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Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher

versão impressa ISSN 0874-6885

Faces de Eva. Estudos sobre a Mulher  no.34 Lisboa  2015

 

ESTUDOS

A epopeia de Maria Lamas, a peregrina do ideal - Uma heroína do século XX

José Gabriel Pereira Bastos1

1Membro do CRIA/FCSH - Centro em Rede de Investigação em Antropologia e da APPPA - Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia Analítica


RESUMO

O lema de Maria Lamas, Sempre mais alto, apontava o amor ao futuro e para além dele. A mesquinhez cultural e o machismo, o fascismo e a Guerra Fria, resumiram, nas Enciclopédias, os seus primeiros 80 anos a uma “escritora de livros para crianças” e a uma militante eleita para o Conselho Mundial da Paz (comunista). Não por acaso, apagavam o fundamental, que evidenciaremos: a recusa das ideologias, a consistente acção de promoção das mulheres, a protecção aos co­‑exilados em Paris, a contínua acção pedagógica e política da peregrina do Ideal da salvação da Humanidade pelo Amor, que um biógrafo recente definiu como uma heroína do século XX.

Palavras­‑chave: política; literatura; mulheres; paz; amor.

 

ABSTRACT

The motto of Maria Lamas, Always higher, pointed love to the future and beyond. Cultural pettiness, sexism, fascism and the Cold War summarized her eighty years work, in the Encyclopedias,  as a writer of children's books, as well as a militant “elected to the World Peace Council (communist)” . The most fundamental, which we highlight in this paper, was not mentioned: her refusal of ideologies, her consistent action to promote women, the protection she gave to the co­‑exiled in Paris, her continuous pedagogical and political action for Humanity's salvation, based on love. Not by chance, a recent biographer defined Maria Lamas as a heroine of the XXth century.

Keywords: politics; literature; women; peace; love.

 

Este livro reflecte a luz que me guia. Deixo­‑o como uma herança moral, humilde, mas sinceríssima, firmemente confiante na redenção da humanidade pelo Amor.(Maria Lamas)2

 

I. O ideal na vida de Maria Lamas: “sempre mais alto”

1. O ex­‑líbris de Maria Lamas (ML), acompanhado do lema da sua vida, Sempre mais alto, apontava o amor ao futuro e para além dele. A mesquinhez cultural do meio e o machismo que lhe estava associado, a governação despótica e a Guerra Fria reduziram, nas Enciclopédias publicáveis, a biografia de ML a uma "escritora de livros para crianças"3 e a uma militante do MUD, que fazia “ intensa propaganda comunista”, a partir de 1945 em Portugal, "tendo sido eleita em 1954, para o“ Conselho Mundial da Paz (comunista).”4

 

2. O fundamental ‘escapava' claramente à escrita dos Enciclopedistas do regime: a total dedicação à promoção das mulheres, a investigação antropológica aprofundada sobre as Mulheres em Portugal e no Mundo; as suas exposições, ímpares em qualquer parte do Ocidente, sobre o Traba­lho da Mulher Portuguesa (1930) e sobre os Livros das Mulheres de todo o mundo (1947); a intervenção como Presidente do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (1945); a acção como representante de Portugal na fundação da FDIM (Federação Democrática Internacional das Mulheres), no Congresso de Ghent (1946), mais tarde eleita para a Direcção do Movimento, o mesmo acontecendo com o Conselho Mundial da Paz. Não por acaso, apagavam o fundamental: o pensamento próprio, a capacidade de risco, a consistente acção institucional e política a nível nacional e internacional, a favor das mulheres; a recusa do feminismo em voga; a contínua acção pedagógica de ML, a Peregrina do Ideal da salvação da Humanidade pelo Amor, que um biógrafo recente definiu como “ uma heroína do século XX ” (Marques, 2012: p. 59).

 

3. Acontece que ML não é redutível à sua personagem enciclopédica e que sem as dimensões familiar, amorosa, profissional e política, original e orientada para amplos futuros por ideais próprios, resta apenas uma caricatura deturpada e insignificante. É esse empobrecimento e distorção que tentaremos corrigir, fornecendo um quadro muito mais amplo de compreensão biográfica e ideológica.5

O método científico exige que se comece pela recolha sistemática de dados e pela análise documental, antes das ‘interpretações', das ‘avaliações' e da inclusão em sistemas, o que neste caso não foi feito, aguardando o espólio a vinda dos investigadores que o ignoraram. Mas o método exige mais, exige a recusa da simplificação e da retórica racionalista. Seguimos Edgar Morin quando, trabalhando sobre o método, a partir de uma epistemologia da complexidade, afirma:

 

O que ensina a aprender, isso é que é o Método. (...) Não parto com o método, parto com a recusa, totalmente consciente, da simplificação. A simplificação, é a disjunção em entidades separadas e fechadas, a redução a um elemento simples, a expulsão daquilo que não entra no esquema linear. (...) Temos necessidade de um princípio de conhecimento que não apenas respeite, mas revele o mistério das coisas. (Morin, 1981: pp. 21­‑22, t.n.)

 

II. A vida vivida de Maria Lamas

4. Nascida no final da Monarquia, em 1893, a mais velha de quatro e a menina dos olhos do pai, estuda no Régio Colégio de Torres Novas e, depois, num colégio de freiras espanholas, até que o pai, republicano, impede o desenvolvimento do que, devido à sua impulsividade sentimental, ameaçava transformar numa vocação religiosa.

Aos 17 anos, é a ruptura com esse mundo. Um jovem tenente do Quartel de Cavalaria de Torres Novas pede­‑a em casamento e arrasta­‑a para um mundo bem diferente da vida rural, católica e sonhadora das meninas locais. Mas ML é especial: ao deixar as Teresianas, onde muito se destacou pela criatividade, uma freira sintetizou a diferença: “Saiu daqui um demónio.”

