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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.75 Lisboa set. 2022  Epub 30-Set-2022

https://doi.org/10.23906/ri2022.75a08 

As migrações europeias numa nova era

Instituições para emergências e a emergência das instituições: O caso da comunidade de inteligência nos Estados Unidos (1947-1960)

Institutions for emergencies and the emergence of institutions: the case of the intelligence community in the US (1947-1960)

Marco Cepik1 

Júlio Rodriguez2 

1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rua Cipó, 705/505, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, CEP 91360-370, Brasil, mcepik@gmail.com

2 Universidade Federal de Santa Maria, Rua Carlos Brener, 165/302, Santa Maria, Rio Grande do Sul, CEP 97050-100, Brasil, julio.rodriguez@ufsm.br


Resumo

Em treze anos, emergiu nos Estados Unidos um complexo organizacional para a realização de atividades de inteligência e segurança bastante diferente do que previa a Lei de Segurança Nacional (1947). Segundo a versão modificada do institucionalismo racional desenvolvida por Amy Zegart, tal resultado seria improvável. Para explicar esta inconsistência, recorremos à noção de institutional drift proposta por Hacker, Pierson e Thelen, e realizamos uma descrição das dinâmicas interativas entre os Estados, organizações e lideranças e suas implicações estruturais, conforme proposto por Falleti e Mahoney. Este processo resultou na emergência de um inédito sistema nacional de inteligência nos Estados Unidos que existe até hoje. Foram identificadas duas etapas principais no processo.

Palavras-chave: inteligência; Estados Unidos; instituições; Guerra Fria

Abstract

In 13 years, a new organizational complex emerged in the United States to carry out intelligence and security activities, one that departed significantly from the National Security Law (1947). In the modified version of rational institutionalism developed by Amy Zegart, such a result would be unlikely. To explain this apparent anomaly, we resort to the notion of institutional drift proposed by Hacker, Pierson e Thelen and describe the interactional dynamics between states, organizations and leaders, with their structural implications as suggested by Falleti e Mahoney.

Keywords: intelligence; United States; institutions; Cold War

Introdução

Neste artigo, discutimos a emergência da chamada comunidade de inteligência (CI) nos Estados Unidos, entre os anos de 1947 e 1960, com o propósito de demonstrar: (1) como se deu o desenvolvimento inicial das organizações de segurança e inteligência naquele país em relação direta com (2) as dinâmicas interacionais da Guerra Fria e as pressões estruturais na configuração destas organizações. Os antecedentes históricos (1775-1945) da criação desta CI foram previamente analisados por Marco Cepik1. Vale mencionar apenas que atividades de inteligência e segurança já existiam em agências policiais - como o Federal Bureau of Investigation (FBI) -, militares - como o Office of Naval Intelligence (ONI) e o Office of Strategic Services (OSS) - e de política externa - como o Bureau of Intelligence and Research (INR) -, mas não se pode falar de um sistema nacional (SN) antes de o período analisado neste artigo. A configuração inicial institucional da CI ocorreu durante as presidências do democrata Harry S. Truman (abril de 1945 até janeiro de 1953) e do republicano Dwight D. Eisenhower (janeiro de 1953 até janeiro de 1961), como veremos mais à frente.

Do ponto de vista teórico, o artigo desafia o argumento de Amy Zegart2 sobre a determinação dos fatores institucionais e políticos internos na explicação do surgimento e evolução de agências de segurança nacional. A partir do estudo da evolução de três agências ao longo da metade do século XX - National Security Council (NSC), Joint Chjefs Staff (JCS) e Central Intelligence Agency (CIA) - a autora argumenta que o alto grau de interconexão burocrática entre essas agências e o predomínio do poder executivo em seu direcionamento institucional condicionam uma disputa interna pela definição de missões, recursos e do desenho organizacional entre a Presidência, o Congresso Nacional e as burocracias envolvidas. Esse enfrentamento é fundamental para a determinação do desenvolvimento de organizações na área de segurança nacional. Alternativamente, procuramos demonstrar que fatores internacionais, especialmente a evolução da distribuição de poder e as dinâmicas conflitivas entre os Estados Unidos e a União Soviética, tiveram um papel ainda mais decisivo na evolução do sistema de inteligência. Trata-se, é claro, de um processo dialético entre o ambiente interno e externo. Mas a explicação de Zegart descarta os fatores internacionais sumariamente, o que não se sustenta por razões lógicas e pela evidência histórica disponível.

O caso dos Estados Unidos é crucial porque se trata do país que dispunha de vantagens militares indisputáveis sobre todos os demais e respondia por 40% do produto interno bruto mundial em 1960. Zegart, portanto, poderia ter razão e, talvez, as decisões sobre a organização e as funções do aparato de segurança nacional fossem, de fato, menos pressionadas por fatores internacionais. No entanto, dados os compromissos e ambições decorrentes da participação destacada dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, bem como o fato de a União Soviética ter tido papel militar decisivo na derrota do nazifascismo, a dinâmica institucional em Washington precisa de ser relacionada com a balança de poder e outros choques externos3. Se isto é verdade para o caso estadunidense, para os demais países com menos poder militar e econômico relativo, interações entre as dinâmicas de poder internacionais e a dinâmica evolucionária dos serviços de inteligência foram ainda mais decisivas.

Para avaliarmos o caso americano na conjuntura crítica4 (momento disruptivo e dinâmico de indeterminismo estrutural em que há a possibilidade de mudança nos arranjos e normas institucionais precedentes) entre 1947 e 1960, buscamos descrever os processos de interação dinâmica entre constrangimentos estruturais (sistêmicos e internos) e preferências organizadas na etapa inicial da formação desta comunidade, destacando os atores envolvidos e seus respectivos papéis5. Identificamos que, entre 1947 e 1952, os requisitos informacionais da competição internacional com a União Soviética foram direcionados para o uso de operações encobertas (subversão) e a preparação para uma guerra convencional na Europa. E, de maneira imprevista por Washington, a guerra acabou ocorrendo na península coreana e não na Europa. Isto alterou os rumos do desenvolvimento inicial dos serviços de inteligência dos Estados Unidos. Também notamos que, entre 1953 e 1960, a competição estratégica com a União Soviética se globalizou, criando incentivos necessários para o desenvolvimento de novas capacidades tecnológicas de espionagem e a expansão das operações encobertas para o Terceiro Mundo6. Identificamos, ao longo das duas etapas, processos de drift institucional7, ou seja, períodos em que, apesar da manutenção das regras, ocorrem por pressões externas algumas mudanças institucionais, que resultaram na conformação de uma CI bastante distinta da previsão legal original. Nossa hipótese é que o desenvolvimento da CI nos Estados Unidos extrapolou os mecanismos institucionais de reprodução da conjuntura crítica que levou à «Lei de 1947» justamente por causa da dialética externo-interno no começo da Guerra Fria, e não apesar dela, como sugere Zegart.

O restante do artigo está organizado em uma sequência temporal, com uma seção para o período 1947-1952 e outra para o período 1953-1960. Na seção final, apresentamos as conclusões gerais do artigo e também a agenda de pesquisa para o período subsequente da história institucional dos serviços de inteligência dos Estados Unidos (1961-1975).

Guerra Fria na Europa e Guerra da Coréia (1947-1952)

Em 26 de julho de 1947, o Congresso dos Estados Unidos aprovou o National Security Act (Lei de 1947/Ato de 1947), uma lei que continuou em vigor até os dias atuais8. A nova legislação reorganizou a estrutura do governo americano para coordenar os esforços militares, diplomáticos e de inteligência no novo contexto internacional pós-Segunda Guerra Mundial. Juntamente com a Doutrina Truman (anunciada em março de 1947) e o Plano Marshall (aprovado pelo Congresso em março de 1948), o National Security Act foi um dos pilares institucionais da emergente Guerra Fria entre Estados Unidos, União Soviética e seus respectivos aliados9.

