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Revista de Enfermagem Referência

Print version ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIII no.5 Coimbra Dec. 2011

https://doi.org/10.12707/RIII1107 

Avaliação dos fatores interferentes na adesão ao tratamento do cliente portador de pé diabético

 

Elizabeth Mesquita Melo*; Mariana Silva Teles**; Rafaela Silva Teles***; Islene Victor Barbosa****; Rita Mônica Borges Studart*****; Margarida Mota de Oliveira******

* Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Professora do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Enfermeira do Hospital Distrital Dr. Evandro Ayres de Moura e Hospital São José de doenças Infecciosas [Velizjornet@yahoo.com.br].

** Enfermeira Graduada pela UNIFOR. Enfermeira da Emergência do Hospital Geral de Fortaleza [marinhateles@bol.com.br].

*** Enfermeira Graduada pela UNIFOR [rafasteles@yahoo.com.br].

**** Aluna do Doutorado em Enfermagem pela UFC. Professora da UNIFOR. Enfermeira do Instituto Dr. José Frota [islene@terra.com.br].

***** Aluna do Doutorado em Enfermagem pela UFC. Professora da UNIFOR. Enfermeira do Hospital Geral de Fortaleza [monicastudart@hotmail.com].

****** Mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Medicina da UFC. Enfermeira do Ambulatório do Pé Diabético do Centro Integrado de Diabetes e Hipertensão e do Hospital Distrital Dr. Evandro Ayres de Moura [margarida.mota@uol.com.br].

 

Resumo

A diabetes é uma doença crónica que exige adaptações na vida do cliente. O estudo objetivou avaliar a adesão do cliente portador de pé diabético ao tratamento. Estudo descritivo, quantitativo, realizado numa instituição especializada em diabetes, em Fortaleza-CE, com 45 clientes portadores de pé diabético. Os dados foram colhidos nos meses de fevereiro e março de 2009, expostos em gráficos e tabelas. O projeto foi aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza. Os clientes foram esclarecidos sobre o estudo, com participação voluntária. A maioria era do sexo masculino, na faixa etária de 50 a 79 anos e casados. Os principais fatores que interferem na adesão ao tratamento incluem: a baixa escolaridade, o nível socioeconómico, o déficit de conhecimento acerca da doença e a dificuldade de acesso ao serviço de saúde. A maioria dos clientes utilizava produtos caseiros para a cura da lesão, demonstrando crença em experiências anteriores. É fundamental que o cliente seja encorajado a assumir a responsabilidade de seu cuidado, enfatizando a necessidade das mudanças no estilo de vida.

Palavras-chave: avaliação; tratamento; pé diabético.

 

Evaluation of interfering factors in treatment adherence of patients with diabetic foot conditions

Abstract

Diabetes is a chronic disease that requires adjustments in patients’ daily lives. The aim of the study was to evaluate the treatment adherence of patients with diabetic foot conditions. A descriptive, quantitative study was carried out in a specialized diabetes institution, Fortaleza-CE, with 45 patients with diabetic foot conditions. Data were collected during February and March 2009 and displayed using charts and tables. The project was approved by the Research and Ethics Committee of the University of Fortaleza. Patients were informed about the study, their participation was voluntary. Most were male, aged 50-79 years and married. The main factors that interfered with treatment adherence included poor education, socio-economic level, knowledge deficit about the disease and poor access to health services. Most patients used homemade products to heal the injury, demonstrating belief in previous experiments. It is essential that patients are encouraged to take responsibility for their care, emphasizing the need for changes in lifestyle.

Keywords: evaluation; therapeutics; diabetic foot.