Ribeiro da Fonseca é republicano. Em Março de 1911, farão o primeiro casamento civil em Torres Novas, logo após a implantação da República, novidade política excitante que Maria comemora, vendo nos ideais republicanos a continuidade dos ideais fraternos do Cristianismo6 como muito mais tarde fará com os ideais libertários do anarquismo e com os ideais comunitários do comunismo Casamento, gravidez, viagem para Luanda, onde a filha nasce, num hotel, em Dezembro de 1911; ida para o sul, por sua pressão, para o desprotegido e perigoso interior, quando poderiam ter ficado numa das ‘aborrecidas' cidades da costa. Viagem de uma dúzia de dias, a cavalo e em carros boer puxados a bois, até ao Forte do Capelongo, nas margens do Rovuma, onde um oficial do exército a comandar era uma novidade e uma branca e a sua bebé nunca tinham sido vistas. Meses depois, regressa, novamente grávida, para a vida com os pais, em Torres Novas.

Dois anos mais tarde, o marido volta e vão viver juntos uma vida de classe alta. Em 1915, Maria, aventureira e fusional, corta o cabelo curto, monta a cavalo à homem e participa nas caçadas às lebres das charnecas do Ribatejo enquanto que, em Lisboa, frequenta saraus e idas ao teatro e à ópera.7 Mas tudo muda: estoirou a guerra, o marido é leviano, a relação torna­‑se dolorosa. Ainda convivem diariamente em Tancos até à partida do Corpo Expedicionário Português.8 A entrada de Portugal na guerra, em 1916, fá­‑lo partir para França onde, ao lado do seu grande amigo Óscar Monteiro Torres, que será abatido, se tornará um dos primeiros aviadores portugueses. Quando regressa, Maria recupera num sanatório, de onde só voltará em 1919, e ficam separados. O início de 1920 regista o seu divórcio, para a época, uma raridade.

 

4. Maria vem viver para Lisboa, com os pais, empobrecidos, e com as filhas a cargo. Começa a trabalhar na Agência Americana de Notícias, dirigida por uma jornalista que admira, Virgínia Quaresma, que a encarrega da recolha, tratamento e envio por telégrafo das notícias do dia para o Brasil. A Agência é um ponto de encontro de jornalistas e de escritores. Conhece a noite de Lisboa e, por pressão da mãe, que morrerá em 1922, rapidamente volta a casar, em Abril de 1921, desta vez com um jornalista monárquico e católico, Alfredo da Cunha Lamas, pai da sua terceira filha.

Com este novo marido, são compatíveis as primeiras tentativas literárias adultas, centena e meia de contos infantis e meia centena de poemas, ainda hoje por reunir, nos jornais católicos A Época, O Correio da Manhã, A Voz e no magazine Civilização; as Cartas às Mulheres, assinadas por Serrana d ' Aire, onde exercita o aconselhamento moral aprendido no convento; a poesia naturalista de Humildes; o primeiro romance, Diferença de Raças (ambos em 1923); meia­‑dúzia de folhetins e novelas, igualmente por publicar em livro.

 

5. Mas a vida será muito mais marcada pelo encontro com os jornalistas anarquistas e, nomeadamente, pelo recém­‑chegado do Brasil, o jovem Ferreira de Castro (FC), que entra a dirigir a Página Literária do semanário anarquista A Batalha, no final de 1924.9 FC convida­‑a, em 1928, para assumir a direcção de O Reino dos Miúdos, no magazine Civilização, que dirige e, quando o escritor, a caminho do sucesso literário, se muda para O Século, como repórter, logo propõe ML para ir consigo, para relançar o Modas & Bordados, suplemento decadente que precisava revitalizado.

 

6. Esse será o seu trabalho nas duas décadas seguintes, como directora informal, e mais tarde formal, da revista (1929–1947), à qual dará visibilidade e dinamismo editorial, criando um mundo de leitoras fiéis, mais interessadas na Vida Feminina (sub­‑título que fará aceitar à Direcção) do que nas antigas Modas & Bordados. Maria acredita no valor da Mulher genericamente considerada. A partir da sua função de Mãe, e para além do seu papel na família, afirma o valor da Mulher Portuguesa, pretende exibir a importância do trabalho e da literatura das mulheres e, sempre humilde, como era seu lema, passará a prová­‑lo exuberantemente. Logo, ergue do nada, por sua iniciativa, o Certame da Mulher Portuguesa – Exposição da Obra Feminina, antiga e moderna, de carácter literário, artístico e científico (1930), exposição que ocupa 11 salas de O Século durante dois meses, com grande êxito, o que lhe valerá ser condecorada com o grau de oficial da Ordem de Santiago em 1934. Reforçada por tardes culturais e por mais exposições, a sua revista torna­‑se na mais rentável de todas as publicações de O Século. Cria o suplemento Joaninha, para raparigas (1936), onde a ‘Tia Filomena' escuta e orienta. O impacto na promoção de jovens e adultas é muto grande. O que justificará a sua eleição para Presidente do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas (1945).

 

7. Com o aprofundamento da relação, os percursos literários de ML e de FC diversificam­‑se e tornam­‑se paralelos – escrevem romances e, a partir de 1928, ambos rejeitam, em simultâneo, as primeiras obras, nomeadamente as que nada tinham que ver com a sua relação nascente enquanto escritores; ao serviço do jornal e autonomamente, fazem reportagens de viagens, no Mediterrâneo, na década de 3010; e passam, de seguida, para os grandes ensaios publicados em fascículos. Ambos entrarão no Pen Club de França, uma distinção literária rara. Mas não só os percursos literários; os percursos políticos também se sincronizam, em Portugal, quando ambos aderem à campanha eleitoral de Norton de Matos e fazem conferências de apoio ao MUD / Movimento de Unidade Democrática, divergindo a partir daí. Na década de 50, ML acelera a sua intervenção política internacional, pelas Mulheres e pela Paz, no momento em que FC, derrotado o anarquismo, abdica da luta política organizada.

