SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.serV issue2Content validation of an instrument to assess the impact of neurocognitive disorders in the familyExperiences of women after mastectomy: rehabilitation nursing care in promoting autonomy author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Revista de Enfermagem Referência

Print version ISSN 0874-0283On-line version ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serV no.2 Coimbra Apr. 2020

https://doi.org/10.12707/RIV19098 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

Validação de indicadores de efetividade hospitalar na dimensão cuidado centrado no doente

Validation of hospital effectiveness indicators in the patient-centered care dimension

Validación de los indicadores de eficacia hospitalaria en la dimensión de la atención centrada en el paciente

 

Leila Soares Seiffert 1
https://orcid.org/0000-0002-8461-0361

Lillian Daisy Gonçalves Wolff 1
https://orcid.org/0000-0002-5152-4811

Alexandra Lunardon Silvestre* 1
https://orcid.org/0000-0002-4899-1734

Talita Rennê Mendonça 1
https://orcid.org/0000-0002-5477-9860

Elaine Drehmer de Almeida Cruz 1
https://orcid.org/0000-0002-7686-6340

Maria Manuela Frederico Ferreira 2
https://orcid.org/0000-0003-4032-9911

António Fernando Salgueiro do Amaral 2
https://orcid.org/0000-0001-9386-207X

 

1 Universidade Federal do Paraná, Paraná, Brasil

2 Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem. Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Coimbra, Portugal

 

RESUMO

Enquadramento: Indicadores de efetividade na dimensão do cuidado centrado no doente.

Objetivo: Validar indicadores quanto à deteção de atributos que possibilitem medir a efetividade da assistência hospitalar na dimensão do cuidado centrado no doente.

Metodologia: Estudo quantitativo do tipo survey, realizado em 2017 para julgamento de 8 indicadores, considerando 11 atributos, por 52 especialistas, utilizando-se técnica Delphi e a plataforma eletrónica Survey Monkey®. A consistência interna foi testada pelo alfa de Cronbach de 0,98. Considerou-se indicador válido quando houve concordância mínima de 70% entre as respostas dos participantes, em todos os atributos.

Resultados: Foram validados 4 indicadores (satisfação do doente; cirurgias canceladas no dia agendado; recomendação do hospital pelo doente; e envolvimento do doente com o próprio cuidado), com alta consistência interna (0,98).

Conclusão: Os indicadores validados favorecem a avaliação da efetividade da assistência hospitalar orientada para a valorização da pessoa enquanto centro do cuidado. Os indicadores não validados são objeto de estudos futuros.

Palavras-chave: assistência centrada no paciente; assistência à saúde; indicadores de qualidade em assistência à saúde; hospitais; cuidados de enfermagem

 

ABSTRACT

Background: Indicators of effectiveness in the dimension of patient-centered care.

Objective: To validate indicators for determining attributes that make it possible to measure the effectiveness of hospital care in the dimension of patient-centered care.

Methodology: Quantitative survey type study, carried out in 2017 to judge eight indicators, considering 11 attributes, by 52 specialists, using the Delphi technique and the electronic Survey Monkey® platform. The internal consistency was tested by Cronbach's Alpha 0,98. A valid indicator was considered when there was a minimum consensus of 70% between the responses of the participants, in all attributes.

Results: Four indicators were validated: patient satisfaction; surgeries canceled on the scheduled day; hospital recommendation; and the patient's involvement in their own care, with high internal consistency (0.98).

Conclusion: The validated indicators favor the evaluation of the effectiveness of hospital care oriented to the valorization of the person as a care center. Non-validated indicators are the subject of future studies.

Keywords: patient-centered care; delivery of health care; healthcare quality indicators; hospitals; nursing care

 

RESUMEN

Marco contextual: Indicadores de eficacia en la dimensión de la atención centrada en el paciente.

Objetivo: Validar los indicadores relativos a la detección de atributos que permitan medir la eficacia de la atención hospitalaria en la dimensión de la atención centrada en el paciente.

