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Psicologia

versão impressa ISSN 0874-2049

Psicologia vol.24 no.1 Lisboa  2010

 

A competência política, a desigualdade de género e as medidas de acção positiva: uma questão “natural” ou de “competência”?

Competence, Gender Inequality and Affirmative Action Measures: A “Natural” or a “Competence” Issue?

 

Maria Helena Santos1,* Lígia Amâncio2

1Doutoranda em Psicologia Social e Organizacional. ISCTE, Instituto Universitário de Lisboa.

2Professora Catedrática do ISCTE, Instituto Universitário de Lisboa

*Autor para correspondência

 


RESUMO

A sub-representação das mulheres na política continua a ser uma realidade (Inter-Parliamentary Union, 2010) e a literatura tem apontado vários factores para a origem da desigualdade de género neste contexto. Têm sido implementadas medidas de acção positiva no sentido de promover a igualdade. Contudo, existe uma enorme controvérsia, sendo as medidas acusadas de serem injustas, sobretudo por violarem o princípio do mérito. No seguimento de uma investigação (Santos, 2004), este estudo procura: confirmar a genderização das representações de pessoas que não são profissionais da política face à profissão de político/a, através da sua associação ao masculino; e o que esses indivíduos pensam acerca das medidas que se destinam a reduzir esta desigualdade. De entre os factores/obstáculos identificados, salientam-se os discursos sobre a “naturalização” da História e a genderização do mérito, que se limita praticamente a traços de personalidade pouco associados ao estereótipo feminino.

Palavras-chave: discriminação, política, género, acção positiva, competência


ABSTRACT

Women’s political under-representation is still a reality (Inter-Parliamentary Union, 2010) and the literature has pointed out several factors to explain the origin of the gender inequality in this context. Affirmative action measures have been implemented in order to promote equality. However, these measures have generated great controversy, being accused of unfairness for violating the merit principle. Following a previous research (Santos, 2004), this study aims at: confirming the genderization of representations held by individuals who are not professional politicians regarding politicians’ activity, through its association to the male sphere; understanding how those individuals perceive gender inequality in politics; and knowing what those individuals think about the measures aimed at reducing this inequality. Among the factors/obstacles identified, we highlight the discourses around the “naturalization” of History and the merit genderization which is mainly limited to personality traits which are seldom associated with the female stereotype.

Keywords: discrimination, politics, gender, affirmative action, competence


 

Objecto de Estudo

Procurar a igualdade de género tem sido um dos grandes objectivos, quer de algumas organizações internacionais (Procacci & Rossilli, 1997), quer dos movimentos feministas (Gubin et al., 2004). É muito devido às suas acções e medidas que os últimos 50 anos têm sido importantes, em termos da generalização da cidadania política das mulheres. Embora o número de mulheres nunca tenha sido tão elevado no mercado de trabalho, elas continuam a ocupar os empregos de mais baixa produtividade, mais mal remunerados e vulneráveis (International Labour Office, 2008), persistindo uma desigualdade de género a nível mundial (Hausmann, Tyson, & Zahidi, 2007), sobretudo no que diz respeito aos cargos de topo, nomeadamente na política (Inter-Parliamentary Union, 2010). A literatura tem sugerido diversas razões para a progressão (ou não) das mulheres na política nomeadamente, os movimentos sociais e as alterações das mentalidades (Pintat, 1997), factores socioeconómicos, culturais e institucionais (e.g., a adopção, ou não, do sistema de quotas) (Norris & Inglehart, 2001) e a ideologia política (Espírito-Santo, 2006).

No seguimento de outro trabalho (Santos, 2004) e no âmbito de uma investigação mais alargada, este estudo tem como objectivo procurar confirmar se existe uma genderização das representações que as pessoas que não são profissionais da política apresentam face à profissão de político/a, através da sua associação ao masculino e, além disso, identificar como estas vêem a desigualdade de género nas esferas de decisão política, bem como perceber a sua opinião sobre as medidas que se destinam a reduzi-la.

 

Origem e Persistência da Desigualdade de Género no Contexto Político

É difícil explicar a origem da desigualdade de género no contexto político. A literatura tem avançado várias explicações para a existência da desigualdade de género na sociedade, em geral, ora de cunho biológico, baseadas no dimorfismo sexual e na função reprodutiva da espécie, ora enquanto fenómeno social. Em 1987, Eagly propõe que os estereótipos de género, assim como as diferenças de estatuto, resultam da divisão genderizada do trabalho. Para a autora e outros (e.g., Eagly, 1987; Wood & Eagly, 2002), o que começou por causar as diferenças existentes entre homens e mulheres, relativamente ao desempenho de papéis, foram as diferenças sexuais físicas inerentes, que fazem com que determinadas actividades sejam mais eficientemente desempenhadas por um sexo ou por outro, dependendo das circunstâncias sociais e da cultura. O género actuaria como um “criador” de diferentes papéis sociais que as pessoas cumprem. Os papéis de género são, segundo Eagly (1987), as expectativas, socialmente partilhadas, sobre os comportamentos que as pessoas devem adoptar, em função do seu sexo. Assim, na cultura ocidental, espera-se que os homens tenham mais dotes de gestão do que as mulheres e que estejam mais bem preparados para desempenhar cargos de responsabilidade e de autoridade nas empresas; e que sustentem, economicamente, a família. Por outro lado, espera-se que as mulheres se encarreguem do trabalho doméstico e dos filhos – actividades não remuneradas e, geralmente, menos valorizadas (ver Amâncio, 1994; Oliveira & Amâncio, 2002). Assim, não é de estranhar que a ideologia de género constitua uma espécie de obstáculo ou de barreira invisível que dificulta o acesso das mulheres ao poder político (Eagly & Diekman, 2006; Huddy & Terkildsen, 1993a; 1993b). Por exemplo, em Portugal, Baum e Espírito-Santo (2004) mostraram que a razão central da menor participação das mulheres na política se deve às diferenças de género existentes, em termos da socialização para a cidadania e dos papéis de género. Outro exemplo prende-se com os eleitores, que também detêm estereótipos de género relativamente aos/às políticos/as. O seu uso tem implicações na avaliação dos/as candidatos/as, na escolha do voto e na participação política (Sanbonmatsu & Dolan, 2007). Por se tratar de um mundo masculino, estas implicações são potencialmente negativas para as mulheres políticas (Huddy & Terkildsen, 1993a), sendo percebidas mais negativamente pelas próprias mulheres (Mathison, 2001) quando violam os estereótipos de género. Parecem interiorizar de tal forma os estereótipos de género que se acomodam ao sistema, não o questionando (e.g., Jost & Banaji, 1994), ou até reforçando a sua condição.

