SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.12 número2Determinação de forças actuantes em quebra-mares verticais e mistosErosão de dunas com os modelos XBeach e Litprof índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista de Gestão Costeira Integrada

versão On-line ISSN 1646-8872

RGCI vol.12 no.2 Lisboa jun. 2012

 

Dinâmica da paisagem e proposição de cenários ambientais: um estudo da planície costeira de Estância, Sergipe, Brasil*

Landscape dynamics and environmental scenarios: a study of Estancia coastal plain, Sergipe, Brazil

 

Anízia Conceição Cabral de A. Oliveira@, I, Rosemeri Melo e SouzaI

@Autor correspondente: aniziacaoliveira@gmail.com

IUniversidade Federal de Sergipe, Grupo de Pesquisa em Geoecologia e Planejamento Territorial GEOPLAN/UFS/CNPq, Av. Marechal Rondon, S/N, Pólo de Gestão/Pós-Graduação, sala 01. São Cristóvão, SE, Brasil.

 

RESUMO

Este trabalho objetivou desenvolver cenários ambientais para a Planície Costeira do município de Estância localizado na porção sul do Estado de Sergipe como subsídio ao ordenamento territorial. O estudo consistiu na compreensão de como se dá o funcionamento da paisagem a partir da análise dos seus sistemas componentes, da sua estrutura espacial e de suas modificações no tempo como alicerce para o desenvolvimento de uma proposta de uso recomendado, aqui designada como cenário de uso recomendado e, com base nele, o uso pretendido, considerado como cenário exploratório, cuja análise envolve as perspectivas de ocupação para o futuro a partir das consequências das opções sugeridas.
No intuito de propiciar as bases para o planejamento da ocupação da área estudada, desenvolveu-se, primeiramente, a delimitação e classificação de unidades e subunidades de paisagens com base em parâmetros relacionados à morfologia, às litoestruturas aliados aos aspectos da cobertura vegetal e do uso e ocupação do solo. Num segundo momento, foi realizada a identificação dos níveis de ocupação de cada compartimento por meio da análise das diversas formas de uso e ocupação do solo e dos agentes e processos físicoambientais mais atuantes.
Nesse contexto, identificados os distintos níveis de ocupação, estes relacionados a processos em sua maior parte de natureza degradante definidores das mudanças ambientais verificadas, puderam ser alcançadas a proposta de uso recomendado e, a partir da proposição, a análise das consequências para o funcionamento da paisagem litorânea em estudo.

Palavras-chave: Cenários Ambientais; Planejamento Ambiental; Planície Costeira.


ABSTRACT

This work aims to build environmental scenarios for the coastal plain of the Estância/Sergipe. The purpose of this study is in understanding how is the functioning of the landscape from the analysis its component systems, their spatial structure and its changes over time as the foundation for the development of two scenarios: recommended scenario and, on the based thereon, the intended use, called of exploratory scenario, which involves the prospects for the future from of the consequences of the suggested options.
In order to provide the basis for the planning of the occupation of the area studied, initially, we developed the definition and classification of units and subunits of landscapes based on morphological parameters allied to aspects of the vegetation and of the use and occupation the soil. Secondly, the analysis of the various levels of the occupation of each compartment was made by analysis of the various forms of land use and agents and environmental processes most active in the study area.
In this context, after identifying the different levels of occupation, the proposition of the scenarios through different descriptions of possible future events and their consequences for the functioning of the coastal landscape could be achieved.

Keywords: Environmental Scenarios; Environmental Planning; Coastal Plain

 

1. Introdução

Cenários são instrumentos de análise que permitem o conhecimento da evolução da paisagem a partir da interpretação dos rumos e das velocidades das transformações no espaço. Por possibilitarem a reflexão sobre as consequências das opções de usos e formas de ocupação do território, ajudam a orientar as ações atuais e futuras do homem.

A relação entre a proposição de cenários e o conhecimento das mudanças na paisagem é intrínseca. Em estudos ambientais, a investigação das alterações numa determinada paisagem, movidas tanto por processos naturais quanto por processos de influência antrópica, ou simultaneamente por ambos, automaticamente reporta-se à perspectiva dinâmica.

Considerando que o estudo da dinâmica da paisagem permite o conhecimento de sua evolução, de maneira geral, pode-se dizer que investigar a evolução da paisagem é tratar da análise de cenários.

Destacando o viés do planejamento, Santos (2004: p.50) enfoca que cenários nada mais são do que "interpretações de momentos em uma paisagem dentro de uma escala temporal, visando auxiliar agentes de planejamento a compreender a dinâmica da área e os problemas ambientais consequentes".

Santos (2004: p.51) trata dos cenários numa ótica que considera os anseios dos agentes envolvidos e vislumbra as dimensões passado, presente e futuro, cada uma permitindo interpretações particulares de fatos: do passado - o que foi (cenário passado); do presente - o que é (cenário real) e do futuro - o que será se medidas não forem tomadas (cenário futuro tendencial), como deveria ser (cenário futuro ideal, frente às potencialidades e restrições biofísicas), como gostaria que fosse (cenário futuro desejado) e o que pode realmente ser (cenário futuro possível, alternativo, frente às restrições biofísicas, às aspirações e às limitações socioeconômicas e administrativas).

No tocante à perspectiva do futuro, Santos (2004: p.53) ressalta que os cenários futuros representam "simulações de diferentes situações, prognóstico das condições ambientais em um tempo mais ou menos próximo".

Conforme Freitas Filho (2001: p.9) quanto à tipologia de cenários futuros, são comuns três classificações:

  • Cenário Tendencial que abarca a dimensão extrapolativa (onde chegaremos?), ou seja, o futuro é a extrapolação do passado com caráter determinista; refere-se ao que tende a acontecer, apresenta a evolução futura com base em projeções de tendências históricas, dando noção de continuidade;
  • Cenário Exploratório - cuja dimensão envolve a noção de complexidade, acaso e rupturas, refere-se ao que pode acontecer, o futuro tem possibilidades alternativas de evolução dada pela conjugação de forças do presente e do passado, (onde poderemos chegar?); e
  • Cenário Normativo - em que a dimensão se baseia no futuro que pode ser construído, diz respeito ao que deve acontecer segundo os valores dos envolvidos com a construção do cenário, apresenta aspectos desejáveis e pode se confundir com a visão de futuro desejada, (onde queremos chegar?).

O Ministério do Meio Ambiente em seu documento Projeto Orla: manual de gestão (Zamboni & Vilanova, 2006), reconhecendo a existência de vários cenários, destaca o tendencial e o desejado. Já Oliveira & Rodrigues (2009) dão ênfase ao cenário tendencial considerado pelos autores como as possibilidades de transformações que a região de estudo estará propensa, sejam elas de origem natural ou antrópica e o cenário exploratório, o qual procura analisar as consequências das opções escolhidas.

Sobre metodologias para cada proposta de cenários Costa e Nascimento (2007: p.50) afirmam que o cenário tendencial faz uso de projeções matemáticas e econométricas literalmente baseadas no passado, o cenário exploratório, por sua vez, precisa extrapolar as tendências e lidar com mudanças do ambiente, já um cenário normativo, conta mais com os valores dos participantes do que com indicações históricas ou fatos portadores de futuro.

Bolós (1992) expõe que para a construção de cenários devem ser conhecidos da paisagem objeto de estudo: a direção e velocidade do desenvolvimento natural dos elementos bióticos e abióticos do geossistema; as mudanças dos elementos do subsistema geoecológico (elementos abióticos e bióticos) sob a influência das atividades econômicas da sociedade; o desenvolvimento dos elementos antrópicos dentro do sistema socioeconômico.

Em se tratando de uma abordagem direcionada à avaliação ambiental, os estudos baseados em cenários prospectivos devem oferecer um quadro fundamental da inter-relação entre fatores e processos dinâmicos atuantes na paisagem proporcionando, a partir da análise dos componentes estruturais e fatores condicionantes das mudanças, o estabelecimento de premissas e um caminho concreto de decisões voltadas ao melhor planejamento e gestão dos ambientes estudados.

A Zona Costeira é marcada pela convergência de diversos usos e rápido dinamismo de ocupação. Historicamente, a Zona Costeira vem-se caracterizando por uma diversidade de atividades vinculadas a vários tipos de usos como o portuário, o agrícola, o de cunho industrial, usos relacionados ao transporte, à exploração petrolífera, ao valor paisagístico como o turístico, o comercial, o recreacional que fazem reunir uma densa infraestrutura e predominar fortes zonas de concentração populacional.

Assim como são múltiplas as atividades, derivadas da alta densidade populacional, da expansão urbana e industrial descontrolada, da especulação imobiliária e da intensificação do turismo são também significativos as pressões e os conflitos delas decorrentes.

Em se tratando da elevada conflitualidade presente nestas áreas, Dias et al (2009: p.4) ressaltam que "(...) interesses portuários competem com as atividades tradicionais (pesca artesanal, agricultura, etc.), interesses econômicos competem com a conservação ambiental, turismo de massas compete com a manutenção dos valores culturais das populações indígenas, obras fixas de proteção costeira competem com os valores paisagísticos naturais, esportes radicais competem com as práticas balneares, atividades industriais competem com o turismo de Natureza".

