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Angiologia e Cirurgia Vascular

versão impressa ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.15 no.3 Lisboa set. 2019

 

ARTIGO ORIGINAL

Tratamento cirúrgico de tumores do corpo carotídeo - experiência de um centro e revisão de literatura

Surgical treatment of carotid body tumors - a single center experience and literature review

Joana Catarino1, Gonçalo Alves1, Nelson Camacho1, Ricardo Correia1, Rita Bento1, Fábio Pais1, Rita Garcia1, Maria Emília Ferreira1

1 Serviço de Cirurgia Vascular, Hospital de Santa Marta, Centro Hospitalar Lisboa Central, Lisboa, Portugal

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Introdução: Os tumores do corpo carotídeo (TCC) são tumores raros (1-2/100.000), de crescimento lento, neuroendócrinos e hipervasculares. A sua causa exata é desconhecida e a maioria são esporádicos. O tratamento cirúrgico através da excisão completa do tumor é o goldstandard.

Métodos: Estudo retrospectivo dos doentes com TCC submetidos a tratamento cirúrgico na nossa instituição, entre 2012 e 2018 e revisão da literatura.

Resultados: No período entre 2012 e 2018 foram tratados 13 doentes com TCC, 7 mulheres (54%) e 6 homens (46%), com idade média de 46 anos (min. 14 - máx. 72 anos). Três (23%) foram classificados como Shamblin I, oito (61,5%) Shamblin II e dois (15,5%) Shamblin III. O tamanho médio dos tumores foi de 3,6cm (min. 2,5cm - máx. 6,6cm). Realizámos embolização pré-operatória em 5 doentes (39%), dois dias antes da cirurgia. Dois dos doentes (40%) apresentavam tumores Shamblin III (um deles com extensa extensão cranial) e três doentes (60%) tumores >5cm Shamblin II. Não se registaram AIT, AVC ou complicações do acesso, associadas ao procedimento. Todos os 13 TCC foram tratados cirurgicamente com ressecção simples (100%), sem necessidade de reconstrução arterial. As perdas hemáticas médias foram de 130ml (min. 100 - máx. 180ml). Neste estudo a taxa de complicações total foi de 7%, um doente com rouquido permanente por lesão no nervo vago (nervo sacrificado por envolvimento tumoral), não houve registo de AIT, AVC ou hematomas. Não houve mortalidade peri-operatória ou durante o follow-up.

Conclusão: Os TCC são raros e o seu tratamento cirúrgico pode ser extremamente exigente e trabalhoso. Na nossa experiência a embolização pré operatória é segura e pode ser uma mais valia principalmente em tumores de grandes dimensões e/ou classe Shamblin III.

Palavras-chave: Tumores corpo carotídeo; Tratamento cirúrgico; Embolização pré-operatória;


 

ABSTRACT

Introduction: Carotid body tumors (CBT) are rare (1-2/100.000) slow-growing, hipervascular neuroendocrine tumors, originate from the neural crest. Their exact cause is unknown. Most are sporadic, but a subset (25%) are associated with hereditary paraganglioma syndrome. Complete surgical removal is the treatment of choice for all CBTs.

Methods: This is a retrospective study of patients with CBT, who were treated at our institution between 2012 and 2018 and a literature review.

Results: Over the last 6 years, 13 patients were treated for CBTs in our center (7 female, 6 male), who were aged 46 years (range 14-72 years). Three (23%) of the tumors were Shamblin I, eight (61,5%) Shamblin II and two (15,5%) Shamblin III. The median tumor diameter was 3,6 cm (range from 2,5 to 6,6cm). We performed preoperative embolization with micro coils in 5 patients (39%), 2 days before surgery.Two patients (40%) presented with Shamblin's III tumors (one with cranial extension) and 3 (60%) had tumor >5cm, Shamblin II. There were no postembolization strokes, TIAs or access site hematomas.