Metodología: Estudio cuantitativo de tipo encuesta, realizado en 2017 para evaluar 8 indicadores, considerando 11 atributos, por 52 especialistas, para lo cual se utilizó la técnica Delphi y la plataforma electrónica Survey Monkey®. La consistencia interna fue comprobada por el alfa de Cronbach de 0,98. Se consideró como indicador válido cuando hubo una concordancia mínima del 70% entre las respuestas de los participantes en todos los atributos.

Resultados: Se validaron 4 indicadores (satisfacción del paciente; cirugías canceladas en el día programado; recomendación del hospital por parte del paciente, y participación del paciente en su propio cuidado), con una alta consistencia interna (0,98).

Conclusión: Los indicadores validados favorecen la evaluación de la eficacia de la atención hospitalaria destinada a valorar a la persona como centro de atención. Los indicadores no validados son objeto de futuros estudios.

Palabras clave: atención dirigida al paciente; prestación de atención de salud; indicadores de calidad de la atención de salud; hospitales; atención de enfermería

 

Introdução

Os indicadores de efetividade, na dimensão do cuidado centrado no doente, têm como objetivo medir a efetividade dos cuidados individualizados ao doente. A análise destes indicadores contribui para a compreensão da perspetiva do doente e familiares. Auxilia a equipa de saúde a transpor os limites impostos pela técnica, por rotinas diárias e por normas internas do hospital; e direciona modificações nas prioridades institucionais em busca da excelência no cuidado, visto que a experiência é julgada pela pessoa que o recebe. Desta forma, as medidas obtidas possibilitam a avaliação da segurança e, especialmente, da qualidade dos cuidados de saúde (Etingen, Miskevics, & Lavela, 2016). Com base nestes pressupostos, o presente estudo tem como objetivo: validar indicadores quanto à deteção de atributos que possibilitem medir a efetividade na dimensão do cuidado centrado no doente em hospitais.

 

Enquadramento

O cuidado centrado no doente é considerado uma dimensão da qualidade que compreende o indivíduo e sua família, uma vez que eventuais deficits cognitivos do doente, decorrentes da idade ou da doença, podem estar presentes e ter implicação no desenvolvimento de atividades educativas para a continuidade do cuidado após a alta (Kruk et al., 2018). É desejável que o cuidado se caracterize pelo empoderamento das competências do doente e familiares, bem como pela procura de recursos disponíveis no sistema de saúde e na comunidade, em prol do doente (Aued, Bernardino, Lapierre, & Dallaire, 2019). O cuidado centrado no doente, portanto, é um conceito significativo e transformador dos cuidados de saúde no mundo.

No que diz respeito à enfermagem, o cuidado centrado no doente e na família amplia a parceria entre as partes, incentiva a partilha de conhecimentos e experiências no planeamento dos cuidados, e pode produzir resultados que beneficiem os doentes e as organizações de saúde (Delaney, 2018). Contudo, a subjetividade envolvida nesta forma de cuidar implica dificuldades para estabelecer indicadores que permitam medir até que ponto o cuidado é centrado no doente. Quando monitorizados, tais indicadores baseiam-se em pesquisas de satisfação ou na experiência do doente, com perguntas focadas na melhoria organizacional, e não na centralidade do indivíduo, desconsiderando as especificidades da sua experiência em diferentes serviços (Larson, Sharma, Bohren, & Tunçalp, 2019). Neste contexto, reconhecer que doentes são os únicos que estão sempre presentes, observam e vivenciam situações diversas, pode impactar os resultados dos programas destinados a promover a segurança e as experiências de cuidado positivas (Seiffert, 2019).

Para a compreensão e prática de cuidados centrados no doente, a entidade americana Institute for Patient- and Family-Centered Care considera como conceitos nucleares: dignidade e respeito, partilha de informações, participação e colaboração. Estes evidenciam que a valorização das suas perspetivas, valores, crenças, contextos culturais e escolhas, aprimora os cuidados de saúde (DeRosa et al., 2019). Deste modo, receber informações completas e imparciais, bem como compartilhá-las com os profissionais de saúde, incentivam os doentes e a sua família a tomarem decisões conjuntas sobre os seus próprios cuidados. Contribuem, igualmente, para a melhoria de políticas, programas, instalações, pesquisa e educação na instituição (DeRosa et al., 2019).