Usos indevidos e formas de ocupação desordenadas quando afetam o equilíbrio de um dos ambientes pertencentes à Zona Costeira acabam comprometendo o sistema costeiro como um todo. Tais usos e ocupações impróprios vêm provocando a descaracterização de muitos sistemas biofísicos, transformando ambientes, antes em condições de certa estabilidade em paisagens degradadas, cujos impactos gerados interferem diretamente na qualidade ambiental da Zona Costeira.

Na Zona Costeira de Sergipe elementos naturais e humanos condicionam a existência de unidades de paisagem que se particularizam conforme as suas características de composição e funcionamento. No Litoral Sul do estado, sobretudo no município de Estância, ambientes naturais marcantes vêm sendo degradados por conta de atividades humanas diferenciadas cujo padrão dispare de ocupação determina a rapidez e a intensidade das transformações.

Do ponto de vista da apropriação do solo, o Litoral Sul apresenta uma estrutura não consolidada, mas que vem se definindo pelo crescente processo de especulação imobiliária. As atividades de veraneio, marcadas por uma certa sazonalidade, aos poucos vêm sendo substituídas pelo adensamento de equipamentos humanos. Tais atividades conjugadas ao desenvolvimento da atividade turística vêm induzindo, ao longo do tempo, empreendimentos imobiliários em quase toda a porção sul provocando a transformação rápida do espaço.

Nesse contexto, considerando a problemática que envolve os ambientes biofísicos sob a atuação de processos de ocupação desordenada e tendo em vista que cresce cada vez mais a preocupação com o planejamento da ocupação territorial, a regulação dos usos no Litoral com base no nível de fragilidade ambiental dos sistemas e preservação da integridade dos ambientes naturais destaca-se como orientação para estudos que focalizem a proposição de cenários como instrumentos favoráveis ao direcionamento de ações visando o ordenamento territorial.

Como ferramenta de planejamento e numa ótica voltada ao ordenamento dos usos, o desenvolvimento de cenários oferece subsídios efetivos para o processo de determinação de pontos de maiores e menores restrições ao uso, dos limites de resiliência dos ambientes afetados por determinado tipo e intensidade de degradação visando à indicação de alternativas de manejo.

É nesse sentido que o presente trabalho objetivou construir cenários representativos das mudanças verificadas na paisagem costeira do município de Estância (Figura 1) pertencente ao Litoral Sul de Sergipe a partir da identificação e caracterização dos elementos e processos físicoambientais mais atuantes e da análise das formas de uso e ocupação e dos diversos níveis de ocupação delas derivados.

 

2. Materiais e métodos

No presente trabalho foram desenvolvidos dois tipos de cenários: o cenário recomendado, proposta de uso recomendado mediante a análise da configuração atual do espaço pelo padrão vigente de uso e ocupação e cenário exploratório, baseado em Oliveira & Rodriguez (2009), designado para se referir ao uso pretendido, com a finalidade de indicar o uso sustentável frente às perspectivas de ocupação para o futuro.

O desenvolvimento dos cenários (cenário recomendado e cenário pretendido) foi nesta pesquisa possibilitada primeiramente pela delimitação e classificação de unidades e subunidades de paisagens com base em parâmetros relacionados à morfologia (caracterização da forma), às litoestruturas e à fisiologia (caracterização dos atributos físicos) aliados aos aspectos da cobertura vegetal e do uso do solo, o que permitiu, num segundo momento, a identificação dos níveis de ocupação de cada compartimento.

A compartimentação das unidades de paisagem da área de estudo utilizou como critério-chave a base de dados de geomorfologia do Atlas Digital sobre Recursos Hídricos de Sergipe (SEPLAN/SRH, 2004). As informações sobre geologia, solos, altimetria, importantes por subsidiarem as análises, também foram extraídas do referido Atlas.

A partir desta classificação oficial é que puderam ser compartimentadas as subunidades de paisagem a partir da associação das características geomorfológicas, com as geológicas, pedológicas, de declividade do terreno, bem como do uso e cobertura vegetal resultando, mediante a integração das informações relacionadas a estes fatores, diferentes categorias de ambientes.

Assim, para a elaboração do mapa de unidades e subunidades da área de estudo, cada polígono foi gerado por meio da combinação dos referidos temas, sendo desenvolvido, para isso, um inventário das características físicas, biológicas e de uso do solo através da identificação e caracterização dos agentes e processos físicoambientais mais atuantes na paisagem, sendo que, para a divisão em subunidades foi adotado como critério-chave a identificação dos níveis de ocupação do solo mediante a análise dos tipos e processos de uso em cada unidade da Planície Costeira.

Destaque se faz ao fato de que as diferentes unidades geomorfológicas têm níveis de ocupação diferentes e essa diferenciação origina-se da relação entre uso do solo e as características morfológicas dos atributos físicos que comumente são determinantes para a existência dos tipos de uso e ocupação encontrados.

Com base na identificação e análise do padrão de uso e ocupação em que se consolida a organização do espaço foram analisados os processos geoecológicos degradantes da Planície Costeira do município de Estância por meio do enfoque funcional proposto por Rodriguez, Silva e Cavalcante (2004) que contempla a análise da dinâmica funcional da paisagem. Segundo estes autores (p. 124), o enfoque funcional objetiva explicar "como a paisagem é estruturada, quais são as relações funcionais de seus elementos, por que está estruturada de determinada maneira (relações genéticas ou causais) e para que está estruturada de certa forma (quais as funções naturais e sociais)".

O enfoque funcional proposto pelos autores é fundamentado nos principais marcos teórico-conceituais:

  • O entendimento de que na paisagem, todos os seus elementos cumprem funções determinadas e participam de forma peculiar no seu processo de gênese.
  • A busca de uma análise integrada dos componentes antrópicos e naturais a partir de uma caracterização socioeconômica e geoecológica.
  • A sustentação da necessidade de esclarecer os elementos substanciais dos subsistemas, que refletem o sistema das inter-relações externas das paisagens, que dominam sua essência e sua vida. Difícil

Este enfoque fornece procedimentos analíticos que permite descobrir quais as mudanças espaço-temporais ocorrem e quais poderão ocorrer na paisagem, traduzindo-se numa abordagem adequada ao estudo da dinâmica paisagística, alicerce para a constituição de cenários ambientais.

Oliveira & Rodrigues (2009: p.306) afirmam que a proposição de cenários ambientais baseia-se na análise e representação de situações de evolução de um ambiente, levando-se em conta o tempo, espaço, interação entre variáveis e a lógica intuitiva e que essa metodologia é de grande importância para o planejamento ambiental, já que analisa em uma perspectiva futura a eficácia das diretrizes propostas.

Nesse contexto, baseado nas definições destes autores, dois tipos de cenários foram desenvolvidos:

  • cenário recomendado que, com base nas alterações detectadas na paisagem, no estado de degradação atual e de acordo com a análise da conformidade do uso com a legislação ambiental vigente, retratou as mudanças na paisagem e estabeleceu para cada tipo de problema, quais devem ser as medidas de ordenamento.
  • cenário exploratório que, de acordo com os autores, é criado a partir da proposta de uso recomendado no cenário anterior. Configura-se como um cenário pretendido, pois procurará analisar as consequências das opções sugeridas, tendo em vista a consideração das propostas de uso recomendado, referindo-se a possibilidade de futuro numa perspectiva que vislumbra o uso sustentável. Para o desenvolvimento deste cenário foi considerado como horizonte temporal o intervalo de 10 anos.

O mapa de uso e ocupação do solo e os mapas de unidades e subunidades de paisagem foram resultantes da análise da interpretação de ortofotos em escala de 1:10.000, cedidas pela Secretaria de Planejamento (SEPLAN/SE) obtidas em cobertura aerofotogramétrica ocorrida em 2003.

O mapa de uso e ocupação do solo foi desenvolvido a partir de uma chave de interpretação baseada nas definições de Meirelles et al. (1999) que considera as variações de cores, textura, forma, padrões de drenagem e relevo.

Tal mapa serviu de base para a confecção do mapa de unidade e subunidades de paisagem, o qual apresenta os níveis de ocupação para cada compartimento da Planície Costeira.

Com base na proposta metodológica de Rodriguez, Silva e Cavalcante (2004), foi desenvolvida a análise da interação entre a dinâmica natural e os processos degradantes relacionados aos usos de cada unidade e subunidade de paisagem e assim propostas classes genéricas sobre o nível de modificação dos sistemas naturais.

O Quadro 01 mostra a associação entre as classes referentes à intensidade de modificação dos sistemas naturais, aos níveis de ocupação, bem como, entre os níveis de degradação baseados em Rodriguez et al (2004).

A proposta de cenário recomendado foi desenvolvida mediante a análise do estado de degradação e da concordância do uso com a base legal vigente.

Em âmbito federal, as seguintes regulamentações jurídicas foram consultadas: a Resolução CONAMA Nº 001, de 23 de janeiro de 1986 que dispõe sobre a Avaliação de Impacto Ambiental; a Resolução CONAMA Nº 303, de 20 de março de 2002 que estabelece parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente; o Código Florestal (Lei Nº 4.771/65) e o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei Nº 7.661/88).