As novas formas de sexismo, mais subtis, como é o caso do sexismo moderno (Swim, Aikin, Hall, & Hunter, 1995) ou do sexismo ambivalente (Glick & Fiske, 1996), também podem constituir um obstáculo à entrada das mulheres na política, já que implicitamente negam a discriminação face às mulheres e individualizam os processos de discriminação grupal, responsabilizando-as pela sua situação desvantajosa (Amâncio, 2004; Palacios, 2004). Ao basear-se na ideologia meritocrática, o sexismo moderno sugere que as pessoas chegam até onde o seu próprio mérito lhes permite (i.e., resultados bons ou maus) e que o insucesso das mulheres se deve à sua falta de capacidade, esforço ou motivação para chegarem aos cargos de topo3, não dependendo tanto da discriminação. Sidanius e Pratto (1999) defendem que a ideia ocidental de “meritocracia” é apenas mais um exemplo dos diferentes mitos legitimadores existentes na sociedade, de que as pessoas se servem para justificar a dominância social. Para estes autores, o sistema social baseado no mérito é falso e produz uma ilusão de justiça. Acreditam que grande parte das formas de conflito grupal e de opressão corresponde a diferentes manifestações da mesma predisposição humana básica para formar hierarquias sociais baseadas nos grupos. Assim, o sexismo pode ser percebido como uma ideologia estruturadora e legitimadora do sistema (Jost & Banaji, 1994, Siddanius & Pratto, 1999) que mantém a desigualdade de género, favorecendo a superioridade dos homens. Ou seja, o sexismo moderno contribui para manter o status quo (Barreto & Ellemers, 2005; Jost & Banaji, 1994), porque, embora surja como inofensivo, tem um efeito pernicioso na concretização efectiva da igualdade de género, julgando, por exemplo, que as medidas de acção positiva já não são necessárias (Tougas, Brown, Beaton, & Joly, 1995). Assim, a ideologia meritocrática, fundamental na nossa democracia (Crosby & Blanchard, 1989), e que parece ser o factor central subjacente à controvérsia sobre as quotas (ver Santos, 2004), também constitui um obstáculo à entrada das mulheres na política. Trata-se de uma ilusão (Ellemers & Barreto, 2009; Jost & Banaji, 1994), visto que a avaliação do mérito não é neutra (Young, 1990).

 

Controvérsia em torno das Medidas de Acção Positiva – O Princípio do Mérito

Têm sido criadas medidas de acção positiva, a nível mundial, como é o caso do sistema de quotas ou da Lei da Paridade, em países como a França e Portugal, em 2000 e 2006, respectivamente (International IDEA, 2009; Lei Orgânica nº 3/2006, de 21 de Agosto4). Porém, a sua aplicação, sobretudo das quotas (consideradas mais hard), tem sido controversa, como se viu nestes dois países (ver Santos, 2004), sendo, aliás, uma das razões que levou a França a optar pela Lei da Paridade (Sénac-Slawinski, 2004)5. Contudo, esta também gerou controvérsia, sobretudo entre universalistas e paritaristas, por chocar com a antiga concepção de representação republicana, fundada sobre o universalismo do indivíduo abstracto e singular (assexuado) (ver Scott, 2005).

Uma das grandes críticas que têm sido apontadas às quotas é que se trata de uma medida injusta, que viola uma das regras centrais da justiça distributiva – o princípio do mérito (e.g., Davey, Bobocel, Son Hing, & Zanna, 1999; Son Hing, Bobocel, & Zanna, 2002) e o âmbito da política não tem sido excepção (Gaspard, et al., 1992; Young, 1990). De facto, os seus opositores argumentam que, desta forma, a selecção é feita tendo em conta o sexo das pessoas e não as suas competências individuais, podendo levar à diminuição da qualidade da política. Crosby e Clayton (2001) referem que, ao considerar-se que há violação do princípio do mérito, parte-se do pressuposto que há uma forma objectiva de medir o mérito, quando são conhecidas as dificuldades de se encontrarem medidas rigorosas para o fazer, sobretudo em contextos subjectivos, como o da política (Agacinski, 1999). Além disso, tratando-se de um mundo tradicionalmente masculino (Thébaut, 2003), o princípio do mérito, que tanto se questiona no caso das mulheres, não se costuma questionar no caso dos homens (Gaspard et al., 1992; Espada et al., 2002).

