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Revista Lusófona de Educação

versão impressa ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  no.23 Lisboa  2013

 

Em busca da boa escola – instituições eficazes e sucesso educativo Jorge
Ávila de Lima, 2008 V. N. Gaia: Fundação Manuel Leão

 

Manuela Marques *

* manuela.marques@nuclisol.org

 

A obra Em Busca da Boa Escola – Instituições Eficazes e Sucesso Educativo, de Jorge Ávila de Lima, surgiu, segundo o autor, da vontade de “saber o que é uma boa escola, como identificá-la e como fazer com que as outras adquiram características semelhantes” (p. 7) e também de saber se as escolas produzem efeitos no desempenho e desenvolvimento dos estudantes.

A obra está organizada em cinco capítulos: o primeiro, remete-nos para a problemática da eficácia da escola e as diferentes polémicas que a abrangem, o segundo, apresenta as várias orientações de investigação existente e os principais estudos sobre escolas eficazes, no terceiro, o autor fala da complexidade das metodologias utilizadas no campo da eficácia, mostra que “a determinação da eficácia da escola é susceptível de variar consoante os distintos critérios de medida, os diversos tipos de dados e os múltiplos métodos de análise utilizados pelos investigadores” (p. 9).

Finalmente, o quarto, refere-se à maneira como o movimento da escola eficaz influencia a educação.

A investigação das escolas eficazes parte dos pressupostos dos trabalhos empíricos realizados por Coleman et al. (1966) e Jencks et al. (1972) que consideravam a educação escolar incapaz de combater as desigualdades dessa época. Estas conclusões foram alvo de crítica por outros investigadores e abriram portas ao surgimento de uma nova corrente reactiva, que alegava que o modelo de análise de Coleman e Jenks apresentava lacunas, não contemplando características da vida interna da escola como determinantes do sucesso do aluno. Seguiram-se novas estratégias para procurar perceber que características distintivas apresentavam as escolas, na tentativa de compreender de que forma os processos que ocorriam na escola afectavam os resultados dos alunos. Neste sentido, começava-se a entender a escola como unidade dotada de especificidades que exercem efeitos sobre a aprendizagem e o desenvolvimento do aluno.

Os estudos desenvolvidos no âmbito da eficácia mostraram que as escolas focalizavam a avaliação nos resultados escolares, privilegiando a aprendizagem no lado formal, deixando de lado ou, para segundo plano, os processos informais e culturais; as escolas eram descritas como entidades estáticas e estáveis.

As técnicas utilizadas, maioritariamente quantitativas, eram constituídas essencialmente por regras e técnicas estatísticas avançadas.

Reconhecem-se muitos pontos fortes nas ditas características, mas outras acabaram por constituir limitações no avanço do estudo da eficácia.

A investigação sobre a eficácia das escolas tem por base a necessidade de contestar a tese de que as escolas não produzem efeitos nos alunos. O pressuposto de que a escola produz efeito no desempenho dos alunos faz com que o sistema educativo seja visto como agregação de unidades múltiplas, que produzem diferentes efeitos sobre os resultados escolares, e não como tendo um comportamento igual, reforçando a ideia de que existe uma “diversificação da produção escolar” (p. 419), dependendo da natureza de cada escola.

As diferentes abordagens de escola eficaz remetem para a equidade na educação, onde os resultados dos alunos nada tinham a ver com as trajectórias familiares ou sociais. É certo que a investigação não ficou por aí, manteve o critério de equidade, mas passou a abranger todos os alunos, mais e menos desfavorecidos, alargando o leque de focalização de resultados educativos, tanto aos académicos como aos sociais, assim como alterou o tempo de concentração dos resultados dos alunos num determinado momento, para ao longo do tempo.

Lima (2008), refere que é consensual entre os diversos investigadores que a escola acrescenta algo aos atributos iniciais dos alunos que nela ingressam e que de facto esse é o critério mais adequado para medir a sua eficácia.

Este princípio tem por base o reconhecimento de que os antecedentes e características dos alunos influenciam de imediato as suas competências quando entram na escola contribuindo para a teoria de que a escola acrescenta valor aos alunos (o chamado valor acrescentado).

O autor reforça a ideia de que a utilização de dados que não tenham em conta o conceito de “valor acrescentado” pode ter efeitos perversos, contrários à melhoria da qualidade da escola.

Esta teoria tende a ser cautelosa na interpretação e utilização, sublinhando que deve ser adoptada sobretudo para distinguir grupos extremos de organizações com desempenhos muito melhores ou piores do que o previsto. A constante reflexividade leva os investigadores a dar ênfase à ideia de que só “…é legítimo e justo comparar aquilo que é comparável” (Lima, 2008, p. 53).

A questão do “valor acrescentado” leva os investigadores a propor um novo conceito, o conceito de escola em melhoria.