Na mesma perspetiva, o Institute of Medicine define que o cuidado centrado no doente é respeitoso, responsivo às necessidades, preferências e valores individuais, e garante que são estes valores que orientaram as decisões clínicas (Cleary, 2016). O foco organizacional no cuidado centrado no doente não prejudica outras ações na procura por melhoria contínua da qualidade, podendo influenciar positivamente outros resultados. Neste sentido, os sistemas de saúde procuram, cada vez mais, desenvolver programas direcionados para o cuidado centrado no doente, de modo a obter melhorias abrangentes (Cleary, 2016).

Deste modo, avaliar indicadores na dimensão cuidado centrado no doente é fundamental para garantir cuidados de qualidade (Kruk et al., 2018). Todavia, quando o indicador não tem um objetivo explícito, é incorretamente especificado ou interpretado, transmite informações imprecisas e não confiáveis, gera prejuízos em recursos e iniciativas políticas (Larson et al., 2019). Por conseguinte, na seleção destes indicadores devem ser considerados se possuem os atributos que os caracterizem como confiáveis e de qualidade. Identificam, na literatura, 11 atributos que possibilitam a análise quanto à adequação do indicador e quanto ao uso a que se propõe (Galhardi & Escobar, 2015; Silveira, Prado Junior, Siman, & Amaro, 2015), os quais estão apresentados e descritos a seguir (Tabela 1).

 

Questão de Investigação

Os indicadores possuem atributos necessários para medir a efetividade da assistência hospitalar no cuidado centrado no doente?

 

Metodologia

O estudo foi aprovado pelo Comissão de Ética em Pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná, no Brasil, sob o Parecer 1.749.438.

Trata-se de um estudo de abordagem quantitativa do tipo survey, com dados colhidos no período de maio a setembro de 2017, por meio da plataforma eletrónica Survey Monkey® e analisados mediante estatística descritiva.

Oito indicadores foram submetidos à avaliação, considerando 11 atributos, utilizando-se fichas técnicas, elaboradas com base na literatura, compostas pelos elementos: nome do indicador, definições ou conceitos, objetivo ou uso, método de cálculo, tipo ou unidade de medida, método de apuração do indicador, frequência e referências (Seiffert, 2019). A medida de julgamento ou avaliação foi elaborada a partir de Escala Likert, com cinco níveis: discordo totalmente; discordo parcialmente; não discordo nem concordo; concordo parcialmente; concordo totalmente.

O recrutamento dos avaliadores, aqui denominados participantes, iniciou-se a partir de lista de 20 autores de artigos relacionados com os indicadores em saúde, obtidos na biblioteca eletrónica Scientific Eletronic Library Online (SciELO), por meio da palavra-chave "Indicadores de qualidade em assistência à saúde"; e 20 profissionais com experiência em gestão da qualidade e segurança do paciente em hospitais brasileiros com selo de qualidade em acreditação, ou que estivessem em processo de preparação para esta certificação.

Adicionalmente, procedeu-se à procura por grupos de pesquisa registados no Diretório de Grupos de Pesquisa no Brasil do Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sediados no país e com desenvolvimento de trabalhos científicos relacionados com indicadores de saúde.

A terceira estratégia para o recrutamento de participantes consistiu na técnica de bola de neve, na qual um participante indica outros, e cuja comunicação se deu por meio eletrónico.

Foram critérios de inclusão de participantes: ser brasileiro, com experiência profissional ou produção científica relacionada com o tema indicador de efetividade assistencial em hospitais. O critério de exclusão foi a não completude de no mínimo 90% das respostas no processo de avaliação. Foram selecionados como participantes aqueles que correspondiam a um ou mais critérios de inclusão, com confirmação, mediante a análise dos seus currículos Lattes.

Os participantes foram codificados pela letra P seguida por um número cardinal, por ordem de finalização do inquérito. A preservação do anonimato justifica-se pela influência que a resposta de um participante, de notório saber, pode ter sobre as respostas dos demais, bem como possibilitar opiniões críticas discordantes e sugestões.

Para a efetivação da avaliação dos indicadores foi realizado inquérito online. Teve-se como premissa que a opinião de um grupo tem mais validade que a individual, e que a heterogeneidade produz resultados qualitativamente melhores. Logo, o propósito foi alcançar o mínimo de concordância ? de 70%, entre as respostas dos participantes, como critério de validação dos atributos, para cada um dos indicadores.