 

8. Mas existem caminhos próprios de ML – caminhos orientados para a promoção das Mulheres, que a levarão a ir abandonando a escrita para crianças e a dedicar­‑se a pesquisas de grande vulto sobre a condição feminina em Portugal e no Mundo – As Mulheres do meu Pais (1948­‑50) e A Mulher no Mundo (1952­‑54).11

A forma muito sua de conceber a promoção da Mulher num mundo plural, bem diferente das várias militâncias feministas das suas antecessoras, líderes do I.º Congresso Feminista e da Educação, de 1924, tem que ver com a recusa da guerra dos sexos, com a celebração da relação amorosa e com a promoção cultural das mulheres, bem como com a evidenciação pública das realização das mulheres, de todas as classes, na família, no trabalho, na cultura e na intervenção política.

Despedida de O Século, organiza na SNBA a Exposição de Livros de Mulheres de todo o mundo (1947), uma realização ímpar a nível mundial, acompanhada de tardes culturais e da exibição diária de filmes de mulheres, ao apresentar 1600 obras literárias, históricas, biográficas, científicas, artísticas, e infantis, do século XVII à mais recente actualidade (Simone de Beauvoir, Marguerite Duras, Margaret Mead, etc.), de mulheres de 30 países (da Ásia, das Américas e da Europa), um grande êxito, com repercussão internacional, imediatamente encerrada pela polícia do regime (Fiadeiro, 2003: pp. 122­‑138).

 

9. Mas não se fica pelas exposições de vulto e pelas grandes reportagens, conferências, tardes culturais, poesia, romances, edição, fotografia12 e ensaios. ML assume sem hesitações a militância em organizações nacionais e internacionais, com consequências graves – ao ser eleita como Presidente do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, que num ápice dinamiza de uma organização quase estagnada para uma entidade viva com mais de 2000 associadas, não aceita a chantagem de João Pereira da Rosa e do regime e assume, em 1947, o despedimento sem justa causa, de O Século, perdendo a segurança económica ao fim de 20 anos de trabalho de grande valor. Seguem­‑se quatro prisões e mais de uma dezena de anos de exílio, no Funchal e em Paris, para não ser presa cada vez que desembarcava em Lisboa, dado que sempre recusou a hipótese, para que a pressionavam, de deixar de participar nos congressos internacionais da Federação Internacional Democrática das Mulheres (FDIM) e da Organização Mundial da Paz, cujas direcções, uma vez eleita e reeleita, veio a integrar, ao lado de uma elite mundial.

 

10. Também a evolução literária ganha uma dimensão claramente diferenciada da sua obra anterior e da obra de FC – a assunção de um projecto auto­‑biográfico orientado pelo desejo de sinceridade e de subalternização das dimensões canónicas da literatura legitimada, ultrapassando o deslocamento literário que ambos utilizavam e avançando para o texto confessional.

Com a possível excepção de A ilha verde (1939), o seu último romance publicado, que retoma o tema da Mulher Moderna, mundana, independente e ousada13, a obra de ML elaborara, desde Diferença de raças (1923), a sua condição amorosa, dividida entre o campo e a cidade, entre o catolicismo rural e familiar da sua juventude e do segundo marido (A. C. Lamas), que sempre lhe negou o divórcio, e as influências republicanas e anarquistas de Ribeiro da Fonseca e de FC, que com ela viveram vidas não convencionais; entre o nível social elevado do seu primeiro casamento e a identificação de FC com o mundo operário (Regresso à felicidade, 1926; O caminho luminoso, 1930). Em Peregrina do Ideal (1927), ainda acreditava na possibilidade de refazer a vida com um novo casamento e no ideal de partir em casal para a América. Influenciado por ML, por esse tempo, FC elaborava a admiração pela Mulher Moderna, na sua obra posteriormente rejeitada (A peregrina do Mundo Novo, de 1926), dando mais tarde expressão à relação com ML em Eternidade (1933), onde figura como Elizabeth e, já com FC de novo casado, em Tempestade (1940), como Cecília, imaginando uma vez mais o que não era possível, na vida: partir em casal (para o exílio político, em S. Tomé; para Moçambique).

Já ML, lutando para clarificar a situação conjugal e obter o divórcio, sempre negado, rejeitara activamente essa fuga em casal (para a América), em Para além do Amor (1935), sobrepondo ao amor em casal a intervenção social em Portugal, a amizade amorosa livre e eternizada, e o amor à humanidade, que aprendera com FC, opção esta que rapidamente a levará do cristianismo às grandes lutas mundiais da sua época, as quais, depois do colapso do Anarquismo, derrotado em Espanha, eram então protagonizadas pelo Movimento Comunista Internacional, que ML sempre identificou com os ideais do cristianismo comunitário.

