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Sociologia

versão impressa ISSN 0872-3419

Sociologia vol.42  Porto dez. 2021  Epub 20-Fev-2022

https://doi.org/10.21747/08723419/soc42a1 

Artigos originais

Conselhos de empresa europeus no contexto português: dos obstáculos às boas práticas no setor metalúrgico

European works councils in the Portuguese context: from obstacles to good practices in the metallurgical sector

Les comités d'entreprise européens dans le contexte portugais: des obstacles aux bonnes pratiques dans le secteur métallurgique

Comités de empresa europeos en el contexto portugués: de los obstáculos a las buenas prácticas en el sector metalúrgico

Hermes Augusto Costa1 

1Universidade de Coimbra, Faculdade de Economia-Centro de Estudos Sociais, Portugal


RESUMO

Quase três décadas após o surgimento da Diretiva que instituiu os conselhos de empresa europeus (CEEs), persistem obstáculos ao funcionamento daquele orgão de informação e consulta de trabalhadores. Depois de se situar o tema no quadro do sistema de relações laborais português e de se mapearem alguns desses obstáculos, faz-se eco de boas práticas à luz do setor metalúrgico e do CEE Volkswagen. Argumenta-se que, mesmo devendo ser olhadas de modo prudente, as experiências de boas práticas são cruciais para enfrentar incertezas e reforçar o potencial de participação laboral nas multinacionais.

Palavras-chave: conselhos de empresa europeus; setor metalúrgico; boas práticas

ABSTRACT

Almost three decades after the emergence of the European Works Councils (EWCs), obstacles persist to the functioning of that body of information and consultation of workers. After placing the topic within the framework of the Portuguese labour relations system and mapping out some of those obstacles, good practices are mentioned in the light of the metallurgical sector and the Volkswagen EWC. It is argued that, even though it should be looked at carefully, the experiences of good practices are crucial to face uncertainties and reinforce the potential for labour participation in multinationals.

Keywords: European works councils; metallurgical sector; good practices

RESUME

Près de trois décennies après l'émergence de la directive des comités d'entreprise européens (CEE), des obstacles persistent au fonctionnement de cet organisme d'information et de consultation des travailleurs. Après avoir placé le thème dans le cadre du système de relations de travail portugais et identifié certains de ces obstacles, les bonnes pratiques sont reprises à la lumière du secteur métallurgique et du CEE de Volkswagen. Même si cela doit être examiné avec attention, les expériences de bonnes pratiques sont cruciales pour faire face aux incertitudes et renforcer le potentiel de participation de la main-d'œuvre dans les multinationales.

Mots-clés : comités d'entreprise européens; secteur métallurgique; bonnes habitudes

RESUMEN

Casi tres décadas después de la aparición de la Directiva de los Comités de Empresa Europeos (CEE), persisten obstáculos para el funcionamiento de ese cuerpo de información y consulta a los trabajadores. Tras situar el tema en el marco del sistema de relaciones laborales portugués y trazar algunos de esos obstáculos, las buenas prácticas se hacen eco a la luz del sector metalúrgico y del CEE de Volkswagen. Se argumenta que, si bien debe analizarse con detenimiento, las experiencias de buenas prácticas son cruciales para enfrentar las incertidumbres y reforzar el potencial de participación laboral en las multinacionales.

Palabras clave: comités de empresa europeos; sector metalúrgico; buenas practicas

1. Introdução

Na identificação das formas organização laboral e sindical transnacional, o tema dos Conselhos de Empresa Europeus (CEEs) é incontornável. Desde logo, porque os CEEs - órgãos de informação e consulta dos trabalhadores nas empresas/grupos de empresas de dimensão comunitária (com 1.000 ou mais trabalhadores e pelo menos 150 trabalhadores empregados em dois Estados Membros do Espaço Económico Europeu) - são porventura o exemplo onde a legislação social europeia mais avançou. Nesse sentido, além de combinarem as vertentes empresarial e setorial, os CEEs fomentam a partilha de problemas comuns entre trabalhadores de diferentes filiais (e países) de uma mesma multinacional e, consequentemente, a criação de formas de solidariedade laboral.

De um ponto de vista conceptual, o tema dos CEEs pode igualmente ser enquadrado no leque de estudos tendentes a valorizar os processos de participação laboral, diálogo social ou democracia na empresa. Nesse sentido, em especial no contexto Europeu, a relevância do tema, além de colocar em relevo dinâmicas transnacionais, é igualmente condicionada pelo modo como se inscreve, de jure e de facto, nos sistemas de relações laborais nacionais. Não obstante os diferentes olhares disciplinares sobre o tema (emanados da sociologia, mas também do direito, da ciência política, da gestão de recursos humanos, da economia, da história ou mesmo da psicologia), podem alinhar-se ângulos de análise presentes em vários estudos, dos quais se podem destacar: a articulação com as tradições de diálogo social nacional; a análise dos processos de comunicação internos e entre CEEs; o registo quantitativo (e comparado) do fenómeno; o escrutínio dos acordos (voluntários e formais) de CEEs; o papel das tipologias de CEEs e a sua aplicação; a operacionalidade e timing da consulta e da informação; as experiências de representantes de trabalhadores; os obstáculos à constituição e o funcionamento dos CEEs; a visão das entidades empregadoras; o perfil sociográfico dos representantes em CEEs; os processos revisão da lei comunitária; o papel dos sindicatos/federações sindicais europeias; a identidade laboral transnacional dos CEEs, etc. (Costa e Costa, 2014: 18-19).