 

Evaluación de los factores intervinientes en la adhesión al tratamiento del paciente con pie diabético

Resumen

La diabetes es una enfermedad crónica que exige adaptaciones en la vida del paciente. El estudio tuvo como objetivo evaluar la adhesión del paciente con pie diabético al tratamiento. Se trató de un estudio descriptivo, cuantitativo, realizado en una institución especializada en diabetes, en Fortaleza-CE, con 45 pacientes con esta dolencia. Los datos fueron recolectados durante los meses de febrero a marzo de 2009 y fueron posteriormente expuestos en gráficos y tablas. El proyecto fue aprobado por el Comité de ética en Pesquisa de la Universidad de Fortaleza. A los pacientes, se les informó sobre el estudio, en el cual participaron de forma voluntaria. La mayoría era del sexo masculino, dentro de la franja etária de los 50 a los 79 años y estaban casados. Los principales factores que interfieren en la adhesión al tratamiento incluyen: la baja escolaridad, el nivel socioeconómico, el déficit de conocimiento acerca de la enfermedad y la dificultad de acceso al servicio de salud. La mayoría de los pacientes utilizaba productos caseros para curar la lesión y demostró basar su confianza en experiencias anteriores. Es fundamental que se le anime a asumir la responsabilidad de su propio cuidado, al mismo tiempo que se debe enfatizar la necesidad de realizar cambios en su estilo de vida.

Palabras clave: evaluación; tratamiento; pie diabético.

 

Introdução

Dentre as complicações desencadeadas pela diabetes mellitus (DM) está o “pé diabético” que se constitui num problema de saúde pública, em razão da frequência com que ocorre e do alto custo do tratamento. O pé diabético pode acarretar grandes prejuízos ao cliente, desde restrições em suas atividades cotidianas e profissionais, baixa autoestima, danos psicológicos, necessidade maior do apoio dos familiares, até gastos financeiros com seu tratamento e hospitalizações.

Metade de todas as pessoas portadoras de diabetes e com mais de 65 anos de idade são hospitalizadas a cada ano, demonstrando que as complicações da doença frequentemente contribuem para maiores taxas de hospitalização (Oliveira e Milech, 2004).

A enfermagem deve oferecer apoio educativo para o cuidado com os pés de acordo com as necessidades individuais e o risco de ulcerações e amputações. Assim, devem ser realizadas consultas regulares, enfatizando o exame do pé pelo cliente diabético, além da observação dos fatores de risco, sinais de doença arterial periférica, alterações na pele, uso de calçados inadequados, presença de edema nos membros inferiores, alterações na perfusão periférica, sinais de isquemia e neuropatia.

O enfermeiro deve cumprir o papel de educador, sendo fundamental o acompanhamento efetivo ao cliente diabético, promoção de grupos de apoio, além das orientações necessárias quanto ao controle da glicemia, enfatizando a importância da adesão a hábitos de vida mais saudáveis. É importante a negociação de um plano de cuidado com o cliente, planeando intervenções direcionadas.

Diante de tantas restrições e cuidados relacionados ao pé diabético, quando a doença é diagnosticada tardiamente, o cliente pode não assimilar a importância de aderir a hábitos mais saudáveis e cumprir de maneira satisfatória todas as etapas do tratamento, que englobam a utilização de insulinoterapia e hipoglicemiantes orais de forma correta e a inspeção diária dos pés.

De acordo com Silva, Pais-Ribeiro e Cardoso (2006), vários fatores atuam em conjunto na adesão do cliente diabético ao tratamento. Dentre esses fatores, ressalta a importância das características do indivíduo, da doença e do tratamento.

Sousa, Peixoto e Martins (2008) destacam que os profissionais de saúde têm um papel fundamental junto aos clientes com doenças crónicas, uma vez que o tratamento geralmente é complexo, implicando mudanças na vida do cliente e no auto cuidado diário. Dessa forma, o enfermeiro deve estreitar o vínculo com o cliente, proporcionando um cuidado individual e humanizado. Ao abordar o cliente é importante que o enfermeiro realize a consulta de maneira criativa para que consiga orientar e estimular a adesão do cliente ao tratamento adequado. Através da empatia e da compreensão esse vínculo será fortalecido, possibilitando, assim, um conhecimento maior do seu cliente no que diz respeito à suas emoções e sentimentos, além do seu esclarecimento acerca do tratamento do pé diabético.