A pesquisa sobre a eficácia da escola confirma que a escola é um lugar onde são produzidos sucessos ou insucessos e que se traduz na tentativa de provar que existe um efeito da escola sobre os alunos. Centrou as escolas nos resultados, no seu aspecto formal e nas suas características de eficácia (quadro 1). Insistiu também na utilização de métodos quantitativos e análises estatísticas de dados, que, segundo o autor, podem prejudicar a compreensão da escola e os seus processos de melhoria.

 

 

Segundo Lima (2008): “o movimento das escolas eficazes deu dois contributos essenciais ao mundo da educação: combateu o pessimismo sociológico e o determinismo estrutural e cultural (isto é, a ideia de que a escola é impotente para contrariar as diferenças sociais existentes), e trouxe uma nova esperança e uma fonte de auto-estima aos profissionais do ensino, levando-os a acreditar que são capazes de fazer alguma diferença na vida dos alunos” (p. 420).

A obra analisada contribui para a compreensão dos processos que se desenvolvem no interior da escola e da sala de aula, com reflexos nos resultados educativos.

O movimento da eficácia estimulou, de forma informada, a reflexão e a auto-avaliação dos professores e das instituições educativas.

Como crítica, que vai ao encontro da opinião do autor, o movimento das escolas eficazes enquadra-se no momento político actual e no contexto da globalização. Trabalha-se para os resultados escolares e não para os resultados educativos.

Percebemos que o movimento das escolas eficazes se afirma na forma como os nossos governos fazem a política educativa, transformando a eficácia numa tecnologia de controlo das suas actividades, acima de tudo se a mudança for impulsionada por planos pré-formatados e medidos pelos itens de sucesso ou fracasso.

Estes resultados são normalmente utilizados para determinar – condicionando ou não - o financiamento dos diversos estabelecimentos de ensino.

A obra destaca ainda o papel do clima nas escolas eficazes, começa por focar os trabalhos de Brookover et al. (1979), apresenta um estudo sobre o clima social da escola e a sua estrutura, considera que estes dois factores são fundamentais para compreender os níveis de sucesso dos alunos e que as variáveis do clima social explicavam o autoconceito dos estudantes e o seu sentido de independência na aprendizagem (self- -reliance).

Os estudos de Brookover tentaram responder à questão: será que o clima psicossocial de uma escola é uma alternativa explicativa viável às teses que dão conta das diferenças de sucesso entre as escolas, baseando-se na composição social da sua população estudantil?

Os investigadores partiram da hipótese de que cada escola tem a sua definição de status e de papéis, de normas, de avaliações e de expectativas relativas aos estudantes. Segundo eles estas eram as características que diferenciavam as escolas nos resultados apresentados.

Brookover considerou que os resultados de uma escola nascem dos inputs que recebe. Esses inputs, por sua vez, influenciam não só os resultados como a estrutura social e o clima de escola.

Dos inputs destacavam-se duas variáveis: a composição do corpo discente e outros aspectos ligados ao pessoal não docente que trabalha na escola. Estas variáveis permitiam compreender a estrutura social e os seus padrões de interacção. Foi também considerado o envolvimento dos pais na vida da escola, o grau de diferenciação do currículo proporcionado aos alunos e o tempo dos professores dedicado ao ensino.

O autor apresenta o movimento das escolas eficazes com algumas limitações e refere que o mesmo, para evoluir, terá que:

• Adoptar uma visão mais alargada dos objectivos educativos das escolas, incluindo aspectos relativos ao desenvolvimento pessoal e social dos alunos, às competências transversais e às aprendizagens de nível mais complexo;

• Mobilizar dados qualitativos e quantitativos de forma complementar, sem sub-meter uns à hegemonia dos outros;

• Recolher e analisar mais informação relativa aos diferentes níveis institucionais (professores, turma, departamento, escola, etc.);

• Integrar dados sobre os contextos significativos da actividade da escola, quer os socioeconómicos mais imediatos, quer os culturais e políticos mais globais;

• Adoptar concepções mais complexas sobre a natureza das organizações escolares, abandonando uma perspectiva finalista e linear sobre as mesmas;

• Abdicar da concepção do aluno enquanto assimilador de conhecimentos pré preparados e do professor como seu transmissor;

• Alterar o seu paradigma conceptual sobre os processos de mudança educativa;

• Evitar e combater activamente as apropriações políticas que subvertem a sua intencionalidade e deturpam a substância dos resultados;

• Desvincular-se da imposição de estratégias gerencialistas que colonizam acriticamente o território escolar com práticas e discursos oriundos do mundo empresarial;

• Valorizar a importância intrínseca dos processos educativos e não apenas os seus resultados;

• Integrar uma maior multiplicidade de perspectivas sobre a qualidade da escola e assumir-se enquanto construção social e não como uma disciplina científica pretensamente neutra capaz de apresentar a realidade escolar “exactamente como é”.