Como resultado da Diretiva 94/45/CE (substituída desde junho de 2011 pela Diretiva 2009/38/CE), os CEEs têm vindo a registar um crescimento progressivo. Em agosto de 2021, segundo o European Works Councils Database (http://www.ewcdb.eu/stats-and-graphs), existiam 1.161 multinacionais com CEEs, 1.196 CEEs ativos (apesar de até então terem sido criados 1.638 CEEs) e 335 multinacionais que antes dispunham de um CEE tinham-se fundido ou dissolvido. Porém, os CEEs tem vindo a “deambular” entre obstáculos prevalecentes e experiências de “boas práticas” a que nem sempre é conferida visibilidade.

Com a crise económica e as políticas de austeridade - que no contexto português produziram severos impactos nas relações de trabalho sobretudo entre 2011 e 2015 (Costa, 2012; Leite et al., 2014; Campos Lima, 2017; Silva, Hespanha e Caldas, 2017; Almeida et al., 2017; Estanque e Costa, 2018) -, os CEEs foram colocados “à prova” e desafiados a responder a múltiplas situações de “desintegração e ineficácia” (Mählmeyer, Rampeltshammer e Hertwig, 2017: 226). Tendo por referência a realidade portuguesa (e, dentro desta, o setor metalúrgico/VW), a minha preocupação neste texto é dupla: revisitar obstáculos e realçar o potencial das boas páticas que dão à vida dos CEEs. Ao fazê-lo, identificam-se também problemas e potencialdades transversais a outros contextos de relações laborais.

O texto está dividido em três partes. A primeira situa o papel dos CEEs no quadro do sistema de relações laborais em Portugal. A segunda identifica obstáculos (quer transversais, quer específicos da realidade portuguesa) reveladores de inoperância e que e, como tal, reclamam novas práticas para os CEEs. Finalmente, a terceira parte, tendo por referência o CEE da VW (com destaque para o contexto da fábrica portuguesa da Autoeuropa), guia-se por uma análise mais otimista dos CEEs. Com base em depoimentos de representantes de trabalhadores, evidencia-se em simultâneo o potencial dos CEEs mas também a necessidade de projetar o seu futuro para além de um registo meramente simbólico (Lecher et al., 1999; 2001; 2002) ou etnocêntrico (Bicknell, 2007).

2. O sistema de relações laborais português e a pesquisa sobre CEEs

É no quadro do sistema de relações laborais que o tema dos CEEs deve ser estudado, com destaque para dois planos de análise: i) um plano macro, de relacionamento institucional tripartido entre parceiros sociais (organizações de trabalhadores e organizações de empregadores , mediante a coordenação do Governo), designadamente no âmbito de uma comissão de concertação social (órgão de consulta do Governo, criado em 1984); ii) e um plano meso/micro, setorial, por empresa, onde a relação capital-trabalho está porventura mais ao rubro. Com efeito, quando se tem em consideração este plano, e sobretudo quando se pensa em empresas multinacionais, os principais atores do sistema são, por um lado, as associações patronais e, por outro, as associações sindicais ou outras estruturas de representação de trabalhadores na empresa (como os CEEs, as comissões de trabalhadores ou as comissões de segurança e saúde no trabalho).

Mas o lugar dos CEEs no sistema de relações laborais português ocupa uma posição secundária. Com efeito, não obstante o permanente desafio do reforço da presença sindical em CEEs (Hall, 2003) e o reconhecimento de que os CEEs podem potenciar um reforço dos direitos dos trabalhadores ao nível da empresa multinacional, eles não têm constituído uma prioridade, inclusive para as organizações sindicais portuguesas mais representativas (ainda que a UGT evidencie um claro compromisso com a integração europeia quando comparado com o sindicalismo de classe na CGTP). Essa secundarização explica-se quer porque o direito à informação e consulta inerente aos CEEs no plano da estrutura transnacional da empresa está já previsto na legislação nacional que regula as comissões de trabalhadores (artº 54.º, n.º 5, al. a), da Constituição da República Portuguesa, CRP), assim como a liberdade sindical (art.º 55.º, n.º 6, da CRP), quer porque mais de 90% do tecido produtivo português é composto por pequenas e médias empresas.

Assim sendo, fazer dos CEEs um objeto de estudo relevante a pensar no “caso português” obriga inevitavelmente a ter como referência multinacionais não portuguesas e, como tal, a captar perceções sobre os CEEs emitidas por representantes portugueses de filiais de multinacionais com sede noutros países (sejam eles escolhidos/eleitos por sindicatos ou por comissões de trabalhadores). Na secção seguinte, a identificação de obstáculos na vida dos CEEs (quer dos genéricos, quer dos mais específicos relativos à realidade portuguesa) não deixa, pois, de ter isso em consideração. De igual modo, o maior otimismo inerente às boas práticas é filtrado a partir das narrativas dos representantes. A escolha do setor metalúrgico justifica-se, entretanto, por ser aquele onde é maior o número de multinacionais presentes em Portugal e maior o número de CEEs constituídos. Por sua vez, o facto de a filial portuguesa da VW (a fábrica da Autoeuropa) constituir um exemplo de referência à escala do país - responsável por 1,6% do PIB português (VW, 2017; Ferreira, 2019) - justifica a atenção que aqui lhe é concedida.