No âmbito militar, a Lei de 1947 criou um National Military Establishment, que logo se transformaria no Departament of Defense, a ser dirigido por um secretário de Defesa). Em setembro de 1947, James Forestal seria confirmado pelo Senado como o primeiro secretário da Defesa. Também foi criada uma força aérea independente do exército e da marinha - United States Air Force (USAF). Embora as linhas de comando fossem clarificadas por novos dispositivos legais em 1949 e 1958, a tendência de estabelecer departamentos subordinados ao secretário da Defesa para a marinha, o exército, a força aérea e os fuzileiros navais já estava sinalizada pelo Ato de 1947. Da mesma forma, o Estado-Maior Conjunto foi fortalecido sob a autoridade permanente de uma chairperson10. Outra inovação importante foi a criação do NSC para coordenar as ações das burocracias civis e militares e assessorar o presidente. A partir de 1949, o NSC passou a fazer parte da estrutura da Presidência, reunindo um número crescente de autoridades, comitês e assessores. Com o tempo, o NSC tornou-se um locus interburocrático importante11.

Finalmente, o National Security Act também criou a cia, uma organização civil e sem poderes de polícia para realizar espionagem internacional e analisar informações relevantes para a segurança nacional. Em um memorando secreto para Truman, enviado em agosto de 1945, o então diretor do Office of Strategic Services (OSS), William Donovan, havia recomendado a criação de uma agência civil permanente12. Com a dissolução do OSS por Truman em 27 de agosto de 1945 e a transferência dos seus recursos para os departamentos de Estado (State Department) e da Guerra (War Department), a querela sobre a necessidade da agência continuou. Quase imediatamente, o Departamento de Estado criou o Office of Intelligence Research (INR), com a missão exclusiva de produzir análises. Em 1946, Truman estabeleceu a National Intelligence Authority (NIA) para coordenar as ações de espionagem e contrainteligência, formada pelos secretários de Estado, da Guerra e da Marinha. Também criou o Central Intelligence Group (CIG), de caráter temporário e com recursos bastante limitados, para executá-las13. Segundo a historiografia, a proposta de Donovan encontrou forte resistência nos militares, diplomatas e também no FBI, pois J. Edgar Hoover queria manter as operações de inteligência na América Latina sob o controle da polícia federal14.

Para Amy Zegart, a sequência dos eventos indicaria que a CIA foi criada somente porque Truman concordou em incluir uma pequena seção sobre a agência no National Security Act, contando com o desinteresse do Congresso Nacional e da sociedade civil sobre o tema15. Bradley F. Smith demonstrou que o New York Times, por exemplo, de fato não publicou qualquer notícia criticando os serviços de inteligência (FBI, CIA) entre 1945 e 195516. Para o Congresso, a criação da CIA implicava custos de decisão menores do que uma nova força aérea ou a unificação das forças armadas sob um Departamento de Defesa liderado por um civil. Nas poucas sessões em que discutiram a criação da CIA, merece destaque um diálogo ocorrido durante o testemunho de Allen Dulles, ex-chefe do OSS na Europa, sobre a criação da nova agência e do cargo de director of central intelligence (DCI). Perguntado por um deputado republicano se a nova agência iria requerer muito pessoal, Dulles respondeu que «não acreditava em uma grande agência», pois ela não poderia funcionar bem com centenas de funcionários17. Como se sabe, o que ocorreu posteriormente foi muito distinto. A começar pelas escolhas de Truman para o novo cargo18. Os quatro primeiros DCI foram militares: rear admiral Sidney W. Souers (1946), lt. general Hoyt S. Vandenberg (1946-1947), rear admiral Roscoe H. Hillenkoetter (1947-1950) e general Walter Bedell Smith (1950-1953). O primeiro civil a ocupar o posto de DCI foi o próprio Allen Dulles (1953-1961), durante os dois mandatos presidenciais do general Dwight D. Eisenhower e no começo do Governo Kennedy19.

As missões e os poderes da nova agência foram definidos muito vagamente na lei. Por um lado, a agência foi proibida de realizar atividades policiais ou de segurança interna, que já estavam sob competência do FBI. Também ficou estabelecido que a CIA não substituiria outras agências e departamentos que já atuavam na área de inteligência. Por outro lado, a agência deveria correlacionar e avaliar as informações obtidas pelos diversos órgãos, subsidiando o processo decisório do NSC e protegendo o sigilo das fontes e métodos. A seção 102 do Ato de 1947 determinou que a CIA poderia exercer «serviços e funções adicionais» de «tempos em tempos», quando o NSC julgasse necessário20.

Entretanto, no contexto de deterioração das relações com a União Soviética, duas funções que não constavam na lei de criação da CIA tornaram-se centrais. Primeiro, a espionagem internacional para a produção de relatórios sobre temas e problemas correntes. Segundo, a realização de operações encobertas (covert actions) contra os soviéticos e seus aliados. Ou seja, a rápida transição internacional entre o final da Segunda Guerra Mundial em 1945 e a emergência da Guerra Fria como realidade predominante, pelo menos desde 1947, explica os resultados institucionais diferentes do que seriam as preferências puras dos atores políticos e burocráticos no momento fundacional da CIA.

No caso da produção de inteligência sobre temas correntes, havia a necessidade de informar diariamente o Presidente Truman sobre acontecimentos no exterior, mesmo que o Presidente não manifestasse um interesse maior pelas chamadas estimativas nacionais de inteligência, produzidas pelo então recentemente criado Office of Reports and Estimates da CIA. Os primeiros relatórios diários, semanais e avaliações especiais da CIA estavam proibidos de incorporar informações derivadas de interceptação de comunicações por razões de segurança, embora os analistas fossem informados do conteúdo das mensagens interceptadas/decodificadas caso elas contrariassem afirmações feitas nos relatórios de análise. Além das motivações corporativas dos militares, que não queriam dividir seu material pelo tipo de acesso ao presidente que ele granjeava, havia razões de segurança reais, tendo em vista a capacidade de espionagem soviética demonstrada no enfrentamento das potências do Eixo desde os anos 193021.

Por sua vez, as operações encobertas, que também não estavam previstas na Lei de 1947, logo se tornaram um instrumento de política externa dos Estados Unidos. Note-se que à época o termo «operações encobertas» (covert actions) era menos conhecido do que o termo soviético «medidas ativas» (активные мероприятия) ou do que o britânico «operações especiais» (special operations). Uma operação encoberta não é necessariamente clandestina, mas sim definida pela tentativa de preservar o que se chama de negação plausível (plausible deniability) acerca da autoria ou participação de um governo nacional22. Entre 1947 e 1949, George Kennan, então chefe da divisão de planejamento do Departamento de Estado, desempenhou um papel relevante na formulação e adoção da doutrina oficial de contenção ao comunismo, propondo o uso sistemático de campanhas encobertas e a criação de um órgão permanente encarregado23. Entretanto, a dinâmica da Guerra Fria e o início da adaptação mútua à lógica do conflito entre Estados Unidos e União Soviética foram os fatores determinantes na conformação da nova missão das agências de inteligência.

Resoluções do Conselho de Segurança Nacional (NSC) e autorizações presidenciais nos anos seguintes resultaram em operações encobertas na Itália, na França, na Iugoslávia, na Albânia, na Polônia, na Tchecoslováquia e na União Soviética24. Em 24 de novembro de 1947 o NSC emitiu sua primeira diretiva (NSC 1/1), recomendando a ação do governo americano para impedir a vitória de uma aliança entre o Partido Comunistas e forças socialistas nas eleições italianas de abril de 194825. Aprovada por Truman, esta primeira operação encoberta envolveu assistência clandestina, guerra psicológica (PSYOP) e ajuda econômica. Inicialmente o Departamento de Estado foi encarregado da tarefa, mas o secretário George Marshall recusou-se a fazê-lo temendo comprometer seu Plano de Reconstrução Econômica da Europa Ocidental. Apesar da hesitação do novo DCI, rear admiral Roscoe H. Hillenkoetter, e também de um parecer jurídico do general counsel da CIA, Lawrence Houston, concluindo que o National Security Act of 1947 apenas autorizava a agência a realizar espionagem e não a se engajar em ações clandestinas de influência, a operação prosseguiu.

