SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.45Manifestações artísticas urbanas contemporâneas: índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.45  Porto ago. 2023  Epub 15-Ago-2023

https://doi.org/10.21747/08723419/soc45ed 

Editorial

EDITORIAL

Virgílio Borges Pereira1 

1Faculdade de Letras da Universidade do Porto


Sociologia: Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto conhece a sua edição XLV, a primeira do ano de 2023, que combina uma secção de Artigos, variados, com uma secção de Fórum, cujo figurino, relevante em momentos marcantes da história da revista, se recupera para dinamizar debates marcantes para o conhecimento científico sobre as sociedades.

A secção de artigos convoca incursões analíticas empiricamente informadas nos domínios da cultura, do trabalho, da religião, da política e também da metodologia, combinando investigações de âmbito sociológico com pesquisas de mais evidente filiação histórica e política, e envolvendo realidades sociais diferenciadas que passam por Portugal, pela comparação Portugal/Alemanha em domínios específicos e pela análise da realidade brasileira, mais concretamente, o Rio de Janeiro.

O primeiro dos artigos, da autoria de Susana Januário e intitulado “Manifestações artísticas urbanas contemporâneas: a territorialidade como expressão da alternativa artística”, propõe uma análise de manifestações artísticas alternativas a partir do estudo intensivo de oito casos significativos em Portugal. Demonstrando como a inscrição territorial influi sobre os processos de afirmação das manifestações artísticas analisadas, o estudo revela, com recurso à análise das representações de agentes envolvidos nestes processos, que esta relação é dialógica e que as manifestações artísticas contribuem também para moldar as configurações dos territórios em que se inscrevem.

O segundo dos artigos, da autoria de Vamberto Ferreira Miranda Filho, intitula-se “Regulação do trabalho via plataformas digitais na Alemanha e Portugal” e propõe-se analisar, como o seu título sugere, a regulação do trabalho nas plataformas digitais em Portugal e na Alemanha. Informado por um programa teórico inspirado na chamada Abordagem dos Recursos de Poder, o artigo investiga, conjugando análise documental, entrevistas e observação, o modo como as iniciativas do IG Metall e do STRUP, dois sindicatos destacados em cada um dos países estudados nos domínios privilegiados pela análise, podem contribuir para a regulação do trabalho via plataformas, sem deixar de identificar dificuldades e impasses.

O terceiro artigo, redigido por Edilma Carrijo, intitula-se “‘Sozinha na rede’. Contributos da Teoria das Redes no estudo de caso de uma pastora batista no Rio de Janeiro”, mobiliza a teoria das redes sociais para ler o modo como tensões e constrangimentos no ministério pastoral são geridos no Brasil. Religião e redes sociais combinam-se; produzindo capital social, a religião gera redes de proteção e cuidado. O estudo do caso de uma pastora batista na cidade do Rio de Janeiro ilustra de modo pertinente este argumento e demonstra as modalidades de estruturação a que a sua rede social se encontra sujeita, revelando possibilidades de ação, mas também significativos constrangimentos.

O quarto artigo, da autoria de Miguel Filipe Silva, intitula-se “O Estudo das Conjunturas Políticas e dos Partidos Políticos na Interseção entre História e Ciência Política - aplicação prática ao período 1890-1910”. Convocando um diálogo entre a História e a Ciência Política, a análise esboça, tomando Portugal como referência, um programa de pesquisa e um período de análise pertinentes - 1890-1930 -, o da “Crise do Liberalismo”, encarados a partir do estudo da ação dos partidos políticos no quadro da crise de 1890-1910. Através do estudo da génese do Partido Republicano Português e da sua ação, a análise demonstra a transformação que se estrutura do tipo de partidos configurados no país.

Por fim, de recorte mais orientadamente metodológico, o artigo de Célia Cardoso intitula-se “Potencialidades, limites e desafios da prosopografia” e assinala, de modo reflexivo, vantagens e desafios inerentes à construção do dispositivo de observação constituído em torno da prosopografia. Munindo-se de revisão de literatura científica, o artigo demonstra o potencial analítico contido no trabalho prosopográfico e a convocatória que contempla de métodos complementares para garantir uma sua plena e heurística utilização.

A secção Fórum contempla três importantes contributos para o aprofundamento do debate teórico e analítico sobre temas com grande relevância na definição das agendas de pesquisa sociológica da atualidade.

O primeiro contributo é de Loïc Wacquant, que regressa às páginas desta revista com “Resolver o Problema da ‘Raça’”, um ensaio que, sistematizando o mais recente trabalho do autor em torno de uma matéria que tem estudado como poucos, envolve a definição de um quadro neobourdieusiano para repensar a dominação racial. Um tal quadro implica movimentos analíticos específicos que passam por historicizar os processos de dominação racial, por rever o lugar ocupado nestes processos pelos Estados Unidos da América, por erradicar a lógica de julgamento na dinamização da respetiva pesquisa e por um trabalho de objetivação das “formas elementares” de dominação que suporta, a saber: categorização, discriminação, segregação, reclusão e violência raciais. Wacquant procura, deste modo, reorientar o centro de pesquisa em torno da dominação racial, inscrevendo esta última, enquanto etnicidade denegada, numa modalidade particular de “formação de grupos”.

O segundo contributo é de Seth Holmes e intitula-se “Acidentes e lesões de trabalhadores agrícolas migrantes: temporalidade, representação estatística, acontecimentos”. Envolvendo resultados de uma pesquisa etnográfica aprofundada desenvolvida ao longo de um extenso período temporal junto de trabalhadores agrícolas migrantes provenientes do sul do México nas explorações agrícolas da Califórnia, do Oregon e de Washington, nos Estados Unidos da América, o presente artigo constrói o seu ponto de vista a partir da análise das experiências de acidente e de lesão no trabalho e de acesso aos cuidados de saúde a que estes trabalhadores estão sujeitos. Sem deixar de equacionar reflexivamente o valor acrescido que a investigação de âmbito sociológico e antropológico tem para a consciencialização social sobre a configuração das desigualdades inscritas nestes processos, o artigo explora as incidências de tais experiências de acidente e de lesão através da leitura de um percurso de trabalhador. Confronta-as, de seguida, com o modo como os acidentes de trabalho são captados e construídos pela estatística geral da saúde e pelo enquadramento institucional dos cuidados de saúde nos Estados Unidos. Demonstra, em diferentes movimentos, por fim, como a normalização, tornada invisível, dos danos infligidos aos trabalhadores migrantes se generaliza.

O terceiro contributo permite-nos regressar aos trabalhos de Seth Holmes, neste caso através de uma entrevista conduzida por João Queirós e intitulada “Para que possamos comer a fruta e os legumes que nos tornam saudáveis, os corpos dos trabalhadores agrícolas migrantes são danificados e a sua saúde é-lhes retirada”. Beneficiando de uma já prolongada colaboração com o Instituto de Sociologia da Universidade do Porto, onde Seth Holmes foi investigador visitante na primavera/verão de 2022 e onde os seus trabalhos têm sido seguidos com particular atenção, João Queirós convida o autor e, agora os leitores, a percorrer os pormenores e as prioridades da original pesquisa que Seth Holmes tem vindo a realizar sobre os trabalhadores agrícolas migrantes e sobre a sua saúde.

Não faltam razões para ler com atenção este número de Sociologia: Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Boas leituras!

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons