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Revista Portuguesa de Imunoalergologia

Print version ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.31 no.1 Lisboa Mar. 2023  Epub Mar 31, 2023

https://doi.org/10.32932/rpia.2023.03.103 

PÁGINA EDUCACIONAL

Rinite alérgica local

Local allergic rhinitis

1 Serviço de Imunoalergologia, Hospitais da Universidade de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra,Coimbra, Portugal

2 Serviço de Imunoalergologia, Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, Vila Nova de Gaia, Portugal

3 Unidade de Imunoalergologia, Hospital CUF Porto e Instituto CUF Porto, Porto, Portugal


RESUMO

A rinite alérgica local (RAL) é um fenótipo de rinite que se caracteriza pela existência de sintomas clínicos sugestivos de rinite alérgica, mas sem evidência de sensibilização IgE-mediada, quer nos testes cutâneos por picada quer nos doseamentos de IgE específicas séricas. Na RAL a produção de IgE específica ocorre localmente, havendo evidência da presença de um padrão inflamatório Th2 a nível da mucosa nasal. Uma vez que os testes cutâneos por picada e as IgE específicas séricas são negativas, o diagnóstico de RAL implica a realização de provas de provocação nasal específicas com os aeroalergénios suspeitos. O seu tratamento farmacológico baseia-se na utilização das mesmas classes de medicamentos que habitualmente são usadas na rinite alérgica (corticoides intranasais e anti-histamínicos), apesar de não haver estudos de eficácia dirigidos. É de destacar, no entanto, que existem vários estudos a suportar o benefício e eficácia da imunoterapia com alergénios na RAL.

Palavras-chave: Rinite; rinite alérgica local; prova de provocação nasal específica; IgE local; imunoterapia específica com alergénios

ABSTRACT

Local allergic rhinitis (LAR) is a phenotype of rhinitischaracterizedd by the occurrence of clinical symptoms of suggestive allergic rhinitis, without evidence of IgE-mediated sensitization on skin prick tests or serum specific IgE quantification. In LAR the production of specific IgE is local and an inflammatory Th2 pattern in the nasal mucosa is present. Since skin prick tests and specific IgE are negative, a nasal allergen challenge with the suspected aeroallergens is required to make the diagnosis.

Similarly, to allergic rhinitis, pharmacological treatment with oral antihistamines and intranasal corticosteroids are the treatment of choice, although their efficacy currently remains to be proven. Allergen specific immunotherapy may be a promising therapeutic approach in LAR.

Keywords: Rhinitis; local allergic rhinitis; nasal allergen challenge; local IgE; allergen immunotherapy

Este artigo começa com um caso clínico sumário ilustrando um problema clínico frequente. Posteriormente, é apresentada evidência relativa a essa patologia, focando diferentes aspetos que se consideram clinicamente relevantes, incluindo formas de abordagem. O artigo termina com as recomendações clínicas dos autores, tendo por base o caso clínico inicial.

CASO CLÍNICO

Doente do sexo feminino, com 32 anos, psicóloga, com antecedentes de eczema atópico, foi enviada à consulta de Imunoalergologia por queixas persistentes de rinorreia anterior e posterior aquosa e prurido nasal com dois anos de evolução, que associava à exposição a pó doméstico e ambientes húmidos. Ao exame objetivo não apresentava alterações à inspeção e palpação nasais; na rinoscopia anterior apresentava hipertrofia bilateral dos cornetos inferiores e mucosa de coloração normal; e à auscultação pulmonar tinha murmúrio vesicular audível bilateralmente, simétrico, sem ruídos adventícios.

Pela clínica compatível com rinite iniciou tratamento com furoato de fluticasona 27,5 mcg/dose intranasal 2id e loratadina 10mg (SOS). O estudo imunoalergológico com testes cutâneos por picada (TCP) com aeroalergénios (extratos padronizados GA2LEN e Lepidoglyphus destructor (Ld)) e doseamento de IgE específicas a Dermatophagoides pteronyssinus (Dp), Dermatophagoides farinae (Df) e Ld (ImmunoCAP®, Thermo-Fisher) foram negativos. Considerando a negatividade do estudo e a forte associação das queixas à exposição a pó doméstico, foi colocada a hipótese diagnóstica de rinite alérgica local (RAL).