Foi criado um grupo especial na CIA (Special Procedures Group) que financiou parte da campanha eleitoral do Partido Democrata-Cristão e do então primeiro-ministro Alcide de Gasperi26. Campanhas de desinformação na mídia (baseadas em documentos forjados, denúncias de atrocidades cometidas pelo Exército Vermelho na Segunda Guerra Mundial e cartas escritas por ítalo-americanos) fizeram parte de uma campanha maior, que incluiu atentados e sabotagem contra comitês eleitorais dos comunistas. Carregamentos de trigo foram desviados de sua rota para a América Latina e entregues à população italiana em caminhões com a bandeira norte-americana, coordenados por políticos democrata-cristãos pagos pela CIA. Tudo isso complementado por uma diplomacia coercitiva envolvendo ameaças diretas e pessoais do Presidente Truman sobre a retirada do apoio norte-americano a qualquer governo que aceitasse a participação de comunistas. Mesmo com o apoio menos intenso e ostensivo dos soviéticos aos comunistas italianos, os democratas-cristãos ganharam 307 das 574 cadeiras em disputa27. É difícil avaliar o impacto específico da operação norte-americana no resultado das eleições italianas, mas o fato é que seu aparente sucesso levou o Governo norte-americano a intensificar o uso de covert actions28.

Ainda em 1948, o NSC e Truman aprovaram uma campanha para favorecer os grupos sindicais moderados contra os comunistas na França. Houve uma acirrada polêmica interna no Governo norte-americano, mas predominou a posição de que qualquer crítico da União Soviética deveria ser apoiado. A mesma lógica levou à Resolução NSC-58/2, que aprovou a entrega de carregamentos clandestinos de material bélico para a Iugoslávia e acertos temporários com Tito após a ruptura daquele país com a União Soviética em 1948. As operações no Leste europeu e na própria União Soviética foram de maior envergadura. Duas resoluções (NSC-20 e NSC-50) autorizaram a CIA a utilizar emigrados recrutados pela organização Gehlen alemã e pelo Secret Intelligence Service (SIS) britânico para montar guerrilhas e movimentos de resistência nos países bálticos, Polônia, Ucrânia e Albânia. Na Estônia, Letônia e Lituânia, quando os grupos treinados pelo Ocidente foram desembarcados na costa báltica, a guerrilha já havia sido esmagada pelo Exército Vermelho. O mesmo ocorreu na Ucrânia e na Albânia. Na Polônia o desempenho foi ainda pior. Lá, entre 1947 e 1951, a CIA e o Secret Intelligence Service (SIS) britânico apoiaram um grupo armado chamado Liberdade e Independência (Wolnosci i Niepodleglosci), que clamava possuir 25 mil militantes e 100 mil apoiadores prontos a irem contra os soviéticos. Sem desconfiar da implausibilidade da estimativa, a operação revelou-se uma armadilha do serviço de segurança polonês, que ficou com milhões de dólares em equipamentos e dinheiro canalizados através dos «líderes» da resistência. O fracasso das ações encobertas no Leste europeu não reverteu a tendência de uso crescente das mesmas em outros contextos29.

Em junho de 1948, por meio da Diretiva 10/2 do NSC, foi criado um novo órgão encarregado das operações encobertas, o Office of Policy Coordination (OPC). Refletindo as disputas burocráticas entre a CIA, o Departamento de Estado e o Departamento de Defesa, mas principalmente os resultados precários dos Estados Unidos na disputa com a União Soviética até aquele momento, o OPC foi mantido na CIA, mas com uma cadeia de comando complicada. Em tese, o DCI também teria controle operacional sobre as atividades de inteligência do Pentágono e do Departamento de Estado. Na prática, porém, isto nunca chegou a se concretizar. Embora o OPC funcionasse dentro da CIA, seu orçamento era custeado parcialmente pelo Departamento de Estado e seu diretor era indicado não pelo DCI, mas pelo secretário de Estado, respondendo politicamente a este e às determinações do secretário de Defesa. O primeiro diretor do OPC foi Frank Wisner e, sob a sua direção, as operações encobertas do governo norte-americano passaram a incluir um amplo leque de ferramentas, tais como propaganda (rádios Free Europe e Liberty), apoio a golpes de estado, ações paramilitares e organização de guerrilhas. Entre 1949 e 1952, os efetivos sob autoridade do OPC subiram de 302 para 2812 (além de 3142 contratados), operando desde 47 estações localizadas em diferentes países. No mesmo período, o orçamento regular do OPC cresceu de 4,7 milhões para 82 milhões de dólares correntes ao ano30.

A falta de coordenação entre o OPC e o órgão de espionagem da CIA (OSO), bem como o fato de que a produção de análises de curto prazo pela CIA era vista como uma intromissão por outros fornecedores de inteligência como o FBI, o Departamento de Estado e os departamentos militares, contribuíram para enfraquecer ainda mais a posição do DCI no sistema31. Em 1948, menos de um ano após a criação da CIA, dois relatórios independentes propunham uma reorganização profunda do incipiente sistema nacional de inteligência. O primeiro relatório foi o Dulles-Jackson-Correa Report, um estudo comissionado em janeiro de 1948 pelo secretário executivo do NSC, Sidney Souers (o mesmo que fora indicado como o primeiro DCI por Truman, tendo ficado no cargo seis meses), para avaliar a «estrutura, administração, atividades e relações interagências da CIA». O segundo relatório resultou do trabalho de um grupo temático da Comissão Hoover, estabelecido em 1948 pelo Congresso dos Estados Unidos para avaliar a organização do braço executivo do governo e que foi dirigido pelo ex-Presidente Herbert Hoover. Ambos os relatórios foram fortemente críticos, no contexto da disputa civil-militar que caracterizou todo o Governo Truman. Apesar da legislação introduzida no mesmo ano (Central Intelligence Agency Act of 1949), os problemas de autoridade e coordenação associados à posição do DCI na institucionalidade de segurança nacional dos Estados Unidos persistiram durante toda a Guerra Fria32. Naquela altura, porém, a inadequação organizacional foi reforçada por eventos internacionais e internos.

No plano interno, a mobilização crescente do medo anticomunista liderada pelo senador republicano Joseph McCarthy aprofundou a face messiânica da Guerra Fria e fortaleceu indiretamente os órgãos de segurança e inteligência interna do Estado. Pode-se dizer que, entre agosto de 1948, quando Whittaker Chambers e Elizabeth Bentley, que haviam trabalhado como «correios» do NKVD soviético durante a guerra, depuseram no HUAC (House Committee on Un-American Activities) sobre a infiltração de espiões da União Soviética na Administração Roosevelt, e meados de 1954, quando McCarthy ainda contava com 50% de aprovação nas pesquisas de opinião pública pouco antes do Senado condená-lo por excessos na «caça aos comunistas», os Estados Unidos viveram um clima de histeria anticomunista comparável à criação da Radical Division do FBI, em 1919. A conexão entre a política interna e a orientação externa ficou evidente em 1950, com a criação do American Committee for the Liberation of the People of the USSR (AMCOMLIB). Em 1954, George Kennan, com o apoio da CIA, ainda fazia lóbi em Washington em favor da «libertação contra o bolchevismo» dentro e fora dos Estados Unidos33.

Externamente, houve uma sucessão de movimentos não antecipados pelos órgãos de inteligência, sendo os mais importantes a detonação da primeira bomba atômica soviética (agosto de 1949), a proclamação da República Popular da China (setembro de 1949) e a invasão da Coréia do Sul pelas tropas da Coréia do Norte (junho de 1950). Aliás, o ano de 1950 que começara sob o signo da Resolução 68 do NSC prescrevendo um aumento brutal do orçamento e das ações para «barrar o avanço de Moscou», terminaria com Truman declarando estado de emergência nacional após a intervenção chinesa na Guerra da Coréia em novembro.