Para percebermos a controvérsia instalada em torno deste tipo de medidas, temo-nos debruçado sobre esta questão, primeiro numa investigação (Santos, 2004) que tinha como objectivo verificar a tolerância das pessoas face a quotas aplicadas a diferentes grupos-alvo e, além disso, mostrar que, no contexto político, a avaliação do mérito não é neutra (Young, 1990), mas influenciada pela ideologia de género, na lógica da assimetria simbólica (e.g., Amâncio, 1994; 1999; Amâncio & Oliveira, 2006), como acontece noutras dimensões do mundo do trabalho. Assim, num estudo qualitativo (Santos, 2004, Estudo 1), onde perguntámos a 114 participantes (48 do sexo masculino, 66 do sexo feminino) quais as competências necessárias para o exercício do lugar de deputado/a, mostrámos que esta actividade está associada, sobretudo, a traços de personalidade (e.g., honesto e inteligente), ligados ao estereótipo masculino, e não tanto a qualificações específicas e objectivas. Por outras palavras, e na linha de outros autores (e.g., Espada et al., 2002), estes resultados revelam que não existe um perfil padrão que permita a avaliação objectiva do mérito neste contexto. Num outro estudo (Santos, 2004, Estudo 2) evidenciámos o consenso entre os/as 310 jovens (159 do sexo masculino, 151 do sexo feminino) em aceitarem mais as quotas relativas às “regiões subdesenvolvidas” e às “pessoas com deficiência” do que para as “mulheres na política” e as “minorias étnicas no trabalho”. Ou seja, as pessoas não parecem ser desfavoráveis às quotas em si, mas apenas em condições em que as representações sobre o grupo-alvo da quota (e.g., mulheres) interferem no julgamento, nomeadamente quando a desigualdade de género é percebida como uma situação histórica ‘natural’. Num último estudo (ver Santos, 2004, Estudo 3), focado no contexto político, confirmámos a centralidade da ideologia meritocrática (e.g., Sidanius & pratto, 1999), principalmente no caso dos homens, que valorizam o mérito dos candidatos a deputados em abstracto. Também se demonstrou a influência da ideologia de género (e.g., Amâncio, 1994), sobretudo no caso das mulheres, cujos julgamentos sobre o mérito também são influenciados pelo sexo do grupo-alvo, parecendo este estar mais associado ao masculino.

Assim, o presente estudo tem como objectivos específicos: (I) identificar as dimensões que representam os atributos e competências considerados fundamentais na política por pessoas não profissionais da política, de modo a clarificarmos se estes estão associados a significados masculinos, como verificámos anteriormente (Santos, 2004, Estudo 1); (II) perceber se a sub-representação das mulheres na política constitui um problema de ordem social (se percebem que há discriminação) e/ou política (se questionam a qualidade da democracia representativa), e qual a origem dessa situação. Pretendemos perceber se as atribuições utilizadas salientam razões internas às mulheres (de acordo com as atitudes de sexismo moderno que tendem a responsabilizá-las pela sua própria condição – Palacios, 2004), ou razões externas, de ordem social; (III) verificar quais são as soluções propostas e perceber o que os participantes pensam acerca das medidas de acção positiva, concretamente acerca da Lei da Paridade e do sistema de quotas, que se destinam a reduzir a desigualdade de género.

 

Método

Participantes

Foram realizadas nove entrevistas de grupo com 51 estudantes de uma Universidade de Lisboa (25 do sexo masculino e 26 do sexo feminino). A configuração dos grupos foi a seguinte: seis grupos homogéneos (três constituídos por participantes do sexo feminino e três do masculino); e três grupos heterogéneos (constituídos por três participantes do sexo feminino e três do masculino). As suas idades variavam entre 18 e 41 anos (M = 21 anos; Mhomens = 21, 5 anos; Mmulheres= 21, 4 anos) posicionando-se politicamente entre o centro e o centro esquerda (M = 4, 5)6. Participaram nas sessões seis pessoas, excepto em três, em que participaram apenas cinco. Trata-se de uma amostra não probabilística de conveniência.

Procedimento

Foi criado um anúncio que distribuímos pela instituição e enviámos por e-mail, em que era fornecida informação aos estudantes sobre o estudo que estava a decorrer no Laboratório de Psicologia, oferecendo 5,00€ em fotocópias aos/às participantes. Informava-se que se tratava de entrevistas de grupo com duração aproximada de uma hora, dependendo da dinâmica do grupo. As sessões foram realizadas pela primeira autora, embora estivesse sempre acompanhada de um assistente, numa sala do Laboratório, tendo demorado entre 45 minutos a duas horas. Após uma conversa informal, os/as participantes liam um guião onde lhes era dada uma informação de carácter geral sobre o estudo. Era-lhes solicitada sinceridade nas opiniões e autorização para gravar as sessões, assegurando-se o anonimato. Após a transcrição e preparação do corpus do material, este foi submetido a uma análise lexical realizada pelo programa informático Alceste7, versão 4.7 (Image, 2005).

Material/Instrumento

No início das entrevistas foram enunciadas algumas questões com o objectivo de despertar nos grupos um clima de discussão aberta sobre o tema em análise (Krueger & Casey, 2000). Estas foram construídas com base na nossa investigação anterior (Santos, 2004) e na revisão de literatura efectuada para este estudo. As dimensões que estruturaram o guião foram seis: (1) no início, com o intuito de ambientar os/as participantes, foram-lhes colocadas questões de carácter sócio-demográfico; (2) era-lhes dito que íamos falar sobre política, perguntando se se tratava de um tema do seu interesse e quais as competências que consideravam necessárias num/a político/a; (3) analisavam dois gráficos com as percentagens da representação política de homens e mulheres, um relativo aos parlamentos nacionais dos países da UE e outro ao Parlamento Europeu por país (Inter-Parliamentary Union, 2006); (4) eram questionados/as sobre o que achavam da situação, a sua origem e como resolvê-la; (5) após serem informados/as sobre o significado dos dois tipos de medidas de acção positiva abordados, era-lhes pedida a opinião sobre as mesmas; (6) era realizado um resumo da sessão pelo assistente, perguntando se havia algum aspecto a acrescentar ou alguma dúvida. No final, respondiam a um breve questionário que integrava outras questões de carácter sócio-demográfico, como o sexo, a idade e a posição política.