All 13 CBTs tumors (including large tumors, extended cranially and Shamblin's III) were treated with resection alone (100%), without need for arterial resection or reconstruction. Average blood loss was 130 mL (range from 100 to 180 mL). In this study the overall rate of complications was 7% (1 patient) who had permanent hoarseness due to vagus nerve resection (vagus sacrificed due to tumor involvement), there were no cases of stroke, TIA or hematoma . There were no mortalities in the perioperative period or during follow-up.

Conclusion: CBTs are rare and surgical excision can be very demanding and laborious. From our experience, pre-operative embolization is safe and may be of value in large and Shamblin III tumors.

Keywords: Carotid body tumors; Surgical treatment; Pre-operative embolization;


 

Introdução

O corpo carotídeo é um quimiorreceptor do sistema paraganglionar extra-adrenal, derivado das células da crista neural. Localiza-se na face posterior da bifurcação da artéria carótida comum, sendo responsável pela adaptação aguda à hipoxia(1). Os tumores do corpo carotídeo (TCC) foram descritos pela primeira vez por von Haller em 1743. A sua incidência é de 1ª 2 casos por 100.000 pessoas (2).

TCC correspondem a aproximadamente 65% dos paragangliomas da cabeça e pescoço. Apesar da maioria serem esporádicos (75%), cerca de 25% estão associados ao Síndrome Paraganglioma Familiar(3).

Dada a sua vascularização e localização, a sua excisão completa é, na maioria dos casos, um desafio técnico(4).

O lugar da embolização pré-operatória tem como objetivo facilitar a dissecção operatória, reduzindo potenciais lesões iatrogénicas, diminuir o tamanho tumoral e as perdas hemáticas, não sendo contudo consensual a sua utilização na literatura.

Este artigo corresponde a uma análise retrospetiva dos doentes com TCC submetidos a tratamento cirúrgico no Hospital de Santa Marta (Lisboa), entre 2012 e 2018 e revisão da literatura.

Material e métodos

Foi realizada uma análise retrospetiva de todos os doentes submetidos a tratamento cirúrgico de TCC no Hospital de Santa Marta (Lisboa), entre 1 de Janeiro de 2012 e 31 de Dezembro de 2018. Os doentes foram identificados através de uma base de dados Microsoft Access®, e foram avaliados os dados clínicos existentes nos processos clínicos dos doentes e estes tratados no SPSS®.

Procedemos à revisão da literatura referente aos tumores do corpo carotídeo, nomeadamente tratamento cirúrgico e complicações mais frequentes noutros centros; indicações, benefícios, complicações e controvérsias da embolização pré-operatória.

Resultados

No período acima descrito foram tratados 13 doentes com TCC, 7 mulheres (54%) e 6 homens (46%), com idade média de 46 anos (min. 14 - máx. 72 anos). O envolvimento familiar foi confirmado por história clínica em 2 (15%) dos doentes. Nesta série não se documentaram tumores bilaterais e nenhum dos tumores apresentava características de malignidade. Nenhum dos tumores foi confirmado como produtor de catecolaminas, através da realização de testes bioquímicos.

Três TCC (23%) foram classificados como Shamblin I, oito (61,5%) Shamblin II e dois (15,5%) Shamblin III. O tamanho médio dos tumores foi de 3,6cm (min. 2,5cm - máx. 6,6cm). A angio TC (43%) e angio RMN (57%) foram os métodos de imagem utilizados para planeamento operatório.

Todos os doentes foram abordados por uma equipa multidisciplinar nomeadamente cirurgião vascular, anestesista e cirurgião de cabeça e pescoço (Instituto Português de Oncologia - IPO Lisboa ou Hospital de São José).

 

 

Realizámos embolização pré-operatória em 5 doentes (39%), dois dias antes da cirurgia, maioritariamente através da embolização da artéria faríngea ascendente, com sucesso técnico de 100%. Dois dos doentes (40%) apresentavam tumores Shamblin III (um deles com extensa extensão cranial) e três doentes (60%) tumores >5cm (Shamblin II). Não se registaram AIT, AVC ou complicações do acesso, associadas ao procedimento.