Os exemplos acima demonstram como os avanços institucionais relativos à CI dos Estados Unidos seguiram desde o início um padrão de drift institucional, com mudanças nas ações dos órgãos e mesmo com a criação ad hoc de novas instâncias. A tensão fundamental, entre uma atividade de inteligência concebida (inclusive legalmente) como produção de «conhecimento para a tomada de decisão», mas que também é um instrumento político de exercício de poder interno e externo aos Estados, só pode ser explicada pelas dinâmicas internacionais e sociais. Além da expansão das missões inicialmente previstas para a CIA, em particular na condução de operações encobertas no contexto da disputa com a União Soviética, outro fator importante na configuração institucional do sistema nacional de inteligência dos Estados Unidos durante a presidência Truman foi a Guerra da Coréia.

Segundo Peter Unsinger, os serviços de inteligência dos Estados Unidos teriam cometido três falhas principais naquele conflito34. A primeira, de alcance estratégico, foi a falha em antecipar, detectar e alertar sobre a invasão da Coréia do Sul pelas tropas da Coréia do Norte. A segunda falha, também estratégica, foi a subestimação da decisão chinesa de intervir no conflito depois que as tropas dos Estados Unidos e da Coréia do Sul extrapolaram o mandato das Nações Unidas e se aproximaram da fronteira com a China no rio Yalu. A terceira falha, de natureza tática, teria sido a tentativa fracassada de realizar operações encobertas com agentes chineses de Taiwan através das linhas inimigas. Como a Doutrina Truman de contenção ao comunismo adotou um tom cruzadista a partir da diretriz aprovada pelo Conselho de Segurança Nacional em abril de 1950 (NSC-68), os tomadores de decisões em Washington consideravam impossível qualquer autonomia nas decisões estratégicas da República Popular da China (RPC) ou da República Popular Democrática da Coréia (RPDC), consideradas meros «satélites» da União Soviética. Como demonstrou Érico Duarte, os fundamentos estratégicos e as dinâmicas políticas entre Moscou, Pequim e Pyongyang foram sempre mais complexas do que a coalizão liderada por Washington avaliou. Todavia, as dinâmicas políticas e militares dos enfrentamentos tiveram efeitos importantes na configuração da CI35.

Como em Pearl Harbor, nenhum alerta avançado foi emitido e o estado-maior norte-americano só discutiu o ataque depois que as tropas norte-coreanas começassem a cruzar o paralelo 38º, nas primeiras horas de 25 de junho de 1950. Mesmo assim, os analistas de inteligência demoraram a concluir se era uma invasão em larga escala que estava em curso. As tropas dos Estados Unidos e da Coréia do Sul foram empurradas até Pusan, no litoral sul da península. Também como em Pearl Harbor, algumas informações isoladas, principalmente derivadas de inteligência de sinais (SIGINT), situavam a invasão da Coréia do Sul como uma possibilidade baixa nas previsões da CIA, as quais eram vistas com ceticismo ainda maior pelos departamentos de Estado e de Defesa. Após o desembarque anfíbio em Inch’on, em setembro de 1950, o general norte-americano Douglas MacArthur (comandante das forças da ONU) assegurou a Truman que os «comunistas chineses não iriam atacar, que os americanos haviam vencido a guerra e que ele poderia enviar uma Divisão para a Europa em janeiro de 1951»36.

Mesmo com suas tropas encontrando unidades chinesas isoladas desde o final de outubro, MacArthur exorbitou suas ordens e desencadeou uma nova ofensiva em 24 de novembro de 1950. A 77.ª força-tarefa foi desembarcada no litoral norte-coreano do mar do Japão e deveria avançar até o rio Yalu para invadir a China. No dia seguinte, 300 mil efetivos chineses atacaram junto com as tropas de Kim Il Sung e avançaram até janeiro de 1951, capturando Seul37. Houve apoio aéreo soviético, mas de modo geral a segunda fase da Guerra da Coréia foi travada principalmente entre a China e os Estados Unidos. Em abril de 1951, o general MacArthur foi demitido do posto de comandante-em-chefe, logo depois da Army Security Agency, a agência de inteligência de sinais do exército, decodificar mensagens diplomáticas espanholas e portuguesas em Tóquio, reportando afirmações do general sobre como ele pretendia «usar a guerra da Coréia para resolver a questão com a China e, se necessário, com a União Soviética» com o uso de armas nucleares. Somente depois da demissão de MacArthur foi possível para a CIA e o Pentágono estabeleceram centros conjuntos de interpretação fotográfica para obtenção de inteligência de imagens (IMINT), uso sistemático das informações de SIGINT e, de forma mais precária, programas de interrogação de prisioneiros, tentativas de infiltração no Norte e operações paramilitares. A partir de julho de 1951, a frente de batalha estabilizou-se na região de Panmunjom, cruzando o paralelo 38º naquilo que seria negociado como linha do armistício assinado em julho de 195338.

As falhas de inteligência na Guerra da Coréia também decorreram das tensões civis-militares que marcaram o Governo Truman.

O novo DCI nomeado após o início da crise coreana, general Walter Bedell Smith, tinha mais acesso ao presidente e autoridade sobre a CIA, forças armadas e Departamento de Estado. Assim, Smith iniciou uma série de reformas conhecidas como «reorganização de 1950», as quais se estenderam até 1953. O peso do componente militar no sistema de inteligência dos Estados Unidos aumentou significativamente39. Duas áreas constituíram o foco das tentativas de melhorar a coordenação e a efetividade, a saber, a inteligência de sinais (SIGINT) e a área de análises interdepartamentais sobre temas internacionais (estimates).

Na área de inteligência de sinais foi criada a National Security Agency (NSA) em 1952, por meio de memorando secreto. Subordinada ao Departamento de Defesa, a nova agência substituiu a Armed Forces Security Agency (AFSA) e centralizou as atividades militares e civis de interceptação, decodificação e produção de inteligência de comunicações e sinais eletrônicos. É importante notar que, nos Estados Unidos, além das forças armadas (exército, marinha e força aérea), existem também as chamadas agências de suporte ao combate, com pessoal civil e militar (oriundos das forças singulares). No final do primeiro mandato de Eisenhower, em 1956, a NSA já tinha mais de nove mil empregados e subordinava um número equivalente de técnicos militares e civis trabalhando nos serviços criptológicos das forças armadas e de outras agências civis. Em 1957 foi concluído o quartel-general da nova agência em Fort Mead, entre Washington e Baltimore. A partir de 1957, a NSA geriu o maior projeto de pesquisa em computação então existente no mundo. Foram mais de 25 milhões de dólares em cinco anos de pesquisas em parceria com a Rand Corporation e o MIT, além de empresas como IBM, General Electric, Philco e RCA. Um resultado do programa foi o aumento de mais de 1000% na capacidade de processamento do parque computacional da agência, que também era o maior do mundo à época40.

Na área de análise e produção de inteligência, foi criado, ainda em 1951, o Office of National Estimates (ONE). O primeiro diretor do órgão foi William Langer, um historiador de Harvard que dirigiu a seção de pesquisa e análise do OSS durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1952, a criação do Diretório de Inteligência (DI) da CIA objetivava coordenar melhor as estimativas nacionais e as análises de fatos correntes. Fracassadas as tentativas anteriores de melhorar a coordenação interagências na área de operações encobertas, primeiro com o Psychological Strategy Board (PSB), em 1951, e depois com o Operations Coordinating Board (OCB) em 1953, a responsabilidade pela condução de operações encobertas no exterior só seria atribuída decisivamente para a CIA por meio da Diretriz 5412 do NSC em 195441. Ainda durante a Guerra da Coréia, em 1952, porém, a CIA respondeu à globalização da Guerra Fria fundindo o OPC (covert actions) e o OSO (espionage) em um novo Diretório de Planos, renomeado em 1973 como Diretório de Operações (DO).