 

Variáveis em estudo

Na análise dos dados considerámos o sexo dos/as participantes e o tipo de grupo. O tipo de grupo foi operacionalizado como: grupos homogéneos, constituídos por participantes do sexo feminino ou masculino; e grupos mistos, constituídos por participantes de ambos os sexos. Como cruzamos o sexo e o tipo de grupo, resultaram as seguintes subcategorias/grupos: mulheres 1, mulheres 2, mulheres 3; homens 1, homens 2, homens 3; e misto 1, misto 2 e misto 3. Com esta concepção metodológica pretendíamos estabelecer uma abordagem comparativa que permitisse controlar os factores de interacção que pudessem eventualmente existir entre ambas as variáveis.

As questões-estímulo/variáveis consideradas foram: (i) Quais as competências necessárias que um/a político/a deve ter?; (ii) Qual é a vossa avaliação/ impressão sobre estes dados estatísticos? O que acham da situação?

(iii) Por que acham que esta situação acontece? (iv) Pensam que se trata de uma situação que se deve manter ou, pelo contrário, que há um problema, do ponto de vista da democracia ou da sociedade? (v) Como é que acham que se pode resolver a situação? Suponhamos que tinham o poder para alterar esta situação. O que fariam? e (vi) O que acham de medidas de acção positiva, como o Sistema de Quotas ou a Lei da Paridade?

 

Resultados

A análise foi efectuada com 75.48% do corpus de dados inicial8. Os resultados que apresentamos de seguida dizem respeito aos dois principais procedimentos da metodologia de análise Alceste: a classificação descendente hierárquica (CDH) e a análise factorial de correspondências (AFC). A CDH permitiu-nos seleccionar as classes lexicais que surgiram a partir dos discursos dos/as participantes e a AFC permitiu-nos analisar as relações de proximidade e dissociação que são estabelecidas entre as classes temáticas e as variáveis em estudo.

 

Análise temática das classes lexicais apuradas

Desta análise resultou a distribuição de três classes lexicais principais, que podemos observar na figura 1, designadas de acordo com o vocabulário que melhor as caracteriza9. A distribuição das três classes lexicais permite-nos, desde logo, distinguir uma estrutura temática global dos discursos dos/as participantes, de acordo com dois momentos principais: (i) o primeiro momento traduz a proximidade e a associação temática entre as classes 1 e 3, remetendo para a avaliação das medidas de acção positiva e para os atributos e competências considerados necessários no/as políticos/as, bem como para as acções que visam a igualdade de género; (ii) a classe 2 agrega-se à estrutura temática anterior e remete para uma análise e comparação que os/as participantes fazem, a nível internacional, sobre a origem e persistência, ou não, da desigualdade de género. Este desenho estrutural traduz as relações de dissociação e de proximidade temática das dimensões. Os conteúdos mais característicos e as variáveis associadas a cada uma das classes também são apresentados na figura 1.

 

 

A classe 1Des/favorabilidade face à acção positiva: uma questão de in/competência – é constituída por 21.3% das UCE’s analisadas. Como vemos na figura 1, as variáveis que mais contribuem para a formação desta classe são a avaliação da acção positiva2 = 339.8) e o grupo de homens 32 = 61.86), tendo o grupo de mulheres 22 = 5.02) e de homens 22 = 2.65) já uma contribuição bastante ténue. As dimensões e conteúdos que emergem desta classe remetem sobretudo para a avaliação das medidas de acção positiva. Independentemente da opinião dos/as participantes ser positiva ou negativa, emerge o discurso referindo que, através deste tipo de mecanismos, a entrada de mais mulheres na política poderá diminuir a qualidade da política.

Assim, é bastante saliente uma dimensão que engloba os discursos favoráveis à entrada das mulheres na política, através deste tipo de medidas, enquanto instrumentos provisórios, com vista a acelerar o processo, mas apenas nos casos em que as mulheres demonstrem interesse pela política e tenham competências e experiência, como ilustram as seguintes UCE’s10:

Eu sou a favor de qualquer método que comece a iniciar o processo de mudança. Portanto, se as quotas vão acelerar o processo, não me faz qualquer tipo de impressão. É um ponto negativo, mas tem que se começar por algum lado, portanto, se o mundo é um mundo de homens e está fechado, tem que haver alguma forma de o abrir.

É uma questão de democracia. Haver, então, os 50/50. Agora, se, realmente, não houver interesse das mulheres, ou se não houver competências, também, agora, só encher, não! Só para fazer número, acho que não vale a pena! Mas, se, realmente, houver igualdade de competências e tudo isso, acho que sim”.

Porém, se a entrada das mulheres na política tiver como objectivo apenas “fazer número”, coexistem dois tipos de discursos. Por um lado, há os discursos dos que, apesar de serem desfavoráveis às medidas, julgam que a sua implementação pode ser um “mal necessário” pelo qual terá de se passar, de modo a que as mulheres que entrem agora na política sirvam de “exemplo” ou “modelo” às outras mulheres:

Estando lá as primeiras, depois, as outras começam a entrar. Acho que é uma medida, tipo...sou pouco favorável, mas, acho que era bom a esse ponto, de ir lá pôr agora algumas e fazer com que, depois, as outras, vendo lá aquelas, também fossem tentar ir para lá.

Agora, seria muito mau, porque ia-se estar lá a pôr pessoas que, se calhar, não tinham interesse naquilo e que não eram competentes, mas iria chamar aquelas que são realmente competentes e que podiam realmente ir fazer alguma coisa”.

Por outro lado, há os discursos desfavoráveis à utilização deste tipo de medidas, vendo-as como uma discriminação clara, porque se trata de “forçar a situação”:

Não, esta questão das quotas é forçar uma situação, é forçar uma situação. Por isso, eu não sou favorável. Quer dizer, não havendo alternativa, não havendo alternativa, é um meio de obrigar os homens, pelo menos, a meterem as mulheres na política, mas, de qualquer das maneiras, não é natural, é uma situação forçada automatismo da metodologia, não é possível identificar, com precisão, as especificidades sociodemográficas de quem as refere.

