36. A questão que se coloca é a de saber se existe indemnizabilidade destes danos em sede delitual.

O problema pode colocar-se em concreto perante a ocorrência de danos causados a accionistas de um banco que, no papel de investidores, tenham de alienar as suas acções em condições objectivamente mais desvantajosas das que existissem na hipótese de não ter ocorrido uma falha de actuação do supervisor que tivesse provocado ou potenciado esse dano. Relativamente a este problema a doutrina tem-se dividido entre, (i) aqueles que negam a possibilidade de indemnizar os accionistas lesados caso haja uma falha de actuação do supervisor que contribua para a produção dos danos por eles sofridos e (ii) os que admitem a ressarcibilidade dos danos em sede indemnizatória, relativamente aos accionistas, em resultado de uma lesão patrimonial decorrente, ou potenciada por falhas de actuação do supervisor.

O cotejo de diversas posições doutrinárias revela a problematicidade desta questão:

(i.i) MENEZES CORDEIRO defende que os danos causados aos accionistas pelo regulador, em desrespeito a direitos fundamentais ou de personalidade, devem ser ressarcidos em sede de responsabilidade civil. Chega a esta conclusão aduzindo o argumento segundo o qual a sociedade deposita nas autoridades reguladoras um especial dever de confiança, exigindo-se da parte delas uma actuação cuidada e uma ponderação acrescida. Caso isso não aconteça, e havendo danos patrimoniais para os accionistas, estaremos perante um caso de responsabilidade civil para com a entidade reguladora 37.

(i.ii) PEDRO ALBUQUERQUE e MARIA LURDES PEREIRA, por sua vez, também admitem essa possibilidade; contudo a sua posição é defendida com apelo a três argumentos distintos:

i) A não aplicação do princípio do livre desenvolvimento da personalidade à actividade de gestão pública: entendem estes autores que “dificilmente se poderá sustentar que o livre desenvolvimento da personalidade do ente regulador deva ser neste contexto promovido em detrimento dos interesses (puramente) patrimoniais de terceiros (…)”; mais: “a aceitação da ressarcibilidade não implica neste caso nenhum entrave à dinâmica da actuação dos sujeitos na vida económica nem cerceia a circulação de riqueza”38;

ii) Gozando as autoridades reguladoras de uma ampla credibilidade e atendendo aos seus amplos poderes de ingerência na actividade das entidades supervisionadas, deve ser levada em linha de conta a sua forte capacidade de influenciar as decisões dos investidores ou, até, de levar ao desinvestimento, o que, naturalmente, envolve deveres e responsabilidades acrescidas 39;

iii) Por fim, defendem ainda que a informação encontra um estatuto especial no Código dos Valores Mobiliários. Deste modo, devem ser fornecidas, sempre que possível, informações completas, verdadeiras, claras e lícitas aos investidores. Uma vez que estas regras visam a protecção dos investidores então, elas, são classificadas como normas de protecção e, assim, qualquer violação das mesmas pode gerar responsabilidade por danos puramente patrimoniais. 40

(ii.i) Em sentido contrário, CALVÃO DA SILVA defende a não responsabilização das autoridades reguladoras independentes relativamente a danos puramente patrimoniais sofridos pelos accionistas. Por um lado, considera que defender a responsabilização de danos puramente patrimoniais não é a solução mais adequada, mais proporcionada e a mais justa. Por outro lado, considera que defender-se a responsabilização das autoridades reguladoras independentes nestas circunstâncias não corresponderia ao modo mais adequado à prossecução do interesse público envolvido na actividade de supervisão. Por fim, aduz-se ainda que defender-se a responsabilidade das autoridades reguladoras resultaria num duplo ressarcimento indevido dos sócios, na medida em que, estes últimos, ficariam abrangidos pela “indemnização para com a sociedade (indirectamente a favor dos sócios) pelos danos a esta causados por inobservância culposa de disposições legais destinadas à sua protecção e a indemnização para com os sócios” 41 42.

