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Economia Global e Gestão

versão impressa ISSN 0873-7444

Economia Global e Gestão v.16 n.2 Lisboa set. 2011

 

Gestão de pessoas e o modelo de gestão de serviços globalmente integrada: um estudo exploratório em uma multinacional de TI

Daniel Scumparim*, Dalila Correa**, Mário Neto*** e Arsênio Netto****

 

*Mestre em Administração pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), Brasil. Especialista em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Gerente de pessoas em prestação de serviços de tecnologia da informação em projetos internacionais. E-mail: d_scumpa@hotmail.com

**Doutorada em Administração pela Universidade de São Paulo (FEA/USP). Docente e Pesquisadora do Mestrado Profissional em Administração da Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Brasil. E-mail: dacorrea@unimep.br

***Doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de São Carlos. Visiting Scholar na Universidade de Chicago (EUA). Professor do Mestrado em Administração da Universidade Metodista de Piracicaba, Brasil. E-mail: msacomano@unimep.br

****Doutorado em Educação, Professor Associado no Mestr ado Profissional em Administração da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), Brasil. E-mail: afnovaes@unimep.br

 

RESUMO

Este artigo discute a gestão de pessoas no contexto da Gestão de Serviços Globalmente Integrada (GSGI) em uma subsidiária multinacional, localizada na cidade de Hortolândia, Brasil. Este modelo ainda não se encontra sistematizado na literatura mas se mostra altamente rentável, uma vez que extrai os melhores recursos disponíveis das empresas subsidiárias em cada país em que estão alocadas. Ao apoiar-se na abertura de mercado e na flexibilidade de operações para alto aproveitamento dos recursos, a GSGI permite manter o controle e poder de ação da matriz, mas também a autonomia e independência das subsidiárias de forma conjugada. O presente artigo, ao abordar este modelo, tem como objetivo discutir preliminarmente o gerenciamento das pessoas no âmbito da força de trabalho remota. Os dados de pesquisa foram coletados por meio de entrevistas em profundidade, realizadas com os principais gestores dessa planta, além da observação participante e da análise documental, por um período de cinco meses. Dentre os modelos de gestão de pessoas explorados neste artigo, pode-se identificar um alinhamento da GSGI em direção ao modelo competitivo de gestão de pessoas.

Palavras-chave : Gestão de Pessoas, Recursos Humanos, Serviços Globais, Competitividade Global

 

People management and the global integrated management services context: an explanatory analysis in a multinational company subsidiary

ABSTRACT

This article discusses people management in the Global Integrated Management Services context (GISM) in a multinational company subsidiary, located in Hortolândia City, Brazil. This model is not systematized in literature yet, but proves to be highly profitable, since it extracts the best available resources from the subsidiaries in each country in which they are allocated. Based on market’s opening and operations flexibility for high resources utilization, GISM allows the parent company to keep the control and power of action, but also the subsidiaries autonomy and independence in a conjugated form. This article, approaching this model, aims at discussing preliminarily people management in the range of remote workforce. Survey data were collected through in-depth interviews conducted with the mean managers of this plant, in addition to participant observation and document analysis during a period of five months. Among the models of people management treated in this article, it is possible to identify an alignment of GISM toward the competitive model of people management.

Key words: People Management, Human Resources, Global Services, Global Competitiveness

 

INTRODUÇÃO

A evolução dos processos e da abordagem conceitual da Administração de Recursos Humanos (ARH) tem sido bastante observada e registrada pela literatura nacional e estrangeira. Dentre os autores que analisam esta evolução destacam-se, respectivamente, Fischer (1998) e Ulrich (2000). A análise dessa evolução vem sendo sistematizada de forma fragmentada, fato que resulta numa produção de conhecimento também desarticulada e pulverizada, uma vez que ela não consegue abarcar em sua plenitude a complexidade que o assunto envolve. Desse modo, outra consideração é destacada, qual seja, nem sempre a evidência em relação à presença de melhores práticas da gestão de pessoas é um indicador de evolução desta gestão – fato que incita análises mais acuradas nos processos de gestão que estão a demandar mudanças na forma de gerenciar as pessoas no ambiente de trabalho. Logo, o assunto merece análise mais contextualizada. O presente artigo enfoca a gestão de pessoas num contexto organizacional de atuação global para compreender o processo evolutivo desta gestão diante de um novo modelo de gestão organizacional envolvendo processos de trabalho intermediados por diferentes agentes estabelecidos em diferentes países de diferentes continentes.

As organizações que operam em base internacional existem desde o Séc. XIX. Entre o surgimento da empresa internacional e os dias atuais, diferentes mudanças vêm sendo processadas nos modelos de gestão organizacional. Tais mudanças são motivadas tanto por iniciativa das empresas em busca de melhorias, quanto pelas variáveis globais de oportunidades, demanda e riscos (Palmisano, 2006).

Os avanços em tecnologia da informação e comunicação (TIC) geraram sistemas e ferramentas integradas de colaboração que possibilitam trabalho a distância, de alta produtividade e aliado a uma abertura de mercado e definições de regras de negócios, jamais vistos. Tais avanços possibilitaram a criação de um novo ambiente competitivo; foi assim que países como a Índia e o mercado de serviços em TI se fundiram. Algumas empresas indianas como a Infosys e Wipro, começaram a concorrer com gigantes de serviços globais, como a IBM e a Electronic Data Systems Corporation (EDS), por exemplo, e a ganhar vários contratos, devido ao baixo custo do trabalho do profissional indiano quando comparado com seus pares estadunidenses e europeus. Foi neste cenário e pensando no enfrentamento desta nova realidade que a referida empresa, a partir do início do Séc. XXI, e com maior ênfase a partir do ano 2002, passou a adotar e implantar em larga escala um conjunto de novas diretrizes e processos de trabalho na configuração de um novo modelo de gestão internacional. Este modelo recebeu o nome de Gestão de Serviços Globalmente Integrada – o GSGI (Scumparim, 2007), e apresentado como uma evolução aos atuais modelos de gestão internacional presentes na literatura da Administração.

No contexto das demandas por novos processos de gestão, alavancadas pelas novas formas de organização do trabalho global, à luz do GSGI, a empresa deparou-se com algumas questões que dizem respeito a sua gestão de pessoas, qual seja: como estruturar as atividades dessa gestão para essa nova realidade? Como administrar de modo eficiente equipes locacionalmente distantes? Como estruturar uma gestão de pessoas capaz de atender as peculiaridades de cada equipa, em seu país, na sua cultura e com suas especificidades legais?

O presente artigo discute o modelo de gestão de pessoas adotado por essa multinacional de tecnologia, no contexto da GSGI, com a intenção de explicitar o contexto de sua implantação, os processos envolvidos e os desafios de sua consolidação. A metodologia adotada neste trabalho é de uma abordagem qualitativa e exploratória, dada a escassez de estudos relacionados ao tema. A coleta de dados preliminares foi realizada por meio de entrevistas em profundidade, com seis gerentes da gestão de pessoas da planta Brasil, unidade de Hortolândia/SP, além da análise documental e observação participante desenvolvida durante de cinco meses. As entrevistas, de natureza semi-estruturada, foram realizadas de forma aberta, a partir de um roteiro pré-elaborado, contendo questões sobre os pressupostos e objetivos desse modelo; os aspectos da organização que ele busca atender; os eventos motivadores de sua implantação; os principais desafios impostos aos gestores e as contribuições da gestão de pessoas para a GSGI.

No primeiro momento, o artigo apresenta uma discussão sobre o conceito da GSGI e dos serviços globalmente integrados. No segundo, apresenta a evolução da gestão de pessoas em contextos organizacionais que reconhecem as pessoas como suas reais fontes de vantagens competitivas, com destaque para a relevância desse ativo para a formação e tangibilidade do capital humano. O terceiro momento apresenta e discute os dados coletados pela pesquisa.

 

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS MODELOS DE GESTÃO INTERNACIONAL DE SERVIÇOS

A produção de conhecimento no campo das organizações, sobretudo nas que se propõem a discutir formas e modelos de gestão, tem evidenciado com maior interesse o setor da manufatura ou indústria de fabricação de bens, comparativamente, ao setor de serviços (SSME, 2008; Paulson, 2006). A escassez de conhecimento sistematizado é mais evidente no campo das empresas que operam na economia global, fato que oportuniza a produção de estudos exploratórios sobre a temática. Assim, a organização objeto deste estudo é primordialmente uma empresa de Tecnologia da Informação (TI), na qual a GSGI é concebida como um modelo de administração e gestão de negócios. A infraestrutura de TI é utilizada para estruturar e operacionalizar o trabalho a distância, não tendo na tecnologia em si, o destino final do serviço prestado. Esse modelo de gestão aplica-se a outros serviços, tais como contabilidade e finanças, análise e diagnósticos de exames laboratoriais, animação e entretenimento, suporte aos negócios no processamento de folhas a pagar, na análise contratual, na logística, entre outros (Scumparim, 2007).

Para apresentar a GSGI, como uma evolução do modelo de gestão internacional de serviços, serão explorados quatro arranjos distintos de redes internas, ou modelos de gestão de empresas internacionais: (1) Exportação de Serviços; (2) Multinacionais; (3) Transnacionais, e (4) Gestão de Serviços Globalmente Integrada (conforme Scumparim e Sacomano, 2008).

 

A exportação de serviços

A corporação nos seus primórdios foi uma criação do Estado. Governos compunham e sancionavam corporações para realizar obrigações específicas do Estado e de seus governantes. Essa realidade mudou no decorrer do Séc. XIX, quando o Reino Unido, Estados Unidos e outros países começaram a introduzir programas de garantias sociais aos trabalhadores de empresas. Estava inaugurada, assim, uma forma de relação de trabalho diferenciada dos padrões da época. Isso conferiu às corporações um status de independência atribuindo-lhes maior autonomia de decisão (Palmisano, 2006).

Araújo et al. (2000) comentam que até o final do Séc. XIX as empresas eram gerenciadas de forma paternal e familiar, o que levava os empregados a se utilizarem dos recursos delas em benefício próprio. Max Weber, por volta de 1890, presumiu que as organizações deveriam ser gerenciadas em bases impessoais e racionais, dando início assim, ao Modelo Burocrático na Administração (Stoner e Freeman, 1999). Em meados do Séc. XIX surgiu o que se pode chamar de corporação internacional. Uma empresa organizada em matriz mais as rede de distribuição, normalmente contando com forças do Estado para proteção dessas redes. Essa estrutura básica de produção nacional e distribuição internacional se aplicava a quase todos os ramos de negócios, como importação de matérias-primas, transformação e exportação de produtos acabados (importação de óleos e exportação de manteiga ou tecido e roupas, por exemplo). A quantidade de serviços que podiam ser exportados era restrita, pois dependia de um desenvolvimento básico no país de origem desta corporação e o envio de profissionais ao destino final, para a sua implantação.