3. Os obstáculos ao funcionamento dos CEEs

Ao longo de quase três décadas, os CEEs têm-se confrontado com obstáculos muito diversificados, alguns dos quais persistentes ou por solucionar. Primeiramente, destaco obstáculos genéricos, i.e, transversais aos CEEs em geral. Em segundo lugar, assinalo alguns obstáculos mais específicos da realidade portuguesa (do seu contexto económico-social e sistema de relações laborais).

3.1. Obstáculos mais gerais

Em termos gerais, vários obstáculos aos CEEs podem ser identificados, deles se depreendendo problemas relacionados com a constituição, perceção, funcionamento e resultados dos CEEs:

Escolha de representantes para os CEE por vezes condicionada pela administração da empresa, impedindo a participação dos legítimos representantes dos trabalhadores (Costa, 2017);

Défice de conhecimento sobre os CEEs, dos seus conteúdos, regras e modo de funcionamento (Olijslagers and De Spiegelaere, 2019), o que não pode dissociar-se do baixo número de ações de formação sobre os CEEs (Whittall e Kotthoff, 2011);

Escassez de fluência em línguas estrangeiras (Miller et al., 2000; Stirling e Tully, 2004), que dificulta entendimentos comuns (Greer e Hauptmeier, 2012);

Incapacidade dos CEEs superarem os problemas reais enfrentados pelos trabalhadores no contexto da globalização (com destaque para a reestruturação empresarial e desemprego) (Bernaciak et al., 2014);

Insistência excessiva das administrações centrais das empresas na “confidencialidade”, designadamente sobre questões fundamentais (tais como cortes de empregos), a qual retira eficácia ao processo de consulta (Laulom e Dorssemont, 2015);

Informação de baixa qualidade e consulta inadequada confere aos CEEs limitada “utilidade prática” ou mesmo uma “qualidade medíocre” (Waddington, 2011b: 45; Hann, Hauptmeier e Waddington, 2017);

Presença recorrente de elementos inibidores da coordenação laboral transnacional: encontros anuais com escassa comunicação; agendas formais com pouco espaço para os contactos informais; predomínio dos representantes do país sede da empresa multinacional (Hann, Hauptmeier e Waddington, 2017); ausência de uma estratégia sindical coerente e consistente sobre o papel dos CEEs que seja capaz de reforçar um sistema europeu de relações laborais (Hann, 2010; Olijslagers and De Spiegelaere, 2019).

Entre outros, estes obstáculos permitiram rotular os CEEs de simbólicos (Lecher et al.,1999; 2001; 2002) ou etnocêntricos (Bicknell, 2007) , ambos de funcionamento muito incipiente e pouco atrativo.

3.2. Alguns obstáculos mais específicos do contexto português

Em complemento aos obstáculos genéricos, importa identificar outros mais específicos (ainda que não exclusivos) do caso português. Por um lado, obstáculos associados ao contexto social e económico:

Os problemas nacionais têm prioridade sobre a criação de CEEs. A defesa dos empregados no local de trabalho é prevalecente e incisiva, tanto mais que a concorrência entre os locais é parte integrante da estratégia de gestão (Weston e Martínez Lucio, 1997);

Os processos de privatização empresarial reduzem a cultura de participação, em especial para trabalhadores mais jovens, com relações contratuais instáveis (Costa et al., 2020);

Por sua vez, de entre os obstáculos mais relacionados com o sistema de relações laborais destacam-se:

A não atribuição de prioridade aos CEEs por parte das confederações sindicais portuguesas. Em especial a CGTP (historicamente anti-União Europeia e com menor tradição de inserção no movimento sindical europeu) não vê nos CEEs a oportunidade de maximização de uma lógica exclusivamente sindical (CGTP, 2020). Por sua vez, a UGT tende a considerar os CEEs como oportunidade para imprimir uma maior dinâmica de atuação transnacional, fruto da sua maior inserção nas estruturas sindicais europeias (UGT, 2017);

A competição entre os sindicatos filiados na UGT e na CGTP, sobretudo quando ambas as centrais sindicais estão representadas na mesma multinacional e o número de representantes a indicar para o CEE é ímpar (Costa e Costa, 2014);

A proximidade geográfica à sede da multinacional diminui a necessidade de um CEE. No caso das multinacionais com sede em Portugal (sem CEEs, mas em condições de constituir CEEs), a proximidade da sede evidencia que os representantes dos trabalhadores têm já acesso (através de legislação específica) às informações da empresa (sede). E em teoria isso confere-lhes uma home advantadge negocial (Lecher et al., 1999) com a administração local;

Os conflitos entre comissões de trabalhadores e sindicatos. Embora os sindicatos e as comissões de trabalhadores (CTs) possam eleger/nomear representantes, existe por vezes uma tensão implícita: por um lado, os representantes em CEEs escolhidos em representação da CTs tendem a considerar que é através destas que são escolhidos os legítimos representantes dos trabalhadores, pois representam toda a força de trabalho da empresa; por outro lado, os representantes escolhidos pelos sindicatos tendem a defender uma “sindicalização” dos CEEs, de resto já observável no maior peso dos representantes sindicais em CEEs face aos indicados pelas CTs (Costa e Araújo, 2009; Costa e Costa, 2014).