Na primeira fase foram encaminhadas a ficha de cadastro do participante, orientações sobre a pesquisa e fichas técnicas, com a solicitação de sugestões com vista ao seu aprimoramento. Nesta fase, 52 participantes concluíram o inquérito online, as questões que apresentaram concordância mínima entre os participantes estipulada foram mantidas e as fichas técnicas foram revistas com base nas sugestões recebidas.

Na segunda fase, os resultados da primeira fase foram apresentados em gráficos aos participantes, e enviadas as fichas técnicas com adequações incorporadas junto com oito indicadores a serem avaliados; 43 participantes concluíram o inquérito online.

Deste modo, a colheita de dados, com agregação de julgamentos por participantes especialistas no tema de estudo, ocorreu por meio da aplicação seriada e intensiva de um inquérito, com feedback (Avella, 2016). Caracterizaram-se como participantes que concluíram o inquérito nas duas fases: 65,38% enfermeiros, 15,38% médicos, 9,62% farmacêuticos, 5,77% administradores, e 3,85% de outras categorias profissionais. Quanto à titulação, 36,64% eram graduados, 36,64% mestres, e 26,72% doutores.

A análise dos dados ocorreu mediante análise descritiva viabilizada pelo IBM SPSS Statistics®, versão 22.0. Considerou-se indicador válido quando se constatou concordância mínima de 70% entre as respostas dos participantes, em relação a todos os atributos. Utilizou-se o teste alfa de Cronbach para análise da consistência interna das perguntas e respostas, na primeira e segunda fases, respectivamente, cujos valores desejáveis são entre 0,70 a 1,00.

 

Resultados

A avaliação dos participantes resultou na validação de quatro entre os oito indicadores de efetividade na dimensão Cuidado centrado no doente, por meio do alcance de consenso ? 70% de concordância nos 11 atributos para cada indicador. A confiabilidade testada, por meio do alfa de Cronbach, alcançou 0,98, em ambas as fases, comprovando a consistência interna. Considerou-se como indicador válido quando verificada a concordância mínima de 70% em todos atributos.

Nas Tabelas 2 e 3, respetivamente, apresentam-se os indicadores validados e não validados.

 

Discussão

Pretendeu-se elevar a confiabilidade do estudo por meio do estabelecimento de critérios para a inclusão de participantes, como a experiência no uso de indicadores de saúde e produção científica relacionada com o tema. A alta consistência interna calculada pelo alfa de Cronbach para as duas fases, confirmou a excelente confiabilidade das perguntas e respostas.

O indicador "recomendação do hospital pelo doente" tem por objetivo medir a satisfação com a estrutura, processos administrativos e assistenciais, bem como com os resultados do seu tratamento.

A simplicidade na sua interpretação e as altas taxas de concordância em relação aos demais atributos apontam que o reconhecimento dos doentes remete para a tríade de Donabedian (estrutura, processo e resultado), culminando na recomendação do serviço de saúde aos seus contactos (Mahdavi et al., 2018), a partir da satisfação alcançada.

A estrutura compreende as instalações adequadas, equipamentos e insumos suficientes, disponíveis e funcionantes, recursos humanos qualificados com competência técnica e interpessoal. O processo diz respeito à eficiência nos procedimentos administrativos e assistenciais, adequados às necessidades do doente, tempestivamente. E o resultado relaciona-se com o atendimento às expectativas do doente no momento do internamento, que repercutem positivamente na sua saúde, como diagnóstico correto, tratamento adequado, seguro e cuidado humanizado (Mahdavi et al., 2018).

O indicador "envolvimento do doente com o próprio cuidado" possibilita avaliar se este foi considerado como parceiro essencial e respeitado desde a conceção à execução dos cuidados de saúde (Gandhi et al., 2018). Historicamente, a participação do doente nos cuidados tem sido passiva, ao passo que a centralidade do cuidado implica aumentar o seu controle no planeamento da própria assistência. Deste modo, pretende-se incentivar o doente a tomar decisões em conjunto com os profissionais de saúde, o que implica mudanças no comportamento paternalista das equipas de saúde. Por outro lado, considerar as expectativas do doente pode resultar na redução do tempo de internamento e de episódios de readmissão hospitalar (Grocott & Mcsherry, 2018).