(ii.ii) No mesmo sentido, MENEZES LEITÃO considera que a indemnização aos accionistas é problemática, porquanto estes se apresentam como terceiros em relação à empresa lesada e, não obstante terem sofrido um dano, esse dano deve ser tratado como um dano reflexo. O autor acaba também por aderir ao argumento aduzido pelo autor supra, segundo o qual estaríamos em presença de um duplo ressarcimento. Por outra parte, e admitindo a possibilidade de responsabilidade civil das entidades reguladoras em virtude de omissão ou deficiência da actividade de supervisão, correspondendo esta uma situação uma violação de normas de protecção protegidas pelo artigo 483.º do Código Civil, considera, porém, que a atribuição da indemnização aos accionistas, nestas circunstâncias, se defronta ainda com o problema de os danos terem sido causados por um lesante principal distinto do regulador, sendo que nestas situações é indispensável apurar se a entidade reguladora foi a principal causadora do dano 43.

(ii.iii) Ainda nesta linha negatória, JORGE ANDRÉ SIMÃO refere a impossibilidade prática de se admitir que todos os accionistas estivessem legitimados a exigir uma indemnização, uma vez que os credores da obrigação de indemnização multiplicar-se-ia para um número incontrolável, “pondo em causa a manutenção da indemnização dentro de limites razoáveis, gerando os chamados “danos em cascata” 44; defende por isso ser quase impossível “aferir a existência de qualquer nexo de causalidade entre o acto da autoridade reguladora e aquele que produziu o dano decorrente da descida do valor das acções” 45. Conclui o Autor pela insusceptibilidade de responsabilização das autoridades reguladoras relativamente a prejuízos puramente patrimoniais ocorridos na esfera jurídica dos accionistas.

5. Conclusões

Das premissas elencadas no presente trabalho retiram-se, a finalizar, as seguintes conclusões:

1. Numa sociedade dominada pela economia de mercado, é fundamental que existam autoridades reguladoras independentes que exerçam os poderes de controlo necessários para garantir a estabilidade do sistema financeiro e também a defesa da posição jurídica dos clientes bancários.

2. Assim, o BP desempenha um papel decisivo relativamente à actividade de supervisão bancária. A sua actuação, entre outros propósitos, tem o alcance de controlar, corrigir e sancionar a actividade bancária quando ocorram situações irregulares, ou mesmo ilícitas.

3. Por vezes, o BP, por um conjunto variado de circunstâncias, falha no seu papel de supervisor. Nestas hipóteses, ter-se-á que verificar se o seu comportamento, activo ou omissivo, se enquadra dentro dos pressupostos da responsabilidade civil previstos no LRCEE ou no RGICSF.

4. A aplicação das regras do LRCEE ao BP revela dificuldades de regime particularmente sensíveis: considere-se, de modo especial, a dificuldade de se encontrar um nexo causal entre o facto e o dano, na responsabilidade in vigilando, quando aplicado à conduta omissiva da entidade reguladora que tenha contribuído para o dano de terceiros.

5. Ademais, está por definir, clara e inequivocamente, qual o círculo de beneficiários da indemnização por actuações ou omissões do BP.

6. Por fim, consideramos que talvez fosse conveniente que o legislador, num futuro próximo, elaborasse um diploma destinado exclusivamente à matéria da responsabilidade civil das autoridades reguladoras independentes.

Bibliografia

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* Mestrando em Direito Administrativo na Universidade Católica Portuguesa. E-mail: edmilson_conde@homail.com.

1 MENEZES CORDEIRO considera que a regulação deve ser entendia enquanto “acto e o efeito de regular, i.e., de estabelecer regras gerais e abstractas de conduta”, in Regulação económica e supervisão bancária, O Direito, 138.º (2006), II, cit., pág. 245.

2 O BP assume o papel de Banco Central Nacional e faz parte integrante do Sistema Europeu de Bancos Centrais - vide artigo 102.º da CRP e artigo 3.º da Lei n. º5/98, de 31 de Janeiro (doravante, LOBP) -, sendo-lhe ainda atribuída a natureza jurídica de autoridade administrativa independente, conforme decorre do artigo 1.º da LOBP.

3 Note-se que o sistema financeiro, aqui considerado, deve ser entendido no sentido amplo, ou seja, abrangendo o sector bancário, dos seguros e os valores mobiliários. Veja-se igualmente que o fim principal do sistema financeiro se encontra definido no artigo 101.º da CRP e tem como alcance “garantir a formação, a captação e a segurança das poupanças (…)”.