 

As organizações multinacionais

Após a Primeira Guerra Mundial e o colapso das economias dos Estados Unidos e da Europa, as corporações internacionais sofreram embargos e bloqueios na comercialização de seus produtos. O protecionismo que se seguiu, de 1920 a 1930, levou à criação de barreiras para as entradas de produtos e serviços importados, como elevação das tarifas, controle monetário e outros. Para reduzir as incertezas e aproveitar melhor o comércio exterior com subsidiárias que pudessem atuar no país destino, surgiram as Corporações Multinacionais (Chandler, 1977). Esse modelo de gestão, fortemente baseado na relação da subsidiária com a matriz, era aplicado às suas unidades. O serviço era prestado localmente e dependente dos processos e procedimentos oriundos da matriz. Havia pouca, ou nenhuma, flexibilidade na gestão de cada subsidiária.

 

As transnacionais

Uma deficiência do modelo clássico de multinacional se devia ao fato de que as transferências de conhecimento só aconteciam em um sentido (da matriz para a subsidiária), fato que limitava as possibilidades de crescimento e ganhos de eficiência. Como apontado por Karl Moore e Julian Birkinshaw (1998, p. 82), para as empresas de serviços, os valores da cadeia produtiva ocorrem, tipicamente, ao replicar toda a cadeia de valores e conhecimentos em país onde opera uma unidade, em vez de centralizar certas partes em países com mão-de-obra de menor custo. A vantagem competitiva se dá não pelo compartilhamento de atividades, mas pela transferência de bens intangíveis, ou conhecimento tácito (Lastres, 2005) de país para país.

Por volta da década de 1980, a expansão da concorrência e o aumento da pressão para elevar a eficiência das corporações, evidenciaram o esgotamento da transferência de modelo de gestão, pois as regras definidas e ditadas pela matriz não se aplicavam competitivamente à realidade do país onde determinada subsidiária estava instalada. Essa realidade instalou uma crescente interdependência das unidades locais para com a matriz. Esse novo modelo de gestão é denominado de Transnacional (Birkinshaw et al., 1998; Mazo et al., 2004). A empresa transnacional é construída sobre a noção de que a multinacional opera em múltiplos ambientes, cada um com características próprias, distintas e complexas. Esta perspectiva assume que os gerentes da subsidiária entendem mais sobre o mercado local do que a matriz, e estão em melhores condições para decidir qual papel a subsidiária deve desempenhar.

 

GESTÃO DE SERVIÇOS GLOBALMENTE INTEGRADA

Roger (Rongxin) Chen e Mark V. Cannice (2006) apontam que a competitividade das empresas que operam internacionalmente se dá com base em duas características específicas: (1) atuar de modo independente da matriz para customizar uma solução, fornecedores e procedimentos para o mercado local, o que possibilita reduções de custos e tornem o serviço mais competitivo contra concorrentes locais; (2) contar com recursos da corporação para tecnologias avançadas e serviços de elite, como diferencial frente aos competidores da mesma região. É com base na exploração inovadora destas duas características conjugadas, que opera o quarto modelo de gestão internacional de serviços: a Gestão de Serviços Globalmente Integrada. Os autores citados destacam os três aspectos que corroboram para a criação da GSGI:

  • os avanços em TIC geraram sistemas e ferramentas integradas de colaboração ao possibilitar o trabalho a distância de alta produtividade;
  • a abertura de mercado e definições de regras de negócios como nunca vistos, criaram um novo ambiente competitivo;
  • a forte concorrência com as empresas indianas de TI, devido ao baixo custo dos profissionais desse país, comparado com os operários estadunidenses e europeus.

A GSGI é um modelo de gestão internacional de serviços que aproveita o custo baixo da mão de obra e o capital intelectual, onde houver a melhor oferta. Esse modelo se difere da multinacional clássica e das transnacionais em vários aspectos, mas principalmente por formar centros de prestação de serviços em locais estratégicos, e aproveitar o potencial desses centros para entregar o serviço aos clientes da corporação em qualquer lugar do planeta. O trabalho também pode ser trocado de centro em centro a curto prazo (algo entre dias ou poucas semanas, dependendo das necessidades), para aproveitar as melhores condições, como a oferta de profissionais com habilidades específicas, ou variações cambiais. A GSGI também se constitui em excelente proteção contra fatores externos e incertezas, uma vez que o centro prestador de serviço a um cliente específico pode ser mudado com bastante agilidade para o de outro país. A Tabela 1 apresenta as características dos modelos de gestão internacional e as diferenças da GSGI.

 

TABELA 1-Diferenças entre os modelos internacionais de gestão de serviços

 

PROCESSO HISTÓRICO DA GESTÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

Um dos aspectos de sustentação do modelo GSGI é a atuação das pessoas potencialmente qualificadas para atuar nessa nova forma de organização do trabalho. Ainda que a literatura sobre a gestão de pessoas não tenha se debruçado sobre essa abordagem, isto é, não se tem conhecimento de uma proposta desta gestão voltada para o modelo GSGI, pode-se identificar tendências que mostram uma perspectiva de atuação na linha da formação e do gerenciamento do capital humano integralizando-o ao capital intelectual da empresa. Nesse sentido assume-se, na condição de um ensaio teórico, que o modelo de GSGI requer um tipo de gestão essencialmente voltada a abordagem do capital humano e que se aproxime do modelo competitivo de gestão de pessoas.

Nesta seção, apresenta-se uma síntese da evolução desta gestão ao buscar descrever a sua trajetória histórica em diferentes momentos e contextos de trabalho. Essa trajetória possibilita melhor compreensão sobre o modelo competitivo da gestão de pessoas vinculando-o ao contexto da GSGI.