Durante a guerra, a sua obra muda de rumo: desfazendo o disfarce literário é a vida íntima de uma mulher, ML, que é exposta nos anos de infância e juventude, em Livro de Amor (1946), revisto e aumentado em Confissões de Sílvia (1949). Anunciará repetidamente que estes anos do Despertar (até ao começo dos anos 20), deveriam ser seguidos pelos volumes do Caminho (até 1945) e da Luta e, mais tarde pelo do Tempo de Exílio. Mas rapidamente consciencializará, dramaticamente, que os seus envolvimentos militantes de democrata anti­‑fascista e que os seus envolvimentos amorosos de mulher discretamente livre entram em colisão com o seu desejo de sinceridade. O regime revela­‑se particularmente persecutório contra os escritores e mais ainda contra ML. Apercebe­‑se que pessoas que entraram na sua vida amorosa podem ser postos em perigo e que factos da sua auto­‑biografia, como as viagens, como militantes da Paz, a Ceilão, à China, ao Japão e a Moscovo, não podem ser transformadas em grandes reportagens14, e isso leva­‑a a adiar a escrita, confiando que a edição da sua Correspondência poderá vir a substituir, depois da morte, os volumes que repetidamente iniciou mas não chegou a publicar.

 

11. FC faz parte do Caminho, mas não terá papel relevante na Luta de ML. O processo de consciencialização política começado com a leitura do jornal anarquista A Batalha, cedo nos anos 20, progrediu para a militância e tornou ML uma lutadora anti­‑fascista de vanguarda – co­‑fundadora e “madrinha” do MUD Juvenil (1945); membro do Conselho Directivo do MUD – Movimento de Unidade Democrática; apoiante activa da candidatura democrática de Norton de Matos, com uma Palestra às Mulheres de Portugal, em 1949; e, após a desistência deste, co­‑fundadora e dirigente nacional do MND – Movimento Nacional Democrático (1949), de Ruy Luís Gomes, de imediato ilegalizado, o que lhe vale uma primeira prisão política prolongada. Regressada do longo exílio e à data doente, enviará ainda uma mensagem de apoio ao III Congresso da Oposição Democrática em Aveiro, em 1974. Depois da revolução, rejuvenescida, será vista comemorando a liberdade, no 1.º de Maio, pelo braço de um jovem marinheiro.

A nível internacional, a sua luta pela promoção da Mulher leva­‑a a participar, enquanto Presidente do CNMP, no 1.º Congresso Mundial das Mulheres, em Ghent, (1946), tornando­‑se co­‑fundadora da FDIM, ao lado de Eugénie Cotton e de Dolores Ibarruri. A partir daí, participando em vários congressos, na Europa e na Ásia, ML virá a integrar a Mesa da Presidência do Vº Congresso Mundial das Mulheres, em Moscovo (1953), sendo reeleita para a direcção mundial da FDIM, num congresso em Berlim Leste (1963). (Tengarrinha, 2008: pp. 81­‑85).

Depois da Revolução, participará como Convidada de Honra no VIIº Congresso Mundial das Mulheres, em Berlim, em 1975; recebendo, no final dos seus dias, a Primeira Medalha de Honra do Movimento Democrático das Mulheres (MDM) (1982) e a Medalha Eugénie Cotton (1983), da FDIM, de que fora co­‑fundadora, pelo trabalho de uma vida dedicada à luta das mulheres.

 

12. Maternidade, promoção da Mulher e recuperação da Democracia entrosam­‑se, para ML, com a defesa da Paz, ameaçada pela Guerra Civil de Espanha. Começando a cumprir as decisões expressas em Para além do amor, em 1936, é uma das fundadoras da Associação Feminina Portuguesa para a Paz, a que virá a presidir em 1938.15

Com a vitória a mericana, os tempos mudam ; perante o agudizar da Guerra Fria e da a meaça a tómica, um cenário bem diverso, que FC já não acompanha, ML apoia o Apelo de Estocolmo, do Conselho Mundial da Paz (CMP), com a realização em 1950 de duas conferências sobre A Paz e a Vida, no Porto e em Lisboa, nascendo desta última a fundação da Comissão Nacional para a Defesa da Paz, de que integra a Direcção (1950), ousadia que lhe vale uma segunda prisão, agora de seis meses, em Caxias.16

Prisão, dolorosa, que não a faz desistir de ser a única representante portuguesa no Congresso dos Povos para a Paz, em Viena (1952), ao lado de Sun Yat Sen e de Eugénie Cotton; de aí ser eleita para o Conselho Mundial da Paz, ao lado de Ruy Luís Gomes; e de participar na Conferência Mundial para a Paz, em Moscovo (1953), dirigindo pela Rádio Moscovo mensagens aos Portugueses pela defesa da Paz, sob o pseudónimo de Helena Torres, sendo uma vez mais presa, à chegada ao aeroporto, por várias semanas, o mesmo acontecendo a umas dezenas de portugueses que aí a esperavam.

Em 1955, ML envia uma Mensagem à Assembleia Mundial de Forças Pacíficas, reunida em Helsínquia, e participa no Conselho Mundial da Paz, em Bucareste; e no verão de 1957, parte sozinha para Ceilão, onde participa em mais um congresso do CMP, realizando depois uma extensa visita de estudo à China, a convite do Presidente da Academia das Ciências, sendo recebida por Mao Tse Tung e por Chou­‑en­‑Lai e colaborado na tradução dos “Lusíadas”.17Segue, daí, para Tóquio, integrando a d elegação do CMP, que participará numa reunião internacional promovida pelo Governo japonês, visando a interdição das armas de destruição maciça, indo, finalmente, visitar Hiroxima, em homenagem às vítimas civis da violência nuclear.

No verão de 1962, ML participa no Congresso Mundial para o Desarmamento Geral e para a Paz, em Moscovo, sendo então forçada a exilar­‑se, por uma segunda vez, em Paris, até à morte de Salazar, para evitar, a pedido instante das filhas, a nova prisão que a esperaria à chegada a Lisboa. Só poderá voltar à pátria com 76 anos.

