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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.43 no.2 Lisboa jun. 2020  Epub 22-Abr-2020

https://doi.org/10.19084/rca.19242 

Artigo

Estratégias de manejo para melhoria da camada de enraizamento profunda de um Latossolo

Management strategies to deep rooting layer improvement of an Oxisol

Marcieli Piccin1 

Telmo J. C. Amado1 

Jackson E. Fiorin2 

1Departamento de Solos - Universidade Federal de Santa Maria, Avenida Roraima, 1000, CEP 97105-900, Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil

2Cooperativa Central Gaúcha Ltda (CCGL-Tec), RS 342, CEP 98005-970, Cruz Alta, Rio Grande do Sul, Brasil


Resumo

A longa duração do sistema plantio direto tem causado limitações para o solo, como a compactação e a acidez subsuperficiais. O objetivo deste trabalho foi avaliar os efeitos de estratégias de manejo sobre os atributos do solo e a produtividade da soja. O experimento foi realizado em um Latossolo nas safras agrícolas de 2016/17 e 2017/18 e seu delineamento experimental foi de blocos ao acaso com três repetições. Os tratamentos foram constituídos pela aplicação de estratégias de descompactação (escarificação e subsolagem) e de melhoria química (óxido de cálcio e magnésio, calcário e gesso), utilizadas de forma isolada e combinada. As amostragens de solo para análise química e a determinação da resistência à penetração do solo foram realizadas 6 e 18 meses após a aplicação dos tratamentos. A escarificação e a subsolagem foram eficientes na redução da resistência à penetração, mas apresentaram efeito temporário no solo. A subsolagem intensa associada à aplicação profunda de óxido de cálcio e magnésio, após 18 meses da aplicação, incrementou os valores de pH e os teores de cálcio e magnésio, além de neutralizar a saturação por alumínio até 60 cm. Em ambas as safras avaliadas, não houve efeito significativo dos tratamentos sobre a produtividade da soja.

Palavras-chave: Sistema plantio direto; resistência à penetração; acidez subsuperficial

Abstract

The long term use of the no-tillage system has caused limitations to the soil, such as the subsurface compaction and acidity. The aim of this study was to evaluate the effect of management strategies on soil attributes and soybean yield. The experiment was carried out in the 2016/17 and 2017/18 crop seasons and its experimental design was a randomized blocks with three replications. The treatments were constituted by strategies of physical improvement (chiseling and subsoiling) and chemical improvement (calcium and magnesium oxide, limestone and gypsum), isolated or combinated. Soil samplings for chemical analysis and determination of resistance to soil penetration were performed 6 and 18 months after application of treatments. The chiseling and subsoiling were efficient in reduction compaction, but presented temporary effects in the soil. The intense subsoiling associated with the deep application of calcium and magnesium oxide, 18 months after the application, increased the pH values and the calcium and magnesium contents in addition to neutralizing the aluminum saturation to the depth of 60 cm. In both evaluated seasons, there was no significant effect of treatments on soybean productivity.

Keywords: No-tillage system; penetration resistance; subsurface acidity

INTRODUÇÃO

No mundo, mais de 150 milhões de hectares de solo são cultivados sob sistema plantio direto (SPD) (Kassam et al., 2015). No Brasil, este sistema começou a ser implantado na década de 70 com o objetivo de evitar a erosão do solo e é baseado em três premissas básicas: ausência de revolvimento do solo, manutenção de cobertura do solo durante todo o ano e rotação de culturas (Hobbs et al., 2008). De acordo com Soratto e Crusciol (2008), o SPD é uma das melhores alternativas para o manejo sustentável dos recursos naturais na exploração agrícola dos solos tropicais e subtropicais, além de ser uma estratégia que auxilia na redução das perdas de água e solo pela erosão, devido à manutenção de cobertura sobre o solo (Schick et al., 2014).

No entanto, a aplicação superficial de fertilizantes e corretivos associada à ausência de preparo do solo expõe o solo à compactação, acidez e toxidez de alumínio em subsuperfície, limitações que podem afetar o crescimento e desenvolvimento radicular das plantas (Dalla Nora e Amado, 2013). É comum os Latossolos tropicais, sobretudo os argilosos, apresentarem uma transição abrupta de qualidade química (Amado et al., 2009) e física (Reichert et al., 2009a) ao longo do seu perfil, apresentando uma camada superficial (geralmente de 0 a 7 cm) com elevada concentração de nutrientes e pH mais elevado associados à menor densidade do solo e, abaixo dela, uma camada subsuperficial (geralmente de 7 a 20 cm), com elevada saturação por alumínio, baixa concentração de nutrientes, pH baixo e com problemas de compactação.

A acidez e a toxidez por alumínio dos Latossolos se explica principalmente à correção de pH do solo, que no SPD é feita através da aplicação superficial de calcário. Este corretivo atua no solo em camadas superficiais, até no máximo 10 cm, o que ocorre devido à baixa solubilidade do calcário e às reduzidas doses aplicadas. Desta forma, os efeitos benéficos da calagem, como a elevação do pH, dos teores de Ca e Mg e neutralização do Al+3 normalmente se restringem às zonas de aplicação ou imediatamente abaixo delas (Pöttker e Ben, 1998).