Esse modelo, conforme apontado por Fischer (1998) é o resultado de uma evolução das diferentes formas de relacionamento entre empresas e pessoas. O autor comenta que essa evolução ocorreu por meio de quatro movimentos históricos reconhecidos nessa relação: (1) Administração de Recursos Humanos (ARH) como Departamento de Pessoal; (2) ARH como Gestão de Comportamento; (3) ARH como Gestão Estratégica, e (4) ARH como Vantagem Competitiva. As principais características de cada movimento são apresentadas a seguir:

 

Administração de recursos humanos como departamento de pessoal

A Administração de Recursos Humanos ( Human Resource Management ) é resultado do desenvolvimento empresarial e da evolução da teoria organizacional dos Estados Unidos. Essa produção tipicamente americana foi aproveitada de diferentes formas por outros países a partir de suas bases peculiares (Fischer, 1998, p. 99). O departamento de pessoal surge quando os empregados se tornaram um fator de produção, cujos custos deveriam ser administrados tão racionalmente quanto o custeio de outros fatores de trabalho. A raiz da posterior Administração de Recursos Humanos estaria na necessidade de a grande corporação gerenciar os funcionários como custos, o elemento diferenciador de competitividade da época.

O contexto histórico de então, determinou o surgimento do Departamento de Pessoal, órgão destinado à administração dos recursos humanos da grande corporação, destacando-se: (1) o crescimento e a especialização da empresa; (2) a livre empresa e o individualismo tornaram-se valores sedimentados na cultura americana, o que permitia às empresas escolher livremente com quem e como trabalhar; (3) a força de trabalho do país ganhara maior mobilidade e era grande o contingente de migrantes que deveriam ser adaptados ao trabalho; (4) os sindicatos não haviam se disseminado dentro do novo tipo de corporação que surgia como um modelo empresarial (Fischer, 1998, p. 100).

A preparação para novas mudanças ganhou força a partir dos estudos de outros pesquisadores que evidenciaram novo pressuposto sobre o trabalhador, desta vez de caráter essencialmente social em substituição à visão econômica da então Escola de Administração Científica . A Administração de Recursos Humanos como gestão estratégica foi introduzida na década de 1980 em resposta à necessidade de vincular a gestão de pessoas às estratégias da organização. Fischer (1999, p. 106) resgata a idéia de Staehle (1990), segundo a qual a visão dos pesquisadores da Universidade de Michigan sobre o assunto era de que a gestão de recursos humanos deveria buscar ajustar-se da melhor maneira possível com as políticas empresariais e os fatores ambientais. Para isso, planos estratégicos dos vários processos de gestão de recursos humanos seriam derivados das estratégias corporativas da empresa.

Fischer (1998) reconhece o avanço proporcionado pelos pesquisadores de Michigan ao demonstrar a importância do caráter estratégico do modelo de gestão de pessoas, mas ressalta os limites dessa concepção. Para ele, tal perspectiva assume o pressuposto da adaptação e implementação, ou seja, o papel de recursos humanos se resumiria a adaptar-se à estratégia do negócio e a implementar sua diretriz específica. Ao assumir este papel adaptativo peca por não considerar a possibilidade de a ARH intervir na estratégia corporativa para introduzir decisões tomadas uma visão estratégica das pessoas e sua contribuição para a empresa.

 

Administração de recursos humanos como gestão de comportamento humano

A utilização da Psicologia como uma ciência capaz de apoiar a compreensão e a intervenção na vida organizacional provocou um redirecionamento no foco de ação da ARH. Além de investir na tarefa, nos custos e nos resultados produtivos, essa gestão passa a atuar sobre o comportamento das pessoas. Isto decorre da influência de duas escolas da Psicologia em diferentes épocas. Segundo Fischer (1998, p. 101), nas décadas de 1930 e 1940 predominou a linha behaviorista do Institute of Human Relations da Yale University, cuja principal contribuição foi a criação dos instrumentos e métodos de avaliação e desenvolvimento de pessoas que, nas empresas, formariam o arsenal da Psicologia e da psicometria aplicadas aos procedimentos de gestão de Recursos Humanos.

A partir dos anos 1940 inicia-se um período em que a psicologia humanista passa a interferir na Teoria Organizacional. Assim, o termo «Human Resource Management» é o foco prioritário no comportamento humano (Fischer, 1998). Nas décadas de 1960 e 1970, a Escola de Relações Humanas, influenciada pela Psicologia Humanista, predominou enquanto matriz de conhecimento em gestão de pessoas. Uma de suas principais contribuições foi descobrir que a relação entre a empresa e as pessoas é intermediada pelos gerentes de linha. Reconhecer a sua importância e levar o gerente de linha a exercer adequadamente o seu papel passa a ser a principal preocupação da gestão de Recursos Humanos. O novo foco de atuação se concentraria no treinamento gerencial, nas relações interpessoais, nos processos de avaliação de desempenho e de estímulo ao desenvolvimento de perfis gerenciais coerentes com o processo de gestão de pessoas desejado pela empresa ( Fischer , 1998, p. 102).

Em 1975, Raymond E. Miles introduziu os conceitos de gestão com comando direto do gerente; satisfação das expectativas dos funcionários, a consideração pela autodeterminação e o auto-gerenciamento. Ainda nessa época, o uso do termo «capital humano», como relatado por Likert, Schltz e Schuster (apud Fischer, 1998, p.103) simbolizava que, apesar dos avanços, os novos processos e procedimentos ainda visavam extrair a maior produtividade possível do «recurso» humano, mas agora com um enfoque comportamental.