A partir do desenvolvimento dessas estratégias, a confiança do cliente será conquistada, fator de extrema importância no tratamento, pois dessa maneira o enfermeiro saberá como conduzir o cliente sem receios, o que poderá possibilitar a este uma recuperação mais rápida.

Geralmente o cliente sente-se desencorajado por não saber identificar sinais de melhora da lesão, do edema, da falta de sensibilidade motora e tátil do pé, dentre outros sintomas. Assim, muitos recorrem à utilização de remédios caseiros e/ou medicamentos populares, que não têm eficácia comprovada cientificamente para tratamento da ferida, e a automedicação, demonstrando, assim, a influência dos fatores comportamentais, crenças e valores culturais no seu auto cuidado.

O trabalho é relevante, pois proporcionará uma visão sobre as dificuldades do cliente relativas ao tratamento da doença, viabilizando a promoção de uma assistência efetiva, buscando o melhor conviver com essa patologia e a redução de complicações. Nesse contexto, o estudo teve como objetivo geral avaliar a adesão do cliente portador de pé diabético ao tratamento. Os objetivos específicos foram: conhecer os fatores que interferem na adesão do cliente ao tratamento do pé diabético; e identificar as principais substâncias utilizadas na lesão

 

Metodologia

Estudo do tipo descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no Centro de Diabetes e Hipertensão, instituição especializada no tratamento do cliente diabético, enfocando o tratamento e o acompanhamento, localizada em Fortaleza-Ceará-Brasil.

Segundo Polit, Beck e Hungler (2004), os estudos descritivos possuem algumas finalidades, tais como: a observação, descrição e documentação dos aspectos de uma determinada situação, apresentando grande valor na enfermagem, pois aprofundam o conhecimento sobre o fenómeno pesquisado.

A população foi composta pelos clientes portadores de pé diabético, acompanhados na instituição, especificamente no ambulatório do pé. A amostra constou de 45 clientes, selecionados por conveniência, no período da colheita, seguindo os critérios de inclusão: ser portador de pé diabético, possuir condições de se expressar verbalmente ou um acompanhante para fornecer as informações; e exclusão: possuir complicações associadas ao diabetes e/ou demência senil, pela impossibilidade de demonstrar o seu conhecimento.

Os dados foram colhidos nos meses de fevereiro e março de 2009, com um questionário, incluindo aspectos sócio demográficos e dados referentes à doença e à ferida, organizados num banco de dados no Programa Excel 2005 e expostos em gráficos e tabelas. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza. Os objetivos e importância foram expostos aos clientes, sendo a participação voluntária, com garantia de anonimato e liberdade de desistência do estudo, sem prejuízo no seu atendimento na instituição.

 

Resultados

A faixa etária predominante entre os clientes foi a de 50 a 79 anos, com 35 clientes (77,7%). A maioria (64,4%) era do sexo masculino, casada (53%) e 51% eram aposentados. Em relação à renda familiar, a maioria (68%) possuía renda de 1 a 2 salários mínimos. A respeito do grau de instrução predominou o ensino fundamental incompleto, com 19 clientes (42%).

O tempo de duração do DM é um ponto indicativo de gravidade e surgimento de úlceras. Nesse sentido, 19 (42,2%) dos entrevistados afirmaram ter descoberto a doença entre 6 a 15 anos, 12 (26,6%) de 16 a 25 anos, 3 (6,7%) foram diagnosticados portadores da doença há mais de 34 anos e 6 (13,3%) tinham diagnóstico confirmado há menos de 6 anos (Gráfico 1).

 

GRÁFICO 1 – Distribuição dos clientes segundo tempo de diagnóstico da doença.