Não obstante esta diversidade de obstáculos, numa minoria de casos os CEEs desenvolveram-se como atores genuinamente transnacionais, quase com poder de negociação (Bernaciak et al., 2014), aproximando-se assim de CEEs de tipo “participativo” ou “eurocêntrico” (Lecher et al, 1999; 2001 ; 2002 ; Bicknell, 2007) . Em meu entender, um olhar sobre o CEE do Grupo Volkswagen (VW), a partir das práticas observadas na fábrica portuguesa ao abrigo da investigação que coordenei (Costa et al, 2019; 2020) vai ao encontro de uma visão mais otimista sobre o funcionamento dos CEEs. É claro que esse otimismo não pode ser exagerado. Desde logo porque a análise que se segue espelha sobretudo a perspetiva de representantes de trabalhadores (e não da administração). De igual modo, embora se recolham pequenos testemunhos de entrevistas com outros protagonistas (de sindicatos e de comissões de trabalhadores) do setor metalúrgico que gravitam no ambiente próximo da fábrica portuguesa da VW, acaba por se conferir maior destaque a depoimentos daquele que foi o representante português efetivo do CEE da VW por mais de duas décadas (até 2017) . Vejamos então alguns desses bons exemplos a partir da experiência portuguesa.

4. Exemplos de “boas práticas”: o CEE do Grupo Volkswagen

Inserido no sector metalúrgico - onde é maior o nº de CEEs constituídos no Espaço Económico Europeu -, o CEE do Grupo VW constitui uma referência sob vários pontos de vista: cultura de parceria social; papel da comissão de trabalhadores (CT); contributos para a uma democracia laboral; maximização de outros mecanismos de diálogo social.

4.1. Da cultura de parceria social ao papel da “lei VW”

O Grupo VW tem uma tradição de negociação norteada pela “cultura-mãe” alemã (Costa, 2013). Trata-se de uma cultura de proteção dos trabalhadores que, por sinal, já existia antes da criação do CEE e que se manteve após o seu surgimento formal em 1992. Ora, a constituição do CEE do Grupo VW, por iniciativa do sindicato alemão IG-Metall, veio corroborar esse espírito de diálogo reinante no seio da VW. Não só os representantes da administração da VW consideram o CEE como um instrumento útil para envolver os representantes dos trabalhadores nas políticas do Grupo, como os representantes dos trabalhadores consideram que o CEE do Grupo VW consegue criar coesão interna e visão estratégica capaz de potenciar a expansão transnacional do Grupo (Costa, 2017).

Aquele que foi o representante português no CEE da VW por mais de duas décadas (até 2017) sempre destacou o papel decisivo do CEE no evitar de encerramento de qualquer fábrica do grupo VW. No entanto, convém lembrar que essa influência do CEE contou, a montante, com o papel histórico da “lei VW” . Os conteúdos desta lei (criada em 1960) e os direitos de cogestão inerentes ao conselho de supervisão da VW são bem resumidos por Speidel : “direitos de voto máximos limitados a 20 por cento das ações não nominais e obrigação de maioria de 80 por cento para aprovar deliberações em assembleia geral de acionistas (...), bem como maioria de dois terços para decisões do conselho de supervisão relativas a construção e deslocação de locais de produção” (Speidel, 2012: 497).

Consequentemente, os direitos de cogestão têm implicações nas estratégias de internacionalização da VW e isso tem reflexos tanto na atividade do CEE, quanto ao nível do comité mundial de representação de trabalhadores da VW. Esse papel de relevo do conselho de supervisão da VW acaba “por reforçar a eficácia do CEE e ajudar a que este orgão tenha um papel intermediador na gestão de crises de emprego que possam desenhar-se no horizonte” (entrevista com ex-representante do CEE do grupo VW, 8.05.2018).

4.2. O papel de interlocução da comissão de trabalhadores na Autoeuropa

Na Autoeuropa - fábrica portuguesa onde nos últimos anos foram produzidos os modelos Sharan, Scirocco e Alhambra (da marca Seat) -, a composição da força de trabalho era, em 31.12.2016, de 3.295 trabalhadores . Neste cenário, a comissão de trabalhadores (CT) desempenha o papel de liderança na negociação com a administração da empresa, secundarizando a presença dos sindicatos. Trata-se de uma situação que evidencia a singularidade do caso português. Muito embora ao abrigo da legislação portuguesa sejam os sindicatos quem detém o monopólio da contratação coletiva, na fábrica da Autoeuropa não se segue esse padrão e vigoram acordos de empresa que são celebrados com a CT. Por outro lado, a presença sindical na empresa tem vindo a reduzir-se. Em 2006, de um universo de 2.900 trabalhadores, 1.400 eram sindicalizados e a taxa de sindicalização na Autoeuropa era de 45%. No final de 2016 existiam mais trabalhadores (3.295) mas apenas 543 trabalhadores estavam sindicalizados, o que correspondia a cerca de 17% de sindicalização (entrevista com coordenador da comissão de trabalhadores da Autoeuropa, 4.09.2017).