Na esfera estadual foi examinada a Lei Nº 5.858 de 22 de março de 2006 que dispõe sobre a Política Estadual do Meio Ambiente e institui o Sistema Estadual do Meio Ambiente.

Em se tratando da legislação municipal, orientaram a análise o Plano Diretor do Município de Estância/SE (Lei Nº 31/2010); o Código Municipal de Meio Ambiente (Lei Nº 18/2008) e a Lei Nº 28/2010 que institui diretrizes para o Parcelamento do Uso do Solo.

A identificação dos níveis de ocupação de cada unidade e subunidade de paisagem da Planície Costeira de Estância e dos níveis de degradação de cada compartimento permitiu a classificação em categorias de ações compatíveis com a situação ambiental de cada classe de uso recomendado (Quadro 02).

 

 

Assim, conforme a indicação destas ações, o cenário de usos recomendados para a paisagem da Planície Costeira de Estância contemplou quatro classes:

  • De Preservação: classe onde o objetivo principal é a preservação. A prioridade é a manutenção da integridade funcional dos ambientes naturais devido à importância biológica/ecológica. Abrange estratégias de ações preventivas em conformidade com o disposto na legislação ambiental. Incluem-se nesta zona as APPs (cursos d'água, mangues, dunas, praias, restingas). Também fazem parte desta classe os ambientes com alto grau de instabilidade geomorfológica, apresentando risco à ocupação, como exemplo as áreas com relevo fortemente ondulado, propensas a processos erosivos. Envolve a delimitação das áreas non aedificandi atendendo ao disposto na legislação.
  • De Conservação: classe onde o objetivo maior é a conservação. Contudo, as áreas pertencentes a esta classe podem ser utilizadas para outros fins. Recomenda-se restringir a ocupação como forma de garantir, dentre outros fatores, a permanência da cobertura vegetal natural. A característica fundante desta classe é a conciliação do desenvolvimento com as vocações das unidades paisagísticas respeitando-se a capacidade de suporte.
  • De Recuperação: classe em que se recomenda, conforme Oliveira e Rodrigues (2009: p.311), a recuperação das principais funções dos ambientes naturais, nesta classe constam "áreas que foram afetadas por processos antrópicos, que necessitam de recuperação para posteriormente se enquadrarem em alguma categoria de proteção ou conservação acima propostas". Dá-se ênfase a recuperação das áreas dotadas de proteção legal. Os problemas ambientais existentes requerem ações para manutenção e melhora da qualidade ambiental.
  • Passível de ocupação (ocupação orientada): classe criada para abranger as áreas que podem ser ocupadas tendo como referência os níveis básicos de sustentação da qualidade ambiental. Os usos devem ser orientados. Abrange áreas geomorfologicamente estáveis não apresentando risco à ocupação.

Já o cenário exploratório é um subproduto da proposta de uso do cenário recomendado. Evidencia as consequências dos acontecimentos desencadeados a partir das classes e ações indicadas no cenário anterior. Como horizonte temporal, foi considerado o intervalo de 10 anos para o seu desenvolvimento.

As classes estipuladas foram as seguintes:

  • Área de Preservação Permanente: É constituída por todas as áreas antes pertencentes à classe Preservação do cenário recomendado. Adota as determinações definidas em lei sobre as categorias de proteção da vegetação.
  • Paisagem com dinâmica ambiental preservada: Diz respeito à classe Conservação. A principal característica é quanto à conservação de todas as áreas pertencentes a esta categoria do cenário recomendado que no cenário exploratório (uso pretendido) possibilitou a manutenção das características e funções naturais dos ambientes biofísicos.
  • Paisagem melhorada: Diz respeito à classe Recuperação proposta para o cenário recomendado. No horizonte temporal adotado, as áreas pertencentes a esta classe estarão em conformidade com a legislação ambiental.
  • Ocupação rarefeita: Classe criada para enquadrar a faixa de terra ao longo da Rodovia Estadual SE-10 que deverá conter baixo adensamento, pois se trata de uma classe que integra a categoria Paisagem com dinâmica ambiental preservada, antes Zona de Conservação.
  • Ocupação consolidada: Classe antes representada pelas áreas pertencentes a classe Passível de ocupação. Envolve a consolidação da ocupação por localidades, pastagens e cultivos, mas como indicado no cenário recomendado abrangerá o controle da qualidade ambiental.

Mapas temáticos foram produzidos a partir do software ArcGIS. Para dar suporte ao inventário dos elementos da paisagem e ao trabalho de vetorização das categorias de uso da terra, dos níveis de ocupação, das classes de estado ambiental e dos cenários propostos, levantamentos bibliográficos e cartográficos foram feitos, bem como, realizados trabalhos de campo para checagem das informações e verificações "in loco" das classes mapeadas.

Para uma melhor explanação do que se propõe para o presente artigo, o fluxograma a seguir apresenta o caminho analítico adotado neste estudo.

 

3. Resultados

3.1. Níveis de Degradação das Unidades de Paisagem da Planície Costeira de Estância-SE

A Planície Costeira do município de Estância possui uma área de 20.403,22 hectares e de acordo com SEPLAN/SRN (2004) encontra-se subdividida em quatro compartimentos geomorfológicos aqui considerados como unidades de paisagem, são elas: Planície Fluviomarinha, Terraço Fluviomarinho, Terraço Fluvial e Terraço Marinho (ver mapa de compartimentos geomorfológicos, Figura 2).

A partir desta classificação é que puderam ser compartimentadas as subunidades de paisagem mediante a associação das características geomorfológicas, com as geológicas, pedológicas, de declividade do terreno, bem como do uso e cobertura vegetal adotando-se como critério-chave a identificação das formas de uso e ocupação do solo (Figura 3) e análise dos processos de uso e níveis de ocupação do solo em cada unidade da Planície Costeira.

Nas unidades e subunidades da Planície Costeira de Estância possuidoras de diferenciadas caracterizações biofísicas são encontrados diferentes tipos de uso que definem distintos níveis de ocupação relacionados a processos em sua maior parte de natureza degradante, os quais, ao interagirem com os processos da dinâmica natural dos ambientes biofísicos determinam variados níveis de degradação.

Nesse contexto, a caracterização biofísica e antrópica de setores homogêneos, a qual considera cada setor como uma unidade que apresenta um padrão semelhante de formas de relevo, solo, vegetação, alteração antrópica, discernível na paisagem e distinto em relação às unidades vizinhas, permite identificar a partir dos níveis de ocupação encontrados quatro unidades de paisagem e sete subunidades (Figura 4 e Quadro 03).

 

3.2. Planície Fluviomarinha

A unidade de paisagem Planície Fluviomarinha abrange uma área de 8654,3 ha o que equivale a 42,41% da área total da Planície Costeira e subdivide-se em três compartimentos:

  1. Planície Fluviomarinha com nível de ocupação baixo onde ocorrem superfícies aplainadas abaixo dos 10 metros compostas em sua maior parte por áreas de mangue;
  2. Planície Fluviomarinha situada em faixa contínua paralela à linha de costa transitando em área de Terraço Marinho com dominância de relevo plano abaixo dos 10 metros e nível de ocupação muito baixo;
  3. Planície Fluviomarinha com nível de ocupação alto em área de transição com zonas de Tabuleiros Costeiros a noroeste da Planície Costeira onde ocorrem relevos ondulados, dissecados em colunas e interflúvios tabulares e áreas com altitudes superiores até 40 metros.

O primeiro compartimento possui 3.738 hectares que representam 43,19% da área total da Planície Fluviomarinha onde predominam superfícies aplainadas com altitudes abaixo dos 10 metros resultantes da acumulação fluvial e sujeitas a inundações periódicas. A confluência do Rio Piauí e do Rio Fundo e o complexo estuarino Piauí/Fundo/Real definem a presença de muitos cursos d'água concentrados mais ao sul da planície.

No tocante à geologia há a dominância de depósitos marinhos e continentais costeiros datados do Quaternário. Em Sergipe são verificadas formações de idade holocênica e pleistocênica. São encontrados depósitos datados do Holoceno recobrindo conjuntos mais antigos principalmente localizados em porções mais internas da Planície Costeira.

A alternância de períodos glaciais e interglaciais acompanhada de importantes flutuações do nível do mar no Quaternário ocasionaram regressões e transgressões da linha de costa que, ao contribuírem com os processos de deposição e erosão, geraram feições e ambientes dotados de grande dinamicidade no que se refere à constante capacidade de transformação existente.

Como componente da Planície Costeira, a Planície Fluviomarinha é marcada por estuários e manguezais que são ambientes costeiros com vida efêmera em constante transformação correspondendo a terrenos de sedimentos quaternários de aspecto transicional, influenciados, por um lado, pelos agentes continentais e, por outro, pelos agentes marinhos.

Prevalecem neste compartimento solos indiscriminados de mangue, ricos em matéria orgânica, mal drenados e de coloração escura, que apresentam altas concentrações de sais solúveis e textura argilo-siltosa. Há presença em menor quantidade de espodossolo no limite com o Terraço Flúvio Marinho, apresentando-se excessivamente drenado com baixo poder de armazenamento de água e de nutrientes devido à textura arenosa.