 

Os clientes foram observados quanto ao conhecimento em relação à doença, sendo que 18 (40%) associaram a doença às suas complicações (agudas ou crónicas), 12 (26,7%) à prevenção, 9 (20%) à presença de açúcar no sangue, 5 (11,1%) aos sintomas presentes e apenas 1 (2,2%) não possuía nenhum conceito formado sobre a doença (Gráfico 2).

 

GRÁFICO 2 – Distribuição dos clientes segundo o conhecimento sobre a doença.

 

A maioria dos clientes era acompanhada na instituição há um período maior do que 6 meses, sendo esse período bastante variável. O mais predominante foi o período de 5 a 15 anos, com 16 clientes (35,6%). Apenas 9 clientes (20%) eram acompanhados até 6 meses. Vale destacar que a maioria (84%) referiu já haver realizado acompanhamento em outros locais (postos de saúde e hospitais), fato compreensível, pois muitos residem distante da instituição ou em outro município (Tabela 1).

 

TABELA 1 – Distribuição dos clientes segundo o tempo de acompanhamento.

 

Ainda no que diz respeito ao acompanhamento do cliente na instituição, 73% não abandonaram o tratamento em nenhum momento. Por outro lado, 12 (26,6%) referiram já ter abandonado o tratamento, pelos seguintes motivos: atividades profissionais, dificuldades de deslocamento para a instituição, descrença no tratamento e dificuldades no agendamento da consulta na instituição. A maioria dos clientes (51%) referiu apresentar a lesão entre 1 a 4 meses, 7 (15,6%) há menos de 1 mês, 7 (15,6%) de 5 a 8 meses e 8 (17,8%) em período maior do que 8 meses (Tabela 2).

 

TABELA 2 – Distribuição dos clientes segundo o tempo da ferida.

 

Em relação ao penso realizado no pé, 40% ressaltaram que o procedimento era realizado somente na instituição. Porém, 60% renovam o penso também no domicílio, sendo o procedimento realizado por familiares, pelo próprio cliente ou por um profissional de saúde próximo da sua residência.

Convém salientar que 66,7% dos entrevistados utilizavam algum tipo de produto caseiro na lesão, enquanto 15 (33,3%) relataram nunca ter feito uso de nenhum produto empírico. As substâncias caseiras mais utilizadas no penso, segundo a colocação dos clientes, estão agrupadas na tabela 3.

 

TABELA 3 – Produtos caseiros utilizados na ferida pelos clientes.

 

Dentre as substâncias utilizadas pelos clientes, as mais citadas foram: aroeira, referida por 13 clientes, babosa (7), água de ameixa (4), açúcar (3) e casca do cajueiro (3). Outras substâncias citadas incluem: vinagre, folha de jucá, extrato de alecrim, tamarindo sem semente, cumaru, carrapateira, casca da jurema, água de fumo, casca de baba timão, pasta d’água e batata inglesa.

Os clientes foram questionados quanto ao seguimento das recomendações dos profissionais de saúde que os acompanhavam na instituição, sendo observado que 38 (84%) seguiam tais recomendações. Todavia, constatamos, ainda, que 7 clientes (15,6%) não seguiam todas as orientações.

Dentre as dificuldades mencionadas pelos clientes para o não seguimento do tratamento estão: a dieta (51,1%), os cuidados com os pés (11,1%), o penso (8,9%), a atividade e ocupação (8,9%) e abandono do álcool e tabagismo (6,7%). Outras dificuldades citadas englobam: impossibilidade de realizar atividades físicas, compreensão acerca da importância da insulinoterapia e hipoglicemiantes orais.

 

Discussão

As lesões de membros inferiores nos clientes diabéticos constituem um grande problema de saúde pública por serem frequentes na população diabética e potencializadas nos clientes de baixo nível socioeconómico, com condições inadequadas de higiene e pouco acesso aos serviços de saúde. Identificar o perfil sócio demográfico dos entrevistados amplia a compreensão acerca das características que podem subsidiar a assistência de enfermagem ao cliente portador de pé diabético.