Trata-se de um desafio de transformação muito complexo, mas necessário, para que se mantenha o interesse por parte dos profissionais de educação, empenhados na mudança e na melhoria da educação, na produção de um trabalho mais autêntico.

Podemos considerar o movimento das escolas eficazes como o pontapé de saída para as boas escolas, as chamadas escolas democráticas. Parte-se do pressuposto de que a investigação sobre os efeitos da escola tem contribuído para a produção da igualdade ou desigualdade de oportunidades nos contextos sociais e educativos em que se vive, desde que a investigação da eficácia abandone a tendência para a comparação do desempenho das instituições, dos alunos, e investigue a razão pela qual as escolas fazem a diferença no meio populacional onde se inserem.

A obra abre caminhos para a compreensão dos resultados da diferenciação interna das escolas, que levam à necessidade da diversificação curricular, os modelos sociais subjacentes à estratificação dos alunos e os efeitos dessa estratificação.

Na sociologia o interesse é dominado pela problemática da desigualdade de oportunidades de sucesso que tem sido aprofundada mais recentemente com os debates sobre o papel da escola na promoção de uma cidadania plena nas sociedades ditas democráticas (Derouet, 1992; Ballion, 1994; Dubet e Duru-Bellat, 2000, citado por Lima, 2008).

Destaca-se ainda nesta obra o quadro 1 das Características – Chave das escolas eficazes, segundo Sammons, Hillman e Mortimore (1995):

Síntese conclusiva e crítica

Para concluir, reforço a ideia patente em Wrigley (2007) de que “ precisamos com urgência de imprimir uma direcção diferente à educação. Não nos podemos limitar a tornar a escola mais eficaz; temos que ser mais radicais e repensar a educação para esta era de globalização. Se outro mundo é possível, então também é possível e necessária outra escola” (p. 12).

Podemos considerar que uma nova escola será uma escola democrática.

Apple e Beane (2005), referem que “as escolas democráticas, como a própria democracia, não se produzem por casualidade. Derivam de intenções explícitas dos educadores de levar à prática as disposições e oportunidades que darão vida à democracia. Estas disposições e oportunidades implicam duas linhas de trabalho: uma passa por criar estruturas e processos democráticos mediante os quais se configure a vida na escola; a outra é planear e desenvolver um currículo que gere experiências democráticas aos jovens” (p. 24).

Escolas de orientação democrática, segundo Apple e Beane (2000), tem por base uma educação apoiada nas necessidades, culturas e histórias dos estudantes e da comunidade, está vinculada a princípios anti-racistas, anti-homofóbicos, anti-sexistas e a uma profunda preocupação com a justiça social.

A sua linha de orientação parte da criação de estruturas e processos democráticos que guiarão a vida escolar e de um currículo que faculte as experiências democráticas dos jovens.

Para terminar, concordo com a ideia de Scheerens e Creemers (1989) que a eficácia da escola deve evoluir no sentido de um modelo em que se integrem as variáveis organizacionais e de sala de aula, bem como factores contextuais de eficácia escolar. O modelo proposto faz apelo às novas teorias, teoria dos sistemas, teoria da contingência, teoria das relações humanas, teoria da burocracia e teoria política, fazendo depender a eficácia não só da produtividade escolar, mas também da adaptabilidade e da coesão organizacional.

 

Referências Bibliográficas

Apple, M., e Beane, J. (2000). Escolas Democráticas. Lisboa: Porto Editora. (2005). Escuelas Democráticas. Madrid: Ediciones Morata.         [ Links ]

Ballion, R. (1994). Le lycée, une cité a construire. Paris: Hachete.         [ Links ] Brookover, W. B., et al. (1979). Schools, social systems and student achievement: schools can make a difference. New York: Praeger.         [ Links ]

Coleman, J. S., et al. (1966). Equality of educational opportunity. Washington: US Government Printing Office.         [ Links ]

Derouet, J.-L. (1992). École et justice: de l´égalité des changes aux compromis locaux? Paris: Éditions Metaillé         [ Links ].

Jencks, C., et al. (1972). Inequality: a reassessment of effects of family and schooling in America. New Work: Basic Books.         [ Links ]

Lima, J. A., (2008). Em busca da boa escola: Instituições eficazes e sucesso educativo. V. N. Gaia: Fundação Manuel Leão.         [ Links ]

Nóvoa, A. (1992). Para uma análise das instituições escolares in A. Nóvoa, ed., As Organizações Escolares em Análise, Lisboa: Dom Quixote.         [ Links ]

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Sammons, P., Hillman, J., e Mortimore, P. (1995). Key characteristics of effective schools: a review of schools effectiveness research. London: OFSTED.         [ Links ]

Scheerens, J. Creemers, B. (1989). Conceptualizing school efectiness, Internacional journal of educational research, vol. 13 (7), 691-706.         [ Links ]

Wrigley, T (2007). Escuelas para la esperanza. Madrid: Ediciones Morata.         [ Links ]