Predomina nesta subunidade, com 75,30% da área total, a vegetação de mangue caracterizada por grande homogeneidade fisionômica ocupando as bordas dos rios em espaços bem delimitados do estuário com maior expressividade na desembocadura onde aparecem manchas mais preservadas. De acordo com Carvalho e Fontes (2006) as três principais espécies encontradas em associação na área são Rhizophora mangle, Laguncularia racemosa e Avicennia germinas.

No que se refere aos tipos de uso e ocupação do solo há existência de aquicultura pontual ao sul da Planície Fluviomarinha em área de transição com o Terraço Fluvial. Já no limite com o Terraço Marinho aparecem manchas de áreas desmatadas com solo exposto e cultivos mais concentrados nas margens da Rodovia Estadual.

Isso faz configurar um baixo nível de ocupação com 20,13% da área total. Todavia, com o avanço de infraestruturas exemplificadas pela construção de estradas e pontes e de empreendimentos imobiliários visando atender ao incremento do turismo na região há uma crescente tendência de ocupação nesta subunidade.

Esta subunidade da Planície Fluviomarinha apresenta uma dinâmica natural marcada por um regime de inundação controlado pela influência do ciclo das marés ao longo dos canais fluviais. Como marca desses ambientes, atuam processos de sedimentação e acumulação de matéria orgânica.

São encontrados solos halomórficos nas áreas mais baixas. Relevos planos não costumam favorecer processos de dissecação. Porém, apesar do predomínio de baixas altitudes, nesta subunidade ocorrem solos com característica instável, sujeitos a inundações periódicas, fazendo com que a suscetibilidade à erosão passe a ser fator decisivo para a qualificação da dinâmica natural deste compartimento.

Apesar disso, mesmo havendo a presença de aquicultura pontual, manchas de solo exposto, cultivos concentrados nas margens da Rodovia Estadual SE-100, todos referindo-se a pontos de desmatamento que denotam a erradicação da vegetação nativa, há o predomínio da cobertura vegetal original. Os manguezais associados à presença de canais aparecem nesta subunidade em grandes manchas.

Sendo assim, esta subunidade de paisagem apresenta sistemas naturais parcialmente modificados, cujos processos degradantes que causam mudanças na estruturação da paisagem são identificados como de intensidade leve a moderada caracterizando um nível pouco degradado, ver Quadro 01 que mostra a associação entre as classes referentes à intensidade de modificação dos sistemas ambientais, aos níveis de ocupação e aos níveis de degradação, estes adaptados de Rodriguez et al (2004).

A segunda subunidade de paisagem Planície Fluviomarinha abrange uma faixa contínua paralela à linha de costa com 1036,3 hectares, cerca de 12% da área total, transitando em área de Terraço Marinho apresentando dominância de relevo suave, situado abaixo dos 10 metros.

Possui a mesma característica geológica do compartimento anterior com predomínio de depósitos marinhos e continentais costeiros. É comum neste compartimento a ocorrência de campos de dunas móveis e fixas intercaladas por baixios interdunares e áreas úmidas ocorrendo neossolos quartzarênicos em toda a sua extensão e formação vegetal de restinga com perfil arbóreo – arbustivo.

As dunas, os baixios e as áreas úmidas associadas à cobertura vegetal de restinga que se distribui em toda a extensão deste compartimento compõem o sistema biofísico da paisagem e totalizam 84,25% de área.

Em contrapartida, no tocante ao uso, um nível de ocupação muito baixo com percentual de 15,75% é encontrado em virtude da presença de cultivos pontuais e de algumas ocupações de veraneio localizadas em zonas interdunares ao sul da Praia do Saco (Povoado Saco do Rio Real). São identificadas casas nas proximidades da faixa de praia que vem sendo atingidas pelo avanço do mar.

Nesta segunda subunidade da Planície Fluviomarinha ocorre uma dinâmica de inundação dominada pelas depressões interdunares em que as áreas úmidas são periodicamente alagadas favorecendo condições para o habitat de algumas espécies de animais.

Essa dinâmica natural é interrompida em muitos trechos a partir da existência pontual de ocupação por cultivos e habitações principalmente em faixa próxima da linha de costa, quando ocorrem ambientes de dunas.

O nível de ocupação muito baixo marca um ambiente não modificado ou com modificação leve. Assim, seguindo as associações presente no Quadro 01 que as classes referentes à intensidade de modificação dos sistemas ambientais, aos níveis de ocupação e aos níveis de degradação, estes adaptados de Rodriguez et al (2004), o nível de degradação identificado é sem ou muito pouco degradado.

A terceira subunidade, com 3880 ha e percentual de 44,83% da área total da Planície Fluviomarinha, refere-se às áreas próximas à transição com a zona de Tabuleiros Costeiros. Os Tabuleiros Costeiros são superfícies planas situadas na transição das Terras Altas com a Frente Marinha resultantes da erosão dos terrenos da Formação Barreiras sendo, muitas vezes, interrompidos pelos estuários dos rios que atingem o litoral e frequentemente utilizadas por plantações de coco - da - baía e pastagem.

Nesta subunidade, ocorrem relevos ondulados, dissecados em colunas e interflúvios tabulares com altitudes entre 10 e 40 metros. Há a presença de muitos canais de primeira ordem e rios como o Rio Biriba e o Rio Fundo. São incluídas neste compartimento as áreas inundáveis que passam grande parte do ano alagadas por sofrerem influência fluvial.

As características geológicas favorece o predomínio de sedimentos marinhos e continentais costeiros, composto por material sedimentar formado por arenito, arenito conglomerático, argilito arenoso apresentando associação a noroeste com sedimentos do Grupo Barreiras em que afloram solos calcários pertencentes à Formação Cotinguiba (Cretáceo Superior) no fundo de vales dos tabuleiros dissecados.

O tipo de solo com maior ocorrência é o argissolo vermelho – amarelo localizado na região de contato entre os Tabuleiros Costeiros (Grupo Barreiras) com a Planície Costeira. Também são encontrados solos halomórficos nas áreas mais baixas onde domina a influência dos cursos dos rios.

Os manguezais associados à presença de canais aparecem nesta subunidade em pequenas manchas. São raras também as áreas com formações pioneiras de Floresta Ombrófila dotadas de espécies arbóreas de grande porte.

Pode-se dizer que esta situação decorre das formas de uso do solo marcadas pela intensa utilização agrícola, pela presença de construções, loteamentos e habitações populares e de áreas desmatadas, no geral, destinadas às pastagens.

Os cultivos são, em sua maioria, de caráter permanente e estão relacionados à cocoicultura ocorrendo em vastas áreas da planície e em superfícies de inundação sazonal, principalmente nas margens dos corpos d'água e áreas úmidas adjacentes.

As áreas desmatadas são áreas onde a vegetação, seja ela de mangue, de restinga ou de floresta, encontra-se suprimida apresentando pastagens extensivas e trechos com cultivos em seu entorno sendo comumente tomadas por estradas e caminhos.

As moradias não são atendidas por serviço de infraestrutura básica. Há necessidade de melhorias nas condições habitacionais pela implantação de serviços de água, energia e esgotamento sanitário, bem como de equipamentos e áreas de lazer de uma forma que prioritariamente seja compatível com a qualidade ambiental da área.

Todos estes fatores possibilitam a identificação de um nível alto de ocupação com usos antrópicos que abrangem 60,45% deste compartimento da Planície Fluviomarinha.

Assim como acontece no primeiro compartimento da Planície Fluviomarinha, uma dinâmica de inundação gera processos de sedimentação e acumulação de matéria orgânica ao longo dos cursos fluviais. Esta subunidade é constituída por áreas com altitudes que chegam a 40 metros na região de contato entre os Tabuleiros Costeiros (Grupo Barreiras) com a Planície Costeira, sendo o argissolo vermelho – amarelo o tipo de solo com maior ocorrência.

Sabe-se que relevos ondulados, a depender da influência da porosidade e permeabilidade do solo, apresentam uma maior suscetibilidade à erosão. A utilização agrícola nas superfícies de inundação sazonal, a presença de vastas áreas desmatadas destinadas a pastagens principalmente em margens dos corpos d'água e a ocupação por casas construídas nas proximidades de rios, provenientes de formas de desmatamento indiscriminado da vegetação natural de mangue, acabam acarretando problemas como erosão do solo e das margens dos canais, alteração da drenagem, perda de nutrientes do solo e poluição do solo e da água.

Esta situação promove declínio parcial da estrutura espacial e funcional dos sistemas e eliminação paulatina das funções ecológicas fazendo predominar ambientes fortemente modificados.

3.3. Terraço Fluviomarinho

A unidade Terraço Fluviomarinho representa uma área de 4304,8 ha, 21,09% da Planície Costeira, e situa-se entre a Planície Fluviomarinha e o Terraço Fluvial. Tal compartimento também apresenta nível alto de antropização com 60,30% da área tomada por ocupação humana.