A faixa etária mais acometida entre os clientes ficou entre 50 a 79 anos de idade. Observamos diferença significativa entre os sexos, sendo a maioria do sexo masculino. Entretanto, o estudo realizado por Silva, Pais-Ribeiro e Cardoso (2006), com clientes diabéticos, demonstrou que a maioria da amostra era constituída por clientes do sexo feminino.

Em relação à escolaridade predominou o ensino fundamental incompleto seguido do ensino médio completo. Ochoa-Vigo et al. (2006) identificaram, no seu estudo, que a maioria dos clientes possuía o ensino fundamental incompleto, condição que pode caracterizar a população de baixa escolaridade e dificultar a compreensão das orientações fornecidas durante o acompanhamento.

De acordo com Maia e Silva (2005), independentemente do grau de instrução dos clientes, o profissional de saúde deve utilizar uma linguagem simples e clara no momento das suas orientações educativas, pois estas são partes integrantes do tratamento.

A baixa escolaridade pode representar um fator que influencia nas complicações crónicas, pela limitação do acesso às informações, devido ao possível comprometimento das capacidades de leitura e escrita, afetando, assim, a compreensão das atividades de educação para a prevenção.

A maioria dos participantes era aposentada, fato demonstrado também por Ochoa-Vigo et al. (2006). Quanto à renda familiar mensal dos entrevistados, a maioria recebia de 1 a 2 salários mínimos. A situação socioeconómica foi fator significante para a adesão do cliente ao tratamento realizado na unidade de saúde já que as dificuldades financeiras implicam em menor acesso aos serviços essenciais, além dos obstáculos para a manutenção da qualidade de vida.

O tempo de doença é um dado relevante na prevenção do pé diabético, pois constitui um fator de risco significativo para a ocorrência de complicações capazes de evoluir para um tipo de síndrome que atinge os pés do cliente diabético. Prevaleceu o tempo de descoberta da doença no período de aproximadamente 6 a 25 anos. Para Barbui e Cocco (2002) a neuropatia é uma das formas mais frequentes de complicação da doença, sendo constatada em 8 a 12% dos diabéticos quando diagnosticado portador da doença e após longos períodos de início da doença (20 a 25 anos) em 50 a 60% dos casos.

Esse quadro reflete a falta de informação que o cliente portador de diabetes tem da doença independentemente do tempo de diagnóstico. Em virtude disso, é fundamental que o profissional de saúde, durante a assistência prestada, oriente o cliente diabético quanto à fisiopatologia da doença e o seu caráter assintomático, sendo essencial orientar clientes que ainda não apresentam sinal ou sintomas da doença.

O acompanhamento periódico do cliente portador de diabetes é um fator primordial para a prevenção de complicações futuras, bem como para o controle de problemas já existentes, entre os quais se insere o pé diabético. A maioria dos participantes era acompanhada na instituição há um período maior do que 6 meses, sendo que predominou na amostra o acompanhamento no período de 5 a 15 anos, com 16 clientes.

No que diz respeito à promoção de cuidados para o diabetes mellitus, é essencial a combinação entre a prevenção da doença com o controle e tratamento das lesões já instaladas, associando o tratamento cirúrgico, com antimicrobianos e acompanhamento/detecção de doença vascular, com o objetivo de reduzir a morbidade e mortalidade da doença. Conforme Santos, Silveira e Caffaro (2006), clientes com pé diabético infectado, idade avançada, duração longa da doença, lesões em calcâneos e insuficiência arterial crônica sem possibilidade de revascularização, apresentam maior risco para amputações.

É fundamental o acompanhamento periódico para a obtenção de resultados positivos em qualquer tratamento de saúde. O estudo revelou que a maioria dos clientes fazia acompanhamento regularmente na instituição, o que contribui para a identificação precoce de problemas que possam interferir na evolução da ferida.

O retorno do cliente à instituição hospitalar para a revisão da ferida e troca do penso contribui para uma melhor evolução da ferida e maior satisfação do cliente. É importante o acompanhamento da ferida por um profissional capacitado para uma cicatrização efetiva e um menor tempo (Melo et al., 2008).