O desenvolvimento institucional entre 1947 e 1952, fortemente condicionado pelas relações de poder entre os Estados Unidos e a União Soviética, condicionou decisivamente o surgimento de um sistema de inteligência propriamente dito nos Estados Unidos. Criada por Truman, a CI consolidou-se como uma parte importante do poder estatal norte-americano durante a presidência de Dwight D. Eisenhower.

Novos requisitos para a Guerra Fria global (1953-1960)

Logo que assumiu a presidência, o ex-comandante-em-chefe das forças aliadas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial escolheu Allen Dulles para ser o novo DCI. Primeiro civil a ocupar o cargo, Dulles foi também o primeiro veterano do OSS a chefiar a CI. Dulles já era o deputy director do DCI Bedell Smith desde agosto de 1951. O novo DCI e seu irmão, o secretário de Estado John Foster Dulles, foram bastante influentes na formulação e implementação da política exterior do governo republicano, bem mais do que previa a legislação de 1947 quando especificava o papel do DCI como um provedor de informações e não como um conselheiro ou formulador de políticas.

Durante o Governo Eisenhower, a CIA manteve a presença na Europa e expandiu suas operações na Ásia, na África e na América Latina. As ações mais destacadas foram as operações paramilitares na Coréia (entre a estabilização do front em meados de 1951 e a assinatura do armistício em julho de 1953), nas Filipinas (supressão da rebelião Huk, 1946-1954) e na Indochina (desde 1954), bem como a intensa participação nos golpes de Estado contra os governos nacionalistas do Irã (derrubada de Mossadegh em 1953, em conjunto com o SIS britânico) e da Guatemala (fornecimento de aviação de ataque aos golpistas e bombardeios para forçar a derrubada de Jacobo Arbenz, em 1954)42.

No plano da espionagem propriamente dita, os anos 1950 foram caracterizados por intensa disputa entre a CIA e o KGB. Tendo como epicentro Berlim, as duas superpotências tentaram infiltrar e romper as medidas de segurança uma da outra de qualquer forma possível, principalmente nas embaixadas e através de países aliados do adversário. Os Estados Unidos marcaram alguns tentos em contrainteligência e espionagem, mas, de modo geral, a inviolabilidade dos principais códigos soviéticos e o forte controle exercido pelos aparatos de segurança da União Soviética sobre suas fronteiras deixavam a superpotência ocidental em desvantagem informacional43. Um equilíbrio relativo seria atingido a partir de meados dos anos 1960. Entretanto, até o final dos anos 1950 parece valer a imagem geral que se tem da Guerra Fria, que sempre destacou a oposição entre a vantagem da União Soviética em termos de fontes humanas (HUMINT) em oposição à superioridade dos meios tecnológicos dos Estados Unidos. Segundo Jeffrey Richelson44, quando o tenente-coronel do GRU Pyotr Popov procurou a CIA em 1953 e espionou para a agência até ser executado, em 1959, seu exemplo mostrou aos americanos que os esforços para penetrar os órgãos de inteligência soviéticos não eram completamente em vão45.

Entretanto, por mais sistemáticos que fossem os programas de entrevistas (debriefings) de adidos, empresários e turistas (operação REDSKIN), por mais bem-sucedidas que parecessem operações como as dos túneis de Viena e Berlim (SILVER e GOLD) ou, ainda, por mais produtivos que fossem os voos de reconhecimento nas franjas do território da União Soviética, os hiatos informacionais eram grandes e davam margem a estimativas imprecisas e/ou autointeressadas por parte da burocracia de segurança nacional dos Estados Unidos. Quando a União Soviética testou uma bomba de hidrogênio nove meses depois dos Estados Unidos, em 1953, estimativas pessimistas sobre o ritmo soviético de produção de bombardeiros estratégicos e mísseis balísticos de alcance intercontinental levaram o Governo Eisenhower a intensificar o uso de meios técnicos de coleta de informações. Apoiada pelas agências signatárias do acordo secreto conhecido como UKUSA, a NSA estabeleceu uma rede de estações fixas para interceptação de sinais de radar e telecomunicações46.

Dada a extensão da massa territorial da União Soviética e a influência da curvatura da terra no alcance das transmissões, a localização das estações passou a ser decisiva para a dinâmica da Guerra Fria. Em 1956, já havia estações de SIGINT no Alaska, Havaí, Canadá, Austrália, Japão, Marrocos, Okinawa, Filipinas, Taiwan, Turquia, Reino Unido e Alemanha Ocidental. A estação de Sinope, na costa turca do mar Negro, por exemplo, monitorava as comunicações da frota e das bases aéreas do sul da União Soviética. Com o início dos testes de mísseis balísticos soviéticos em Kasputin Yar, no Volga, o alcance da antena da estação de Sinope foi ampliado para 4827 quilômetros, fornecendo as primeiras informações de telemetria sobre alcance e capacidade47.

Do mesmo modo, obter fotografias aéreas das instalações militares, infraestrutura econômica e de transportes, bem como das áreas soviéticas de testes balísticos, tornou-se uma prioridade para os serviços de inteligência dos Estados Unidos. Assim, em novembro de 1954, Eisenhower determinou que a CIA liderasse um projeto com a empresa Lockheed para a construção de trinta aeronaves especiais de alto desempenho. O primeiro voo de teste ocorreu em prazo recorde, em agosto de 1955. Mais conhecido como U-2, o avião possuía um só lugar, era monomotor, com largura de asa de 24,3 metros e 15,2 metros de comprimento. Voando a uma altitude máxima de 24 quilômetros, era capaz de atingir 740 quilômetros por hora e tirar quatro mil pares de fotos de uma faixa de terra de 201 quilômetros por 3,3 mil quilômetros durante uma única missão. A resolução das fotos tiradas com o sistema de câmaras do U-2 permitia aos analistas distinguir dois objetos no solo que estivessem a 30 centímetros de distância entre eles. Sucessivas gerações desse que é o mais antigo avião de espionagem ainda em uso aperfeiçoaram a altitude, resolução e área de cobertura48.

Os voos operacionais iniciaram em julho de 1956. Eram realizados a partir da Grã-Bretanha, Noruega, Alemanha Ocidental, Turquia e, posteriormente, Paquistão e Taiwan. Embora detectados pelos radares soviéticos, a grande altitude de voo tornava-os inacessíveis para as baterias de SAM (surface-to-air missiles) e para os caças MiG conseguirem interceptar. Eisenhower e a CIA sabiam que eventualmente os soviéticos poderiam interceptar uma das aeronaves. Por isso, as autorizações para missões de reconhecimento estratégico eram dadas pelo presidente e frequentemente interrompidas por razões diplomáticas ou climáticas. Após os soviéticos lançarem o satélite Sputnik 1 em 1957, as missões do U-2 foram intensificadas. Entre 1956 e 1960 foram realizados cerca de 24 sobrevoos no território da União Soviética. As imagens obtidas tornaram-se a principal fonte de informação sobre o desenvolvimento dos sistemas de armas e plataformas da União Soviética, especialmente o monitoramento do centro de testes de defesa aérea de Saryshaghan e das bases de lançamento de mísseis balísticos de Kasputin Yar, Tyuratam e Semipalatinsk (hoje Semey). Com base nas fotos do U-2, debates sobre o chamado gap a favor da União Soviética nas áreas de bombardeiros e ICBM passaram a contar com evidências mais consistentes na cadeia de comando dos Estados Unidos49.