Agora, se o objectivo é ter já representatividade da mulher, sim senhora, temos eficiência, mas, se calhar, perdemos eficácia, se calhar, podíamos vir mais a perder muito mais competência. Quer dizer, não é assim fácil. Não é, agora, espetar para lá, assim, não sei quantas mulheres, porque temos que pôr mulheres!

Independentemente da sua opinião face às medidas, é saliente o discurso em como, através de “ferramentas artificiais”, a entrada das mulheres pode conduzir à diminuição da qualidade da política, em termos de competências:

Por que será que, por ter que preencher a quota, para se poder garantir os benefícios, não vão pôr todas as mulheres que aparecerem no Partido ali? E isso, depois, vai-nos levar a uma fraca qualidade do Partido, em si, quando, se calhar, se poderia ter muito mais qualidade se se tivesse menos quantidade de mulheres, neste caso.

E nesse aspecto é que se pode concordar com as medidas e eu sou a favor das quotas, como ferramenta para acelerar processo. Não como uma medida a tomar a longo prazo, porque, eu acho que isso ia criar desigualdade outra vez, porque, depois, há homens que tinham mais competências e, certamente, não iam chegar, porque a taxa era só de...

Embora com uma expressividade bastante ténue emerge um discurso em como a situação tem de evoluir “naturalmente”, devendo antes ser as mulheres a tomarem a iniciativa, o que, actualmente, ainda não fazem:

É péssimo, claro. Então, isso era bom que as mulheres tivessem... que fosse 50/50. Se calhar, era o ideal, não sei. Mas acho que isso, tendencialmente, poderá vir a ser assim, ou, pelo aumentar estes valores, acho que sim. As mulheres não tomam a iniciativa.

A classe 2Desigualdade de género determinada pela História – concentra 37.8% das UCE’s. As variáveis que mais contribuem para a constituição desta classe são a avaliação da situação2 = 72.60), manter ou problema2 = 51.15) e justificação da situação2 = 43.59), tendo as variáveis sociodemográficas uma expressividade mais ténue (χ2 entre 12 e 3.85), embora com uma predominância do masculino (ver figura 1). Ao procurarem avaliar e justificar a desigualdade de género na política, e partindo da observação de dados estatísticos sobre a representação de homens e mulheres nesse contexto nos países-membros da UE e no Parlamento Europeu, os discursos dos/as participantes, neste contexto temático, resultam da comparação que fazem, em termos de evolução ou desenvolvimento, entre os países.

Assim, é saliente o discurso da “normalidade”, considerando que se deve a razões históricas. Ou seja, constatam e consideram “natural” que haja uma maior igualdade nos países mais desenvolvidos, como é o caso dos países nórdicos, dado ter a ver com a evolução histórica interna de cada país, dependendo bastante dos regimes políticos existentes, das mentalidades e da emancipação das mulheres. Salientam que, geralmente, muito devido à longevidade do regime ditatorial, os portugueses têm mentalidades mais fechadas:

A participação das mulheres, em certos países, ainda é baixa, mas isso é o espelho de toda a sociedade. Em certos países, vai aumentando a participação das mulheres, devido à evolução histórica dos países.

 

É, em parte, por causa do que aconteceu, da dominação masculina. Creio que nos países nórdicos foi onde ocorreu primeiro a emancipação da mulher, como é lógico, é normal. Acho que é uma situação que tem tendên- cia a mudar”.

 

Emerge o discurso em como os estereótipos de género podem afectar homens e mulheres. Por um lado, podem fazer com que os homens barrem a entrada das mulheres, num mundo que ainda é percebido como sendo de homens e, por outro, podem levar a que as próprias mulheres não se interessem pela política:

Óbvio que, na maior parte das vezes, são logo cortadas pelos homens.

 

Mesmo por factores históricos, as mulheres não se interessam muito pela política. Hoje em dia, já está a começar a ficar diferente, porque alguns países já trabalham com mais mulheres do que homens no Parlamento Europeu.

 

Finalmente, embora percebam a desigualdade de género como “normal”, visto que tem uma origem histórica, existe um discurso optimista e acreditam que a sociedade está a evoluir “naturalmente” para a igualdade, considerando que é assim que deve ser, ou seja, que não se deve “forçar” a situação:

Eu acho que deve mudar, não de uma forma forçada. Penso que é uma questão de evolução, que é uma situação que vai mudar. E passa, realmente, pela mentalidade das mulheres, de quem tem que aceitar as mulheres, porque, por exemplo, nós sabemos que a Holanda, Suécia e Finlândia, são países que sempre tiveram uma mentalidade muito mais aberta que outros países do Sul da Europa, por exemplo, Itália e Portugal.

 

Esta desigualdade é normal, porque há uns anos atrás a política era só de homens, não havia mulheres. Por isso, é normal. Estou a falar da desigualdade entre os sexos. É normal que as mulheres, cada vez mais, ocupem lugares de topo e comecem a entrar mais participativamente nos movimentos políticos e nas decisões políticas dos países”.

 

A classe 3 – Competências políticas fundamentais e acções para a igualdade de género – é constituída por 40.94% das UCE’s. Como vemos na figura 1, são as variáveis competência política2 = 126.27) e resolução da situação2 = 49.51) que mais contribuem para a formação desta classe, seguindo-se as variáveis sócio-demográficas homens 3 (χ2 = 29.41) e mulheres 1 (χ2 = 18.99). A contribuição das restantes variáveis é bastante mais reduzida (χ2 variando entre 8.24 e 3.17). Esta classe representa essencialmente os discursos sobre a importância que os/as participantes conferem aos atributos necessários para o bom exercício da política e as sugestões que fazem para que a participação das mulheres na política aumente. Quanto às sugestões de acções, são salientes, sobretudo, a realização de campanhas de sensibilização, o papel da sociedade e da educação, em geral, com o intuito de se aumentar a consciência sobre o género. As medidas de acção positiva também são apontadas como uma das formas de alterar a situação, embora de forma menos expressiva.