 

13. A militância política coerente tem um preço a pagar e deixa sequelas nos que não se adaptam ao congelamento da Democracia e da Liberdade de Expressão. No caso de ML, a mutilação da pesquisa sobre as Mulheres, com a interdição, vinda do director de O Século, que se tornara um jornal do regime, de aceitar o convite da Legação Americana para se deslocar aos Estados Unidos, em 1944, durante quatro meses, para investigar e publicar o que seria o seu primeiro grande ensaio: um estudo sobre A Mulher Americana18 que, se viabilizado, teria contribuído com material para o célebre ensaio comparativo de Margaret Mead, Male and Female (1949); a perda do posto de trabalho e da segurança económica, devido ao despedimento político das suas funções de directora do Modas & Bordados, ao fim de duas décadas de trabalho premiado, e sem invocação de justa causa, em 1947, por não ter aceitado o ultimato, encomendado pelo regime e protagonizado por Pereira da Rosa, de que, se queria manter­‑se em O Século, teria que abandonar a Presidência do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas. Seguiram­‑se quatro prisões políticas associadas à sua militância anti­‑fascista e à militância internacional pela Promoção da Mulher e pela Paz; quase uma dezena de anos de exílio, no Funchal e em Paris, para evitar novas prisões se desembarcasse em Lisboa19; e o bloqueio de editar os seus romances e reportagens em Portugal, tendo chegado a publicar sob pseudónimo as traduções de que vivia, em Paris, já que, face à PIDE, o seu nome, mesmo nesse nível, punha em perigo os editores e as edições.

 

14. Mas o Estado Novo teve continuadores, depois do 25 de Abril. A tentativa de apagar o seu nome começou uma semana depois da sua morte, em 1983: perante uma moção de homenagem a ML apresentada na Assembleia Municipal de Lisboa, que a considerava como “ resistente anti­‑fascista e grande lutadora pela paz e pelos direitos das mulheres portuguesas, que colocou grande parte da sua vida ao serviço das causas da liberdade, da democracia e da paz ”, registou­‑se a abstenção dos membros do PSD e do CDS que, de seguida, vetaram uma segunda moção que visava a atribuição do nome de Maria Lamas a uma rua ou praça da capital. (Diário de Lisboa, 13 de Dezembro de 1983, p. 24)20.

 

15. A Democracia outorgou­‑lhe, em 1980, a Ordem da Liberdade, mas não honrou a sua luta nacional e internacional pela promoção da Mulher, o que é manifestamente pouco. A proposta do MDM de transladação dos seus restos mortais para o Panteão Nacional, para engrandecer a representação da Mulher Portuguesa, ao lado da escassa presença de uma fadista e de uma poetisa, foi alvo de amortecimento mediático e parlamentar, e aguarda decisão indefinidamente. A homenagem, na Fundação Mário Soares, em Abril de 2015, permite pensar que a injustiça poderá ser ultrapassada. É de esperar que o Município de Torres Novas crie, na casa em que nasceu, um Centro Cultural e uma Casa­‑Museu com o seu nome. E que a Imprensa Nacional inicie a edição da suas Obra Completa, incluindo dispersos e inéditos. O Portugal democrático deve isso a si próprio e à memória da sua maior lutadora do século XX.

 

III. O tempo e o modo – da vida vivida ao carisma e aos ideais

15. Se o conhecimento da Vida Vivida, como lhe chamava, é indispensável, não basta para a dar a conhecer. ML, militante política, foi muito mais do que isso, como insistem aqueles que a conheceram de perto, nomeadamente quando exilada em Paris. São constantes e repetidos os testemunhos sobre a sua juventude de espírito; sobre a sua capacidade de receber, proteger, apoiar e compreender aqueles que chegavam desprotegidos e os que se sentiam tentados a desistir de uma luta que parecia sem fim. Sobre a sua “ independência ideológica e combatividade ”, conta Helena Pato, nas memórias que publicou sobre o Tempo de Exílio:

 

Conheci­‑a em 1962, logo que cheguei a Paris. Fiquei a viver durante três anos (…), ali mesmo ao lado do Hotel Cujas (...) Aí residia Maria Lamas.

Interessava­‑se profundamente pela evolução da situação política em Portugal, mostrava­‑se sempre disponível para apoiar iniciativas de solidariedade com os combates contra o fascismo, e vivia com particular intensidade – e não raras vezes, com sofrimento – os momentos pouco pacíficos da vida política da comunidade portuguesa no exílio. (…)

Maria Lamas aparecia, aos meus olhos de jovem, como um exemplo de independência ideológica e de combatividade.

Presa para sempre às «Mulheres do seu País» e sabendo do meu interesse pelas questões da condição feminina e pela sua situação, procurava convencer­‑me da importância de organizar em Portugal um Movimento que as unisse nos seus anseios.

Eu concordava com essa preocupação e tinha muito em conta as suas opiniões, por saber que traduziam o conhecimento que ela tinha da dura vida das mulheres portuguesas. Mas, também, porque eram fruto de debates, ao longo dos anos, com muitos outros, homens e mulheres que reflectiam amiúde sobre essa problemática. Maria Lamas insistia sempre em que um tal movimento deveria nascer no interior do país, como uma iniciativa de mulheres, e ser lançado com a participação, desde logo, de uma grande diversidade, quer do ponto de vista social e profissional, quer das suas opções políticas e religiosas.21

 

Os conflitos íntimos e as dúvidas políticas eram duplicadas pela guerra dos sectarismos que serviam de escape ao insucesso, guerra que ML atenuava, mantendo em aberto o diálogo e a construção de pontes, liderando, se bem que com pouco sucesso, o objectivo da unidade na oposição ao regime:

 

Em Paris, havia exilados de todas as cores políticas da oposição: havia comunistas, havia socialistas, havia velhos republicanos, liberais, havia anarquistas, havia trotskistas, esquerdistas – enfim, toda a gama de opções.