INTRODUÇÃO

Rinite alérgica local (RAL) define-se como uma resposta alérgica localizada ao epitélio nasal, sem evidência sistémica de atopia, isto é, sem qualquer positividade nos TCP ou IgE específica sérica 1,2. O termo “Rinite Alérgica Local” foi introduzido em 2009 por Carmen Rondón 3, embora estudos de Huggings e Brostoff que remontam a 1975 tenham sugerido esta entidade após deteção de IgE nas secreções nasais de doentes com rinite sem evidência de sensibilização alergénica nos TCP3. Em 2003, Powe et al. introduziram o termo “entopia” referindo-se à produção local de IgE, em oposição à “atopia”, produção sistémica de IgE 4. A sua prevalência na população geral é incerta, mas estima-se que corresponda a cerca de 21-25% das rinites crónicas 5. Entre indivíduos não atópicos com sintomatologia nasal sugestiva de etiologia alérgica, a sua prevalência pode aproximar-se dos 50-75%. Indivíduos com o diagnóstico de rinite não alérgica (RNA), não submetidos a prova de provocação nasal específica (PPNE) têm uma elevada probabilidade de diagnóstico alternativo de RAL 5,6. Vários estudos sugerem que a prevalência de RAL nas regiões mediterrâneas poderá ser mais elevada comparativamente aos países do Norte da Europa e Ásia. São escassos os estudos que avaliam a sua prevalência em adultos e crianças, mas estima-se que seja semelhante em ambas as faixas etárias 6.

A RAL é um fenótipo estável e não um estádio inicial de rinite alérgica (RA) 7, e ambas podem coexistir 8. Indivíduos com RAL manifestam sintomatologia que pode ser intermitente ou persistente, semelhante à dos doentes com RA, distinguindo-se apenas pela ausência de TCP ou IgE sérica específica positivos na RAL.

Esta entidade caracteriza-se por um padrão inflamatório do tipo Th2 a nível da mucosa nasal, onde há produção local de IgE específica durante a exposição natural a aeroalergénios e uma resposta positiva na PPNE 2,9.

Assim, a PPNE positiva na RAL faz a distinção da RNA 1,2. Trata-se de um meio de diagnóstico com alta sensibilidade, especificidade e reprodutibilidade, sendo por isso considerado o gold standard para o diagnóstico 2.

Asma e conjuntivite são as comorbilidades mais frequentemente associadas à RAL. À semelhança da RA, os ácaros do pó doméstico, nomeadamente o Dermatophagoides pteronyssinus, representam os desencadeantes mais comuns da RAL persistente 6,9. O pólen das gramíneas é o desencadeante mais relevante na RAL intermitente 6.

Curiosamente, a Alternaria alternata está mais frequentemente envolvida na RAL do que na RA6. Os epitélios de animais e o pólen de Olea europaea encontram-se menos frequentemente associados à RAL, em comparação com a RA, pelo menos no que diz respeito às regiões do Mediterrâneo 6. Similarmente ao que ocorre na RA, os doentes com RAL podem apresentar reatividade nasal a alergénios 6.

FISIOPATOLOGIA

A fisiopatologia da RAL é semelhante à da RA, mas limitada ao epitélio nasal. Numa fase de sensibilização alérgica, as células dendríticas presentes na mucosa nasal captam o alergénio e transportam-no até aos gânglios linfáticos. Aí, o alergénio é apresentado às células T naive, originando linfócitos Th1 e Th2 específicos do alergénio.

Ainda no gânglio, as células Th1 comunicam com células B naive, originando células B memória (IgG+) específicas do alergénio, que, bem como as células Th2, atingem a corrente sanguínea e consequentemente a mucosa nasal. Concomitantemente à ativação das células dendríticas, são também ativadas as células linfoides inatas tipo 2, que, por sua vez, produzem IL-4, IL-5 e IL-13.

Estas citocinas assumem preponderância quer numa fase precoce, estimulando a maturação das células dendríticas, quer na fase de reexposição ao alergénio, onde são adjuvantes no processo de class switch recombination das células B memória IgG+ para IgE+, levando à produção de elevada quantidade de IgE por plasmócitos IgE+ 10.