 

 

Todos os 13 TCC foram tratados cirurgicamente com ressecção simples (100%), sem necessidade de reconstrução arterial. As perdas hemáticas médias foram de 130ml (min. 100 - máx. 180ml).

 

 

A taxa de complicações total foi de 7%, um doente com rouquidão permanente, por lesão no nervo vago e síndrome de Horner, por secção cadeia simpática cervical homolatreal (ambos sacrificados por envolvimento tumoral no mesmo doente), não houve registo de AIT, AVC ou hematomas. Não houve mortalidade peri-operatória ou durante o follow-up. O follow-up médio foi de 34±5 meses. A maioria destes doentes realizam o follow-up na consulta de Angiologia e Cirurgia Vascular e, em simultâneo, na consulta de cabeça e pescoço do Instituto Português de Oncologia de Lisboa ou Hospital de São José, com a realização de exame objetivo em todas as consultas e exames de imagem seriados (angio TC) para deteção de recidiva, sendo eu estes são realizados anualmente nos primeiros anos e posteriormente com maior intervalo de tempo.

Discussão

A definição de paragangliomas diz respeito a tumores neuroendocrinos extra-adrenais, que podem também ser classificados de acordo com a sua localização(5). Os tumores do corpo carotídeo (TCC) foram descritos pela primeira vez por von Haller em 1743, e são tumores raros, sendo que a sua incidência é inferior a 1 por 30000(2).

Estes correspondem a aproximadamente 65% dos paragangliomas da cabeça e pescoço(3). Usualmente são diagnosticados entre os 40 e os 60 anos de idade e, de acordo com estudos recentes estes são mais prevalentes no sexo feminino (1,9:1). Existem 3 variantes descritas na literatura: esporádica, hiperplásica e familiar(6). A variante esporádica é a mais frequente, atingindo predominantemente as mulheres(7). A variante hiperplásica é relativamente comum em doentes com doença pulmonar obstrutiva crónica, doentes com patologias cardíacas congénitas e em habitantes de regiões localizadas a mais de 2000 metros acima do nível do mar(1). Considera-se que a hipóxia crónica poderá hiperestimular as células do corpo carotídeo, condicionando hiperplasia/neoplasia. A forma familiar ocorre em aproximadamente 25% dos casos, sendo que a que a mutação genética no complexo enzimático da succinato desidrogenase, nomeadamente SDHD (11q23), SDHB (1p36), e SDHC (1q21) foram identificadas como etiologia nestes casos. Doentes com esta variante tem maior incidência de tumores bilaterais (20% nas formas familiares vs 5% na variante esporádica) e desenvolvem tumores em idades menores(3). Os TCC são usualmente benignos e quimicamente silenciosos, não obstante tumores malignos podem acontecer em até 10% dos doentes e cerca de 5% podem produzir catecolaminas (histamina, serotonina ou epinefrina)(1). Os tumores funcionais são detetados por testes bioquímicos pré operatórios que incluem o doseamento de catecolaminas na urina e metanefrina no plasma. Doentes com tumores produtores de catecolaminas devem ser medicados no pré-operatório com antagonistas alfa adrenérgicos, de forma a prevenir elevações súbitas da tensão arterial no intra operatório(3). Apesar da ausência de critérios consensualmente definidos, um tumor do corpo carotídeo maligno caracteriza-se pela invasão local de estruturas adjacentes e pela presença de metastização, sendo que esta é rara nestes tumores(8). Dos 13 TCC incluídos neste análise, cerca de 7 eram mulheres (54%) e 6 homens (46%), com idade média de 46 anos (min. 14 - máx. 72 anos). O envolvimento familiar foi confirmado por história clínica em 2 (15%) dos doentes. Nesta série não se documentaram tumores bilaterais e nenhum dos tumores apresentava características de malignidade. Nenhum dos tumores foi confirmado como produtor de catecolaminas, através da realização de testes bioquímicos.