Morais et al. (2008) pontuam que a avaliação atuará como subsídio para elaboração e desenvolvimento de um plano de cuidados com estratégias de tratamento adequado, reunindo uma conduta terapêutica ampla com variedades de métodos propícios para executá-lo, proporcionando uma rápida e eficaz cicatrização além de priorizar o conforto para o cliente.

Entre os participantes, a maioria afirmou não ter abandonado o tratamento em nenhum momento, como também as visitas para troca e avaliação do penso realizado no pé. No entanto, 12 clientes já tinham abandonado o tratamento por motivos variados.

É coerente assinalar que não é fácil para o cliente diabético aceitar a doença, pela sua cronicidade e difícil controle, já que esta exige mudanças significativas na sua vida, compromisso com o tratamento e medidas de cuidados para a prevenção de complicações.

A diabetes mellitus é uma doença crónica, em ascensão, que transforma a vida das pessoas por ela acometidas, uma vez que exige uma série de mudanças nos hábitos de vida, para além das diversas complicações quando não tratada corretamente (Fajardo, 2005).

Silva, Pais-Ribeiro e Cardoso (2006) acentuam que o tratamento do diabetes é extremamente desafiante, em decorrência do grau de envolvimento ativo e mudanças exigidas pelo cliente.

Quanto ao tempo da ferida, a maioria dos clientes referiu apresentar a lesão entre 1 a 4 meses. As úlceras surgem devido à perda da sensação no pé, causada pela neuropatia periférica, neuropatia autonómica, as quais são potencializadas pela diminuição da circulação sanguínea e baixa imunidade. Uma vez instalada a lesão, a cicatrização ocorre de forma lenta, o que pode incorrer em prejuízos na vida do cliente. A atuação da equipe multidisciplinar e a avaliação clínica, por meio de consulta médica e/ou de enfermagem, são fundamentais para a prevenção de lesões nos pés, sendo utilizados instrumentos especializados para a classificação do grau de risco das lesões (Ochoa-Vigo e Pace, 2005).

Para Duque, Bastos e Melo (2007), a cicatrização é um processo lento e complexo, que exige condições adequadas tanto locais como sistêmicas; independentemente dessas condições, as lesões nos pés dos clientes diabéticos podem levar a consequências trágicas, mesmo quando tratadas a tempo. Se não tratadas, o dano é quase sempre a deformação do pé, podendo levar a amputação e até mesmo a uma grave infecção sistémica.

Nesse contexto, Morais et al. (2008) enfatizam a importância da avaliação holística de enfermagem, contemplando aspectos inerentes à idade, doenças crónicas, condições nutricionais, repouso, uso de medicamentos, entre outros, fatores estes que contribuem para o avanço ou demora da cicatrização. Ao investigar quem realiza a troca do penso, 18 clientes informaram que o procedimento era realizado exclusivamente na instituição. No entanto, a maioria renovava o penso também no domicílio, sendo o procedimento realizado por familiares, pelo próprio cliente ou por um profissional de saúde.

É importante destacar que para que se desenvolva um plano de cuidado adequado ao cliente, é necessário um profissional especializado, pois este acompanhará a evolução das diversas etapas do tratamento da ferida, identificando pontos importantes que influenciam no processo de cicatrização. O enfermeiro, utilizando métodos terapêuticos, busca a cicatrização da ferida com restauração das funções e prevenção das sequelas o que vem beneficiar o cliente dando-lhe mais qualidade de vida.

Como destacam Morais et al. (2008), o profissional de enfermagem está diretamente relacionado ao tratamento de feridas, desde a atenção primária até a terciária, devendo manter observação intensiva em relação aos fatores locais e sistémicos que condicionam o surgimento da ferida ou que possam interferir na cicatrização.