4 Não se pode deixar de recordar que os bancos desempenham um papel estrutural nosso modelo de sociedade global, na medida em que desempenham um papel central no desenvolvimento da economia de mercado, actuando nas mais variadas matérias, como por exemplo, a mobilização de poupanças ou o financiamento de investimentos. Assim, alertamos para o facto de a falência de um banco poder gerar o pânico nos mercados, provocando a desconfiança em relação a todo o sistema bancário, podendo até levar a que instituições bancárias que não se encontravam em crise, passem a ficar nessa posição, em razão da escassez de liquidez, criando-se assim um «efeito dominó». Também dá nota dessa preocupação FERNANDA MAÇÃS in Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, págs. 59 ss.         [ Links ]

5 Cfr. Secção 6 (1) do Kreditwesengesetz – KWG.

6 Para um desenvolvimento mais aprofundado desta matéria veja-se o estudo desenvolvido por MICHEL TISON in, Challenging the Prudential Supervisor: Liability versus Regulatory Immunity, Financial Law Institute, University of Gent, 2003. Disponível on-line em http://www.law.ugent.be/fli/wps/pdf/WP2003-04.pdf

7 Budesgerichtshof, de 15 de Fevereiro de 1979 (Wetterstein), NJW, 1979 e Budesgerichtshof, de 12 de Julho de 1979, 1879, cfr., MICHEL TISON (em nota de roda pé n.º 12), Challenging the Prudential Supervisor: Liability versus Regulatory Immunity, Financial Law Institute, University of Gent, 2003.

8 Sublinhe-se que, depois da revisão de 2014, o Acto Bancário alemão “Kreditwesengesetz – KWG”, na sua Secção 6, deixou de fazer menção à necessidade de a entidade supervisora actuar segundo o interesse público. O que, a nosso ver, poderá abrir, novamente, a porta a entendimentos jurisprudenciais que admitam a possibilidade de responsabilizar a autoridade supervisora por falhas de supervisão que causem danos a terceiros.

9 Este diploma reviu o anterior Banking Act de 2009.

10 Confronte-se a versão original do Banking Act de 2013 que, no seu Capítulo 4, Secção 40, (14), dispõe o seguinte: “(1) None of the following is to be liable in damages for anything done or omitted in the discharge, or purported discharge, of the Regulator's functions— (a) the Regulator; (b) any person (“P”) who is, or is acting as, an officer or member of staff of the Regulator; (c) any person who could be held vicariously liable for things done or omitted by P, but only in so far as the liability relates to P's conduct.;” e “(4) Sub-paragraph (1) does not apply— (a) if the act or omission is shown to have been in bad faith, or (b) so as to prevent an award of damages made in respect of an act or omission on the ground that the act or omission was unlawful as a result of section 6(1) of the Human Rights Act 1998”.

11 Cfr., FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n. º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 64.         [ Links ]

12 Refira-se que o n. º 2 do artigo 10.º da LRCEE estabelece uma presunção de existência de culpa leve quando haja a prática de actos jurídicos ilícitos. Por outra parte, a lei também exige a demonstração da ilicitude para os casos de culpa leve, conforme previsto no artigo 9.º LRCEE.

13 Cfr. artigo 7.º, n.º 1 do LRCEE.

14 Assim, FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 67.         [ Links ]

15 Cfr., FERNANDA MAÇAS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 67;         [ Links ] No mesmo sentido, CARLA AMADO GOMES, O Novo Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado, in A Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração por facto ilícito, pág. 36.         [ Links ]

16 Cfr.FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., págs. 66.         [ Links ]

17 Cfr. FERNANDA MAÇAS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 66.         [ Links ]

18 Cfr. FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág.67.         [ Links ]

19 Cfr. FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 67.         [ Links ]

20 Cfr. artigo 8.º, n.º 1 LRCEE.

21 Cfr. artigo 8.º, n.º 3 e artigo 6.º da LRCEE. Ainda a propósito do direito de regresso veja-se Tiago Serrão, in O direito de regresso na responsabilidade administrativa, Coimbra Editora, Coimbra, 2015.