 

Administração de recursos humanos como gestão estratégica

A administração de Recursos Humanos como gestão estratégica foi apresentada inicialmente na década de 1980, em resposta à necessidade de vincular a gestão de pessoas às estratégias organizacionais. Fischer (1998, p. 106) defende a idéia de Staehle (1990), segundo a qual a visão dos pesquisadores da Universidade de Michigan sobre o assunto, era de que a gestão de recursos humanos deveria buscar ajustar-se da melhor forma possível às políticas empresariais e aos fatores ambientais. Para isso, planos estratégicos dos vários processos de gestão de recursos humanos seriam derivados das estratégias corporativas da empresa.

Ainda que tal avanço se mostre de forma positiva, na medida em que a função de recursos humanos assume caráter estratégico, é reconhecido também os limites dessa concepção. Tal perspectiva assume o pressuposto da adaptação e implementação, ou seja, o papel de recursos humanos se resumiria a adaptar-se à estratégia de negócio e a implementar sua diretriz específica. Para Fischer (1998) esta perspectiva peca por não considerar a possibilidade de a ARH intervir na estratégia corporativa , ao proporcionar às decisões tomadas uma visão estratégica das pessoas e sua contribuição para a empresa.

 

Administração de recursos humanos como vantagem competitiva

Nesta categoria o conceito de Gestão de Recursos Humanos se amplia e assume uma perspectiva focada no âmbito estratégico da empresa, ao posicionar as pessoas para a concretização da vantagem competitiva. Hendry e Pettigrew (1994), citados por Fischer (1998, p. 108), enfatizam a competitividade, com a afirmativa de que é preciso ir além, para «que as pessoas sejam vistas pela organização como um recurso estratégico», para se atingir a «vantagem competitiva».

Assim, entre o final dos anos de 1980 e 1990, a gestão de Recursos Humanos deixa de ser estratégica, ou seja, as pessoas passam a ser estratégicas somente nas situações em que o ser humano «é visto e tratado como uma fonte de vantagem competitiva» (Fischer, 1998, p. 108). A gerência de recursos humanos afeta a vantagem competitiva em qualquer empresa, em algumas, ela é a chave para a vantagem competitiva (Porter, 1989, p. 39).

Fischer (2002, p. 25) enfatiza a competição presente nas obras de autores como Porter (1989) e Humer e Prahalad (1995), ao direcionarem de forma decisiva toda a teoria organizacional, com a criação das bases do surgimento de um modelo de gestão de pessoas baseado em competências. No estudo deste modelo, considera-se: gestão de pessoas e vantagem competitiva; gestão de pessoas e reengenharia; e gestão de pessoas e competências.

A noção de pessoas vinculadas à obtenção de ganhos compet itivos é reconhecida por Bohlander et al. (2003) ao destacarem que, principalmente nos setores baseados no ativo do conhecimento, como os de software e serviços de informação, onde o sucesso depende cada vez mais das competências das pessoas. De fato, um número crescente de especialistas alega atualmente que a chave para o sucesso de uma empresa está no estabelecimento de um conjunto de competências essenciais – conhecimentos integra dos no interior de uma empresa, que a distinguem de suas concorrentes e agregam valor aos clientes.

Nesse contexto, a atuação da ARH é essencialmente única na medida em que deve incorporar as peculiaridades de cada contexto organizacional, em busca da criação de um modelo adequado a esta realidade e a ambientes específicos. A busca se configura em transmitir a estratégia da empresa para as pessoas, envolvendo-as com o negócio, ao buscar o alinhamento do seu comportamento e a tomada de decisão.

 

ESTUDO DE CASO

O estudo de caso caracteriza-se como exploratório que, segundo Cervo e Bervian (2002, p. 6) tem por objetivo obter uma nova percepção sobre o fenômeno e descobrir novas idéias. Para Andrade (2003, p. 124) a pesquisa exploratória tem como finalidade proporcionar maiores informações sobre determinado assunto ou descobrir um novo tipo de enfoque para o trabalho. Neste sentido, busca-se conhecer melhor o comportamento da gestão de pessoas de uma organização que opera no modelo GSGI.

A empresa foco do estudo foi fundada em 15 de Junho de 1911, em Nova Iorque, Estados Unidos, como resultado da consolidação de duas empresas, sendo uma delas de tecnologia da informação. Ela opera cinco áreas de negócios: serviços de TI; serviços de apoio aos negócios; desenvolvimento de software; pesquisa, desenvolvimento e manufatura de hardware, como mainframes e soluções de storage, e um segmento de financiamento. Sua atuação é desenvolvida em seis setores: serviços financeiros, serviços públicos, indústrias, redes de distribuição, comunicações e pequenos e médios negócios (Reuters, 2007). A empresa conta hoje com 350 mil funcionários, agrupados em regiões definidas como Américas, Ásia-Pacífico e EMEA (Europe, Middle East & Africa).

No Brasil, a empresa tem cerca de 10 mil colaboradores (entre funcionários e terceiros), tendo como principais sites: Tutóia (São Paulo), Hortolândia (São Paulo) e Rio de Janeiro/RJ, além de outros novos locais. O site de Hortolândia, com cerca de seis mil profissionais, fornece a maior parte de serviços da subsidiária brasileira. O site suporta tanto clientes nacionais quanto internacionais. Hortolândia é um key player para a empresa em escala global, pois está localizada em uma região com abundante mão de obra em TI e com boas universidades em cidades próximas, como Campinas, Americana e Piracicaba. O Brasil também está bem posicionado globalmente, por contar com profissionais proficientes em inglês, e principalmente com conhecimentos em mainframe (computadores de grande porte), uma tecnologia pouco comum em outros países como a Índia, a China e a Rússia.