Esta IgE vai-se ligar ao FcεRI presente na membrana dos mastócitos da mucosa. Aquando da sua ativação, gera-se assim um infiltrado inflamatório padrão T2, com um aumento de mastócitos e eosinófilos locais, com libertação de mediadores pró-inflamatórios, como triptase e proteína catiónica eosinofílica 3. Na RA, a quantidade de IgE produzida é suficiente para saturar os FcεRI da mucosa nasal, atingir a corrente sanguínea, saturar os FcεRI dos basófilos circulantes e acabar por se ligar aos FcεRI dos mastócitos cutâneos (daí a positividade nos testes cutâneos e nos doseamentos de IgE), enquanto na RAL a IgE produzida não é suficiente para ser detetada à distância11. Apesar de nem todos os trabalhos serem concordantes no que toca à deteção de IgE na mucosa nasal de indivíduos com RAL, um estudo recente que recorreu à colocação de esponjas intranasais para colheita de secreções mostrou a presença de IgE em >90% dos doentes 12.

Embora as semelhanças entre RAL e RA sugiram que possam trata-se de diferentes fases de sensibilização ao alergénio, estudos de seguimento comprovaram que a RAL é um fenótipo diferente da RA e que não evolui para atopia sistémica a longo prazo 5,6.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de RAL deverá ser considerado num doente com suspeita de RA, cujos resultados dos TCP e doseamento de IgE específicas séricas (IgEs) para aeroalérgenios relevantes sejam negativos (Figura 1) 13-15. Por outro lado, a sensibilização local e sistémica a diferentes aeroalergénios pode coexistir, e o diagnóstico de RAL deverá também ser considerado quando o perfil de sensibilização não explica adequadamente o padrão dos sintomas nasais 4,8,14. Por exemplo, um doente com sintomas peranuais e exacerbações sazonais poderá revelar uma sensibilização apenas a alergénios sazonais e uma PPNE positiva a alergénios perenes, ou vice-versa 8,14.

Este fenótipo foi observado tanto em crianças como em adultos e denomina-se rinite alérgica dupla (RAD) (dual allergic rhinitis) 8,14,16. Neste contexto, uma história clínica dirigida ao padrão de sensibilização e métodos que avaliem possíveis sensibilizações locais são essenciais para o diagnóstico de RAL. O exame físico e meios complementares de diagnóstico adicionais são de igual importância para diferenciar distúrbios nasais de apresentação semelhante. Alguns dos diagnósticos diferenciais a considerar incluem a rinossinusite crónica com e sem polipose nasal, subfenótipos de rinite não alérgica, por exemplo atrófica, medicamentosa ou hormonal, doenças sistémicas como a fibrose quística, discinesia ciliar primária, granulomatose, sarcoidose e amiloidose e alterações anatómicas do nariz 8,14,16.

Prova de provocação nasal específica

A PPNE é considerada o gold standard para o diagnóstico de RAL 13. Consiste num método de indução de uma resposta nasal específica, através da colocação do alergénio a ser testado na mucosa nasal, ao nível dos cornetos inferiores 9,13,17. Trata-se de um procedimento de fácil execução, com elevada especificidade e sensibilidade, reprodutível, e com metodologia padronizada a nível europeu, com valores cut-off de positividade bem definidos 13,14. As suas limitações incluem a imprecisa padronização dos extratos de aeroalergénios, o incómodo causado ao doente pela possível indução de sintomas, o tempo e material específico necessários para a sua execução 13,14,18. A prova é segura em crianças e adultos, incluindo doentes com asma, desde que cumpridas as devidas indicações e precauções 14,19. Uma análise retrospetiva de 11499 PPNE, realizadas em 518 crianças e 5830 adultos, não observou qualquer efeito adverso sistémico ou respiratório inferior, mesmo nas provas com múltiplos alergénios e sessões 19. Nesse mesmo estudo, a administração do alergénio a nível nasal usando spray e micropipeta foram igualmente seguros 19.