Nesta unidade há o predomínio de relevo suave com altitudes menores que 10 metros apenas havendo valores superiores, mas não ultrapassando os 30 metros, na área de transição com o Terraço Fluvial. Esta unidade apresenta sedimentos marinhos e continentais costeiros, não consolidados, de natureza e granulometria variadas com dominância de areia, argila e sedimentos eólicos.

Predomina um tipo de solo, o halomórfico (indiscriminado de mangue) nas áreas de transição com a Planície Fluviomarinha, apesar de grande ocorrência de espodossolo.

Esta unidade é recortada pelo Rio Fundo e canais distributários. Por fazer limite com a Planície Fluviomarinha e por abranger longo trecho marginando os cursos fluviais, apresenta porções de vegetação de mangue e algumas manchas mais ao sul de Floresta Ombrófila densa que, ora permanecem em seu estado mais primário, ora indicam níveis baixos de antropização. São pequenas porções de cobertura vegetal original que resistem aos processos de uso e ocupação do solo.

Quanto às formas de uso e ocupação, neste compartimento existem muitos terrenos preenchidos por cultivos, áreas desmatadas com solo em exposição, além de pastagens, na sua maioria de caráter extensivo. Devido à ocorrência de extensas áreas destinadas à pecuária (cerca de 25%) e cultivos principalmente de Cocos nucifera são comuns manchas de vegetação em estado médio e avançado de degradação.

Esta unidade da Planície Costeira é marcada pelo Rio Fundo e por canais distributários cujas presenças dão destaque a paisagem deste compartimento. No que se refere à dinâmica natural, o relevo plano e o regime de oscilação das marés promovem a acumulação de sedimentos areno-argilosos finos. Inundações periódicas favorecem condições adequadas para a geração de habitats para animais, influindo diretamente na reprodução de espécies da avifauna.

Entretanto, a dinâmica natural vem sendo afetada por processos degradantes. A ocorrência de áreas com pastagens e cultivos em quase toda extensão alteram a paisagem natural, sobretudo, pelo desmatamento das margens do Rio Fundo.

A vegetação original de mangue vem sendo substituída por uma cobertura vegetal esparsa o que acarreta um processo erosivo e poluição do solo e da água e a degradação da qualidade dos mananciais.

Diante disso, o Terraço Fluviomarinho é identificado como um nível alto de ocupação e enquadra-se como unidade de paisagem degradada em que a perda parcial da estrutura espacial e funcional deste compartimento dá lugar à desestruturação da integridade biofísica dos ambientes naturais.

3.4. Terraço Fluvial

A outra unidade componente da Planície Costeira é a unidade Terraço Fluvial. Com 1520,72 ha e um percentual de 7,45% configura-se como a menor unidade da Planície Costeira, contudo, nela aparecem as maiores altitudes predominando relevo entre 20 e 30 metros em quase toda margem das lagoas Grande e Funda chegando a 50 metros a oeste já em porção mais interna, no limite com a Planície Fluviomarinha e as superfícies dissecadas dos rios.

Esta unidade forma uma faixa contínua situada entre o Terraço Fluviomarinho e o Terraço Marinho onde são encontrados depósitos marinhos e continentais costeiros e sedimentos não consolidados compostos por areia, argila, sedimento eólico. Constitui-se por depósitos aluvionares mais antigos e em nível mais alto do que o atual conformando-se como relevo-testemunho de um período de evolução da Planície Costeira relacionado a antigas planícies de inundação.

Quanto aos tipos de solos destacam-se os neossolos quartzarênicos e o espodossolo, sendo que ao sul, nas proximidades da desembocadura, e a oeste há pequena presença de solos halomórficos, havendo também pequena mancha de argissolo vermelho-amarelo.

A cobertura vegetal original praticamente inexiste nesta unidade da Planície Costeira, apenas algumas poucas manchas de formação arbóreo-arbustiva de restinga compondo setores de paleodunas fixas em relevo suave ondulado, ondulado a forte ondulado.

Tomada por áreas compostas em sua maior parte por pastagens e cultivos (86,55% da área total), esta unidade é preenchida por estradas e caminhos em toda a sua extensão. Destaque para grande área com cultivo de coco ao sul. No limite inferior, em setor de transição com a Planície Fluviomarinha, aparecem viveiros, sobretudo, relacionados à produção de camarão.

Assim, a ocupação por cultivos, pelas fazendas de camarão e pela presença de atividade pecuária de natureza extensiva perfazem uma área de 88.87% caracterizando o Terraço Fluvial como unidade com nível muito alto de ocupação.

Nesta unidade de paisagem os fatores relacionados ao uso e ocupação do solo são os que interferem na dinâmica natural dos agentes continentais responsáveis pela estrutura e funcionamento desta unidade.

Tais fatores estão representados pelas pastagens e cultivos presentes em toda a extensão. O alto grau de antropização decorre de impactos ambientais associados à ocupação de cultivos e pastagens e de extração de areia irregular em áreas de paleodunas, caracterizando comumente a perda irrecuperável de ambientes com importante potencial biológico e paisagístico.

O preenchimento de grandes áreas por plantações de coco (Cocus nucifera) através do desmatamento altera as propriedades do solo aumentando a exposição do terreno ao poder da erosão. Também a presença de atividade pecuária de natureza extensiva favorece o aparecimento de processos erosivos, já que a substituição da cobertura nativa por cultivos anuais torna os solos mais susceptíveis à erosão laminar.

Em se tratando do nível de degradação, encontra-se um nível muito degradado.

3.5. Terraço Marinho

A paisagem costeira de Sergipe é marcada por terraços marinhos que, de acordo com Fontes (2007), são, em geral, antigos depósitos de origem marinha, com formas tabulares e topos planos, geralmente com cotas altimétricas inferiores a cinco metros, que foram soldados à Planície Costeira.

A unidade de paisagem Terraço Marinho que com 5.923,4 ha representa 29,03% da área total da Planície Costeira foi subdividida em dois compartimentos:

  1. Terraço Marinho com nível de ocupação médio formado por superfícies planas dominadas por baixios alagados e cordões litorâneos regressivos dispostos de forma paralela à linha de costa;
  2. Terraço Marinho com nível médio de ocupação tendo o predomínio de superfícies praiais, de antedunas, de dunas móveis e baixios interdunares.

A primeira subunidade é a do Terraço Marinho marcado por superfícies aplainadas dominadas por áreas de restinga, baixios inundáveis e cordões litorâneos regressivos paralelos à linha de costa.

Este compartimento apresenta 4174 ha e abrange 70,46% da unidade Terraço Marinho. Possui grande trecho que faz limite com as Lagoas Funda e Grande. São encontradas, além das lagoas permanentes, muitas zonas úmidas que sofrem influência dos períodos de maior pluviosidade.

Quase metade da área, mais precisamente 49,70%, é composta por vegetação de restinga que se caracteriza como associação perenifólia, pouco densa, com variadas espécies arbóreo-arbustivas com destaque para o cajueiro (Anacardium occidentale), murici (Byrsonima sp.), mangabeira (Hancornia speciosa) e se distribui de forma esparsa em muitos trechos, sendo entremeada por cordões litorâneos em forma de faixas de solo arenoso esbranquiçado que se expõe quando da ausência de cobertura vegetal, intercalados por baixios que alagam no período mais chuvoso.

De acordo com Neto et al. (2004), cordões litorâneos são barreiras arenosas com feições alongadas paralelas à linha de costa, totalmente isolados do continente (ilhas barreiras) ou soldados a ele por uma das extremidades (pontais arenosos) a linha de costa. Essas feições podem isolar lagunas costeiras, sedimentadas ou não por canais que permitem a circulação da água no ciclo das marés entre a laguna e o mar aberto.

Em Sergipe, tais depósitos arenosos são considerados como areias litorâneas regressivas e apresentam-se descontínuos em muitos setores pela migração dos campos de dunas ou por algum mecanismo de ocupação antrópica.

Nesta subunidade ocorrem sedimentos inconsolidados, com variação granulométrica e material sedimentar areno-argiloso e de sedimento eólico. Predominam espodossolos tendo também a presença de neossolos quartzarênicos ocupando margens das referidas lagoas.

Quanto ao uso e ocupação do solo, há cultivos permanentes de coco-da-baía presentes de forma bem distribuída e associados muitas vezes às pastagens e a prática de agricultura familiar de subsistência em sítios e chácaras composta, em sua maior parte, por cultivos temporários de frutíferas somando no total 33,48% da área. Presença também de casas e estabelecimentos comerciais em toda a extensão da Rodovia Estadual e margens da Lagoa Grande.

Destaques para os povoados Riboleirinha, Porto do Mato e Saco do Rio Real, localidades do município de Estância onde aparecem as áreas de maior adensamento, sendo encontradas nas suas imediações áreas desmatadas com solo exposto, caminhos e estradas completando a paisagem.

Os povoados Riboleirinha e Porto do Mato, localizados em porções mais interiores do Terraço Marinho são formados por habitações populares. Na Praia do Saco o processo de ocupação é antigo e remete ao núcleo inicial de povoamento. Compõe terrenos nas proximidades da linha de costa e é onde se localizam as construções de alto padrão com proprietários detentores das rendas mais altas. As casas de veraneio, em sua maioria, ocupam de forma irregular áreas próximas ou sobre os campos de dunas móveis.