Os TCC habitualmente apresentam-se como tumefações cervicais assintomáticas contudo, com o crescimento e essencialmente através de compressão mecânica das estruturas adjacentes, podem condicionar sintomatologia local(9). Os sintomas mais frequentes são a dor cervical, a sensação de compressão local, a rigidez cervical, a disfagia, a rouquidão, o estridor, a rigidez mandibular e o zumbido. Os tumores produtores de catecolaminas podem, adicionalmente, provocar palpitações, taquicardia, hipertensão, cefaleias, diaforese, tonturas ou rubor(10).

Nesta análise, nenhum dos doentes apresentava sintomatologia, sendo o único sinal presente uma tumefação cervical assintomática.

O diagnóstico destes tumores é por vezes difícil considerando que não existem guidelines específicas na literatura. Se após o exame objetivo e história clínica existe suspeita de TCC o diagnóstico é confirmado por exames de imagem, nomeadamente ultrasonografia cervical, angio TC, angio RMN ou angiografia. A ultrassonografia cervical é, hoje em dia, o primeiro exame realizado quando existe suspeita de TCC, sendo também utilizada no screnning de doentes, por corresponder a um método não invasivo e facilmente disponível. Este demonstra afastamento da bifurcação carotídea por uma massa sólida, hipervascular, de limites bem definidos. Com o crescimento, o tumor habitualmente circunda a artéria carótida interna e a artéria carótida externa, sem condicionar estenoses hemodinamicamente significativas. A angio TC ou angio RMN são também importantes, especialmente no planeamento pré operatório, e fornecem informação sobre o tamanho, a extensão, e o grau de invasão de estruturas adjacentes, assim como a identificação de tumores multicêntricos. A angiografia permite uma excelente caracterização tumoral, nomeadamente das suas dimensões, suprimento vascular e grau de envolvimento com as estruturas adjacentes(2).Esta permite também identificação de doença oclusiva concomitante e avaliação da colateralização intra-cerebral, informação que pode revelar-se essencial nos tumores de maior dimensão, especialmente nos Shamblin III, em que poderá ser necessário proceder a revascularização carotídea(4).Para além disso, permite também, em casos selecionados, uma atitude terapêutica, com embolização supra-selectiva. A biópsia como meio de diagnóstico está contra indicada, dada a proximidade de estruturas vasculares e a hipervascularização deste tipo de tumores, pelo que esta representa um risco elevado de complicações hemorrágicas, de disseminação, de formação de pseudoaneurismas e de trombose carotídea(11). No nosso grupo de doentes, a angio TC (43%) e angio RMN (57%) foram os métodos de imagem utilizados para planeamento operatório.

De acordo com a atual classificação de Shamblin, os TCC são divididos em 3 grupos, considerando a relação entre o tumor com as estruturas adjacentes. Os tumores Shamblin I não envolvem toda a bifurcação carotídea, não existe alargamento da bifurcação carotídea e são facilmente removidos cirurgicamente; os tumores Shamblin II envolvem a bifurcação (se bem que não na sua totalidade) com moderada aderência às artérias carótidas ; os tumores Shamblin III são usualmente tumores de maiores dimensões que englobam a totalidade da bifurcação carotídea e que causam alargamento significativo da bifurcação carotídea, normalmente associados a ressecções cirúrgicas mais extensas e complexas(6).Três TCC (23%) foram classificados como Shamblin I, oito (61,5%) Shamblin II e dois (15,5%) Shamblin III. O tamanho médio dos tumores foi de 3,6cm (min. 2,5cm - máx. 6,6cm).

De acordo com todos os autores revistos na literatura, a classificação Shamblin é utilizada pelos cirurgiões como preditiva da necessidade de reconstrução arterial, o aumento do tempo de cirurgia e, todos os estudos salientam o aumento do número de complicações relacionadas com a excisão cirúrgica tumoral com o aumento da classificação Shamblin, sejam elas complicações neurológicas, assim como as perdas sanguíneas associadas. No entanto, um estudo recente publicado por Kim et al. descreve a existência de dois novos fatores pré operatórios que devem ser associados á classificação Shamblin para melhor prever o risco de complicações associado á cirurgia. Os autores defendem que a distância tumoral á base do crânio (DTBOS) e o volume tumoral (em conjunto com a classificação Shamblin) predizem de maneira mais correta e viável o risco de complicações hemorrágicas e neurológicas, sendo que a ressecção cirúrgica prévia á expansão tumoral á base do crânio reduz o risco de complicações, nomeadamente 1 cm de diminuição na DTBOS diminui >250ml perdas hemáticas e 1,5 vezes o risco de lesões dos pares cranianos(12).