Este indicador teve os 11 atributos validados, contudo, alguns participantes pontuaram aspetos do processo assistencial que podem transformar- se em obstáculos da sua utilização, tais como o nível de dependência, de consciência e de autonomia dos doentes; e os custos na sua aplicação prática. Todavia, o fator que mais influencia na disponibilidade de dados para cálculo deste indicador pode ser o receio do doente quanto a ser negligenciado nos cuidados, decorrente da manifestação da sua proatividade e opinião sobre os cuidados recebidos (Seiffert, 2019).

"Satisfação do doente" é um indicador que mede o resultado do tratamento e da assistência recebidos, e viabiliza a monitorização da qualidade dos cuidados hospitalares. Este indicador, como resultado da assistência recebida - efetividade assistencial - pode variar de acordo com a gravidade da condição de saúde ou faixa etária, embora estudo mostre que essas variáveis influenciam pouco na perceção do doente, ainda que o indicador "satisfação do doente" possa influenciar uma série de outros resultados (Cleary, 2016). A valiosa participação dos doentes na identificação de lacunas no serviço, e na avaliação e desenvolvimento de soluções que respondam às suas necessidades, é reiterada pela alta concordância obtida por esse indicador de satisfação do doente, quanto aos atributos simplicidade e objetividade. Tem-se como exemplos hospitais que fazem uso de alguma metodologia para esta medição, como a aplicação de pesquisas de satisfação, padronizadas no momento ou após a alta (Cleary, 2016).

O indicador "cirurgias canceladas no dia agendado" por motivos que não dependeram do doente visa reconhecer o problema, e a sua redução a médio prazo, ao se considerar que o cancelamento impacta a ansiedade e, consequentemente, a confiança do doente relativamente à instituição e equipa de saúde, além de implicações na saúde, recursos, custo e qualidade dos cuidados (Talalwah & Mclltrot, 2019).

Adicionalmente, destaca-se o aspeto ético observado frente às informações verbais e escritas dissonantes, quando a realização de procedimento cirúrgico diverge do planeado e quando ocorre suspensão de cirurgia e não são feitos registros nem justificativas (Talalwah & Mclltrot, 2019).

Houve maior concordância entre os participantes em relação aos atributos de simplicidade quanto à facilidade no cálculo e na interpretação deste indicador, por ser utilizado na melhoria da gestão das salas cirúrgicas, otimizando a sua ocupação (Seiffert, 2019).

O indicador "orientação ao doente", mede a conexão entre esse e a equipa assistencial, a quebra de barreiras de comunicação e a criação de um ambiente de diálogo aberto e de confiança (Pereira, Santana, Morais, Soares, & Silva, 2016). A comunicação tem peso, significativo, nas queixas dos doentes com relação ao atendimento e interfere na satisfação. Alcançar formas de comunicação eficazes na perspetiva dos doentes abre oportunidade para a criação de um sistema de saúde de vanguarda e contribui para uma sociedade mais igualitária (Grocott & Mcsherry, 2018).

Especialmente em saúde, a comunicação abrange diversos aspetos do cuidado, tais como dieta e restrição alimentar, atividade física, medicação e interação medicamentosa, sinais e sintomas, e autocuidado. A linguagem utilizada deve ser clara, simples, sendo necessária a avaliação da compreensão quanto às orientações prestadas (Weber, Silva Lima, Acosta, & Marques, 2017). Ademais, a falta de estratégias para a clara transferência de informações pode gerar deficiências do sistema de saúde, como o aumento dos custos, a demora na resolução de problemas e a perda da continuidade do cuidado. Deste modo, estabelecer métodos para a assertividade na comunicação evita a perda de informações, o retrabalho e a duplicidade de ações (Aued et al., 2019).

Neste contexto, e considerando o modelo de atendimento centrado no doente, verifica-se que a comunicação é fundamental também no planeamento da alta, o qual deve ser orientado pela ênfase nas necessidades do doente que incluem condição socioeconómica, histórico e condições atuais de saúde, bem como os cuidados necessários após a alta (Aued et al., 2019).