O penso pode ser definido como a aplicação local de remédios em feridas ou úlceras para limpá-las ou tratá-las. Muitos portadores do pé diabético recorrem à utilização de substâncias caseiras na ferida em busca de uma cura instantânea. No estudo em questão, a maioria dos clientes informou já ter utilizado algum tipo de produto caseiro na lesão, sendo os mais utilizados: aroeira, babosa, água de ameixa, açúcar e casca do cajueiro.

A cultura popular influencia diretamente no tratamento das doenças, pois as pessoas acreditam em remédios caseiros já utilizados por conhecidos ou familiares, muitas vezes sem comprovação científica, o que pode, ao invés de contribuir para a cura, acarretar danos ao cliente.

As orientações dadas pelo profissional de saúde têm como objetivo sensibilizar, motivar e mudar atitudes do cliente que deve incorporar a informação recebida sobre os cuidados com os pés no seu dia a dia, reduzindo, consequentemente, o risco de ferimento, úlceras e infecção.

Em se tratando do seguimento das orientações dos profissionais de saúde da instituição, por parte dos clientes, notamos que a maioria seguia tais orientações. Todavia, constatamos, ainda, um pequeno número de clientes que não seguia todas as orientações fornecidas.

Melo et al. (2008) ressaltam que, no seguimento dos clientes portadores de ferida, é fundamental que o enfermeiro explique as ações realizadas, conscientizando-os sobre a importância do tratamento, buscando cooperação e interesse.

Foram percebidas, entre os clientes, dificuldades relacionadas com o tratamento, sendo as mais significativas: alimentação, cuidados com os pés, penso, ocupação, abandono do álcool e tabagismo. Outras dificuldades mencionadas, em menor proporção, foram: impossibilidade de realizar atividades físicas, compreensão acerca da importância da insulinoterapia e hipoglicemiantes orais.

É comum a presença de sentimentos diversos, no momento que uma doença é diagnosticada, principalmente quando exige mudanças no estilo de vida e necessidade de abdicar de comportamentos habituais. É essencial que o cliente diabético esteja ciente sobre as possíveis complicações que podem surgir frente à doença, para que se comporte de forma a não ampliá-las ou acentuá-las, buscando ajuda especializada quando necessário.

 

Conclusão

Ao tratarmos dos aspectos que envolvem o pé diabético, identificamos inúmeros fatores que interferem na adesão do tratamento, tais como: a baixa escolaridade, o nível socioeconômico, o déficit de conhecimento acerca da doença e a dificuldade de acesso ao serviço de saúde.

A maioria dos clientes utilizava produtos caseiros visando a cura da lesão, o que demonstra a crença em experiências anteriores. O uso dos produtos não está ligado a conhecimento científico, sendo que o produto mais utilizado foi a aroeira, talvez pelo fato de estar associada à cicatrização.

A diabetes é uma doença crónica que exige adaptações pessoais e no estilo de vida. Dessa forma, será necessário que o enfermeiro adote uma postura de decisão com o cliente, a fim de identificar as medidas mais pertinentes e passíveis de execução.

O cuidado à saúde do portador do pé diabético deverá envolver também a capacitação da equipe multiprofissional visando um melhor acompanhamento, sendo essencial a sensibilização do cliente, para que este perceba os resultados positivos decorrentes de cada mudança de comportamento.

A enfermagem deve ser capaz de identificar, na sua atuação junto aos clientes, as anormalidades precoces para lhes proporcionar educação contínua e lhes oferecer apoio na prevenção de úlceras e infecção de membros inferiores, minimizando dessa maneira os riscos de amputações.

Acredita-se que esse estudo contribuiu de forma significativa para um olhar mais reflexivo a respeito do cuidado com o cliente portador do pé diabético, a fim de facilitar a adesão ao tratamento. Entretanto, mais estudos são necessários, a fim de um maior aprofundamento da temática e, consequente incorporação na prática de enfermagem.

 

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Recebido para publicação em: 20.01.11

Aceite para publicação em: 30.06.11

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