22 Ainda que o direito de regresso possa ser exercido nos dois regimes jurídicos – LRCEE e RGICSF - a verdade, porém, é que o exercício do direito de regresso no RGICSF, por ser facultativo e estando dependente da existência de uma gravidade tal da conduta do agente que justifique o seu exercício, comporta, naturalmente, um exercício mais restrito, podendo inclusive nem sequer ser exercido em virtude de um não exercício legitimo, porquanto facultativo, por parte do BP. Ora, esta é uma situação em tudo mais vantajosa para o agente lesante comparativamente à sua sujeição ao exercício obrigatório do direito de regresso por parte do Estado conforme acontece nos casos de responsabilidade civil em casos de dolo ou culpa grave de acordo com o previsto no regime do LRCEE.

23 Neste sentido depõe FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., págs. 68 ss.         [ Links ]

24 Conforme faz notar RUI MEDEIROS a propósito do n.º 3 do artigo 10.º da LRCEE, o conteúdo útil deste preceito reside “na consagração expressa da aplicabilidade no âmbito da responsabilidade civil da Administração por factos ilícitos das presunções de culpa associadas ao incumprimento de deveres de vigilância previstas no Código Civil”, in AA.VV., Comentário ao Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, Universidade Católica, Lisboa, 2013, pág. 284.

25 Cfr. JOÃO RAPOSO, Novas fronteiras da responsabilidade civil extracontratual da Administração, CJA, n. º 58, (Jul - Ago), 2006, pág., 69.         [ Links ]

26 Cfr. FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 73.         [ Links ]

27 Assim, FERNANDA MAÇAS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., págs.73 – 74.         [ Links ]

28 Neste sentido, veja-se também as posições assumidas por PEDRO DE ALBUQUERQUE e MARIA DE LURDES PEREIRA que apelam à necessidade de a actuação da entidade reguladora, quando colida com direitos alheios, ter que ser exercida com respeito à boa fé. Faltado essa boa fé estar-se-ia perante um caso típico de abuso de direito – artigo 334.º do CC. Os autores concluem assim que a ingerência na esfera jurídica dos particulares quando desencadeada pela entidade reguladora deverá ter como limite de actuação o princípio da proporcionalidade in, A responsabilidade civil das autoridades reguladoras e de supervisão por danos causados a agentes económicos e investigadores (…), O Direito, 136.º, (2004), I, págs. 104 – 105; No mesmo sentido, MENEZES CORDEIRO, contudo o autor refere-se à necessidade de a actuação das entidades reguladoras – fazendo referência à Autoridade da Concorrência – não poderem ser exercidas com alarido, nem poderem exceder os limites necessários. Assim o autor faz também apelo ao princípio da proporcionalidade como limite de actuação das autoridades reguladoras, in Defesa da concorrência e direitos fundamentais das empresas, O Direito, 136.º, (2004), I, pág. 75.

29 Cfr. FERNANDA MAÇAS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 74.         [ Links ]

30 Assim, FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 71;         [ Links ] ibdem); MENEZES LEITÃO, A Responsabildiade Civil das Entidades Reguladoras, Estudos em homenagem ao Prof. Sérvulo Correia. - Coimbra, 2010. - Vol. 3, cit., pág. 119;         [ Links ] PEDRO DE ALBUQUERQUE e MARIA DE LURDES PEREIRA, A responsabilidade civil das autoridades reguladoras e de supervisão por danos causados a agentes económicos e investigadores (…), O Direito, 136.º, (2004), I, págs. 105 e ss;         [ Links ] CALVÃO DA SILVA, Mercado e Estado, Serviços de Interesse Económico Geral, Coimbra, Almedina, 2008, págs. 166 e ss;         [ Links ] MENEZES CORDERO, Defesa da concorrência e direitos fundamentais das empresas, O Direito, 136.º, (2004), I págs. 70 e ss.         [ Links ]

31 Veja-se que a supervisão prudencial tem como principal objectivo “controlar a segurança e a estabilidade das instituições de crédito em termos individualizados, analisando as suas contas e o cumprimento de rácios e limites pré-fixados, por forma a garantir «uma gestão sã e prudente» de cada instituição”. Assim, FERNANDA MAÇÃS, in Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., (nota rodapé 49), pág. 71.         [ Links ]