A continuidade da ausência do País, as dificuldades da própria vida lá criadas aos exilados, as saudades, não só da terra mas das famílias, criavam um clima de irritabilidade, que dificultava, muito mais do que é normal, a aproximação dessas pessoas. E as opções diferentes criavam grandes e profundas divisões entre os exilados.

Ora, justamente, durante os largos anos em que Maria Lamas viveu em Paris exilada, todos encontraram nela a pessoa que procurava o denominador comum de todas as opções, lutando fundamentalmente para a unidade entre todos os combatentes. Se há realmente alguém que, no exílio, lutou sempre por essa aproximação, tendo a consciência nítida que só através da unidade de forças antifascistas seria possível lutar contra o inimigo comum – esse alguém foi ML.22

 

Confirma Rogério Paulo, numa Homenagem Pública:

 

(...) em Paris, onde ia meio desesperado, para poder ler outros jornais e ouvir outras coisas, era ela que me dizia sempre: “ É preciso voltar. Se tu podes voltar, volta; é lá em baixo que é a luta. (Rogério Paulo, Homenagem do MUTI, 1976)

 

Acrescenta Alexandre Babo, sublinhando a capacidade humana e política de Maria Lamas, na mesma Assembleia:

 

Cansado de muitos anos de luta (...) estava em Paris, de regresso a Lisboa (...).

Maria Lamas compreendeu o meu estado de preocupação, de sofrimento, de abatimento, e quase não me largou durante dois dias, sendo para mim, realmente, uma irmã, uma mãe. E foi, na verdade, talvez das poucas vezes na minha vida em que a aproximação humana duma pessoa me tocou tão profundamente e me tocou tanto. (...) Toda a gente que estava lá exilada – e havia muita gente nessas condições – encontrava em ML, sempre, a amiga, com aquele carinho, aquela compreensão humana, que são realmente apanágio só das grandes pessoas. (Homenagem do MUTI, 1976)

 

Vista por uma neta que a visita em 1967 e 1968, Maria Lamas estava tudo menos sozinha; bem pelo contrário era o pivot de grande diversidade política e cultural, em diferentes versões de convívio e de resistência ao regime:

 

(...) em 1962, participa em Moscovo na Conferência sobre o Desarmamento Geral, o que comprometeu definitivamente a sua segurança em Portugal. No regresso ao país, a decisão está tomada: exilar­‑se­‑á em Paris, onde colaborará com outros expatriados na luta contra a Ditadura. (...) Descobrimos aí uma avó de 74 anos, a viver num pequeno quarto do hotel, onde preparava refeições simples e onde recebia ininterruptamente membros das Oposições ao regime, do grupo de Argel aos membros do Partido Comunista na clandestinidade e aos desertores das guerras de África – jovens emigrados ao desamparo, amigos de Lisboa e pessoas sozinhas a precisar de uma palavra. Lembro­‑me de ver entrar Jorge Reis, António José Saraiva, Maria Nobre Franco, José Carlos Ferreira de Almeida, João Franco, a Miriam e a Teresa Rita Lopes, Helena Pato e Mário Neves, Eugénia Pereira de Moura e Helena Neves. Procuravam ajuda, mas também lhe escreviam cartas e lhe traziam notícias, coisas suas, como presentes, livros, pintura, gravura, desenho, escultura, fotografias, roupa, alimentos. Passavam, ficavam, partiam. Iam passear com ela para o Jardim do Luxemburgo. (Monteiro, 2015, pp. 13­‑14)

 

16. Maria Lamas, bem depois, esclarecerá a sua posição na vida e na luta, que considerava interminável:

 

(...) a coisa mais importante da minha vida foi a minha tomada de consciência política, Pois essa consciência política (...) não está limitada a um programa de um partido sequer.

Nós temos que considerar a nossa vida uma aprendizagem permanente. (...) Há com certeza uma coisa que é uma grande força: é a unidade, e uma coisa que (...) digo no sentido ilimitado da humanidade: é Amor: (...) Não há força maior que a do Amor. (...) Pois nós temos que cultivar esse amor, amor à Paz, amor à vida, amor à justiça, amor a tudo aquilo que passo a passo nós formos dando, que nos vá ajudando a completar­‑nos, a descobrir o homem que ainda não está descoberto. (...) Nada está acabado. O que está acabado é tão pequeno, que acaba por não ter importância nenhuma.

 

17. Se os que protegeu e relançou na luta lhe agradeceram, os poetas, souberam eternizar a gratidão. Num poema de um livro de 1955, apreendido pela PIDE, Orlando da Costa evidencia melhor do que ninguém, em ML, a força da integração, na unidade do ser mulher, do lado materno, da vida íntima e do lado combativo, expresso na luta solidária pela liberdade e pela Paz.

 

Porque trazes na voz a voz das companheiras

Companheira te chamamos

 

Porque no teu olhar se alargam os olhos que semeiam e vigiam

o sol a todas as alturas, o sol dos meninos e das colheitas

 

Porque nele se tornam mais límpidos os olhos das namoradas

Companheira te chamamos

 

Porque nele gelam as lágrimas do medo e da dor

Gelam e estalam desfeitas num pranto de calor

 

Porque nos teus olhos continuam acesos

os olhos vendados de encontro às paredes

 

Porque trazes no peito o sopro das nossas irmãs

O sopro resoluto do trabalho, o verde e dourado sopro que branqueia o pão

 

O sopro das que amam

E amando crescem e envelhecem ao nosso lado

 

Das que amam

E amando tombam em cada dia num só momento por milhões partilhado

 

Porque caminhas na terra dividida

Por uma estrada aberta pelo esforço dos povos

 

Onde cada presença é um apelo e cada apelo uma conquista

Porque até o sol remoça na neve tranquila dos teus cabelos

 

E o vento sopra­‑te com a mesma força que a nós

Companheira te chamamos

 

Porque as palavras na tua boca

Têm a medida do mundo e a face dos mortais

 

Porque no teu ventre a fome e a vida se completam

Porque no teu rosto fala o tempo até nós

 

Mãe te chamaríamos

Companheira te chamamos23

 

18. A mulher que Orlando da Costa celebra, logo em 1955, companheira de uma longa e conturbada viagem existencial e política, é, a nosso ver, a Mulher que melhor representa as qualidades multifacetadas da Mulher Portuguesa do século XX, em que a coragem, a lucidez, a criatividade e o amor se condensam.