Apesar de bem-sucedida, a operação com os U-2 sofreu uma importante derrota no dia 1.º de maio de 1960, quando uma aeronave pilotada por Gary Powers foi derrubada por um míssil soviético na região de Sverdlovsk (hoje Yekaterinburg). Após o incidente foram interrompidos todos os voos sobre a União Soviética. Vale relembrar o evento por dois motivos. Primeiro, porque a doutrina da negação plausível e seus limites foram pela primeira vez expostos. Segundo, porque a discussão sobre meios de coleta de inteligência intrusivos adquiriu maior importância nas relações internacionais em função do incidente50.

Em primeiro lugar, as missões de sobrevoo do território estavam cada vez mais arriscadas por causa das contramedidas soviéticas. Fotografias tiradas nas próprias missões do U-2 e validadas pelo agente norte-americano no GRU, tenente-coronel Pyotr Popov, confirmavam que em 1959-1960 uma quantidade crescente de unidades soviéticas de defesa antiaérea vinha recebendo novos radares P-30 (capazes de detectar a presença de alvos acima de 24 quilômetros), caças Sukhoi SU-9 (supersônicos com altitudes de interceptação acima de 20 quilômetros) e sistemas de mísseis SA-2 (com altitudes de engajamento até 25 quilômetros para alvos voando até 1500 quilômetros/hora). Além disso, uma reestruturação nos sistemas de C3I (comando, controle, comunicações e inteligência) das Forças de Defesa Aérea da União Soviética estava em curso, em resposta à incapacidade de impedir as violações de espaço aéreo e a coleta de inteligência através de plataformas aerotransportadas. Em segundo lugar, os voos sobre a União Soviética haviam sido suspensos depois da reunião entre Eisenhower e Khrushchev em Camp David, em setembro de 1959. Afinal, Eisenhower não queria correr o risco de um avião ser derrubado antes da reunião de cúpula entre as quatro potências, marcada para Paris em maio de 1960. Entretanto, como a CIA e os militares queriam novas evidências dos testes operacionais dos ICBM que poderiam impactar a reunião de junho, obtiveram autorização presidencial para mais uma série de voos.

Em 1 de maio de 1960, o U-2 pilotado por Gary Powers decolou de Peshawar no Paquistão com destino previsto para Bødo, Noruega. Informado pelo ministro da Defesa Malinovski às cinco horas de que um avião intruso havia sido detectado sobre o Tadjiquistão e dirigia-se para a região industrial dos Urais, Khrushchev ordenou que o avião fosse abatido, considerando uma provocação inaceitável a violação do espaço aéreo da União Soviética no feriado do Dia do Trabalho, quando uma grande parada ocorreria em Moscou. Segundo os registros soviéticos, às oito e quarenta e cinco um míssil SA-2 explodiu à frente do U-2 pilotado por Powers, seguido por outro que acertou a fuselagem e o motor logo depois que o piloto conseguiu saltar de paraquedas. Um caça MiG-19 foi derrubado por fogo amigo51.

Eisenhower usou inicialmente uma «estória de cobertura», afirmando tratar-se de um avião desarmado da NASA em missão de monitoramento meteorológico. Quando Khrushchev protestou e as autoridades soviéticas mostraram o piloto Gary Powers vivo e destroços do U-2 foram expostos na Praça Vermelha, a «plausibilidade da negação» evaporou-se e Eisenhower assumiu a responsabilidade pela violação do espaço aéreo soviético. A cúpula de Paris foi cancelada depois que Khrushchev fez exigências de retratação que Eisenhower recusou-se a atender. Seguiram-se manobras diplomáticas de ambos os lados, mas as relações entre as duas superpotências pioraram com o incidente. Dentre as manobras, Eisenhower propôs pela segunda vez a assinatura de um tratado para permitir sobrevoos de reconhecimento estratégico (Open Skies Treaty), recusado pela União Soviética. Vale lembrar que os aviões U-2 já haviam voado missões para monitorar as crises de Suez e da Hungria (1956), sendo utilizados novamente nos anos seguintes na China, em Cuba, na Indochina, na Indonésia, no Oriente Médio e em outros lugares52.

Privados de uma importante fonte de informações sobre a União Soviética, os Estados Unidos aceleraram os estudos iniciados pela Força Aérea e pela Rand Corporation em 1946, sobre a orbitação de satélites artificiais com sistemas de vigilância eletro-ópticos. A partir de 1954, o Pentágono e a CIA passaram a investir em projetos de desenvolvimento de um satélite capaz de fotografar o território inimigo sem os inconvenientes da violação do espaço aéreo nacional. Segundo William Burrows53, em 1956 os vários estudos foram consolidados em um único programa, chamado Weapon System 117L, a partir do qual a Lockheed Missiles and Space Company e outras empresas contratadas tentaram orbitar satélites em três programas específicos:

(1) SAMOS: no qual as fotos seriam gravadas e processadas em câmeras de vídeo e então enviadas através de sinais de rádio para estações de controle em terra de modo similar às transmissões de TV. O projeto previa a disponibilização das imagens para análise em torno de noventa minutos após as fotografias terem sido tiradas. Embora tenham sido lançados entre cinco e dez satélites samos, nenhum foi bem-sucedido e o programa foi abandonado em 1963.

(2) MIDAS: o Missile Defense Alarm System utilizaria sensores infravermelhos montados em telescópios estacionados em órbitas acima do limite geoestacionário para monitorar lançamentos de mísseis e alertar contra-ataques nucleares. Também esse projeto estava muito à frente da tecnologia disponível no final da década de 1950 e foi encerrado.

(3) CORONA: iniciado apenas em 1958, após os problemas com os outros dois programas terem ficado evidentes, tratou-se um programa da CIA voltado para a obtenção de fotografias convencionais e que utilizava a ejeção de uma cápsula com os rolos de filmes para ser recolhida em terra, no ar ou no mar. O projeto, também dirigido por Bissell em associação com a Lockheed, produziu resultados mais imediatos e duradouros a um só tempo, colocando em órbita o primeiro satélite completamente operacional para coleta de imagens meses após a derrubada do avião pilotado por Gary Powers54.

Em 18 de agosto de 1960, o Discoverer XIV foi lançado da Vandenberg Air Force Base na Califórnia, atingindo uma órbita de 182 quilômetros de perigeu, 807 quilômetros de apogeu e um ângulo de inclinação de 80o, que permitia ao satélite sobrevoar todo o território da União Soviética55. No dia seguinte, a cápsula de reentrada de 38 quilômetros foi recolhida por um avião C-119 no Alaska e enviada para Washington DC, onde os intérpretes fotográficos da CIA trabalharam sobre o rolo de 90 centímetros do filme. As primeiras fotos de satélite eram escuras e de baixa qualidade, mas um único filme trazia uma cobertura de mais de 1,6 milhão de quilômetros quadrados do território soviético, maior do que a soma dos quatro anos de operações com o U-2. Novas missões corona nos meses seguintes descobriram Plesetsk como uma base de lançamento de ICBM com as mesmas configurações existentes em Tyuratam, mas não confirmaram qualquer outra localidade semelhante.

Para lidar com o potencial que as novas plataformas de coleta de IMINT implicam, Eisenhower autorizou a criação de duas novas organizações na crescente CI. Subordinado ao Pentágono, mas com influência formal do DCI sobre questões de orçamento, prioridades e pessoal, o National Reconnaissance Office (NRO) controlaria os processos de pesquisa, desenvolvimento e aquisição de novos satélites desde sua criação em 25 de agosto de 1960. A existência do NRO só foi relatada pela mídia após 1973 e só foi admitida oficialmente pelo governo dos Estados Unidos em 1992. Para a interpretação das fotos obtidas, Eisenhower assinou uma diretriz de segurança nacional do NSC pouco antes de deixar a presidência, autorizando a criação de um National Photographic Interpretation Center (NPIC), o que ocorreu já em 1961. Além das duas novas organizações, foi instituído também um comitê interagências para estabelecer prioridades de vigilância e reconhecimento, o COMIREX (Committee on Imagery Requirements and Exploitation).