Em praticamente todas as localidades, é notória a deficiência na oferta de saneamento básico. Problemas com o esgotamento sanitário, abastecimento de água, coleta dos resíduos sólidos são frequentes. A coleta de lixo não é eficiente, os destinos mais comuns dados aos resíduos são a queima e o lançamento em terrenos baldios ou em vias públicas.

Muitos residentes captam água de poços semiartesianos, uma vez que, o abastecimento por rede geral ainda não abrange toda a população dos povoados. A água proveniente da perfuração de poços não recebe nenhum tratamento e apresenta alta concentração de ferro possuindo cor e odor característicos.

Os usos e as formas de ocupação encontrados neste compartimento do Terraço Marinho totalizam 45.59% da área enquadrando-o no nível médio de ocupação.

Esta subunidade de paisagem dominada por cordões litorâneos com nível de ocupação médio apresenta cultivos com predomínio de coqueirais de forma bem distribuída evidenciando o processo agrícola na região. A população dos povoados, principalmente do Porto do Mato e Saco, em sua maioria, sofre com a ausência de oferta de rede de esgoto, água e pavimentação evidenciando problemas ambientais como a contaminação do solo e dos lençóis freáticos por fossas rudimentares e resíduos sólidos e contaminação das águas superficiais pela emissão de efluentes nos canais.

Quanto ao nível de degradação, as formas de uso e ocupação existentes, cujas interferências provocam uma desestruturação da paisagem, fazem caracterizar sistemas naturais medianamente modificados a modificados identificados pela perda parcial da estrutura espacial e funcional, apesar de ainda conservarem a capacidade de recuperação ao estado original. Ocorre um nível médio de degradação com predomínio de processos pouco degradantes a degradantes.

A segunda subunidade do Terraço Marinho possui 1749,4 ha e 29,53% em relação à área total sendo caracterizada pela presença de dunas móveis e em processo de fixação e por superfícies com formações praiais e de antedunas distribuídas ao longo da linha de costa.

Em Sergipe, sobre os terraços marinhos holocênicos da Planície Costeira encontram-se as gerações de dunas recentes divididas em conjuntos mais internos, já fixas e do tipo parabólico e, bordejando o litoral, do tipo barcanas (Bittencourt et al. 1982). São constituídas de sedimentos arenosos, bem selecionados. As dunas parabólicas estão fixadas pela vegetação e ocorrem na parte mais interna dos terraços marinhos holocênicos.

Nesta subunidade da Planície Costeira de Estância encontram-se tipos de relevo suave ondulado, ondulado e forte ondulado. Há relevo plano com cotas altimétricas menores que 10 metros, marcado por praias que acompanham a orla marítima. Valores acima de 10 metros aparecem em porções de dunas semifixas com altitude não superior aos 20 metros. No caso das dunas estabilizadas, estas ocorrem intercaladas com as dunas móveis nas proximidades da praia ou mais recuadas em direção ao continente.

Em toda a extensão desta subunidade há presença de zonas interdunares, baixios periodicamente alagados dependentes das condições de pluviosidade.

Depósitos marinhos e continentais costeiros, compostos por sedimentos inconsolidados e bem selecionados são características geológicas desta subunidade. Há presença de neossolos quartzarênicos ocupando de forma contínua a zona praial. Este tipo de solo apresenta cor clara e esbranquiçada, constituído basicamente de quartzo, muito profundo, excessivamente drenados e de baixa fertilidade natural.

Nos ambientes de praia e de dunas embrionárias a cobertura vegetal inclui espécies psamófilas como a salsa-da-praia (Ipomoea pescaprae) em áreas de associação entre praias e antedunas. Em setores de dunas móveis, há o predomínio de vegetação perenifólia de restinga com perfil arbustivo, em setores de dunas fixas ou em fase de estabilização encontra-se vegetação de restinga arbóreo-arbustiva, estas sofrem processos pedogenéticos que favorecem a fixação de recobrimento vegetal em sua superfície.

No tocante ao uso há uma densidade média de habitação principalmente nas porções nordeste (Abaís) e sul (Povoado Saco do Rio Real). Na Praia do Abaís cresce o número de imóveis destinados à segunda residência. São comuns dunas e zonas interdunares alteradas (32,11% da área), pois são alvos da especulação imobiliária pelo avanço da ocupação de veraneio, crescente expansão de arruamentos e loteamentos.

Na Praia do Saco muitos lotes chamam atenção pelo tamanho da propriedade e por se localizarem em áreas de dunas. A inexistência de um campo dunar pleno acontece também pela barreira de casas, tráfego motorizado sobre praia e dunas, e turismo desordenado.

Destacam-se como grande ameaça aos sistemas dunares instalações comerciais situadas à beira-mar. Na área mais visitada por banhistas presenciam- se bares voltados para o lazer, porém com precárias instalações.

Práticas de recreação, lazer, turismo pontual e esporádico nas áreas de dunas móveis são comuns. Aliado a isso, uma dinâmica imobiliária impulsionada pelo avanço da segunda residência e infraestrutura de médio porte (iluminação pública, torres de telefonia, ruas asfaltadas) vem se manifestando de forma crescente. Toda esta situação aliada à presença de alguns cultivos expõe para esta subunidade um nível médio de 42,83% de ocupação.

Atuam, atrelados à dinâmica natural, processos de acresção e acumulação de sedimentos, colonização de espécies psamófilas nos setores de antedunas, progradação dos sedimentos favorecendo, com isso, o desenvolvimento e evolução da morfologia dunar. Os baixios interdunares, ambientes integrados aos sistemas dunares, interrompem a continuidade das feições e são dependentes do regime pluviométrico alagando-se periodicamente quando ocorre a subida do lençol freático.

Contudo, o ritmo e a densidade de ocupação nas Praias do Saco e Abaís impõem limitações à dinâmica natural dos sistemas biofísicos presentes neste compartimento da Planície Costeira.

Fatores de ameaças ao sistema dunar e às áreas de baixios interdunares estão representados pela ocupação por construções e infraestrutura humana principalmente nas áreas de antedunas; pelo turismo pontual e esporádico nas áreas de dunas móveis; por uma dinâmica imobiliária impulsionada pelo avanço da ocupação de veraneio e por manchas de cultivos e áreas desmatadas.

Esta subunidade é alvo da especulação imobiliária, do avanço da ocupação de veraneio, e da crescente expansão de loteamentos. A infra-estrutura turística é considerada como um indicador que vem impondo limitações à dinâmica natural dos ambientes dunares do Litoral Sul de Sergipe, uma vez que, a intensificação das atividades turísticas vem promovendo desmonte de dunas móveis para loteamentos, residências secundárias e hotéis. O interesse pelo desenvolvimento do turismo no Litoral de Sergipe parte principalmente de empresas hoteleiras que visam o estabelecimento de grandes complexos de hotéis (resorts).

Tais fatores geram graves problemas ambientais, a saber: acúmulo de resíduos sólidos a sotavento das dunas, remobilização de material nos campos de dunas decorrentes do desmatamento, deposição de esgotos "in natura" em corpos d'água, bloqueio da alimentação no sentido praia-duna e consequente erosão na zona de praia em virtude do déficit de sedimentos por conta das barreiras antrópicas, comprometimento dos processos de recomposição dunar e perda significativa de sua capacidade evolutiva, etc.

São pressões que indicam fortes mudanças na estruturação dos sistemas naturais. A paisagem medianamente modificada a modificada ainda conserva a capacidade de recuperação, porém apresenta um nível de degradação de pouco degradado a degradado. A estabilidade natural modifica-se progressivamente, como consequência, ocorre uma perda parcial da estrutura espacial e funcional com eliminação paulatina das funções ecológicas.

A compartimentação da Planície Costeira do município de Estância em unidades e subunidades de paisagem, por considerar a associação entre as características geomorfológicas, geológicas, pedológicas, bem como da vegetação, seus componentes geoecológicos e as descontinuidades espaciais resultantes das interferências de ordem antrópica possibilita um melhor entendimento da configuração da paisagem em termos de elementos e fatores envolvidos na sua estruturação.

 

4. Cenário recomendado

A identificação dos níveis de ocupação de cada unidade e subunidade de paisagem da Planície Costeira de Estância e a análise dos processos degradantes em cada compartimento permitiu o desenvolvimento de cenários como alternativa de uso para os diversos problemas socioambientais identificados na área de estudo.

Com subsídio ao ordenamento territorial que visa à compatibilização das necessidades do homem, relativas à ocupação e ao uso do solo, com a capacidade de suporte dos ambientes naturais este trabalho objetiva a proposição de um conjunto de ações, aqui enquadradas como classes componentes da proposta de cenário recomendado (Figura 5).

Tais classes estão elencadas a seguir:

Classe de Preservação

Abrange a manutenção da dinâmica e funções naturais com atividades compatíveis com estratégias de ações preventivas em conformidade com o determinado na legislação ambiental.

As áreas propostas para esta classe envolvem na unidade Planície Fluviomarinha todas as áreas de mangue localizadas nas margens dos cursos fluviais. Esta classe também engloba assim como as áreas de dunas, nascentes, áreas de mata ciliares ainda não afetadas pela ocupação humana.