32 Cfr. FERNANDA MAÇÃS, Responsabilidade civil das entidades reguladoras, CJA, n.º 88 (Jul - Ago), 2011, cit., pág. 72.         [ Links ]

33 Cfr. artigo 101.º da CRP./.

34 Cfr. GOMES CANOTILHO/V. MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol.II, 4ª ed., Coimbra Editora, 2007, pág. 1082.         [ Links ]

35 Sobre este tema veja-se, CARNEIRO DA FRADA, Teoria da Confiança e Responsabilidade Civil, Coimbra, Almedina, 2004, págs 238 ss;         [ Links ] CARNEIRO DA FRADA e MARIA VASCONCELOS, Danos económicos puros ilustração de uma problemática, Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano: no centenário do seu nascimento. - Lisboa. - Vol. 2, 2006, págs. 151 ss;         [ Links ] ADELAIDE MENEZES LEITÃO, Norma de Protecção e Danos Puramente Patrimoniais, Almedina, 2007, págs. 259 ss.         [ Links ]

36 CARNEIRO DA FRADA e MARIA VASCONCELOS, Danos económicos puros ilustração de uma problemática, Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano: no centenário do seu nascimento. - Lisboa. - Vol. 2, 2006, pág 155.         [ Links ]

37 Cfr. MENEZES CORDEIRO, Defesa da concorrência e direitos fundamentais das empresas, O Direito, 136.º, (2004), I, pág. 76.         [ Links ]

38 Cfr. PEDRO DE ALBUQUERQUE e MARIA DE LURDES PEREIRA, A responsabilidade civil das autoridades reguladoras e de supervisão por danos causados a agentes económicos e investigadores (…), O Direito, 136.º, (2004), I, cit., pág. 119.         [ Links ]

39 Cfr. PEDRO DE ALBUQUERQUE e MARIA DE LURDES PEREIRA, A responsabilidade civil das autoridades reguladoras e de supervisão por danos causados a agentes económicos e investigadores (…), O Direito, 136.º, (2004), I, cit., pág. 125.         [ Links ]

40 Cfr. PEDRO DE ALBUQUERQUE e MARIA DE LURDES PEREIRA, A responsabilidade civil das autoridades reguladoras e de supervisão por danos causados a agentes económicos e investigadores (…), O Direito, 136.º, (2004), I, cit., págs. 125 ss.         [ Links ]

41 Cfr. CALVÃO DA SILVA, Mercado e Estado, Serviços de Interesse Económico Geral, Coimbra, Almedina, 2008, cit., págs. 171- 172.         [ Links ]

42 Contudo, o autor parece recuar na sua posição quando admite a possibilidade de, perante a actuação da empresa geradora dos danos, ser ainda possível corresponsabilizar a autoridade reguladora independente quando tenha falhado no seu papel de entidade vigilante. A justificação desta corresponsabilidade reside na legítima confiança depositada pelo público na supervisão estatal. Contudo, considera o autor, deve admite-se essa possibilidade a apenas e quando houver acções ou omissões graves (faute lourde) na supervisão, um pouco à semelhança da responsabilidade dos juízes, cfr., CALVÃO DA SILVA, Mercado e Estado, Serviços de Interesse Económico Geral, Coimbra, Almedina, 2008, cit., pág. 172.         [ Links ]

43 MENEZES LEITÃO, A responsabilidade Civil das Entidades Reguladoras, Estudos em homenagem ao Prof. Sérvulo Correia. - Coimbra, 2010. - Vol. 3, cit., pág. 121.         [ Links ]

44 Cfr. JORGE ANDRÉ CARITA SIMÃO, A Responsabilidade Civil das Autoridades Reguladoras, Revista de Concorrência e Regulação, Ano II, n.º 6, (Abr - Jun), 2011, cit., pág. 152.         [ Links ]

45 Cfr. JORGE ANDRÉ CARITA SIMÃO, A Responsabilidade Civil das Autoridades Reguladoras, Revista de Concorrência e Regulação, Ano II, n.º 6, (Abr - Jun), 2011, cit., pág. 152.         [ Links ]