Note-se (como já foi referido) que o coordenador da CT foi desde sempre membro de um sindicato (o SITE-Sul - filiado na federação FIEQUIMETAL da CGTP, e que absorve cerca de 70% dos sindicalizados). Para o referido coordenador (que se aposentou em janeiro de 2017), o historial de relações entre a CT e os sindicatos nunca foi pacífico no que concerne à posição face aos CEEs :

“Os sindicatos da Autoeuropa encaram os CEEs como uma coisa de políticas de direita, que não resolve nada. Encaram os CEEs apenas como instituições de carácter consultivo, considerando que a luta deve ser sempre interna, nacional. Enquanto esta atitude prevalecer e não houver predisposição para participar é difícil incorporar o sindicato” (ex-representante português dos trabalhadores do CEE do Grupo VW e ex-coordenador da CT, entrevista, 8.05.2018).

Secundada pelo CEE, a CT assumiu quase sempre junto da administração uma postura flexibilidade laboral, em sintonia com o acordo dos down-days celebrado no final de 2003 . Além disso, na Autoeuropa processou-se uma “descentralização” da cultura de diálogo da “casa-mãe”, particularmente visível na intensificação de reuniões entre representantes de trabalhadores e administração da empresa sempre que se regista algum foco de tensão potencial.

É importante realçar aqui a especificidade da VW, onde os betriebsräte [conselhos de empresa] são separados e independentes dos sindicatos: “mesmo sabendo que, no caso da VW, todos os representantes são membros do IG-Metall, o betriebsräte não é um organismo sindical. Ele é um organismo definido por lei de representação de todos os trabalhadores da fábrica, independentemente do sindicato” (entrevista com representante do IG-Metall, 5.11.2018). No contexto português, a CT apresenta-se mais sintonizada com a cultura de diálogo da casa-mãe, ao passo que os sindicatos atuam mais como impulsionadores de formas de ação coletiva (mobilização). Inclusive no parque industrial de Palmela (onde se situam muitas outras empresas fornecedoras da VW) essa posição é evidente. Como afirmava um representante do CEE da Faurecia (maior fornecedor de peças de automóvel para a Autoeuropa), “os sindicatos representam mais a ideia coletiva, enquanto as comissões de trabalhadores representam a questão mais particular dentro das empresas, sempre através do pré-acordo e de uma votação através do voto secreto, que é uma prática em várias das empresas no parque industrial” (entrevista, 2.03.2018).

Como corolário dos contactos preferenciais entre CT e administração da Autoeuropa, a CT pode mesmo recorrer à sede do grupo VW sempre que alguma questão não fica totalmente resolvida na fábrica portuguesa, ainda que a perceção de que os CEEs são uma segunda instância de resolução de problemas quando estes não são solucionados no plano nacional também seja reconhecida por parte de responsáveis sindicais.

4.3. Sinais de democracia laboral

Distintamente do que é a prática em muitos CEEs, não é obrigatório que um problema ocorra em pelo menos dois Estados do EEE para que ele possa ser resolvido. O requisito da transnacionalidade é uma preocupação a que as administrações das multinacionais procuram dar prioridade, em respeito pelo disposto na Diretiva. Mas isso não impede que, pelo menos circunstancialmente, se procurem resolver os problemas de âmbito essencialmente nacional, pois ainda que seja pedagógico conhecer os problemas comuns e condições de trabalho inerentes às diferentes filiais de uma multinacional, procurar resolver os problemas vividos “em casa” acaba por ser também prioritário (Costa et al, 2019). No caso da fábrica portuguesa da VW, alguns desses problemas nacionais registados ao longo da última década foram os seguintes (de acordo com as informações prestadas pelo ex-representante português dos trabalhadores do CEE do Grupo VW, entrevistado em 8.05.2018, pelo coordenador da CT, entrevistado em 4.09.2017 e pelo secretário da FIEQUIMETAL, entrevistado em 2.03.2018): o encerramento do posto médico ao fim de semana; a destituição de um team líder por ser membro da CT; a não automatização das cabines de pintura; o desconhecimento dos destinos dos investimentos futuros da empresa; a substituição de um administrador que prejudicava as relações com os trabalhadores. Ora, sempre que se registaram dificuldades locais em resolver este tipo de problemas (junto da administração local), o CEE emergiu como uma via complementar para sensibilizar a administração central do grupo VW para os problemas locais. Mas mais do que afirmar convictamente que o CEE resolveu automaticamente esses problemas, importará realçar o prestígio e a influência granjeados pelo representante dos trabalhadores no CEE, isto é, o seu acesso privilegiado à administração pressionaram a direção central da VW a intervir no contexto português (Costa et al., 2020).

Além desta prioridade ao local tornada possível pelo próprio CEE, outros contributos para um incremento da democracia laboral podem ser sistematizados nos seguintes pontos:

A informação e a consulta dos trabalhadores é considerada suficiente e prestada antes do facto consumado. Tal sucede porque não há uma agenda de trabalhos rígida fixada pela administração, havendo espaço para a incorporação de preocupações de sindicatos e CTs;

O formato das reuniões do CEE do Grupo VW é descentralizado e faseado temporalmente, primeiro com base num encontro de partilha de problemas entre representantes de trabalhadores, ao que se segue um encontro entre trabalhadores e diretores de recursos humanos, terminando com uma reunião entre representantes de trabalhadores e a administração do Grupo VW;

A adoção de procedimentos informais - que põem ao rubro relações de confiança pessoal enquanto “pré-condições para estabilidade e eficácia em EWCs” (Mählmeyer, Rampeltshammer e Hertwig, 2017: 225) - tanto podem ocorrer à margem de reuniões formais do CEE ou inclusive nas reuniões de âmbito ainda mais alargado (internacional);

A noção de solidariedade colocada em prática significa (como corolário dos pontos anteriores) concorrer para o objetivo comum de evitar o encerramento de fábricas por meio da adoção de posições concertadas e não de posições sectárias. O já mencionado papel do conselho de supervisão da VW é decisivo, como o são as estratégias de articulação e compromisso entre distintas fábricas nacionais e a sede do grupo e para as quais o CEE funciona como instância de mediação.

4.4. A relevância das “Cartas” para o diálogo social transnacional

Além dos aspetos já mencionados terem sido indutores de boas práticas no universo do grupo VW, importa assinalar outros referenciais de diálogo social transnacional que devem ser considerados em conjugação com os CEEs.

i) a Declaração sobre direitos sociais e relações industriais na Volkswagen (conhecida como Carta Social), subscrita em junho de 2002 pela administração central da VW, pelo conselho de empresa mundial do Grupo VW (CEM-VW) e pela Federação Internacional dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas (FITIM). Baseando-se nas principais convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), visa, entre outros pontos: harmonizar transnacionalmente as relações laborais; reforçar os mecanismos de responsabilidade social empresarial; conferir impulso à celebração de Acordos de Empresa Transnacionais com um alcance mais vasto do que os Acordos-quadro europeus ou internacionais (Rehfeldt, 2015; Martínez Lucio, Mustchin e Whittall, 2015);

ii) A Carta das relações laborais do Grupo Volkswagen, subscrita entre a administração mundial da VW, o CEM-VW, o CEE da VW e a FITIM, em outubro de 2009. Aplicada a todas as empresas e unidades industriais do Grupo VW, este documento visa: reconhecer distintas tradições sindicais no grupo VW; estabelecer um quadro vinculativo de cooperação na resolução de conflitos e direitos de participação das organizações de trabalhadores na empresa, mormente em assuntos financeiros, de política de recursos humanos e sociais da empresa, de informação, consulta e cogestão (VW AG et al., 2009). Embora não se possa falar de uma transposição integral dos princípios do “modelo” de cogestão alemão (Telljohann, 2012), tanto mais que é necessário respeitar os sistemas de relações laborais nacionais, a assunção de compromissos com uma política de promoção de consensos e resolução de problemas é-lhe inerente;

iii) a Carta relativa a agência de trabalho temporário, celebrada em 2012 entre a administração mundial da VW, o CEM da VW, o CEE da VW, a FITIM e a IndustriAll, com o propósito de garantir uma aproximação de direitos salariais entre trabalhadores permanentes e trabalhadores temporários (Whittal et al., 2017);

iv) a Carta sobre Educação e Formação, subscrita em 2015 entre a administração mundial da VW, o CEM da VW, o CEE da VW e a FITIM, com o objetivo de criar condições adequadas aos trabalhadores em processo de aprendizagem (principiantes) (Whittal et al., 2017).

5. Conclusão

Reitero que os CEEs são muito provavelmente o instrumento normativo europeu que mais potenciou da participação laboral nas multinacionais. Porém, não deixam de ser ainda instituições em amadurecimento permanente (Waddington, 2011a; Hann, Hauptmeier e Waddington, 2017), o que significa que prevalecem múltiplos obstáculos à sua implementação e funcionamento: diferenças na capacidade formal dos representantes de trabalhadores exercerem o seu papel; processos nem sempre claros de seleção de representantes de trabalhadores; empresários para quem os CEEs são apenas organismos que podem ser usados para legitimar decisões que já foram tomadas; escassez de encontros entre os próprios representantes de trabalhadores além das reuniões formais; atribuição de um sentido utilitarista aos CEEs; difícil apreensão do sentido prático/eficácia dos CEE; prioridades nacionais que secundarizam a constituição de CEEs; indisponibilidade de representantes de trabalhadores para acumularem funções nos CEEs e noutros organizações de representação de trabalhadores; reduzido número de ações de formação sobre a missão e papel dos CEEs, etc. Na mesma linha, como assinalaram De Spiegelaere e Waddington (2017) ao analisarem 1.100 acordos no âmbito da Recast Directive, apenas se produziram efeitos nas definições de informação e consulta, assim como na definição de competências transnacionais. Mas noutros domínios ou não houve espaço para melhorias (como a formação e os comités restritos) ou houve apenas menções indiretas (como foi o caso da representação sindical), o que faz supor que a influência da Recast Directive ficou aquém do esperado.

Mas ainda que os CEEs não sejam geradores de relações laborais ideais cujo sucesso resida na obtenção permanente de compromissos e consensos (Whittal et al., 2017), a referência ao CEE da VW à luz da realidade portuguesa refletiu um conjunto de pontos de impacto positivo: a tradição de cultura negocial da VW, a “lei-VW” que a sustenta e a reforça, o não encerramento de fábricas, a preocupação com os problemas das filiais consideradas isoladamente e a resolução (ou empenho na tentativa de resolução) dos problemas (primeiro nacionalmente e, depois, caso no local não haja entendimento, via CEE), a concretização de uma prática do CEE que vai além dos termos formais do acordo que lhe dá vida, ou ainda uma articulação progressiva do CEE da VW com os acordos de empresa transnacionais.