Figura 1 Algoritmo diagnóstico de rinite crónica (Adaptado de 11

Previamente à realização da PPNE deverá ser garantido um período de estabilização clínica de pelo menos 4 semanas para qualquer doença alérgica de base. No que se refere à suspensão prévia dos corticoides nasais, as recomendações variam entre 48 horas e 4 semanas. Enquanto o Comité de Rinoconjuntivite da SEAIC e uma revisão da AAAAI recomendam a suspensão 48 a 72 horas, o grupo Allergic Rhinitis - Clinical Investigator Collaborative recomenda 2 semanas e o estudo previamente mencionado que incluiu 11499 PPNE recomendou aos participantes a suspensão pelo menos 4 semanas antes da PPNE 19-22. Relativamente aos anti-histamínicos e vasoconstritores nasais, estes devem ser suspensos durante 2 semanas e 1 semana, respetivamente. Infeções virais ou bacterianas agudas implicam adiar a prova pelo menos 4 semanas e cirurgia nasal ou dos seios paranasais pelo menos 6 a 8 semanas 13,14,18. Outras precauções temporárias incluem a suspensão do consumo de álcool e tabaco durante 48 horas, e em provas com alergénios sazonais a PPNE deverá ser realizada pelo menos 4 semanas após a época polínica respetiva 13,14,18. As contraindicações absolutas incluem idade inferior a 5 anos, gravidez, asma não controlada ou outra doença obstrutiva com volume expiratório máximo no 1.º segundo ou pico de fluxo expiratório inferior a 70% do previsto, comorbilidades graves, como doença cardiopulmonar instável com diminuição da capacidade pulmonar, tumores malignos ou doenças autoimunes, perfuração do septo nasal, reação anafilática, imunoterapia em curso com o respetivo alergénio e utilização de extratos alergénios não padronizados na PPNE 13,14,18. Relativamente à padronização dos extratos alergénicos, recomenda-se a utilização de kits comerciais pela sua melhor padronização.

As diluições, o modo e frequência de administração podem variar entre os kits comerciais e, portanto, devem ser seguidas as indicações de cada fabricante. Desta forma é assegurada a segurança, precisão e reprodutibilidade da prova, ainda que as próprias diferenças referidas entre kits possam implicar viés nos resultados 13,14,18.

Não existe atualmente nenhum critério de positividade universal para definir o resultado da PPNE, pelo que as recomendações apoiam a utilização adaptada de métodos que avaliem parâmetros subjetivos (esternutos, prurido nasal, rinorreia, obstrução nasal e sintomas oculares) e parâmetros objetivos (patência nasal) 13.

Para a avaliação dos parâmetros subjetivos várias escalas estão recomendadas: a escala de Linder, escala de Lebel, total nasal symptom score (TNSS, score total de sintomas nasais) e a escala visual analógica, sendo as duas últimas as mais utilizadas 13. Para a avaliação de parâmetros objetivos estão disponíveis várias técnicas: pico do fluxo nasal inspiratório (PNIF, peak nasal inspiratory flow), rinometria acústica ou rinomanometria. A técnica mais utilizada na prática clínica diária é o PNIF, pela sua simplicidade, custo e portabilidade. A rinometria acústica é uma técnica objetiva não invasiva, que mede a área e o volume da cavidade nasal através de ondas sonoras emitidas através das narinas, enquanto a rinomanometria se baseia na medição do fluxo e pressão transnasal, permitindo calcular a resistência nasal ao fluxo aéreo 23,24.

Apesar da utilidade da avaliação objetiva, nem todos os centros têm os meios técnicos disponíveis, o que limita a avaliação da resposta na PPNE. Realça-se que a concordância entre os parâmetros subjetivos e objetivos nem sempre se verifica, pelo que as guidelines da European Academy of Allergy and Clinical Immmunology (EAACI) recomendam a utilização concomitante de medidas subjetivas e objetivas, que avaliam aspetos diferentes da obstrução nasal e poderão ser usadas em conjunto para definir a positividade na PPNE 13. O futuro da avaliação objetiva poderá passar pela utilização de técnicas computorizadas, como a “Dinâmica de fluidos computorizada” (por exemplo o Flowgy®) 25; no entanto, a utilidade desta técnica na avaliação da resposta na PPNE ainda não está estabelecida e será limitada pela necessidade de imagem de tomografia computorizada. IgE específica nasal e teste de ativação de basófilos (TAB)

A quantificação de níveis de IgE específicas nasais (NIgEs) e o TAB são métodos adicionais úteis para o diagnóstico de RAL e RAD. As amostras de secreções e mucosa nasal podem ser obtidas através de métodos invasivos como a biópsia, escovagem e raspagem, ou não invasivos, como a lavagem nasal e esponjas nasais 26,27.

As técnicas laboratoriais para a deteção de NIgEs são as mesmas utilizadas para o doseamento de IgE específicas séricas (ImmunoCAP, ELISA, Microarray ou RIA) 26.