Dentro da unidade Terraço Fluviomarinho estão incluídas nesta classe a preservação das margens do Rio Fundo e áreas de manguezal a fim de evitar a degradação e assoreamento do sistema fluvial.

No Terraço Fluvial inserem-se as áreas compostas pelas margens das lagoas Funda e Grande buscando, dentre os fatores relevantes, a proteção da diversidade das espécies de animais e vegetais.

No Terraço Marinho enquadra-se a vegetação original de restinga quando localizada, de acordo com o disposto na legislação federal (Resolução CONAMA 303, de 20/03/02), em faixa mínima de trezentos metros, medidos a partir da linha de preamar máxima ou em qualquer localização ou extensão, quando recoberta por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues. Também constituem essa classe as lagoas permanentes e de regime estacional, além dos sistemas de dunas embrionárias, móveis e em processo de fixação.

Destaque para a necessidade urgente de ações que visem conter o problema da ocupação indevida por casas de veraneio nas proximidades da faixa de praia em áreas de antedunas, tendo em vista que, tais tipos de intervenções na dinâmica natural destes ambientes alimentam os efeitos da erosão marinha.

Classe de Conservação

Classe onde o objetivo maior é a conservação, podendo haver formas restritas de ocupação desde que por meio de controle rigoroso e de maneira a respeitar a capacidade de suporte dos ambientes naturais. As formas de uso e ocupação devem ser compatíveis com a conservação da qualidade ambiental.

As porções pertencentes a esta classe compreendem na unidade Planície Fluviomarinha as áreas úmidas sujeitas à inundação periódica e os baixios interdunres. São áreas compostas em sua maioria por terrenos inundáveis localizados principalmente nas proximidades dos canais fluviais. São áreas importantes para a manutenção das áreas de preservação permanente. Estas áreas também estão presentes na unidade Terraço Fluviomarinho sendo importantes para a conservação do equilíbrio dos ecossistemas componentes da paisagem.

No Terraço Fluvial recomenda-se o controle do uso agrícola em áreas mais acidentadas a fim de conservar o solo contra os efeitos da erosão. Em áreas planas as restrições quanto à ocupação são menores, porém nas áreas mais elevadas, por conta da instabilidade do solo, deve-se coibir instalações humanas a fim de evitar riscos à ocupação. Deve-se assim buscar a compatibilização da atividade agrícola, considerando critérios adequados de uso e conservação com base nas reais vocações do território.

No Terraço Marinho as áreas úmidas aparecem em forma de baixios interdunares. Há existência de corpos d'água e superfícies inundáveis localizadas entre cordões em área de restinga onde deve haver controle da qualidade da água para conservar as condições de vida da fauna e flora locais. Recomenda-se não apenas a restrição, mas sim a proibição de construção de habitações nos terrenos naturalmente encharcados, bem como a novas ocupações e parcelamentos em áreas de alto valor ecológico para a conservação destes ambientes.

Classe de Recuperação

Classe em que se recomenda a recuperação das áreas onde ocorrem manchas de áreas desmatadas, de solo exposto e cultivos, devendo por isso haver recuperação da vegetação original, sobretudo nas margens dos rios da Planície Fluviomarinha.

Principalmente na unidade Terraço Fluvial que abrange áreas atualmente ocupadas por pastagens, por localidades, cultivos recomenda-se a recuperação da vegetação nativa das áreas desmatadas. Também a proibição de extração irregular de areias e construção de moradias nas margens dos cursos d'água visando à recuperação das porções de terreno degradadas.

Recomenda-se a recuperação da mata ciliar dos canais distributários, das áreas compostas por vegetação em estágio médio e avançado de degradação encontradas no Terraço Fluviomarinho e da vegetação original de restinga pertencente ao Terraço Marinho.

Nas áreas formadas por superfícies inundáveis deve-se investir na implantação de infraestrutura viária e de drenagem capazes de suportar determinado grau de adensamento, sendo que os terrenos, ou parte deles, mais encharcados não poderão ser ocupados com área construída.

Visando a recuperação das condições de equilíbrios dos sistemas biofísicos é indicada a proibição de instalações humanas nas margens das lagoas Grande e Funda, de forma a coibir a implantação de loteamentos e o consequente aterro.

A recuperação da vegetação em torno das lagoas é de fundamental importância, bem como a proibição de abertura de ruas e ampliação de loteamentos principalmente nas áreas de preservação permanente, pois podem afetar processos naturais como os de acresção e formação de dunas e de escoamento superficial entre as zonas de cordões.

Classe passível de ocupação (ocupação orientada)

Abrange as áreas que podem ser ocupadas. Entretanto, deve-se abarcar o uso controlado, com ênfase na qualidade ambiental. Envolve as áreas tomadas por localidades, pastagens e cultivos com ocupação já estabelecida que não se encontram nas zonas de preservação, conservação e recuperação estando relacionadas à expansão agropecuária e de consolidação urbana.

A deficiência na oferta de saneamento básico é notória em praticamente todas as localidades. Assim, em se tratando da implantação de infraestrutura urbana deve-se priorizar o saneamento ambiental com implantação de fossas sépticas adequadas às condições locais e oferta eficiente de abastecimento de água, coleta de lixo, bem como melhorias habitacionais.

 

5. Cenário exploratório

Baseado nas definições de Oliveira e Rodrigues (2009) é apresentado o cenário exploratório (Figura 6) como subproduto da proposta de uso do cenário recomendado. Como recorte temporal, foi considerado o intervalo de 10 anos para o desenvolvimento deste cenário. As classes estipuladas são as seguintes:

 

Área de Preservação Permanente

É constituída por todas as áreas antes pertencentes à classe Preservação que segue as determinações sobre as categorias de proteção da vegetação definidas em lei.

Em 2021 estarão preservadas as áreas de mangue localizadas nas margens dos cursos fluviais, as nascentes, as matas ciliares, bem como as margens das lagoas, as áreas cobertas por vegetação original de restinga, as lagoas permanentes e de regime estacional que servem de refúgio para espécies migratórias da ave-fauna, além das dunas embrionárias, móveis e em processo de fixação.

A proteção destas áreas mediante a proibição da ocupação evitará processos de degradação como assoreamento do sistema fluvial e problemas como o da erosão marinha relacionados à localização indevida de casas de veraneio e estabelecimentos comerciais nas áreas ambientalmente frágeis como de praias e de antedunas.

Em se tratando da preservação dos sistemas dunares, tem-se a garantia de que os processos naturais de fornecimento sedimentar, de acresção, de desenvolvimento das feições estarão mantidos para promoverem a consequente evolução do campo.

Paisagem com dinâmica ambiental preservada

Refere-se à classe Conservação. Mantidas as áreas pertencentes a esta categoria do cenário recomendado puderam ser conservadas as características e funções naturais dos ambientes biofísicos.

Com a conservação dos terrenos e baixios inundáveis, o controle da ocupação do solo a partir de parcelamentos ambientalmente planejados e do uso agrícola principalmente em áreas de relevo mais acidentado, haverá a conservação do solo contra os efeitos da erosão, conservação das condições de vida da fauna e flora locais, manutenção das áreas de preservação permanente e do equilíbrio dos ecossistemas componentes da paisagem.

Em 2021 as atividades vinculadas ao uso residencial, comercial e turístico desenvolvidas de forma restrita e planejada não interferirão na qualidade ambiental e causarão uma baixa interferência na dinâmica natural dos ambientes com alto grau de conservação pela alta capacidade de resiliência.

Paisagem melhorada

Diz respeito à classe Recuperação proposta para o cenário recomendado. No horizonte temporal adotado, as áreas pertencentes a esta classe estarão em conformidade com a legislação ambiental.

As ações para evitar a degradação das áreas com cobertura vegetal original, somadas à recuperação da vegetação nativa das áreas desmatadas por cultivos e pastagens dentro do que rege a legislação, sobretudo da mata ciliar dos rios da Planície Fluviomarinha e da vegetação original de restinga encontrada no Terraço Marinho, permitirá, ao longo dos 10 anos, a recomposição da vegetação, antes em estágio médio e avançado de degradação, e o seu enquadramento no estado em que predominam as condições de estabilidade.

A proibição de instalações humanas impactantes nas margens das lagoas Grande e Funda e a recuperação da vegetação do entorno possibilitará a regeneração natural da cobertura vegetal e conservação dos ecossistemas.

O controle da ocupação dos terrenos naturalmente inundáveis de forma a garantir a permeabilidade permitirá escoamento natural intracordões evitando com isso riscos à ocupação.

Ocupação rarefeita

Classe que abrange toda a margem da Rodovia Estadual SE-10. Criada para enquadrar a faixa de terra ao longo da rodovia que deverá conter baixa adensamento de construções e população residente, pois se trata de uma classe que integra a categoria Paisagem com dinâmica ambiental preservada.

Os terrenos que fazem parte desta classe devem apresentar uma ocupação rarefeita com paisagens levemente modificadas pela atividade humana com baixo potencial de impacto.