Seria, todavia, precipitado dar o futuro como garantido. No que diz respeito à fábrica portuguesa, basta ter em conta, por exemplo, a tensão entre trabalhadores e administração da Autoeuropa que ocorreu em 2017 na sequência de um pré-acordo assinado em 28.07.2017 entre a administração e a comissão de trabalhadores. Esse pré-acordo previa a realização de 18 turnos de trabalho (três turnos diários de segunda a sábado, uma folga ao domingo e outra rotativa durante a semana) de modo a responder à necessidade de montar mais de 200 mil veículos por ano, resultantes da produção no novo modelo desportivo (o T-Roc). Esse acordo foi rejeitado pelas estruturas sindicais da CGTP e por parte de 75% dos trabalhadores (em votação em plenário). Um novo pré-acordo com vista à reorganização do tempo de trabalho (celebrado em 21.11.2017) entre a CT e a administração seria igualmente recusado, deixando no ar sinais de incerteza quanto ao futuro. Em ambos os casos, foi notório que a substituição do ex-líder da CT (que desempenhara igualmente um papel crucial no CEE ao longo de mais de duas décadas) desencadeou uma disputa sindical no sentido de conquistar o poder da CT, tanto mais que a administração continua a ver na CT o interlocutor privilegiado para o diálogo com os trabalhadores.

Os impactos da pandemia da COVID-19 (que não foram objeto de análise neste texto) trouxeram igualmente profundas incertezas nas relações laborais e no emprego (sobretudo atendendo aos milhares de trabalhadores temporários no Grupo VW em toda a Europa), quebras de produção e de expectativas que vieram igualmente abalar a eficácia dos CEE, a qual, por sinal, no caso da VW, sempre esteve muito ligada a conjunturas económicas favoráveis. A pandemia estará, pois, a testar uma vez mais a resistência dos CEEs. Em março de 2021, ao publicar os resultados de um inquérito online realizado no início do ano e ao qual responderam 476 membros de CEEs, o Instituto Sindical Europeu dava conta de alguns dos impactos da pandemia no trabalho real dos CEEs: as vídeoconferências tornaram-se numa má alternativa às reuniões face a face; o número de reuniões permaneceu o mesmo para metade dos respondentes, embora 1/4 tenham reportado a realização de mais ou de menos reuniões; a qualidade da informação e consulta deteriorou-se consideravelmente, assim como o funcionamento interno do CEE (para 1/3 dos inquiridos); apenas metade dos inquiridos foi regularmente informada sobre a situação geral da empresa (contra 78% em tempos normais); apenas 16% foram capazes de influenciar as decisões de gestão durante a pandemia (sendo de 23% antes da pandemia): a maioria considera que as relações com a administração se deterioraram, etc. (EWC Academy, 2021).

As incertezas que pairam no ar reforçam a importância dos CEEs enquanto mecanismo de monitorização permanente das relações laborais no reino dos “gigantes transnacionais”. Importa, pois, como aqui procurei demonstrar, usar o melhor que as boas práticas podem propiciar para conferir aos CEEs o sentido genuíno e emancipatório que esteve na base da sua constituição original.

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1Este artigo incorpora informações recolhidas ao abrigo do projeto “Rebuilding trade union power under austerity age: three sectors under review”, concluído em 2019, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT/MEC) e cofinanciado pelo FEDER através do Programa Operacional Competitividade e Inovação COMPETE 2020 no âmbito do projeto PTDC/IVC-SOC/3533/2014 - POCI-01-0145-FEDER-016808. O grosso da reflexão e resultados aqui contidos são anteriores ao cenário de pandemia ditado pela COVID-19.

2A Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) e a União Geral de Trabalhadores (UGT).

3A Confederação Empresarial de Portugal (CIP), a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) e a Confederação do Turismo Português (CTP).

4Por exemplo, a análise da negociação de acordos de CEEs realizada por Waddington (2011a: 70) vai no sentido de identificar uma presença sindical próxima dos 70%, ao passo que os trabalhos de investigação sobre CEEs das duas últimas décadas e os artigos deles resultantes mencionam o envolvimento sindical em 65% dos casos (Hann, Hauptmeier e Waddington, 2017: 216). De igual modo, no contexto português estima-se que a presença sindical nos CEEs se aproxima também desses valores (Costa e Costa, 2014).

5Trata-se, aliás, desde o início da constituição de CEEs, do setor mais representativo, como se pode constatar na síntese quantitativa produzida por De Spiegelaere e Jagodzinski (2015: 16) ou pela informação disponível em http://www.ewcdb.eu/stats-and-graphs (consultada em 4.08.2021).

66 Um CEE simbólico caracteriza-se por: ter apenas reuniões anuais; passividade dos representantes dos trabalhadores, deixando à administração a condução das reuniões; não realização de reuniões preparatórias ou de grupos de discussão; incapacidade de obtenção e processamento de informação além da que está estipulada no acordo; inclusão meramente formal de sindicatos.

7Num CEE etnocêntrico os representantes do país de origem da empresa dominam os procedimentos e estão mais próximos da administração. Os representantes dos outros países são marginalizados.