A criação da NSA e do NRO, assim como as reorganizações da CIA, a expansão de suas missões e a criação de novas estruturas interagências são inseparáveis das dinâmicas conflituosas da Guerra Fria. O papel dos interesses burocráticos e das preferências políticas de atores governamentais e empresariais nos Estados Unidos também precisa ser analisado, o que faremos em trabalhos posteriores nesta seara de pesquisa.

O importante, no caso deste artigo, foi destacar um fator negligenciado pelos modelos estritamente institucionalistas, qual seja, o de que as dinâmicas institucionais são inseparáveis das relações de poder, principalmente internacionais.

Conclusão

Em 1960, a NSA detinha um orçamento que era o dobro do da CIA, o qual, por sua vez, também era quase o dobro do orçamento do Departamento de Estado. Em treze anos, durante as presidências Truman e Eisenhower, o Governo norte-americano construiu um aparato de inteligência que já não era temporário, mas sim formava uma nova burocracia permanente na área de segurança nacional, ao lado das forças armadas e da diplomacia. Ao lado do soldado e do diplomata, as figuras arquetípicas das relações internacionais segundo Raymond Aron, havia surgido uma terceira, o oficial de inteligência56.

Em seu famoso discurso de despedida da Presidência em janeiro de 1961, Eisenhower alertou a nação sobre os perigos de uma influência indevida do complexo militar-industrial. Mas também reconheceu a irreversibilidade da revolução tecnológica que iniciara, reiterando indiretamente a importância da inteligência para o equilíbrio entre segurança e liberdade57. A emergência da CI caracterizou-se, no curto prazo, pelas operações encobertas que estiveram associadas ao primeiro grande desastre público da história da inteligência norte-americana. Ignorando o quase fracasso da operação na Guatemala (1954), além do completo fracasso da tentativa de derrubar o Presidente Sukarno da Indonésia (1957), bem como o desgaste decorrente das suspeitas de envolvimento no assassinato de Patrice Lumumba (1960), Eisenhower autorizou a CIA a lançar diversas campanhas contra o regime de Fidel Castro após a vitória da revolução cubana em 1959. Tais campanhas culminaram na fracassada invasão da baía dos Porcos, já no Governo Kennedy, tornando-se assim o marco de uma nova fase na história dos serviços de inteligência dos Estados Unidos. Estas operações marcam o início das atividades desenvolvidas pelas novas instituições e estão relacionadas com, por um lado, o contexto determinante de Guerra Fria e, por outro lado, com a organização de uma comunidade de inteligência no interior dos Estados Unidos. Esta relação dialética entre os níveis externo e interno influenciou o perfil organizacional e a dinâmica política da área de inteligência e segurança nacional.

Identificamos, neste artigo, com a análise de dois momentos distintos, que no decorrer da inicial adaptação dos Estados Unidos à disputa estratégica com a União Soviética foram criadas as primeiras instituições com atribuições de realizar ações de inteligência no exterior e a característica das primeiras ações marcaram as guinadas institucionais realizadas pelo governo norte-americano. Estas mudanças obedecem inicialmente às pressões externas por ações em regiões distintas das quais havia pensado, por exemplo na Guerra da Coréia, com uso recorrente de operações encobertas e, em seguida, de inteligência de sinais e imagens, com o aprofundamento da disputa estratégica pelo domínio do espaço. Assim, neste período, nos Estados Unidos, teve início a formação de uma comunidade de inteligência que, pelas razões que apontamos no decorrer do trabalho, superou muito (em tamanho e em ações) o que estava previsto e acordado na época de aprovação da Lei de 1947.

Ainda, este período de formação inicial sinalizou algumas características que acompanharão as mudanças nesta comunidade durante as próximas décadas. Destacamos no artigo algumas delas como (a) o peso da disputa estratégica entre Estados Unidos e União Soviética sobre a conformação das instituições de inteligência, (b) a importância para o poder executivo da inteligência de sinais e das operações encobertas, como mecanismo de ação externa, (c) o papel das ações e adaptações institucionais do período analisado que tiveram, por um lado, a imprecisão normativa sobre as definições, funções e atribuições dos aparatos de inteligência criados e, por outro lado, a inexistência de regramentos internacionais sobre operações de inteligência, o que permitiu, por exemplo, a expansão das operações encobertas para o Terceiro Mundo.

Destacamos então que foi em função das pressões estruturais e das dinâmicas políticas e de segurança internas aos Estados Unidos que foram criadas e moldadas duas das principais instituições desta comunidade de inteligência (CIA e NSA). A partir da relação dialética entre os imperativos da competição estratégica, das preferências políticas do executivo e das prioridades de segurança interna estas instituições passaram por ajustes imprevistos e por guinadas que obedecem aos mecanismos denominados de drift institucional58, como evidenciamos nos períodos analisados, em especial, na incorporação das operações encobertas como forma de ação dos Estados Unidos no exterior.

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2ZEGART, Amy. - Flawed by Design: The Evolution of the CIA, JCS, and NSC. Stanford University Press, 2000.

3FIORETOS, O. - «Historical institutionalism in international relations». In International Organization. Vol. 65, N.º 2, 2011, pp. 367-399.

4CAPOCCIA, Giovanni; KELEMEN, R. Daniel - «The study of critical junctures: theory, narrative, and counterfactuals in historical institutionalism». In World Politics. Vol. 59, N.º 3, 2007, pp. 341-369.

5BAUDET, Floribert; SIBUL, Eric A. - «Historical research in the military domain». In Routledge Handbook of Research Methods in Military Studies. Nova Iorque: Routledge, 2014. pp. 87-97.

6BERGER, Mark - «The real Cold War was hot: the global struggle for the Third World». In Intelligence and National Security. Vol. 23, N.º 1, 2008, pp. 112-126.

7 HACKER, Jacob S.; PIERSON, Paul; THELEN, Kathleen - «Drift and conversion: hidden faces of institutional change». In MAHONEY, James; THELEN, Kathlen, eds. - Advances in Comparative-historical Analysis. Cambridge: Cambridge University Press, 2015, pp. 180-208; THELEN, Kathleen; MAHONEY, James - «Comparative-historical analysis in contemporary political science». In Advances in Comparative-historical Analysis. Vol. 3, 2015, p. 36.

8Note-se que o National Security Act of 1947 (Public Law 253, 80th Congress, Chapter 343, 1st Session; S. 758) foi incorporado ao Código de Leis Federais dos Estados Unidos (U.S. Code, Title 50). A maior parte da legislação sobre assuntos de inteligência, com exceção das leis anuais de autorização orçamentária, tem sido introduzida como emenda aos diversos capítulos da Lei de 1947. Assim, referências ao National Security Act «as amended» indicam alterações ocorridas ao longo do tempo. Ver: https://uscode.house.gov. Ver também: https://www.intelligence.senate.gov/legislation. Último acesso em 20 de agosto de 2021.

9 LEFFLER, Melvyn; WESTAD, Odd Arne, ed. - The Cambridge History of the Cold War. Cambridge: Cambridge University Press, 2010, vol. 1.

10ZEGART, Amy. - Flawed by Design…, pp. 109-162.

11ZEGART, Amy - Spying Blind: The CIA, the FBI, and the Origins of 9/11. Princeton University Press, 2000, pp. 54-108.

12GOLDMAN, Jan, ed. - The Central Intelligence Agency: An Encyclopedia of Covert Ops, Intelligence Gathering, and Spies. ABC-CLIO, 2015, pp. 415-419.

13MONJE, Scott - The Central Intelligence Agency: A Documentary History. Nova Iorque: Greenwood Publishing Group, 2008.

14ANDREW, C. - For the President’s Eyes Only: Secret Intelligence and the American Presidency from Washington to Bush. Londres: HarperCollins, 1995.

15ZEGART, Amy - Spying Blind…, p. 163.

16SMITH, Bradley - «An idiosyncratic view of where we stand on the history of American intelligence in the early post‐1945 era». In Intelligence and National Security. Vol. 3, N.º 4, 1988, pp. 111-123.