O estímulo à ocupação de baixa densidade dá-se de forma a garantir a permanência da vegetação original e a conservação de áreas com alto valor ecológico como brejos, restingas, dunas e lagoas.

Ocupação consolidada

Classe que apresenta áreas consolidadas compostas por localidades, pastagens e cultivos. Seguindo as indicações propostas na Classe Passível de ocupação definida para o cenário recomendado, haverá a consolidação das áreas predominantemente residenciais com ampliação ou implantação de infraestrutura, oferta de áreas de lazer, equipamentos e serviços urbanos.

Apesar da menor exigência quanto ao nível de modificação pela atividade humana em comparação com as outras classes, a estratégia de ação corretiva e de controle da qualidade ambiental estará presente nas formas de uso e ocupação.

 

Conclusões

A compartimentação da Planície Costeira do município de Estância em unidades e subunidades de paisagem possibilitou um melhor entendimento da configuração da paisagem em termos de elementos e processos envolvidos por meio da identificação dos níveis de ocupação e dos problemas característicos mais importantes do espaço costeiro permitindo, com isso, a compreensão de certas especificidades frente aos limites e potencialidades de cada unidade.

Assim, a compartimentação em unidades de paisagem possibilitou a compreensão dos fatores que caracterizam a dinâmica de funcionamento da Planície Costeira da área de estudo, no que se refere à associação entre os componentes naturais e antrópicos envolvidos na configuração de sua estruturação possibilitando, com isso, a proposição de alternativas de uso para os diversos níveis de fragilidades ambientais.

Considerando fatores como as práticas de uso da terra, os níveis de degradação decorrentes, o desrespeito à legislação e a consequente mudança da paisagem foi desenvolvida uma proposta de uso recomendado (cenário recomendado) mediante a análise da configuração atual do espaço pelo padrão vigente de uso e ocupação. Baseado nesta proposta desenvolveu-se, a partir de Oliveira e Rodriguez (2009), o cenário exploratório (designado para se referir ao uso pretendido, com a finalidade de indicar o uso sustentável frente às perspectivas de ocupação para o futuro), o qual compreende o horizonte temporal de 10 anos.

Estas proposições, apresentadas como procedimentos para o planejamento do meio físico, norteiam o reconhecimento das prioridades de ação permitindo contribuir com a orientação dos usos em função do controle das pressões antrópicas e de proposições que não comprometam a integridade biofísica.

Assim, a compreensão de como se dá o funcionamento da paisagem a partir da análise dos seus sistemas componentes, da sua estrutura espacial e de suas modificações no tempo foi necessária para o desenvolvimento do cenário de uso recomendado e, com base nele, o cenário pretendido.

Tendo em vista que os critérios utilizados no ordenamento dos usos e na gestão costeira comumente desconsideram as capacidades de reações e evoluções dos ambientais naturais urgem propostas de estudos deste tipo.

 

Bibliografia

Bittencourt, A.C.S.P.; Dominguez, J.M.L.; Martin, L.; Ferreira, Y.A. (1982) - Dados preliminares sobre a evolução paleogeográfica do Rio São Francisco.-SE/AL, durante o quaternário: influências da variação do nível do mar. IV Simpósio do Quaternário do Brasil, p. 49-68., ABEQUA, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.         [ Links ]

Bolos, M. (org) (1992) - Manual de ciência del paisaje. Teoria, métodos y aplicaciones. 273p., Ed. Masson, Barcelona, Espanha. ISBN: 9788431105952.         [ Links ]

Carvalho, M.E.S.; Fontes, A.L. (2006) - Estudo ambiental da zona costeira sergipana como subsídios ao ordenamento territorial. Revista Geonordeste (ISSN 1518-6059), ano XV (2):10-39, Núcleo de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil. Disponível em http://200.17.141.110/pos/geografia/geonordeste/index.php/GeoNordeste/article/view/69/5        [ Links ]

Costa, H.A.; Nascimento, E. (2007) - Cenários para o turismo no Brasil 2007-2010: análise da consistência metodológica e plausibilidade dos cenários. Caderno Virtual de Turismo (ISSN: 1677-6976), 7(3):46-65. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Disponível em http://www.ivt.coppe.ufrj.br/caderno/index.php?journal=caderno&page=issue&op=view&path%5B%5D=25        [ Links ]

Dias J.A.; Carmo, J.A.; Polette, M. (2009) - As Zonas Costeiras no contexto dos Recursos Marinhos. Revista de Gestão Costeira Integrada / Journal of Integrated Coastal Zone Management 9(1):3-5. Disponível em http://www.aprh.pt/rgci/pdf/RGCI-168_Prefacio.pdf        [ Links ]

Fontes, A.L. (2007) - Relevo e solos. In: V.L.A. França & M.T.S. Cruz (coord.), Atlas Escolar Sergipe: espaço geo-histórico e cultural, pp.69-82, Editora Grafset. João Pessoa, PB, Brasil. ISBN: 8587872451.         [ Links ]

Freitas Filho, A. (2001) - A metodologia de construção de cenários: conceitos básicos. Workshop para prospecção em C&T, pp.1-25, Brasília, DF, Brasil.         [ Links ]

Meirelles, M.S.P.; Becker, B.; Egler, C.; Miranda, M.; Bragança, P.C.O.; Santos, U.P.; Campos, M.L. (1999) - Metodologia para elaboração do Zoneamento Ecológico- Econômico em áreas com grande influência antrópica. Embrapa Solos, Circular Técnica nº 4, ISSN 1517-5146, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Disponível em http://www.cnps.embrapa.br/publicacoes/pdfs/circular_tecnica_4_1999_metod_zee.pdf        [ Links ]

Neto, J.A.B.; Ponzi, V.R.A.; Sichel, S.E. (org.) (2004) - Introdução à Geologia Marinha. 279p., Editora Interciência, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. ISBN: 8571930988.         [ Links ]

Oliveira, P.C.E; Rodrigues, S.C. (2009) - Utilização de cenários ambientais como alternativa para o zoneamento de bacias hidrográficas: estudo da bacia hidrográfica do Córrego Guaribas, Uberlândia – MG. Sociedade & Natureza (ISSN:1982-4513), 21(3):305-314, Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil. Disponível em http://www.seer.ufu.br/index.php/sociedadenatureza/issue/view/547        [ Links ]

Rodriguez, J.M.M.; Silva, E.D.; Cavalcante, A.P.B. (2004) - Geoecologia das Paisagens: uma visão geossistêmica da análise ambiental. 222p., Editora UFC, Fortaleza, CE, Brasil. ISBN: 9788572821481        [ Links ]

Santos, R.F. dos (2004) - Planejamento Ambiental: teoria e prática. 184p., Editora Oficina de Textos, São Paulo, SP, Brasil. ISBN: 9788586238628.         [ Links ]

SEPLAN/SRH (2004) - Atlas Digital sobre Recursos Hídricos de Sergipe. CD-ROM, SEPLAN – Secretaria de Estado de Planejamento e Desenvolvimento Económico / SRH - Superintendência de Recursos Hídricos, Aracajú, SE, Brasil.         [ Links ]

Zamboni, A.; Vilanova, R.R. (coord.) (2006) - Projeto orla: manual de gestão. 88p., Ministério do Meio Ambiente, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Brasília, DF, Brasil. ISBN: 8577380505. Disponível em
http://www.conpam.ce.gov.br/categoria1/orla/documentos/manual-do-orla/manualgestao-new.pdf

Legislação consultada:

Lei n. 7.661/88 de 16 de maio de 1988. Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7661.htm. Acesso em 20 de janeiro de 2011.

Lei Nº 4.771 de 15 de setembro de 1965. Institui o novo Código Florestal. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4771.htm. Acesso em 20 de janeiro de 2011.

Resolução CONAMA Nº 001, de 23 de janeiro de 1986 que dispõe sobre a Avaliação de Impacto Ambiental. Disponível em http://www.antt.gov.br/legislacao/Regulacao/suerg/Res001-86.pdf. Acesso em 20 de janeiro de 2011.

Resolução CONAMA Nº 303, de 20 de março de 2002 que estabelece parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente. Disponível em http://www.ambiente.sp.gov.br/legislacao/estadual/resolucoes/2002_Res_CONAMA_303.pdf. Acesso em 20 de janeiro de 2011.

Estância. Lei Nº 18 de 14 de março de 2008. Institui o Código Municipal de Meio Ambiente e dá outras providências.

Estância. Lei Nº 28 de 02 de fevereiro de 2010. Institui diretrizes para o Parcelamento do Uso do Solo e dá outras providências.

Estância. Lei Nº 31 de 02 de fevereiro de 2010. Institui o Plano Diretor do Município de Estância/SE e dá outras providências.

Lei Nº 5.858 do Estado do Sergipe de 22 de março de 2006 que dispõe sobre a Política Estadual do Meio Ambiente e institui o Sistema Estadual do Meio Ambiente. Disponível em www.semarh.se.gov.br/modules/wfdownloads/visit.php?cid=1. Acesso em 20 de janeiro de 2011.

 

Nota

*Submission – December 5, 2011; Evaluation – January 16, 2012; Reception of revised manuscript – April 7, 2012; Accepted – May 12, 2012; Available on-line – May 28, 2012

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons