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Medicina Interna

versão impressa ISSN 0872-671X

Medicina Interna vol.29 no.1 Lisboa mar. 2022  Epub 01-Abr-2022

https://doi.org/10.24950/rspmi.2022.01.300 

Cartas ao Editor

Impacto da Pandemia COVID-19 nos Doentes Não-COVID: Diferenças na Mortalidade

Impact of the COVID-19 Pandemic in Non-COVID Infected Patients: Differences in Mortality

Mário Gil Fontoura1 
http://orcid.org/0000-0002-9723-8239

Luísa Viana Pinto2 

Filipe Machado1 

Rita Maciel1 

1Serviço de Medicina Interna, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, Santa Maria da Feira, Portugal.

2Serviço de Medicina Física e Reabilitação, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, Santa Maria da Feira, Portugal.


A coronavirus disease 2019 (COVID-19), infeção causada pelo vírus severe acute respiratory syndrome coronavirus-2 (SARS-CoV-2), apresenta um amplo espectro de manifestações clínicas e de gravidade. Em Portugal, o primeiro caso foi diagnosticado a 2 de março de 2020 e, a 19 de março, decretado o primeiro estado de emergência im-posto pela pandemia COVID-19. De acordo com dados da Direção Geral da Saúde, foram infetados à data de redação desta carta, mais de 1 milhão de pessoas pelo SARS-CoV-2, com mais de 18 000 óbitos.1 No entanto, são ainda poucos os estudos nacionais que permitam aferir as repercussões desta pandemia nos doentes sem infeção por SARS-CoV-2.

Foi realizado um estudo retrospetivo, comparando os doentes internados em enfermaria num Serviço de Medicina Interna, no período de 43 dias do primeiro Estado de Emergência (19/03/2020 a 02/05/2020) com o período de 43 dias subsequente (3/05/2020 a 14/06/2020). A colheita dos dados foi efetuada através do processo clínico informático do doente. A análise estatística foi realizada através do programa SPSS®. Foram avaliados dados demográficos, diagnósticos principais e principais sistemas orgânicos afetados, duração do internamento, número de reinternamentos e recorrências ao Serviço Urgência (SU) nos 30 dias após alta e a mortalidade intra-hospitalar e a 30 dias. Na análise comparativa das variáveis qualitativas aplicou-se o teste Qui-quadrado e na de variáveis contínuas, pela distribuição não normal da amostra, foram aplicados testes não paramétricos (teste U de Mann-Whitney e Kruskal-Wallis). Considerou-se um valor p <0,05 como estatisticamente significativo.

Nos 86 dias analisados estiveram internados 934 doen-tes, com uma mediana de idades 79 anos (AIQ: 66-87), maioritariamente do sexo feminino (n = 486, 52%). A mediana do tempo de internamento foi de 6 dias (AIQ: 3-8). O score de Charlson mediano foi 2. No estudo comparativo entre os dois períodos, objetivou-se que a mortalidade a 30 dias no primeiro estado de emergência foi significativamente superior à do período subsequente (7,5% vs 4,2%; p = 0,036). Da mesma forma, verificou-se um número significativamente superior de doentes com patologias do sistema respiratório no 1º período do estudo (217 vs 108; p < 0,05); por sua vez, houve maior número de patologia dos sistemas cardiocirculatório, digestivo, genitourinário e neurológico no 2º período de forma significativa. Não se observou diferenças estatisticamente significativas entre os dois períodos relativamente ao género (p = 0,616), idade (79 anos vs 80 anos; p = 0,241), tempo de internamento (5 dias vs 6 dias; p = 0,679), readmissão SU a 30 dias (24,1% vs 24,1%; p = 0,938) ou reinternamento a 30 dias (14,8% vs 14,1%; p = 0,274).

Hipoteticamente, em linha com as conclusões de estudos internacionais de grande dimensão sobre mortalidade nos doentes sem infeção por SARS-CoV-2, postulamos que este aumento possa ser explicado pela recorrência mais tardia dos doentes às instituições de saúde, apresentando-se assim com doenças em fases mais avançadas e graves.2-4Acresce, a favor desta conclusão, a superior proporção de óbitos extra-hospitalar entre março e agosto de 2020, em Portugal, face à média de óbitos no período homólogo de 2015-2019.5

Apesar destes resultados, pode não ser possível inferir mesmo para outras instituições de saúde, devendo ser interpretados cautelosamente. Assim, pretende-se com esta carta ao Diretor, realçar a importância destes dados e questionar a sua reprodutibilidade. Lança-se, também, o repto à Sociedade Portuguesa de Medicina Interna para a realização de estudos neste contexto, de carater multicêntrico, por forma a podermos retratar de forma mais fiel o impacto da pandemia COVID-19 a nível nacional. Desta forma, poderão ser retiradas conclusões que permitam uma melhoria da resposta dos hospitais em situações similares no futuro.

Tabela 1 

Declaração de Contribuição / Contributorship Statement:

Mário Gil Fontoura - Idealização, Redação, Revisão do artigo.

L. V. Pinto, F. Machado, R. Maciel - Redação, Revisão do artigo.

REFERÊNCIAS

1. Direção Geral da Saúde. [consultado Out 2021] Disponível em: http://www. dgs.ptLinks ]

2. Bodilsen J, Nielsen PB, SÃgaard M, Dalager-Pedersen M, Speiser LO, Yn-digegn T, et al. Hospital admission and mortality rates for non-covid disea-ses in Denmark during covid-19 pandemic: nationwide population based cohort study BMJ. 2021;373:n1135 doi:10.1136/bmj.n1135 [ Links ]

3. Rivera R, Rosenbaum JE, Quispe W (2020). Excess mortality in the United States during the first three months of the COVID-19 pandemic. Epidemiol Infect. 2020; 148: e264. doi: 10.1017/S0950268820002617 [ Links ]

4. Vieira A, Ricoca Peixoto V, Aguiar P, Sousa P, Abrantes A: Excess Non-COVID-19 Mortality in Portugal: Seven Months after the First Death. Port J Public Health 2020;38:51-7. doi: 10.1159/000515656 [ Links ]

5 5. Instituto Nacional de Estatística . A mortalidade em Portugal no contexto da pandemia COVID-19, semanas 1 a 35 de 2020. [consultado Set 2020] Disponível em: http://www.ine.pt. [ Links ]

1Responsabilidades Éticas Conflitos de Interesse: Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse na realização do presente trabalho Fontes de Financiamento: Não existiram fontes externas de financiamento para a realização deste artigo Proveniência e Revisão por Pares: Não comissionado; revisão externa por pares. Ethical Disclosures Conflicts of Interest: The authors have no conflicts of interest to declare. Financing Support: This work has not received any contribution, grant or scholarship Provenance and Peer Review: Not commissioned; externally peer re-viewed

2© Autor (es) (ou seu (s) empregador (es)) e Revista SPMI 2022. Reutiliza-ção permitida de acordo com CC BY-NC. Nenhuma reutilização comercial. © Author(s) (or their employer(s)) and SPMI Journal 2022. Re-use permit-ted under CC BY-NC. No commercial re-use.

Recebido: 30 de Novembro de 2021; Aceito: 18 de Janeiro de 2022

Correspondence / Correspondência: Mário Gil Fontoura - mario.fontoura@chedv.min-saude.pt Serviço de Medicina Interna, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga (CHEDV), Santa Maria da Feira, Portugal. R. Dr. Cândido Pinho 5, 4520-211, Santa Maria da Feira

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