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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.43  Porto jun. 2022  Epub 31-Jul-2022

https://doi.org/10.21747/08723419/soc43r1 

Recensão

Afonso, Almerindo J., e Palhares, José A. (2019). Entre a Escola e a Vida. A condição de jovem para além do ofício de aluno. Vila Nova de Gaia, Fundação Manuel Leão

Guilherme Rego da Silva1 

1Universidade do Minho, Instituto de Educação


O livro organizado por Almerindo Janela Afonso e José Augusto Palhares, com o título “Entre a Escola e a Vida”, coloca um cenário familiar à nossa frente, independentemente da idade ou situação socioprofissional de cada um porque, na “sociedade pedagogizada” ou “sociedade do conhecimento”, o título define a ponte pela qual todos caminhamos entre a escola e a vida. Mas logo o subtítulo da obra “A condição de jovem para além do ofício de aluno” nos posiciona num campo mais especializado, o da juventude. Este livro, na perspetiva de quem o lê já na idade adulta, obriga a um exercício duplo de reposicionamento mental: olhar para o passado, para o período jovem do nosso percurso de vida (introspeção) e também para o presente, para os outros, para aqueles que hoje beneficiam, mais ou menos, das alegadas vantagens de quem vive essa fase da vida (empatia).

O livro é de leitura acessível, beneficiando do formato das páginas, clássico e não muito grande, da introdução que focaliza o leitor, seguida por oito capítulos, cada um tratando a temática em perspetiva especializada, e da conceção da matéria de cada capitulo como uma unidade em si, com apresentação do tema, desenvolvimento e conclusões; nesse sentido, e dadas as intenções pedagógicas da obra, cada capítulo oferece um pequeno curso de síntese sobre o subtema que lhe compete desenvolver.

Para além da introdução, escrita pelo organizador, Almerindo Afonso, os oito capítulos seguintes mobilizam no seu conjunto treze académicos com obra reconhecida na área de estudo.

José Machado Pais, no capítulo 1, “Jovens, rumos societais e desafios educacionais”, desafia- nos a “olhar para o lado”, a olhar para fora da escola para compreender a realidade escolar; a ver as culturas juvenis modernas como interconectadas, onde perdem sentido as fronteiras e particularmente a fronteira que separa a escola e a vida, o conhecimento escolar e o extraescolar. A escola lança mais um conjunto de pontes entre outras pontes que são não escolares, e todas elas unem espaços de uma rede através da qual os jovens constroem o seu mundo. “Vicissitudes do ofício de aluno: de novo, o insucesso escolar em questão”, é o capítulo 2 onde o autor, Manuel Sarmento, começa por fazer uma síntese sobre o estado atual das teorias explicativas do insucesso escolar e em seguida apresenta as propostas mais relevantes que têm surgido para superar esse problema, da parte de estudiosos académicos e de organizações internacionais. O trabalho de síntese resulta útil e prático para aqueles que, por necessidade de estudo do tema ou de intervenção no terreno, se encontrem motivados para fazer uso desse conhecimento. Leonor Torres no capítulo 3, “A narrativa da excelência na escola e no trabalho: ilusões e paradoxos da cultura meritocrática”, apresenta uma síntese sobre a expressão da ideologia da excelência meritocrática na escola portuguesa atual. Passamos, nas últimas décadas, de uma meritocracia envergonhada ou encapotada, para uma meritocracia exibicionista, feita de quadros de honra e prémios de mérito e isto enquanto a escola deve, ao mesmo tempo, lutar pela integração de todos os estudantes, pela igualdade de oportunidades e contra o insucesso escolar. Como a escola procura gerir estas duas exigências em simultâneo é assunto complexo que este texto ajuda a esclarecer.

No capítulo 4, “As elites nas universidades chilenas: perfis dos alunos e projetos formativos institucionais”, Maria Luísa Quaresma, mostra como no Chile, do mesmo modo que em outros países com os quais desenvolve comparação, o sistema de ensino superior mantém em funcionamento mecanismos para a manutenção dos privilégios dos grupos mais favorecidos da sociedade. É o sistema das “universidades de elite”, cuja estrutura está bem identificada em vários países, que é aqui objeto de estudo analítico e comparativo. As universidades de elite permitem aos governos fazer o discurso da democratização do ensino superior, ao mesmo tempo que asseguram a reprodução das desigualdades.

José Manuel Resende, David Beirante e Luís Gouveia, redigem o capítulo 5, “A democracia ajuizada através das experiências escolares: dilemas e desafios na sua perscrutação”, no qual discutem as condições possíveis para a realização do ideal político e pedagógico da “escola democrática”. Ao ler ficamos cientes que, se do ponto de vista ideológico e até filosófico, a escola democrática e inclusiva é algo que se pode visualizar com alguma nitidez, já do ponto de vista concreto, das condições reais da vida escolar, isso não é assim tão simples. E os autores explicam porquê…

Teresa Sarmento e Fernanda Martins escrevem o capítulo 6, “Pais crianças-alunos e sucesso educativo: fragmentos da política educativa de um município”, que apresenta as novas responsabilidades dos municípios nesta temática complexa e multifacetada da promoção do sucesso educativo e igualdade de oportunidades. O texto entra nas várias dimensões desta questão através da leitura da Carta Educativa de um município.

“Rede local de parceiros garantia jovem: tensões e obstáculos às políticas de proximidade”, por Maria Manuel Vieira, Tatiana Ferreira e Lia Pappámikail, é o título do capítulo 7, que deixa o leitor esclarecido quanto às dificuldades e limitações com que se deparam os programas estatais de proximidade, para acompanhamento dos jovens em risco. Seguindo os resultados dos estudos e as circunstâncias concretas que são apresentadas, parece quase uma inevitabilidade que a eficácia dos referidos programas de proximidade se revele reduzida.

Por último, José Palhares, no capítulo 8, “Educação e aprendizagens não formais e informais de jovens no ensino secundário: contributos críticos à compartimentação educativa”, chama a atenção para a importância das aprendizagens não escolares na construção do perfil cultural dos jovens e também no sucesso educativo. O texto mostra como os programas de promoção do sucesso escolar - centrados na escola - estão condenamos a ter um sucesso limitado, dada a importância das aprendizagens não escolares e a possibilidade da sua maior ou menor mobilização no território escolar.

No final da leitura fica-se com a convicção de que é possível condensar, num livro acessível, a síntese do conhecimento fundamental e da produção teórica que resulta do trabalho de pesquisa, sobre a problemática relação dos jovens com a escola e com o espaço extraescolar, as questões de igualdade e justiça no processo de escolarização, e as dificuldades que tendem a surgir na fase de inserção no mundo do trabalho e na transição para a vida adulta. Mas também com a sensação de que as medidas facilitadoras e de justiça social estão a produzir um efeito positivo, ainda que relativo, e que não é possível resolver os problemas de uma forma inequívoca e definitiva, mas que apenas podemos gerir esses problemas e procurar minimizar as situações mais urgentes.

O discurso lógico do livro, leva-nos a ter confiança em que a realidade está bem caraterizada e que as melhores medidas estão a ser aplicadas para obter os resultados possíveis.

Mesmo perante o conhecimento que temos já reunido, constata-se que não conseguimos resolver finalmente os problemas de democraticidade, justiça, igualdade de oportunidades, insucesso escolar, integração dos jovens em contextos de trabalho . Conscientes das limitações da nossa capacidade de intervenção, mesmo na posse do mais sólido conhecimento, temos que perseverar na ação que objetivamente esteja a produzir resultados visíveis.

Recebido: 20 de Fevereiro de 2022; Aceito: 29 de Abril de 2022

Guilherme Rego da Silva. Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho, Departamento de Ciências Sociais da Educação. Endereço de correspondência: Instituto de Educação, Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga (Portugal). Email: grs@ie.uminho.pt

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