Para o bom exercício da actividade política, em geral, são destacados traços de personalidade (e.g., honestidade, responsabilidade, competência, liderança e carisma), muito ligados ao estereótipo masculino, embora também abordem a importância de o/a político/a servir o país tendo em conta os interesses do povo e não os interesses pessoais:

Um bom político, na minha opinião, tem que ter carisma, capacidade de liderança, tem que ter reconhecimento social, ser competente, e tem que fazer passar a mensagem.

 

Para além de altruísta, tem de ser uma pessoa com muita capacidade de observação, tem que ser uma pessoa muito expressiva, tem que se saber expressar bem, conseguir expressar as suas ideias, saber defender as suas ideias.

 

É saliente o discurso da importância da vocação para a política, parecendo que este mundo continua muito ligado ao simbólico masculino, o que se pode confirmar pelas palavras mais citadas (e.g., ele + e bom político):

Não é qualquer pessoa que eles encontram que serve para ser político. Acho que na política é preciso ter vocação, porque tem que se gostar, e não é qualquer pessoa que tem.

 

Em termos das sugestões de acções para aumentar a participação das mulheres na política, salientam-se a realização de campanhas de sensibilização em diversos sectores, realçando a importância da educação tanto em casa, como nas instituições de ensino, desde o ensino básico à Universidade, nomeadamente ao nível da divisão dos papéis e dos estereótipos de género. Entendem que a iniciativa de se tratarem os sexos de igual forma também deve partir da sociedade:

 

Não sei, tinha que ser uma coisa muito bem pensada. Em termos de informação, através de campanhas em universidades, escolas, facultar, desde cedo...

 

Nas próprias bases de educação primária, sensibilizar, aí, assim, na educação, que as coisas são iguais. Acho que deve partir mesmo da própria sociedade, nós próprios... não pensar, olha, vou fazer isto, porque é uma mulher, ou porque é aquilo, mas tratar as pessoas de igual para igual, coisa que não acontece nos dias de hoje.

 

Outra dimensão que surge nesta classe, apesar de ter uma menor expressividade, diz respeito à sugestão de medidas de acção positiva para mudar a situação de desigualdade:

Eu até concordo com as medidas. Não concordo totalmente, mas eu acho que, se deixarmos as coisas correr e ver até onde vai, não se vai alterar nada por aí além, porque a maioria das pessoas pensa por regras, e se não têm regras, preferem conformar-se, deixar andar

 

E não é só pela informação, porque temos tanta informação sobre tanta coisa, hoje em dia, e não mudámos. Eu acho que devem ser impostas leis, e essas leis podem não ser brilhantes.

 

Plano de projecção factorial: análise das relações entre as classes e as variáveis

Nesta secção, apresentamos os dados relativos à AFC que ilustra a projecção das três classes e das variáveis, num plano factorial constituído a partir de dois factores, o que corresponde a 100% da variância explicada (ver Figura 2). Assim, podemos analisar a distribuição e a associação existentes entre as classes lexicais, as questões-estímulo e os nove grupos.

O plano factorial concebido é composto por dois factores organizadores dos discursos que surgiram a partir desta temática. O 1º factor, no eixo horizontal, tem associada 52.27% da inércia (variância explicada) e foi designado “Questões de desigualdade de género”; o 2º factor refere-se ao eixo vertical e explica 47.73% da inércia, sendo designado “Questão de in/competência política”.

Com efeito, os contextos temáticos associados ao 1º factor remetem-nos para questões de desigualdade de género. O eixo horizontal reflecte uma oposição entre as causas da origem e da persistência da desigualdade de género e a avaliação das medidas de acção positiva. O domínio das questões sobre a desigualdade de género está particularmente associado à classe 2, resultando das variáveis avaliação da situação, justificação da situação e se esta se deve manter ou é um problema. Como vimos, partindo da comparação entre os países da UE, a desigualdade de género não é tanto percebida como um problema, mas antes como uma situação “normal” que se deve a factores históricos e que está a evoluir “normalmente” para a igualdade, embora mais rapidamente nos países desenvolvidos. Foi o grupo de homens 1 que mais contribuiu para os discursos da “naturalização da História” embora exista uma leve contribuição dos três grupos mistos. No lado oposto do eixo situam-se os discursos sobre a avaliação das medidas de acção positiva que procuram promover a igualdade de género (classe 1), reflectindo a polarização de opiniões que há sobre este tema, sendo salientada a questão de in/competência política e da discriminação inversa, e o argumento de que devem ser as mulheres a demonstrar que têm competência e interesse pela política. São os grupos de homens 2 e 3 e os grupos de mulheres 2 e 3 que mais contribuem para estes discursos. Assim, embora o dendograma revele um discurso eminentemente masculino, apesar da heterogeneidade parece existir algum consenso entre os sexos.

O 2º factor equivale ao eixo vertical e nele está representada a “Questão da in/competência política”, salientando uma polarização entre a classe 1 e a classe 2, situadas nos quadrantes superiores, face à classe 3, situada nos dois quadrantes inferiores, que se prende com as opiniões sobre as acções de resolução dessa situação e as competências requeridas para o bom exercício da actividade política. Homens e mulheres (concretamente os grupos de mulheres 1 e 3, grupo de homens 3 e grupos mistos 1 e 3) contribuíram para estes discursos, construídos em torno de expectativas de menor competência para a política por parte das mulheres, enquanto que, em cima, as questões emergem de discursos predominantemente masculinos, embora com uma leve contribuição dos grupos misto 2 e mulheres 2, revelando alguma diferenciação entre os sexos. Este eixo parece apresentar uma oposição entre os discursos sobre a incompetência das mulheres para o exercício da política, englobando os significados emergentes das questões relativas à desigualdade de género e da avaliação das medidas de acção positiva (em cima), e a competência que consideram crucial para o bom exercício da actividade política (em baixo) que, como vimos, são significados muito associados a traços de personalidade do estereótipo masculino. E, pela distância existente entre os conteúdos, as mulheres estão muito longe dessa representação.