De modo complementar, o indicador relativo à "perceção do doente sobre a preparação para sua alta" tem como objetivo avaliar a efetividade das ações realizadas pela equipa multidisciplinar, especialmente pela de enfermagem, com vista a prepará-la para exercer, com autonomia, o autocuidado, sob a ótica de trabalhar com o doente e não pelo doente (Pereira et al., 2016). Os participantes consideraram que o atributo simplicidade, no que concerne à facilidade no cálculo, foi a melhor propriedade desse indicador. Em contrapartida, a falta de dados foi considerada como prejudicial, gerando desconfiança nos resultados.

O indicador "compreensão dos doentes sobre sua medicação" relaciona-se com o envolvimento destes nas deliberações críticas. A simplicidade quanto à facilidade de cálculo e interpretação, e a tempestividade no uso deste indicador, foram os atributos que apresentaram as maiores concordâncias entre os participantes; a utilização do questionário foi considerada a maneira mais eficaz para a colheita dos dados. Quanto ao atributo tempestividade, considera-se que a comunicação de informações oportunas e precisas é fundamental para as transições de cuidados eficazes. A disponibilidade de indicador que possibilite monitorizar se os doentes desempenham um papel ativo, expressando as suas preocupações sobre o uso de medicamentos e se compreenderam as orientações recebidas, é relevante para a enfermagem, responsável por prestar a maioria deste tipo de orientação aos doentes (Liu, Gerdtz, & Manias, 2016).

Os cinco atributos não validados neste indicador estão relacionados com a inexistência de levantamentos sistemáticos relativos à compreensão dos doentes sobre a sua medicação.

Na realidade brasileira, mas não restrita a esta, é necessário que os hospitais implementem a pesquisa de opinião, com questões alusivas à compreensão do doente acerca das orientações e esclarecimentos relativos à sua medicação, em momentos de transição dos cuidados, e à compreensão da sua responsabilidade sobre o uso dos medicamentos, por ocasião da alta hospitalar.

O indicador "doentes informados sobre a ocorrência de incidentes com danos" refere-se à transparência na comunicação oportuna em tais eventos, essencial à aprendizagem e ao planeamento de ações, com foco na minimização de danos e na prevenção de novas e semelhantes ocorrências. Hospitais que procuram resultados ótimos incluem doentes e familiares no seu sistema de gerenciamento de incidentes, inserem mecanismos institucionais para incentivar o doente a perguntar sempre que suspeitar de que alguma coisa não está certa com o seu cuidado (Ewing, Austin, Diffin, & Grande, 2015).

Os atributos que alcançaram as mais altas concordâncias para este indicador foram a simplicidade no entendimento da ficha técnica para a gestão do indicador, e a sensibilidade para reconhecer variações que podem repercurtir-se nos resultados. Os atributos disponibilidade de dados para cálculo do indicador e, por consequência, a confiabilidade no resultado, não foram validados.

Apesar da falta de preparação das organizações de saúde para lidar com os erros, especialmente pelo receio de altas indemnizações judiciais, evidenciam-se mudanças neste cenário. Numa pesquisa realizada em 1457 hospitais norte-americanos sobre o engajamento de doentes e familiares nos incidentes com danos, os autores constataram avanços relacionados com a existência de políticas formais para disclosing (66,6%), procedimento que revelou erros na assistência com pedidos de desculpas ao doente e familiares, em entrevistas rotineiras e facilita a participação destes em análises de causa raiz (46,9%; Herrin et al., 2016).

 

Conclusão

Entre os oito indicadores de efetividade assistencial hospitalar na dimensão Cuidado centrado no doente avaliados, quatro foram validados, por meio da avaliação satisfatória quanto aos 11 atributos elencados, e quatro indicadores não obtiveram avaliação satisfatória integralmente e, portanto, não foram validados.

Os indicadores validados foram: satisfação do doente; cirurgias canceladas no dia agendado; recomendação do hospital pelo doente; e envolvimento do doente com o próprio cuidado.