Ninguém, melhor do que ML para falar de si mesma, partilhando a mensagem pessoal e política que mantinha bem viva com 82 anos:

 

(...) eu recuso­‑me a ser símbolo de mim mesma, excepto naquilo em que eu própria coincida com a luta. Porque é preciso lutar, hoje mais do que nunca. (...) hoje o povo já sabe que a miséria não é uma lei natural, mas sim uma aberração com que alguns homens conspurcam e decepam a vida de muitos outros homens. E a vida não é, não tem que ser nada disso. A vida é – ou tem que ser – amor, Paz, Liberdade. A vida para mim é um acto de amor e de luta. Toda a minha vida não foi mais do que uma luta contra aquilo que me apresentaram como irremediavelmente acabado. (...) Uma luta contra o convencional. Contra o estabelecido. (....) o irremediável não existe. Sempre fui muito total e quiseram obrigar­‑me a matar a minha autenticidade. (...) Amadureci em função do amor e da luta. Creio que são dois factores inalienáveis da minha natureza. (...) Quero a Paz que corresponde a uma transformação integral de tudo quanto está errado no Homem e na sociedade. Esta, é uma Paz em permanente luta.24

 

Falta ainda muito “ trabalho do cérebro ” para redescobrir que só o amor cura, que é preciso confiar na “ redenção da Humanidade pelo Amor ”, a única força que reconcilia as decepções da biografia e da história com a vida que se renova, que cura os traumas iniciais, relançando o gosto de viver e o futuro, devolvendo a esperança e a felicidade, renovando a vida e criando eternidades. A luta é perene; como propunha ML: “É preciso descobrir o homem que ainda não está descoberto".

 

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Notas

2Dedicatória de As Mulheres do meu País à filha mais velha, Marimília, e ao genro, Fernando Carlos, cujos desenhos ilustram a obra; datada de Maio de 1948).

3Verbete não assinado, “LAMAS (Maria)”, na Grande Enciclopédia Luso­‑Brasileira, vol. 14, 1945, p. 599.

4Eduardo Serpa, “Lamas (Maria da Conceição Vassalo e Silva da Cunha)”, verbete em VERBO – Enciclopédia Luso­‑Brasileira de Cultura, vol. 11, Lisboa: Verbo, 1971, colunas 1370­‑1371.

5Baseado no levantamento e no estudo da correspondência familiar e amorosa bem como de inéditos, com base em dois anos de pesquisa documental no Espólio (BNP) e na Casa­‑Museu Ferreira de Castro – uma pesquisa que continua. Parte do texto integrou a Conferência de Homenagem a Maria Lamas, no ciclo “ Vidas com sentido ”, da Fundação Mário Soares, em Fevereiro de 2015.

6“Eu era uma apaixonada dos revolucionários franceses. Ainda muito miúda li Victor Hugo, Zola, Robespierre. Os livros destes autores provocavam em mim uma intensa vibração. O meu pai explicava­‑me tudo o que eu não percebia. E assim fui fazendo a minha educação literária. No colégio, em contacto com as freiras, apaixonei­‑me pela figura do Cristo. (...) Mais tarde, as minhas ideias políticas alicerçar­‑se­‑iam na doutrina evangélica que assimilara e que defendia o bem­‑estar de todos. Daí faria depois uma transferência para o campo lógico. Sem nunca ter pertencido a nenhum partido político, lutaria toda a minha existência pela melhoria de vida de todos os desprotegidos.” ( ML., in Melo, R. N. N., 1975: p. 93 )

7 Descrições longas destas vivências no romance Diferença de Raças (1923), recentemente redescoberto na Biblioteca Nacional, bem como nos folhetins Regresso à felicidade e Peregrina do ideal (escritos em 1926).

8Informação inédita, contida num manuscrito, depositado no Espólio, que prolonga O despertar de Sílvia (1949).

9Regina Louro, “Maria Lamas. A mulher e a paz”, in Vida Mundial, 10­‑VIII­‑1973: 27.

10 As reportagens de ML, entre 1934 e 1939, permanecem dispersas. FC, “o novo peregrino dos pequenos mundos”, como refere Jaime Brasil (in Ferreira de Castro .Lisboa: Arcádia, 1961: p. 51), virá a reunir as reportagens das suas viagens em Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1936), em edição de luxo que lhe garantirá a independência económica. Num golpe de originalidade, ML, com A Ilha Verde (1938), ensaia unir os contrários e criar uma reportagem­‑romance, indo mais longe quando, com As Mulheres do Meu País (1948­‑1950) e com Arquipélago da Madeira, Maravilha Atlântica (1954­‑1956), publicou duas longas reportagens­‑ensaio.