8Um CEE participativo tem como regra: desenvolver atividades para além das atribuições normalmente associadas aos CEEs; fomentar acordos e posições conjuntas com a administração com base em temas consensuais a todos os intervenientes; enfrentar questões complexas (como horários de trabalho ou proteção no local de trabalho) mediante o reconhecimento dos distintos interesses em jogo e processos de troca de informação adequados; intensificar interações internacionais; celebrar acordos sobre saúde e segurança, igualdade de oportunidades, informação e direitos sindicais, “Cartas Sociais”, etc. No mesmo sentido, um CEE eurocêntrico desenvolve uma identidade europeia clara, eleva níveis de confiança interna e de comunicação entre os membros e planeia uma agenda europeia comum.

9A investigação analisou os “recursos de poder” sindical em 3 empresas (Autoeuropa, TAP e PT-Altice) tendo sido a partir de um dos 6 critérios de análise aí trabalhados - “nacional/internacional” - que a problemática dos CEEs foi situada. Especificamente no contexto da Autoeuropa, foram realizadas entrevistas a responsáveis sindicais da Federação Intersindical das Indústrias Metalúrgicas, Químicas, Elétricas, Farmacêutica, Celulose, Papel, Gráfica, Imprensa, Energia e Minas (FIEQUIMETAL) e do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Transformadoras, Energia e Ambiente do Sul (Site-Sul), bem como a representante e ex-representante do CEE da VW e da comissão de trabalhadores. No universo da VW foi ainda entrevistado um representante do sindicato IG-Metall (Industriegewerkschaft Metall).

10Refiro-me a um representante de trabalhadores com grande experiência quer na comissão de trabalhadores, quer no campo sindical (tendo sido dirigente do sindicato mais representativo na empresa, o SITE-Sul, filiado na FIEQUIMETAL, federação da CGTP), quer no CEE e, inclusive, no select committee do CEE (órgão de poder mais importante do CEE da VW).

11Nesta secção retomo e atualizo alguns conteúdos provisoriamente formulados em Costa (2017).

12Mesmo tendo em consideração o cenário adverso ditado pela COVID-19, o Grupo é formado por 12 marcas de 7 países europeus: Volkswagen carros de passageiros, Audi, SEAT, ŠKODA, Bentley, Bugatti, Lamborghini, Porsche, Ducati, Volkswagen veículos comerciais, Scania e MAN. Opera em 118 fábricas, distribuídas por 20 países europeus e mais 10 países nas Américas, Ásia e África. Em todo o mundo, 662.575 funcionários produzem cerca de 34.900 veículos por dia. O Grupo VW vende os seus veículos em 153 países (http://www.volkswagenag.com/en/group/portrait-and-production-plants.html, página consultada em 4.08.2021).

13Sobre a relevância social da “lei VW”, enquanto garante de direitos de cogestão e solidariedade sindical internacional, cf. Speidel (2012) e Chora (2008).

14A fábrica portuguesa foi instalada em 1991 como joint-venture entre a Ford e o Grupo VW e desde 1999 somente composta pelo Grupo VW.

15Entretanto, esse valor foi alterado desde 2017, pois a produção de um novo modelo desportivo - o T-Roc - iniciada em 31.07.2017 aumentou o nº de trabalhadores para 5.912, ainda que no final de 2020 esse valor se situasse em 5.282 (http://www.volkswagenag.com/en/group/portrait-and-production-plants.html, página consultada em 4.08.2021).

16Esta quebra significativa do número de sindicalizados explica-se em parte pelo facto de o grosso dos trabalhadores mais jovens (mais afetados pela crise que se adensou em Portugal em 2011) preferirem poupar 1% da cota que descontavam para o sindicato. Além disso, na fábrica da Autoeuropa foi implantado um fundo de pensões desde 2011 para o qual cada trabalhador pode, se assim o entender, contribuir com 2% e a empresa com outros 2%. Muitos preferem, assim, descontar para o fundo de pensões em vez de descontarem para o sindicato (Costa, 2017).

17Para fazer face à quebra da produção de veículos em resultado da crise mundial do mercado automóvel, a CT e a administração da empresa acordaram que os trabalhadores efetuariam 22 de paragem por ano. Este acordo permaneceu sempre em vigor, apesar dos sindicatos se terem oposto a esse acordo em 2003: “Disseram-nos que em 2003 fizemos um acordo que até era ilegal porque não aumentámos os salários. Não é verdade! Nós reduzimos foi o tempo de trabalho em 22 dias por ano, conseguimos um prémio de 500 euros, nessa altura, que foi cinco vezes superior aos aumentos salariais que eles tiveram nessa época” (representante português dos trabalhadores do CEE do Grupo VW, entrevista, 22.04.2016). Na verdade. “o sindicato hoje diz que foi o ‘padrinho’ desse acordo mas fez uma campanha enorme contra o acordo: ‘não é com dias em casa que compra batatas’. Lembro-me perfeitamente dessas frases. Ficámos em casa a receber o salário mas durante dois anos não fomos aumentados. Ou seja, trocámos o aumento desses dois anos (7,2%) por dias.” (ex-representante português dos trabalhadores do CEE do Grupo VW, entrevista, 8.05.2018).

18Como afirmava um responsável da FIEQUIMETAL: “o papel do CEE passa por levar para lá problemas que muitas vezes não se conseguem resolver aqui porque as administrações não querem discutir (...). Por isso, já tivemos casos até em que eles já cá vieram propositadamente para tentar mediar” (entrevista com secretário-coordenador da FIEQUIMETAL, 2.03.2018).

Recebido: 20 de Setembro de 2021; Aceito: 25 de Novembro de 2021

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