 

Gestão de pessoas da empresa em estudo

O modelo de gestão de pessoas da empresa tem sido publicamente referenciado como bem sucedido e amplamente discutido pela literatura (Tichy, 1981; Fombrun et al., 1984; Dyer e Holder, 1987; Hiltrop, 1995; Huselid et al., 1997; Stewart, 1997; Guest, 1999; Lepak e Snell, 1999; Fischer, 1999), entre outros autores. Contudo, as mudanças mais recentes ocorridas nessa empresa ainda não estão sistematicamente relatadas na literatura de gestão de pessoas. Essas mudanças ocorreram em nível de inovação de produtos, de serviços, de processos e de gestão. A cadeia de mudanças mais expressiva teve à frente o atual CEO assumindo em 2002 como Chairman. Este CEO pôs em prática o seu plano de ação para orientar e posicionar a empresa na direção do que ele chamou de «empresa globalmente integrada». Logo, quaisquer idéias «pré-formadas» sobre o modelo de gestão de pessoas dessa empresa devem ser revisadas a partir de 2002. Nesta gestão pode-se identificar elementos dos vários movimentos históricos da ARH, conforme os apresentados na revisão bibliográfica deste artigo, com predominância a uma tendência em direção ao modelo competitivo de pessoas. Na próxima seção serão apresentados os processos dessa gestão.

 

Estrutura e processos da gestão de pessoas

A gestão de pessoas da empresa sofreu várias mutações ao longo dos anos, ao deixar um modelo burocrático-legal, que servia apenas ao cumprimento das determinações legais. Em seguida, passou por um modelo tecnicista, com foco na implementação de demandas políticas e ferramentas de gestão. Anteriormente a 2002, ela havia avançado na direção do modelo estratégico, ao alinhar suas ações à estratégia da corporação.

Na empresa, atualmente, a gestão de pessoas está confiada a poucos profissionais diretos e focados massivamente no plano estratégico. Esses profissionais atuam numa dinâmica voltada para a busca de oportunidades de parceria e no desenvolvimento entre a estratégia de RH e os acontecimentos do momento. Eles agem como parceiros, tutores, clientes e fornecedores das áreas. As atividades básicas ou «manuais» de RH foram pulverizadas e são de responsabilidade dos gestores, como a coleta de feedback, ou por departamentos terceirizados, como no processamento de demissões e de outros processos pertinentes à rotina trabalhista. Como a empresa está presente em vários países do mundo, ela conta com um departamento global que define, em nível estratégico, a direção dos projetos da gestão de pessoas, bem como as características básicas dos processos para todas as subsidiárias. Cada site atua com relativa independência. Além de seguir os processos básicos, cada uma deles conta com orçamento próprio para as adaptações e aplicações, conforme as necessidades próprias e as necessidades e oportunidades do momento. Perfeitamente integrados em cada subsidiária, os profissionais atuam de forma estratégica. Os principais processos da gestão de pessoas adotados pela organização são:

  • Políticas de suprimento de pessoas: são elaboradas a partir da realidade local, a partir de considerações sobre variáveis sócio-culturais que se configuram no processo de captação de pessoas no mercado de trabalho. Em nível global a empresa fornece treinamento para os profissionais que lidam com processos seletivos e disponibiliza as diretrizes legais vigentes, além da descrição do potencial de desenvolvimento. As habilidades profissionais necessárias são definidas pelo gestor de primeira linha ou pelo gerente do projeto da atividade fim. As fontes de seleção e processos de integração são desenvolvidos de acordo com a realidade e necessidades locais.
  • Políticas de aplicação de pessoas: quanto aos requisitos básicos da força de trabalho e atribuições constantes do universo de cargos da organização, a gestão de pessoas define em nível básico o que é esperado do ocupante de cada cargo. A definição específica das atividades a serem desenvolvidas no dia a dia é emitida pelas gerências das áreas. Ocupantes de determinado cargo podem desempenhar atividades bastante diferentes, mas não incoerentes com a base definida pela gestão de pessoas. Sobre os critérios de planejamento, alocação e movimentação interna e o plano de carreira, a gestão de pessoas posiciona-se como um consultor e sensor. Isto porque os modelos de carreira e as trajetórias de crescimento mostram-se bem definidas e, cabe às pessoas manifestar interesse e proatividade neste sentido. A gestão de pessoas e os gerentes de linha atuam como divulgadores de opções e oportunidades, compete ao colaborador o trabalho de buscar informações e iniciar o processo. Mesmo assim, os gerentes de linha desempenham papel mais atuante, ao consultar os profissionais daquela gestão, quando necessário. Isto não impede que essa gestão, enquanto sensor, identifique os potenciais humanos, com base nas avaliações de desempenho e de potencial e, recomendá-las. Na avaliação de desempenho, a gestão de pessoas fornece as ferramentas e processos de suporte à avaliação, além dos budgets e políticas de premiação. Este processo é realizado anualmente com objetivos de negócios definidos para cada organização e sub-dept. Ao final do ano, os gerentes de linha se reúnem com os profissionais de gestão de pessoas para validar os resultados da avaliação e classificar cada desempenho quanto à superação, atingimento ou falha na execução dos objetivos esperados.
  • Políticas de manutenção de pessoas: a avaliação de resultados leva à premiações, de valores variáveis, dependendo das legislações e resultados de cada região e profissional, além da premiação de iniciativa dos mais diversos conjuntos organizacionais. Quanto à motivação, a empresa dispõe, em escala global, avaliações anuais de satisfação no trabalho, atuando com determinação na resolução de problemas identificados. Há estudos que interligam os resultados das unidades (renda) com os pontos de satisfação obtidos pela empresa; logo, é uma estratégia-chave da corporação manter níveis elevados de motivação dos colaboradores. A gestão de pessoas trabalha com todos os níveis gerenciais e unidades, com políticas globais e variantes regionais que explicitam o papel a ser desempenhado por cada pessoa na organização, em relação ao clima organizacional.
  • Políticas de desenvolvimento de pessoas : há uma sólida política de treinamento e desenvolvimento na empresa, contando com uma expressiva agenda de treinamentos internos, em sua maioria, disponíveis gratuitamente em formato eletrônico pela intranet. Também existe a preocupação especial com os gestores e líderes, de forma que possam sempre receber conhecimento atualizado quanto às diretrizes estratégicas da corporação. A gestão de pessoas conta com suporte para planos individuais de carreira, com diretrizes para que os gestores façam o acompanhamento e auxiliem os funcionários a traçar estes planos. Em 2003, e pela primeira vez nos seus quase 100 anos de operação, a empresa convocou os colaboradores de todos os países para reexaminar sua base de valores. O evento resultou na descrição de uma nova plataforma de valores que, doravante, passou a ser adotada por todos. É importante mencionar que esta perspectiva de valores foi criada com base em sugestões e votos dos próprios funcionários, e é o modelo que a gestão de pessoas mantém à disposição para nortear o comportamento dos empregados.
  • Políticas de controle de pessoas: a gestão de pessoas mantém diversos bancos de dados, alimentados pelos gestores e próprios funcionários, para gerir proficiências, desempenho, dados cadastrais, certificações e detalhes em geral, para as análises quantitativa e qualitativa da força de trabalho da organização. Ademais, realiza auditorias permanentes sobre a aplicação e adequação das políticas e processos relacionados às pessoas. Pelo menos no setor de serviços, objeto deste estudo, a gestão de pessoas tem como principal expectativa o valor agregado que os indivíduos podem fornecer. Há uma grande disposição da organização para gerir pessoas como vantagem competitiva, com foco no desenvolvimento deste seu maior ativo. Logo, pode-se considerar que apesar de a gestão de pessoas ser direcionada pela estratégia da organização, o seu principal objetivo e foco estão na direção de criar um contrato psicológico de trabalho que deixe claro aos gestores que a vantagem competitiva está nas pessoas, e para as pessoas que estejam conscientes da sua importância para com o negócio, buscando desenvolver-se e alinhar as suas atitudes do dia a dia com os valores e objetivos da organização.