 

Discussão

A análise dos conteúdos das três classes lexicais permitiu-nos identificar as principais dimensões temáticas dos discursos dos/as participantes. Organizámos esta secção de acordo com os objectivos específicos que orientaram este estudo.

A análise efectuada acerca das competências políticas fundamentais e acções para a igualdade de género permite-nos responder ao primeiro objectivo, que pretendia identificar as dimensões que representam os atributos e competências considerados fundamentais na política por pessoas não profissionais da política, para clarificar se estas estão associadas a significados masculinos. Embora surja um discurso, consensual entre homens e mulheres, pouco expressivo, que se prende com o “altruísmo”, geralmente mais associado ao estereótipo feminino, por estar associado ao cuidar dos outros, destacam-se, sobretudo, a honestidade, a capacidade, a responsabilidade, a competência, a liderança, a comunicação, o carisma e a vocação. Ou seja, representam traços de personalidade, em consonância com os resultados anteriores (Espada, et al., 2002; Santos, Estudo 1) que, como vimos, continuam ligados ao estereótipo masculino (Amâncio, 1994). Tal como em França (2003), em Portugal, a política parece continuar associada aos homens, o que pode, de facto, constituir um obstáculo, tanto relativamente à entrada das mulheres na política, como à sua permanência. A ideologia de género, que influencia ambos os sexos, funciona como uma espécie de barreira invisível, a nível vertical e horizontal (e.g., Eagly & Diekman, 2006), dificultando o acesso das mulheres aos lugares de decisão (Sanchez-Mazas & Casini, 2005), como neste caso. Além disso, as (poucas) mulheres que conseguem ultrapassar essas barreiras, continuam a ter de enfrentar estereótipos de género negativos, sendo, como vimos, por vezes, ainda mais criticadas pelas mulheres (Mathison, 2001). Ao assimilarem a ideologia de género, muitas vezes, estas não questionam o sistema (e.g., Jost et al., 2001) e até o reforçam, exigindo mais das mulheres políticas, em termos de mérito, do que dos homens (Espada et al., 2002; Gaspard et al., 1992). Se a ideologia meritocrática é percebida como fundamental (e.g., Crosby & Blanchard, 1989; Siddanius & Pratto, 1999) na nossa sociedade, como confirmámos ao longo deste estudo, torna-se paradoxal pensar que esta pode coexistir em “harmonia” com a ideologia de género, sobretudo em contextos subjectivos como a política (Agacinski, 1999). A meritocracia só é possível com precisão em sistemas imparciais (Clayton & Tangri, 1989), o que não é o caso, visto que a discriminação ainda existe na nossa sociedade. Por isso, o actual sistema de avaliação do mérito não é equitativo (Son Hing et al., 2002), nem “objectivo” ou neutro (Crosby & Clayton, 2001; Young, 1990), sobretudo quando estão a ser considerados traços de personalidade. Trata-se antes de uma ilusão de meritocracia (Ellemers & Barreto, 2009), uma vez que, como vimos no contexto político (Santos, 2004; Santos & Amâncio, 2007; 2010), a avaliação do mérito também é influenciada pela ideologia de género.

O segundo objectivo pretendia perceber se a sub-representação das mulheres na política constitui um problema de ordem social e/ou política, e qual a origem dessa situação. A análise da classe 2, sobre o facto de a desigualdade de género ser determinada pela História, permite-nos concluir que os discursos em torno desta temática resultam, sobretudo, dos homens. Ao admitirem a existência da desigualdade de género na política portuguesa, distanciam-se do problema, uma vez que consideram que esta é fruto da própria História ou das mulheres. De facto, consideram “normal” que nas sociedades mais desenvolvidas haja uma maior igualdade do que nas menos desenvolvidas, como Portugal, porque entendem que se trata de uma situação que resulta da evolução histórica interna de cada país ou sociedade, dependendo, nomeadamente, dos regimes políticos (e.g., a ditadura, em Portugal), das mentalidades e da emancipação das mulheres.

Assim, podemos concluir que, embora estes percebam a discriminação existente face às mulheres (percebendo a desigualdade de género na política como um problema de ordem social), emergem discursos contraditórios, numa perspectiva determinista, em como se trata de uma situação “normal”, “aceitável” que se deve a “razões históricas” e que, portanto, não implica as pessoas. É como se, perante tal facto, não houvesse nada a fazer, porque “é a sociedade que é assim”. Apesar de tudo, há algum optimismo, acreditando que a sociedade está a evoluir “gradativa” e “naturalmente” para a igualdade e que é assim que deve ser. Por outras palavras, consideram que não se deve “forçar a situação”, interferindo “artificialmente”, através de medidas de acção positiva, na evolução “natural” da História. A par destes discursos coexistem outros, embora de forma pouco expressiva, que se prendem com o reconhecimento da existência de estereótipos de género. Existe a noção de que estes são efectivamente nocivos para as mulheres, podendo tanto fazer com que os homens vedem a sua entrada na política, como com que as próprias mulheres (por questões “culturais” ou “instintivas”) não se interessem por esse mundo, ainda masculino. Ou seja, é atribuída responsabilidade às mulheres pela situação de desvantagem em que se encontram. De acordo com Morales (2005), as mulheres podem, efectivamente, assimilar os estereótipos de género, acomodando-se ao sistema não o questionando (e.g., Jost et al., 2001), ou reforçando-o, auto-responsabilizando-se pela sua condição (Palacios, 2004). Vários autores (e.g., Jost & Banaji, 1994, Siddanius & Pratto, 1999) têm chamado à atenção para o facto de as ideologias legitimarem o sistema, servindo para manter e justificar o status quo. Assim, a ideologia de género pode constituir um obstáculo à entrada das mulheres na política.