No que diz respeito ao papel da embolização pré-operatória este não é consensual na literatura. O seu objetivo é diminuir o tamanho tumoral, reduzir o tempo operatório, limitar as perdas hemáticas e facilitar a ressecção peri-adventicial do tumor, preservando as estruturas adjacentes, podendo também ter um papel paliativo em tumores irressecáveis(13-16,17). No entanto os estudos mostram resultados contraditórios.

Os opositores realçam que a embolização pré-operatória é um procedimento com riscos potenciais associados e, na sua opinião, desnecessário. Virginia et al conclui na sua série retrospetiva que não existiam diferenças significativas, nas perdas hemáticas e nas morbilidades peri-operatórias, entre os doentes embolizados e os doentes não embolizados pré-operatoriamente em grupos de doentes com TCC até 4/5cm(14). Estes resultados foram confirmados por outros autores(5,15).

Os autores que são a favor da embolização pré operatória defendem que a mesma diminui as perdas hemáticas associadas á excisão do tumor, diminui o tempo cirúrgico e facilita o procedimento (menor necessidade de clampagems carotídeas). Não obstante, nestes mesmos estudos, a embolização pré operatória não diminui a taxa de complicações neurológicas(11,19).

Sendo assim a literatura analisada é consensual e defende que esta poderá constituir uma mais valia em tumores >4/5cmcm, aqueles que englobam a artéria carótida interna ou aqueles que se estendem acima do ângulo da mandíbula ou corpo vertebral de C2(19).

Tipicamente a embolização pré-operatória inclui embolização seletiva da artéria faríngea descendente, o que permite uma redução da vascularização tumoral de aproximadamente 75%, e esta deve ser realizada 48h antes da excisão cirúrgica(3).

Quando realizada por cirurgiões experientes, embolização pré-operatória associa-se a um baixo risco de complicações. A complicação mais temida é a embolização paradoxal para a circulação intra-cerebral, provocando um AVC/AIT. Outras complicações descritas na literatura incluem défices neurológicos focais, febre e dor(20).

Concluindo, vários estudos defendem que a embolização pré-operatória de TCC >4cm, Shamblin III ou que apresentem extensão cranial significativa, pode ser um tratamento adjuvante importante, com taxas de complicações baixas, pelo que ,segundo esta linha de ação, na nossa prática clínica procedemos á embolização de tumores com semelhantes características.

No nosso centro, dos 13 doentes com TCC tratados, realizámos embolização pré-operatória em 5 doentes (39%), dois dias antes da cirurgia, maioritariamente através da embolização da artéria faríngea ascendente, com sucesso técnico de 100%. Dois dos doentes (40%) apresentavam tumores Shamblin III (um deles com extensa extensão cranial) e três doentes (60%) tumores >5cm. Não se registaram AIT, AVC ou complicações do acesso, associadas as procedimento.

Assim sendo, e de acordo com a nossa experiencia, a embolização pré operatória é segura quando realizada por cirurgiões experientes, e pode ser uma mais valia em tumores extensos (incluindo tumores Shamblin II) e/ou classe Shamblin III.

A decisão sobre a realização de pré-embolização deve ser sempre individualizada para cada doente e deve ponderar os potenciais riscos (embolização paradoxal, AVC/AIT, complicações do acesso) e os potenciais benefícios (diminuição das perdas hemáticas, facilidade na dissecção, diminuição do tempo operatório).