 

Gestores globais e seus papéis

Para garantir a integração das operações à GSGI, a empresa deve contar com gestores atuando em funções específicas. Em seu ensaio «O que é um gerente global», Bartlett e Ghoshal (2003) mapearam alguns papéis desempenhados por gestores globais que se alinham muito bem à realidade da organização em estudo. A seguir, algumas considerações sobre essas modalidades, destacando-se os papéis exercidos pelos gestores devidamente alinhados às prospectivas da gestão de pessoas:

  • O gerente de negócios (Estrategista + Arquiteto + Coordenador): os gerentes de negócios, ou gerentes de divisão de serviços, têm a responsabilidade de aumentar a eficiência e competitividade da companhia em escala global. Ao trabalharem com os recursos das subsidiárias e cientes dos riscos, estes gestores se alinham com a primeira dimensão da organização operacional da GSGI. Na empresa este papel é desempenhado por executivos seniores.
  • O gerente do país (Sensor + Construtor + Contribuidor) : existe uma gerência responsável pela subsidiária nacional, tal como a atual presidência. O papel desse gestor é desenvolver permanentemente sensibilidade às oportunidades locais e requerimentos de governo, bem como contribuir para as operações globais (Makino et al., 2004). Eles também são os principais responsáveis pelo desenvolvimento das competências e do capital intelectual local.
  • O gerente funcional (Scanner + Integrador + Campeão) : os gerentes funcionais garantem que as linhas de serviço estejam integradas entre as geografias (ou centros de prestação de serviço). A principal responsabilidade é a busca e o estabelecimento de padrões. Sejam as melhores práticas geradas por uma subsidiária; sejam de mercado (como ITIL, por exemplo), esse gestor se encarrega da implementação e acompanhamento de operações. Este é um papel-chave para garantir a economia de escala que pode ser atingida globalmente via integração de processos, base de conhecimentos e medidores de qualidade e produtividade (Anand et al., 2002). Além das linhas de serviço, os gerentes funcionais podem estar focados em várias outras divisões possíveis: podem se constituir no ponto de contato de um determinado cliente; gerente de conta; gerente financeiro de um determinado cliente ou grupo de clientes; representante de carreiras, entre vários outros exemplos. Assim, temos um gerente, ou uma estrutura de gestores, responsáveis por desenvolver aquela função entre as geografias com excelência e, deste modo, agregar eficiência operacional para toda a corporação.

Todos estes papéis existem na empresa, sobre diversas nomenclaturas, como por exemplo, DPE (Delivery Project Executive), o gestor que cuida da entrega do serviço e faz o link entre o cliente e as equipas de suporte dispersos entre as geografias.

 

Força de trabalho remota

Quando Castells (2000) explorou a questão «Mão-de-obra global?» a realidade dizia que o trabalho remoto era uma parte muito pequena, e que havia mais pesquisadores observando o home office do que trabalhadores efetivamente atuando desse modo. Castells também defendeu que a mão de obra global era, basicamente, composta de trabalhadores especializados (gestores, engenheiros, cientistas), com atuação global, o que exigia deles deslocamentos para atuar nas subsidiárias ou país de origem das corporações. O aproveitamento da força de trabalho local e de baixo custo era feito massivamente, com a abertura de uma subsidiária no país onde essa mão-de-obra estivesse disponível, para produzir os produtos, vender localmente, ou fornecer parte da produção (ou de um produto específico) ao mercado global dessa multinacional.