11A Mulher no Mundo acumulou cerca de 20 anos de pesquisas, desde que assumiu a direcção da Secção de Educação da Federação Nacional das Mulheres Portuguesas (FNMP), em 1936. Para manter a sua independência económica, assume mais duas obras por fascículos, que já não escapam à censura prévia: Arquipélago da Madeira, Maravilha Atlântica (1956) e O Mundo dos Deuses e dos Heróis – Mitologia geral (1959). A partir daí, bloqueada pelo regime a possibilidade de publicar os romances que sucessivamente preparava (Confissões de Sílvia, em 3 volumes; Um rapaz à proa de um barco , Fronteiras (I), Cartas da prisão , Fronteiras (II) , Tempo de Exílio ), dos quais existem segmentos no Espólio, viverá de traduções, por vezes assinadas com pseudónimos (Daniel Cardigos), tal era o cerco editorial que lhe fora montado.

12Não tem sido destacada a incansável dimensão editorial da acção cultural de ML. E só recentemente obteve reconhecimento internacional o trabalho fotográfico pioneiro desta repórter, em Exposição internacional, em Paris ( Jorge Calado, “ Les femmes de Maria Lamas ” / “ The women of Maria Lamas ”, in Au Féminin. Women Photographing Women 1849 – 2009 , Paris: Centre Culturel Calouste Gulbenkian, 2009, pags. 75­‑86 e fotos 66 a 68 e 70.

13Como a Soledade de A peregrina do Mundo Novo, de FC (1926), personagem que ML ajudara a construir porque, como virá a afirmar, o escritor não compreendia as mulheres e só via nelas a “ mulher­‑fêmea ” . (Carvalho, H. A palavra a Maria Lamas . I n Mulher. Modas & Bordados, 64 (3321), 8.10.75: 2­‑4). Nesta novela, a partida em casal, para o Mundo Novo, é negada, dado que Soledade é uma Mulher Moderna, divorciada e depois viúva, que se quer viajada pelo mundo, livre e independente.

14“Essa viagem (à China) pesa na minha vida como uma frustração. Não publiquei o livro que deveria ter publicado, não aproveitei o material recolhido e hoje, 16 anos decorridos, a China já não é a mesma, passou pela revolução cultural, e eu só poderei narrar o que vi num livro de memórias... ” (ML, in entrevista de Antónia de Sousa, República, 19­‑3­‑73: p. 13 ).

15 FC, então director de O Diabo, interpela ML, quando sublinha: As mulheres de Portugal não podem ser indiferentes à atmosfera pesada em que vive o mundo.” (nº 108, de 19 de Julho de 1936 ). No espólio existe, manuscrito, o original da resposta, assinado por “um grupo de mulheres portuguesas ”: As mulheres portuguesas também protestam contra a guerra, o qual exorta à solidariedade com o manifesto das mulheres espanholas, publicado a 29 de Setembro, em O Diabo, e à fundação da Associação Feminina para a Paz.

16Com o seu destemor habitual, é ML que dá a cara, no Porto e em Lisboa. Na capital, no final, a partir da plateia, cerca de 50 notáveis assinam então o protocolo de fundação da Comissão Nacional para a Defesa da Paz.

17 Extensos apontamentos de viagem, para uma reportagem impossível de publicar em Portugal e que, após a Revolução Cultural, ficarão desactualizados, estão guardados no Espólio.

18Um ensaio que teria preenchido a lacuna de And Keep Your Powder Dry. An Anthropologist looks at America (1942), obra em que Margaret Mead reconhece que não pode proceder ao estudo desapaixonado da sua própria cultura, bem como a de The American People. A Study in National Character, do britânico Geoffrey Gorer (1943), que substitui Mead na tarefa, centrando­‑se no mundo masculino. O regime não concebia a internacionalização da Mulher Portuguesa, vigiada pela PIDE e reduzida ao escasso horizonte da Obra das Mães. ML propunha­‑se viajar abdicando do vencimento e deixando os números do Modas em maquette, mas nem o pedido de socorro a FC, que Pereira da Rosa respeitava, lhe valeu. Já faltava pouco para ser despedida.

19“Cumpri sempre as minhas penas. Sofri muito, é certo, mas, quando voltava para a vida, vinha mais disposta ainda a continuar a lutar. (...) Estive exilada três vezes. Em 1953, de 1956 a 1957 e de 1961 a 1969. A PIDE criara o hábito de me prender e eu não encontrei outra forma de poder viver e trabalhar, No exílio, a vida foi dura. ” (ML, in Melo, 1975: p. 101).

20O mesmo acontecendo na Madeira: “ Na Assembleia Municipal do Funchal, uma proposta dos vogais do P.S. para um voto de pesar para aquela ‘ que foi uma das grandes figuras das letras portuguesas (...) que sobremaneira sobre enaltecer a terra e o povo madeirense ', foi aprovado por unanimidade. O mesmo não aconteceria a uma outra proposta dos vogais do Partido Socialista na mesma assembleia, que pediam fosse dado o nome de Maria Lamas ao actual Miradouro das Cruzes, que foi reprovada. O escrutínio desta votação teve o seguinte resultado: Votos a favor – 11 (P.S.); votos contra. 27 (P.S.D.); Abstenções: 8 (2 do P.S.D.). ” (Luis Jardim, “ Maria Lamas, grande dama da literatura portuguesa, in Díário de Notícias – Funchal, de 15 de Janeiro de 1984, p. 5)

21Testemunho guardado na página de Facebook Maria Lamas, associada à de J G. P. Bastos – https://www.facebook.com/MARIA­‑LAMAS­‑514011695355290/

22 Idem.

23 Poema de 1955, in Sete Odes do Canto Comum, 
 então com publicaçã o proibida; recolhido pela Doutora Regina Marques no espólio da PIDE, na Torre do Tombo e lido em Homenagem a Maria Lamas.

24ML, “Tenho ainda tanto para dizer”, entrevista por Maria da Graça Varella Cid, O Jornal, de 14­‑5­‑76, p. 24 .