O terceiro objectivo deste estudo era verificar quais são as soluções propostas e perceber o que os participantes pensam das medidas de acção positiva que se destinam a reduzir a desigualdade de género, particularmente, a Lei da Paridade e o sistema de quotas. Relativamente às sugestões de acções para aumentar a participação das mulheres na política (classe 3) homens e mulheres salientam a realização de campanhas de sensibilização em diversos sectores e destacam o papel que a sociedade e a educação têm, em geral, no despertar da consciência do género, para que os sexos sejam tratados de igual forma. As medidas de acção positiva surgem com uma expressividade irrisória. A classe 1 ilustra a enorme heterogeneidade que existe nos discursos, sobretudo proferidos por homens, quanto ao uso destas medidas, como forma de aumentar a representação de mulheres na política.

De facto, existem discursos favoráveis ao uso de medidas, enquanto instrumentos provisórios, mas apenas nos casos em que as mulheres demonstrem interesse pela política e tenham competências e experiência. Existem discursos em que, apesar de desfavoráveis, caso a entrada das mulheres na política seja apenas para “fazer número”, admitem que as medidas podem ser um “mal necessário”, para que estas mulheres sirvam de “exemplo”/”modelo” às outras. Outros discursos são claramente desfavoráveis, percebendo as medidas como um exemplo de discriminação (inversa) flagrante, tratando-se de um mecanismo que “força a situação”. Tal como na classe 2, embora com menor expressividade, reemerge o discurso da importância de existir uma evolução “natural” e não através de “mecanismos artificiais”, para a igualdade, devendo antes as mulheres demonstrar interesse pela política.

Independentemente dos discursos verificados, existe um sentimento de “desconfiança” generalizado em como o aumento da entrada de mulheres na política, através do recurso a este tipo de “ferramentas artificiais”, irá diminuir a qualidade da política. Estes resultados vão, de certa forma, ao encontro do nosso estudo experimental (Santos, 2004, Estudo 3), onde verificámos que a avaliações do mérito são genderizadas pelas mulheres, parecendo construir-se em torno de expectativas de menor mérito por parte das deputadas em comparação com os deputados.

Parece, assim, que a ideologia de género contamina o mérito, de acordo com a lógica da assimetria simbólica (e.g., Amâncio, 1994), na medida em que, ao contrário do que acontece geralmente com os homens, a quem nem sequer se questiona o mérito, existe uma desconfiança quanto ao das mulheres, devendo estas provar que têm mérito num contexto que continua associado ao masculino. Aliás, o plano factorial ilustra bem como a desigualdade e a incompetência se distanciam da competência e como, em termos do segundo eixo, as duas primeiras estão próximas.

Finalmente, gostaríamos de salientar que este estudo, realizado com jovens universitários/as, se enquadra numa investigação mais alargada que também integra profissionais da política. Procurámos, desta forma, aprofundar o conhecimento sobre os factores explicativos da desigualdade de género na política, bem como sobre as medidas que se destinam a reduzi-la, particularmente sobre a Lei da Paridade, implementada em Portugal em 2009, salientando-se os factores de natureza ideológica.

 

Referências

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Fianciado por:

Esta investigação foi financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, subvenção concedida à primeira autora: SFRH/BD/21628/2005.

 

*Autor para correspondência:

Maria Helena Santos, CIS/ISCTE-IUL, Av. das Forças Armadas, 1649-026, Lisboa, Portugal. E-mail: Helena.Santos@iscte.pt

 

Notas

3A ideologia meritocrática, ideologia de mobilidade social individual, é sustentada pela crença de que a capacidade e o esforço pessoal são os grandes determinantes dos êxitos pessoais (Taylor & McKirnan, 1984).

4Foi designada por “lei da paridade”, embora nas listas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para as autarquias locais seja assegurada a representação mínima de apenas 33% de cada um dos sexos.

5A “paridade” é diferente da “quota”. Esta é uma medida transitória de recuperação, que visa compensar o desequilíbrio criado no passado (Marques-Pereira, 2003), enquanto aquela pretende o reconhecimento, inscrito no direito, da igualdade da representação das mulheres e dos homens na política (Gaspard et al., 1992). Apesar de muitos autores considerarem que a base conceptual e filosófica dos dois conceitos é diferente, para Diaz (2003), não é possível distinguir entre as duas posições quando se trata da sua implementação prática.

6A escala variava entre 1 e 7: Extrema direita, direita, centro direita, centro, centro esquerda, esquerda, extrema esquerda.

7O Alceste (análise lexical por contexto de um conjunto de segmentos de texto) é uma metodologia de análise de dados qualitativos que se adequa a todos os domínios de investigação em que se pretenda analisar material textual, especificamente quanto à sua composição lexical e estruturação temática (e.g., Soares, 2005). Assim, pode aplicar-se a dados resultantes de diversos procedimentos (e.g., entrevistas) que tenham por base a linguagem verbal. O principal objectivo da análise Alceste é identificar a organização interna do/s discurso/s existente/s nesses textos (Reinert, 1998).

8Isto é, das 1411 UCE’s identificadas, foram classificadas 1065.

9Cada classe do dendograma é composta por um conjunto de palavras que seleccionámos tendo em conta o valor do Qui-Quadrado (por ordem decrescente, até 10). O grau de associação das variáveis e palavras-plenas em cada classe lexical é expresso através de um indicador resultante desta medida (i.e., χ2).

10As UCE’s (unidades de contexto elementar, correspondem à ideia de frase) constituem exemplos representativos das dimensões que integram cada uma das classes lexicais. Pelo