Independentemente da idade do doente ou do tamanho do tumor, a excisão total e precoce destes tumores, é o tratamento gold standard descrito na literatura. No entanto esta pode ser laboriosa e tecnicamente desafiante dada a proximidade das estruturas vasculares, á vascularização destes tumores, assim como á complexa anatomia do pescoço, muitas vezes distorcida nestas situações(11). A incidência de complicações na literatura é bastante variável comparando as varias séries de doentes, sendo que estão descritas taxas de lesões neurológicas entre os 11 e os 49%, frequentemente relacionadas com o nervo vago ou com o nervo hipoglosso (sendo que a maioria destas são temporárias e que apenas 1% são descritas como lesões permanentes), taxas de AIT/AVC que variam entre os 0 e os 8% e as taxas de mortalidade operatória que variam entre os 0 a 7,4%(1).

Apesar da ressecção cirúrgica ser o tratamento de escolha nestes doentes, existem condições que contraindicam esta opção tais como: tumores Shamblin III em doentes idosos e frágeis ou com múltiplas co-morbilidades, sendo que nestes casos a radioterapia ou a embolização podem ser uma opção de tratamento paliativo válida, assim como tumores que no pré-operatório envolvam os pares cranianos ou a cadeia ganglionar(6).

Após a embolização pré operatória dos cinco doentes anteriormente descrita, todos os 13 TCC da nossa série foram tratados cirurgicamente com ressecção simples (100%), sem necessidade de reconstrução arterial. As perdas hemáticas médias foram de 130ml (min. 100 - máx. 180ml). A taxa de complicações total foi de 7%, um doente com rouquidão permanente (por lesão no nervo vago) e síndrome de Horner (por secção cadeia simpática cervical homolateral), ambos sacrificados por envolvimento tumoral no mesmo doente. Este doente apresentava um tumor Shamblin III, com 6,6cm e extensa progressão cranial tumoral. Não houve registo de AIT, AVC ou hematomas e não houve mortalidade peri-operatória.

No que diz respeito ao seguimento e prognostico destes doentes, estão descritas na literatura taxas de recorrência ipsilateral de 5%. O seguimento a longo prazo por uma equipa multidisciplinar é fundamental, e o rastreio em familiares destes doentes é recomendado pela maioria dos autores. A esperança de vida, após exérese cirúrgica bem sucedida em tumores benignos, é semelhante à população geral(9). É estimado que os doentes com TCC malignos apresentem uma taxa de sobrevida aos 10 anos de menos de 50%(18).

Conclusão

Os TCC são raros e o seu tratamento cirúrgico pode ser extremamente exigente e trabalhoso. A detecção precoce destes tumores diminui a morbilidade associada ao procedimento, sendo que estes doentes devem ser avaliados por um equipa multidisciplinar em todo o seu percurso.

De acordo com a nossa prática clínica, consideramos que a embolização pré-operatória deve ser ponderada em tumores do corpo carotídeo Shamblin III e/ou com diâmetros superiores a 4 cm. De acordo com a nossa experiência este procedimento é seguro quando realizado por cirurgiões experientes e, na nossa opinião, a embolização simplifica a exérese cirúrgica destes tumores, especialmente em tumores muito extensos (mesmo que Shamblin II), ou nos classificados como Shamblin III.

A excisão completa do tumor contínua a ser o tratamento gold standard. A decisão de embolizar deverá ser individualizada, ponderando-se, por um lado, os riscos e benefícios inerentes a cada um dos procedimentos, tendo em consideração a experiência pessoal/ institucional.

 

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Correio eletrónico: joanarita.catarino@gmail.com (J. Catarino).

 

Responsabilidades éticas.

Proteção dos seres humanos e animais. Os autores declaram que os procedimentos seguidos estavam de acordo com os regulamentos estabelecidos pelos responsáveis da Comissão de Investigacão Clínica e Ética e de acordo com os da Associacão Médica Mundial e da Declaracão de Helsinki.

Confidencialidade dos dados. Os autores declaram ter seguido os protocolos do seu centro de trabalho acerca da publicação dos dados de pacientes.

Direito à privacidade e consentimento escrito. Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

 

Recebido a 14 de junho de 2019

Aceite a 07 de outubro de 2019

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