Entre os não validados, destaca-se o não alcance do consenso mínimo nos atributos confiança no resultado, relação custo-benefício na obtenção das informações e disponibilidade de dados. Destaca-se que dificuldades na obtenção de dados para construir o indicador foram relacionadas a todos eles. Essas condições devem ser enfrentadas por meio de ações que valorizem a cultura do cuidado centrado no doente e estimulem o correto e oportuno registo de informações, com o auxílio de sistemas inteligentes.

Reitera-se, portanto, a relevância da análise pelos gestores, da especificidade, clareza e confiabilidade de indicadores de efetividade em uso, ou a serem propostos a fim de alcançar o objetivo organizacional do cuidado centrado no paciente.

A monitorização do uso dos indicadores validados nesta pesquisa, potencialmente, contribuirá para a identificação de importantes aspetos da efetividade da assistência, agregando-se aos demais subsídios, com vista a construir e direcionar ações de melhoria contínua, na procura pela excelência dos cuidados em saúde.

Pode-se considerar como limitação deste estudo a subjetividade que envolve pesquisas do tipo survey. Para minimizar a possibilidade de viés nos resultados, definiu-se o critério mínimo de concordância para a validação, a partir do julgamento de especialistas estudiosos no tema e com experiência no uso de indicadores de saúde. Adicionalmente, foi incluído o cálculo de consistência interna, como parâmetro de avaliação.

 

Referências bibliográficas

Aued, G. K., Bernardino, E., Lapierre, J., & Dallaire, C. (2019). Liaison nurse activities at hospital discharge: A strategy for continuity of care. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 27(e3162), 1-8. doi:10.1590/1518-8345.3069.3162        [ Links ]

Avella, J. R. (2016). Delphi panels: Research design, procedures, advantages, and challenges. International Journal of Doctoral Studies, 11, 305-321. doi:10.28945/3561        [ Links ]

Cleary, P. D. (2016). Evolving concepts of patient-centered care and the assessment of patient care experiences: Optimism and opposition. Journal of Health Politics, Policy and Law, 41(4), 675-696. doi:10.1215/03616878-3620881        [ Links ]

Delaney, L. J. (2018). Patient-centred care as an approach to improving health care in Australia. Collegian, 25(1), 119-123. doi:10.1016/j.colegn.2017.02.005        [ Links ]

DeRosa, A. P., Nelson, B. B., Delgado, D., Mages, K. C., Martin, L., & Stribling, J. C. (2019). Involvement of information professionals in patient- and family-centered care initiatives: A scoping review. Journal of the Medical Library Association, 107(3), 314-322. doi:10.5195/jmla.2019.652        [ Links ]

Etingen, B., Miskevics, S., & Lavela, S. L. (2016). Assessing the associations of patient-reported perceptions of patient-centered care as supplemental measures of health care quality in VA. Journal of General Internal Medicine, 31 (Sup. 1), S10-20. doi:10.1007/s11606-015-3557-2        [ Links ]

Ewing, G., Austin, L., Diffin, J., & Grande, G. (2015). Developing a person-centred approach to carer assessment and support. British Journal of Community Nursing, 20(12), 580-584. doi:10.12968/bjcn.2015.20.12.580        [ Links ]

Galhardi, N. M., & Escobar, E. M. (2015). Indicators of quality of nursing care. Revista de Ciências Médicas, 24(2), 75-83. doi:10.24220/2318-0897v24n2a2639        [ Links ]

Gandhi, T. K., Kaplan, G. S., Leape, L., Berwick, D. M., Edgman-Levitan, S., Edmondson, A., & Wachter, R. (2018). Transforming concepts in patient safety: A progress report. BMJ Quality & Safety, 27, 1019-1026. doi:10.1136/bmjqs-2017-007756        [ Links ]

Grocott, A., & McSherry, W. (2018). The patient experience: Informing practice through identification of meaningful communication from the patient's perspective. Healthcare, 6(26), 1-14. doi:10.3390/healthcare6010026        [ Links ]

Herrin, J., Harris, K. G., Kenward, K., Hines, S., Joshi, M. S., & Frosch, D. L. (2016). Patient and family engagement: A survey of US hospital practices. BMJ Quality & Safety, 25(3), 1-8. doi:10.1136/mjqs-2015-004006        [ Links ]