17HOLT, Pat - Secret Intelligence and Public Policy: A Dilemma for Democracy. Washington, D.C.: Congressional Quarterly Press, 1995, p. 199.

18SCHROEDER, Richard - The Foundation of the CIA: Harry Truman, the Missouri Gang, and the Origins of the Cold War. University of Missouri Press, 2017.

19GARTHOFF, Douglas - Directors of Central Intelligence as Leaders of the US Intelligence Community, 1946-2005. Potomac Books, Inc., 2007.

20GOLDMAN, Jan, ed. - The Central Intelligence Agency….

21Para uma avaliação dos primeiros relatórios sobre a União Soviética, entre 1946 e 1950, ver: KUHNS, Woodrow J. - Assessing the Soviet Threat: The Early Cold War Day. Center for the Study of Intelligence (CSI/CIA), 1997, p. 466.

22GODSON, Roy - Dirty Tricks or Trump Cards: US Covert Action & Counterintelligence. Routledge, 2018.

23CORKE, Sarah-Jane - «George Kennan and the inauguration of political warfare». In Journal of Conflict Resolution. Vol. 26, N.º 1, 2006, pp. 101-120.

24GADDIS, John - Strategies of Containment: A Critical Appraisal of Postwar American National Security Policy during the Cold War. Edição revisada e atualizada. Nova Iorque: Oxford University Press, 2005, pp. 24-52.

25THORNE, Thomas; LAFANTASIE, Glenn, ed. - Foreign Relations of the United States, 1945-1950. Emergence of the Intelligence Establishment. Washington, DC: US Government Printing Office.

26SMITH, Robert - «A note on the origins of the CIA’s covert action capability». In The Historian. Vol. 48, N.º 2, 1986, pp. 225-230.

27CALLANAN, James - Covert Action in the Cold War: US Policy Intelligence and CIA Operations. Nova Iorque: I. B. Tauris, 2010.

28O’ROURKE, Lindsey - Covert Regime Change: America’s Secret Cold War. Nova Iorque: Cornell University Press, 2018, pp. 108-110.

29PRADOS, John - Presidents’ Wars: CIA and Pentagon Covert Operations since WWII Through the Persian Gulf. Edição revisada e atualizada. Nova Iorque: William M. & Company, 1996, pp. 13-60.

30 WARNER, Michael - The Rise and Fall of Intelligence: An International Security History. Washington, DC: Georgetown University Press, 2014, pp. 176-179.

31GUSTAFSON, Kristian - «Early stages in the evolution of covert action governance in the United States, 1951-1961». In Public Policy and Administration. Vol. 28, N.º 2, 2013, pp. 144-160.

32WARNER, Michael; MCDONALD, J. Kenneth - US Intelligence Community Reform Studies since 1947. Washington, DC: CSI/CIA, 2005.

33ENGERMAN, David - Know Your Enemy: The Rise and Fall of America’s Soviet Experts. Nova Iorque: Oxford University Press, 2009, p. 139.

34UNSINGER, Peter - «Three intelligence blunders in Korea». In International Journal of Intelligence and Counterintelligence. Vol. 3, N.º 4, pp. 549-561.

35DUARTE, Érico - A Guerra entre China e Estados Unidos na Coréia: Da Escalada às Negociações de Cessar-Fogo. Curitiba: Appris, 2019, pp. 37-112.

36ANDREW, C. - For the President’s Eyes Only…, pp. 184-196.

37DUARTE, Érico - A Guerra entre China e Estados Unidos na Coréia..., p. 95.

38Ibidem, pp. 345-366.

39WARNER, Michael - The Rise and Fall of Intelligence..., pp. 176-179.

40AID, Matthew - «The National Security Agency and the Cold War». In Intelligence and National Security. Vol. 16, N.º 1, 2001, pp. 27-66.

41GUSTAFSON, Kristian - «Early stages in the evolution of covert action governance…», p. 156.

42PRADOS, John - Presidents’ Wars…, pp. 108-148.

43O Ministério da Segurança do Estado (Komitet Gosudarstvennoy Bezopasnosti - KGB) foi assim nomeado em 1954, depois da tentativa fracassada de Beria em fundir a segurança do Estado com o Ministério do Interior (MVD) na União Soviética.

44RICHELSON, Jeffery T. - A Century of Spies: Intelligence in the Twentieth Century. Oxford: Oxford University Press, 1995, pp. 256-271.

45«GRU» é a sigla para «Glavnoye Razvedyvatel’noye Upravleniye», o diretório principal de inteligência do Estado-Maior das Forças Armadas da União Soviética, criado em 1918-1924 e que manteve suas funções e o mesmo nome na Rússia após a dissolução da União Soviética.

46«UKUSA» refere-se ao acordo assinado em 1948 pelos Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Envolve desde então a operação conjunta de estações de interceptação, divisão de áreas geográficas para cobertura criptográfica e troca completa das interceptações e decodificações obtidas, além do uso padronizado de terminologia, equipamentos, procedimentos operacionais e de segurança em inteligência de sinais, imagens, vigilância oceânica, contrainteligência, inteligência militar e científica. WELLS, Anthony R. - Between the Five Eyes: 50 Years of Intelligence Sharing. Oxford, UK: Casemate, 2020.

47ALVAREZ, David - «Behind Venona: American signals intelligence in the early cold war». In Intelligence and National Security. Vol. 14, N.º 2, 1999, pp. 179-186.

48O código do programa era «acquatone/idealist» e, para encobrir sua função real, o novo avião foi chamado de Utility-2. Ver RICHELSON, Jeffrey T. - The Wizards of Langley: Inside The CIA’s Directorate of Science and Technology. Boulder: Westview Press, 2002.

49POLMAR, Norman; ALLEN, Thomas - Spy Book: The Encyclopedia of Espionage. Nova Iorque: Random House, 1997, pp. 8-16 e 561--563.

50ALDRICH, Richard; RAWNSLEY, Gary; RAWNSLEY, Ming-Yeh - «Introduction: the clandestine cold war in Asia, 1945-65». In Intelligence and National Security. Vol. 14, N.º 4, 1999, pp. 1-14.

51SCHELL, John - «The SA-2 and U-2: secrets revealed». In Air Power History. Vol. 68, N.º 2, 2021, pp. 33-42.

52BERGER, Mark - «The real Cold War was hot…».

53BURROWS, William - This New Ocean: The Story of the First Space Age. Nova Iorque: Modern Library, 1999.

54RICHELSON, Jeffrey T. - The U.S. Intelligence Community. 7.ª edição. Boulder: Westview Press, 2002.

55Uma exposição sucinta e instrutiva sobre dinâmicas orbitais e os diversos aspectos relacionados aos veículos de lançamento de satélites (foguetes e ônibus espaciais) pode ser encontrada nos capítulos 1 e 2 de: DUTTON, Lyn; HARDING, Richard; WINTERTON, Richard - Military Space. Londres: Brassey’s, 1990.

56ARON, Raymond - Paz e Guerra entre as Nações. Brasília: UnB, 2002.

57GADDIS, John - Strategies of Containment…, p. 389.

58HACKER, Jacob S.; PIERSON, Paul; THELEN, Kathleen - «Drift and conversion…».

Recebido: 27 de Outubro de 2021; Aceito: 18 de Fevereiro de 2022

Marco Cepik Professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais (DERI) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor permanente do programa de pós-graduação em Estudos Estratégicos Internacionais (UFRGS) e colaborador do programa de pós-graduação em Relações Internacionais (UFSM). Doutorado em Ciência Política pelo IUPERJ (2001). Pós-doutoramento na Universidade de Oxford (2005) e no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (2018).

Júlio Rodriguez Professor adjunto do Departamento de Economia e Relações Internacionais (DERI) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Professor permanente do programa de pós-graduação em Relações Internacionais (UFSM). Doutorado em Ciência Política pela Universidade de Lisboa (2013).

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