A quantificação de NIgEs apresenta uma especificidade de 100%, no entanto uma sensibilidade global de 20-60%, que varia consoante a técnica de colheita utilizada. Para obter a máxima sensibilidade é aconselhada uma PPNE prévia ao doseamento e o uso técnicas de colheita que evitem diluição da amostra 2,14,28. Apesar da comodidade e elevada especificidade, o doseamento de NIgEs carece de padronização, o seu custo é elevado e não se encontra disponível em todos os centros. O TAB, ao invés da deteção de NIgEs, é um método validado, com valores de cut-off bem definidos para positividade e que não requer PPNE prévia para obter a máxima sensibilidade.

A especificidade do TAB para o diagnóstico RAL e RAD é de 100%, enquanto a sensibilidade é de cerca de 50-66% 14,28,29. Um TAB positivo, para além de evidenciar a presença de NIgEs, indica que as NIgEs presentes são funcionais 14,15. Apesar da elevada especificidade de ambos os métodos e da padronização do TAB, estas técnicas atualmente são aconselhadas apenas como suporte à PPNE, quando existem contraindicações para realização da PPNE ou em contexto de investigação 2,14,28.

TRATAMENTO

A RA e a RAL partilham características clínicas e imunológicas, pelo que a abordagem terapêutica pode ser similar, incluindo, por exemplo, educação para a saúde, evicção alergénica e tratamento sintomático com anti-histamínico oral e corticoide nasal 2. Por outro lado, os anti-histamínicos intranasais, apesar de por norma serem menos eficazes do que o corticoide nasal na RA, têm um efeito significativo na congestão nasal e na redução do prurido e dos esternutos, com eficácia igual ou superior à dos anti-histamínicos orais de segunda geração, podendo a terapêutica combinada com o corticoide nasal trazer benefícios adicionais 9. No entanto, a maioria dos tratamentos farmacológicos não foram testados especificamente na RAL, sendo a sua eficácia extrapolada do uso na RA. Nos doentes com RA que não respondem completamente à terapêutica farmacológica, está indicada a imunoterapia com alergénios (ITA). A ITA é atualmente o único tratamento que tem a capacidade de modificar a história natural da doença, aumentando a tolerância imunológica, reduzindo os sintomas clínicos e a necessidade de medicação 2.

Além de muito eficaz, é segura e confere benefício clínico a longo prazo 2. Dadas as semelhanças entre a RA e a RAL, vários estudos têm sido feitos para avaliar o potencial da imunoterapia subcutânea (SCIT) com alergénios no tratamento da RAL. Três ensaios clínicos randomizados duplamente cegos controlados por placebo, respetivamente de SCIT com Dp 30, com Phleum pratense 31 e com Betula verrucosa 32, vieram recentemente suportar a eficácia clínica da SCIT mantida a curto e a longo prazo em doentes com RAL. Esta eficácia reflete-se principalmente numa melhoria da gravidade da rinite, dos sintomas e da necessidade de medicação.

Os três estudos mostraram ainda que a SCIT induz um aumento significativo da tolerância alergénica, bem como um aumento progressivo dos níveis séricos de sIgG4 2. Estes resultados confirmam que a SCIT é um tratamento eficaz para a RAL, com um impacto muito positivo na qualidade de vida dos doentes 2.

CONCLUSÃO

No caso clínico descrito, a clínica de rinite era desencadeada, de forma reprodutível, após contacto com pó doméstico, sugerindo alergia a ácaros. Nesse sentido foi realizada PPNE com extrato de Dp que se revelou positiva segundo o TNSS (score 7 aos 5 minutos), confirmando o diagnóstico de RAL. Realizou a posteriori PPNE com Ld que foi negativa. Foi prescrita imunoterapia específica subcutânea com extrato de Dp a 100%.

Atualmente cumpre o terceiro ano de tratamento, com melhoria significativa da sintomatologia nasal, sem necessidade de terapêutica de manutenção, apresentando rinorreia anterior esporádica, que resolve com a toma de loratadina SOS.

A RAL é um fenótipo de rinite, em que, como o próprio nome indica, a resposta alérgica ocorre localmente.

O diagnóstico é feito pela PPNE. O seu tratamento é semelhante ao da RA, destacando-se o benefício e eficácia da ITA, apesar de não existir evidência de alergia sistémica. É importante a sua divulgação e conhecimento para evitar o subdiagnóstico, que pode limitar a orientação e tratamento adequado destes doentes.

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Recebido: 21 de Dezembro de 2021; Aceito: 06 de Fevereiro de 2023

Autor correspondente: Márcio Mesquita Serviço de Imunoalergologia, Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, Vila Nova de Gaia, Portugal Email: m.mesquita.296@gmail.com

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