Kruk, M. E., Gage, A. D., Arsenault, C., Jordan, K., Leslie, H. H., Roder-DeWan, S., & Pate, M. (2018). High-quality health systems in the sustainable development goals era: Time for a revolution. Lancet Global Health, 11(6), 1196-1252. doi:10.1016/s2214-109x(18)30386-3        [ Links ]

Larson, E., Sharma, J., Bohren, A. U., & Tunçalp, Ö. (2019). When the patient is the expert: Measuring patient experience and satisfaction with care. Bulletin of the World Health Organization, 97(8), 563-69. doi:10.2471/BLT.18.225201        [ Links ]

Liu, W., Gerdtz, M., & Manias, E. (2016). Creating opportunities for interdisciplinary collaboration and patient-centred care: How nurses, doctors, pharmacists and patients use communication strategies when managing medications in an acute hospital setting. Journal of Clinical Nursing, 25(19-20), 2943-2957. doi:10.1111/jocn.13360        [ Links ]

Mahdavi, M., Vissers, J., Elkhuizen, S., van Dijk, M., Vanhala, A., Karampli, & Evan de Klundert, J. (2018). The relationship between context, structure, and processes with outcomes of 6 regional diabetes networks in Europe. PLoS One,13(2), e0192599. doi:10.1371/journal.pone.0192599        [ Links ]

Pereira, S. K., Santana, R. F., Morais, V. S., Soares, T. S., & Silva, D. M. (2016). Planejamento da alta hospitalar no pós-operatório de idosos: Estudo de casos múltiplos. Revista Cuidado Fundamental, 8(4), 4949-4955. doi:10.9789/2175-5361.2016.v8i4.4949-4955        [ Links ]

Seiffert, L. S. (2019). Indicadores para avaliação da efetividade assistencial de hospitais (Tese de doutoramento). Universidade Federal do Paraná, Brasil.         [ Links ]

Silveira, T. V., Prado Junior, P. P., Siman, A. G., & Amaro, M. O. (2015). The importance of using quality indicators in nursing care. Revista Gaúcha de Enfermagem, 36(2), 82-88. doi:10.1590/1983-1447.2015.02.47702        [ Links ]

Talalwah, N. A., & McIltrot, K. H. (2019). Cancellation of surgeries: Integrative review. Journal of Peri Anesthesia Nursing, 34(1), 86-96. doi:10.1016/j.jopan.2017.09.012        [ Links ]

Weber, L. A., Silva Lima, M. A., Acosta, A. M., & Marques, G. Q. (2017). Transição do cuidado do hospital para o domicílio: Revisão integrativa. Cogitare Enfermagem, 22(3), e47615. doi:10.5380/ce.v22i3.47615        [ Links ]

 

Financiamento

Este estudo enquadra-se em projeto de estágio de doutoramento financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes, Ministério da Educação do Brasil).

 

Contribuição de autores

Conceptualização: Seiffert, L. S., Wolff, L. D. G., Silvestre, A. L., Mendonça, T. R., Ferreira, M. M. F.

Tratamento de dados: Seiffert, L. S., Wolff, L. D. G., Silvestre, A. L., Ferreira, M. M. F., Amaral, A. F. S.

Metodologia: Seiffert, L. S., Wolff, L. D. G., Ferreira, M. M. F.

Redação - preparação do rascunho original: Seiffert, L. S., Wolff, L. D. G., Silvestre, A. L., Mendonça, T. R.

Redação - revisão e edição: Seiffert, L. S., Wolff, L. D. G., Silvestre, A. L., Mendonça, T. R., Ferreira, M. M. F., Cruz, E. D. Almeida.

 

*Autor de correspondência:

Alexandra Lunardon Silvestre

Email: alexandra_lunardon@yahoo.com.br

 

Como citar este artigo: Seiffert, L. S., Wolf, L. D. G., Silvestre, A. L., Mendonça, T. R., & Cruz, E. D., Ferreira, M. M. F., & Amaral, A. F. S., (2020). Validação de indicadores de efetividade hospitalar na dimensão cuidado centrado no doente. Revista de Enfermagem Referência, 5(2), e19098. doi:10.12707/RIV19098

 

Recebido:10.12.19

Aceite: 06.05.20

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License