Entre a publicação de Castells e o contexto atual, muita mudança ocorreu e outra realidade é presenciada. De acordo com Belson (2007), atualmente, 40% da força de trabalho global da empresa não está sediada numa planta física de um escritório, pois trabalham em sua própria residência, nas dependências do cliente ou na estrada. A tecnologia da informação, comunicação e colaboração foram difundidas, amadureceu e passou a ser utilizada com maior facilidade pelas pessoas (físicas e jurídicas).

Como o fluxo de mão de obra na GSGI é dinâmico, a habilidade de gerir equipas remotas é imprescindível para a continuidade das operações. O local de trabalho remoto é utilizado em seu sentido mais amplo, conforme o parágrafo anterior, podendo significar trabalho desenvolvido em uma subsidiária e gerenciado a partir de outra localidade ou sob a coordenação de funcionários trabalhando em casa (Ellison, 2004; Jones et al., 2005). Como a gestão remota é essencial para o sucesso das operações no modelo de GSGI, é vital para a empresa que os gestores estejam capacitados a esse tipo de administração que, em grande escala, é algo novo para os gerentes de vários países. Este é um assunto amplo e com potencial de pesquisa.

Sempre houve contato entre pessoas de países diferentes e em várias empresas mas, com a adoção da GSGI, as diversas equipes espalhadas ao redor do globo passaram a trabalhar juntas nas operações diárias, como se elas estivessem do outro lado da mesa. Sem poder contar com algumas pessoas com melhor proficiência de idioma para fazer as pontes, todos os funcionários da linha de frente se vêem frente a essa nova realidade, que não se limita apenas ao conhecimento de idiomas, mas também o entendimento das diferentes culturas, linguagens e sentidos na negociação. Nesse caso, o atendimento, a gerência de expectativas e outras atividades fazem-se necessárias para a boa fluidez das atividades.

 

Benefícios resultantes da adoção do modelo estratégico de gestão de pessoas em GSGI

Atualmente, 50% dos colaboradores da empresa atua no setor de serviços, e mais de 60% da receita bruta provém dela; logo, é uma empresa de serviços que tem colhido os benefícios da GSGI, com reflexos em sua rentabilidade em comparação com as concorrentes e com a valorização de suas ações (bolsas de Nova Iorque para empresa e concorrente 1 e NASDAQ, para concorrentes 2 e 3), conforme ilustra a Tabela 2 abaixo:

 

TABELA 2

Comparação de indicadores financeiros

 

Além do valor das ações a empresa tem outro importante diferencial em relação aos concorrentes : a amplitude de seus negócios de Sistemas e Financiamento a Software e Serviços. Ela conta com todas as áreas de suporte ao negócio na própria corporação, podendo prestar serviço mais agilidade do que as suas concorrentes (que têm de contar com parceiros para cobrir as áreas nas quais não atuam). Este modelo de gestão iniciado pela empresa começou a ser adotado por suas concorrentes e têm potencial para se expandir para outras corporações de serviços.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo apresentar, sob a forma de estudo preliminar, os resultados parciais da implantação da GSGI em uma empresa multinacional de TI, focada nos aspectos de sua gestão de pessoas. Incorporou-se ao texto uma revisão bibliográfica sobre os modos de operações internacionais e sua evolução culminando com o surgimento da GSGI, bem como da evolução dos modelos históricos de gestão de pessoas.

Foram exploradas as características da gestão de pessoas na empresa, com a identificação de seu alinhamento no sentido de adotar um modelo competitivo de gestão de pessoas, no recorte do setor de serviços. Na empresa, a GSGI apresentou alta performance de aproveitamento de recursos, de uma organização distinta, ao conseguir agregar valor ao serviço, com proveito das vantagens locais de onde estão instalados os seus centros de prestação de serviços, com a geração de rentabilidade e solidez.

Apesar de os ganhos de vantagem competitiva, adquiridos com a implantação da GSGI não tenham sido processados com precisão, pode-se confirmar a evolução do valor de sua ação, na ordem de 85% desde 2002. A ascensão maior ocorreu a partir de meados de 2006, ao saltar de 73,57 dólares para os atuais 116,78 dólares. Tais indicadores são apontados pelos gestores da empresa como atributos da percepção do mercado, o qual, mais recentemente, começou a notar os efeitos positivos e sustentáveis da GSGI.

Conforme discutido nas seções anteriores, a GSGI, por meio da exploração de suas redes internas e da adoção de diversos elementos e ferramentas configurou-se como uma evolução das transnacionais, tornando-se um modelo de gestão adequado para a nova realidade de tecnologia e comércio internacional, com o aproveitamento dos melhores recursos de suas subsidiárias em cada país.

Por se tratar de um modelo de gestão recém-constituído e ainda não explorado pela literatura organizacional, o mesmo carece de sistematização. A continuidade do presente estudo poderá trazer conhecimentos mais elaborados sobre cada um dos processos da gestão de pessoas na compreensão de sua organicidade e operacionalização.

A expectativa é de avanço das pesquisas no sentido de se avaliar as reais possibilidades de implementação da GSGI por outras organizações. Desse modo, o presente estudo configura-se como uma abordagem seminal sobre o tema, com base em dados preliminares. Dada esta natureza a sua continuidade prevê a coleta de dados adicionais junto a gestores internacionais, alocados em unidades da empresa sediadas em outras regiões do globo.

 

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