Segundo Beulter e Centurion (2004), a compactação afeta a distribuição das raízes das plantas no solo, pois altera a estrutura do mesmo, principalmente devido à redução da porosidade, principalmente da macroporosidade, o que afeta a disponibilidade de água no solo.

A resistência mecânica à penetração do solo (RP) pode representar a condição de compactação do solo e a sua influência no enraizamento das plantas (Bengough et al., 2011), pois está relacionada à coesão do solo e pode servir como indicador para apoiar a decisão de realizar ou não a escarificação mecânica (Drescher et al., 2016). No entanto, Whiteley et al. (1981) relatam que a pressão exercida pela haste do penetrômetro pode ser diferente da realmente exercida pelas raízes das plantas, sobretudo em solos não mobilizados, os quais frequentemente possuem canais preferenciais, de origem biológica, que podem ser utilizados pelas raízes durante o crescimento e que apresentam resistência reduzida.

Os valores críticos de RP ao crescimento radicular podem sofrer variações de acordo com o tipo de solo, umidade, teor de matéria orgânica do solo (MOS), com a cultura e, até mesmo entre as cultivares. Como padrão, Taylor et al. (1966) definiram que valores de RP acima de 2,0 MPa são limitantes ao crescimento das raízes e desenvolvimento da parte aérea da maioria das culturas de interesse agrícola.

A soma dos efeitos da compactação, acidez e toxidez de Al+3 do solo subsuperficial podem potencializar os danos causados por situações de déficit hídrico, comuns no Rio Grande do Sul. Nesse contexto, este estudo teve como objetivo avaliar se a aplicação profunda de óxido de Ca e Mg associada à descompactação é eficiente para a melhoria dos atributos físicos e químicos da camada de enraizamento profunda de um Latossolo.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi realizado próximo da cidade de Dois Irmãos das Missões no sul do Brasil (27º 67’ S 53º 56’ O e 525 m de altitude) em um Latossolo Vermelho Distrófico típico de textura argilosa (EMBRAPA, 2018) ou Rhodic Ferralsol (IUSS Working Group WRB, 2014). O clima da região é classificado como Subtropical Úmido (Cfa) (Köppen, 1938) e a precipitação pluvial durante o período experimental pode ser observada na Figura 1.

Figura 1 Precipitação pluvial diária e acumulada durante o período experimental. 

Anteriormente à implantação do experimento, a área foi manejada sob sistema plantio direto por aproximadamente 20 anos. No verão, a área era cultivada com soja (Glycine max L.) e no inverno com a cobertura de aveia (Avena strigosa L.), azevém (Lollium multiflorum L.) e nabo-forrageiro (Raphanus raphanistrum L.). O experimento foi implantado em outubro de 2016, anteriormente à semeadura da soja (cultivar NS5909) e os atributos químicos e físicos do solo no momento da implantação estão descritos no Quadro 1.

Quadro 1 Caracterização química e física da área experimental anteriormente à aplicação dos tratamentos 

Prof. pH H+Al Al CTC M.O. Sat. Ca Sat. Mg V m S P RP
cm H2O -- cmolc dm-3 -- ------------------ % ------------------ - mg dm³ - KPa
0-10 10-20 20-40 40-60 60-80 80-100 5,2 5,1 5,2 5,1 5,2 5,2 5,1 5,6 5,3 5,6 5,2 5,1 0,2 0,5 0,5 0,7 0,6 0,7 11,7 10,3 9,2 8,9 8,0 7,4 3,8 2,7 2,4 1,9 1,5 1,2 40,8 33,7 31,1 27,0 24,9 21,4 10,6 8,9 9,6 9,0 9,6 8,5 56,1 45,5 43,0 37,1 35,1 30,4 3,6 9,8 12,1 17,9 17,6 22,2 10,9 16,9 13,6 16,0 11,6 11,7 14,1 3,7 2,0 1,6 1,4 1,6 1123 2974 2364 1763 - -

Prof. - Profundidade; H+Al - Acidez potencial; Al - Alumínio; CTC - Capacidade de troca de cátions; M.O. - Matéria orgânica; Sat. Ca - Saturação por cálcio; Sat. Mg - Saturação por magnésio; V - Saturação por bases; m - Saturação por Al; S - Enxofre; P - Fósforo; RP - Resistência à penetração do solo.

Como ferramentas de melhoria da qualidade química do solo foram utilizados o óxido de Ca e Mg (ou cal virgem), calcário e a associação de gesso e calcário. O óxido de Ca e Mg possuía poder relativo de neutralização total (PRNT) de 183% e sua concentração de CaO e MgO é de 60% e 30%, respectivamente. O calcário utilizado neste trabalho foi o magnesiano, o qual possuía concentrações de CaO e MgO de 25% e 10%, respectivamente e PRNT de 71%. O gesso agrícola (CaSO4-.2H2O) utilizado possuía concentração de Ca de 15% (150 g kg-1 de Ca2+) e de S de 11% (110 g kg-1 de S O 4 2- -S).

Para atenuar os efeitos da elevada resistência à penetração da subsuperfície do solo, foram utilizadas duas ferramentas: a escarificação e a subsolagem. A escarificação (até 30 cm) foi realizada utilizando um escarificador da marca Jan®, modelo Matic, o qual consistia de hastes escarificadoras com espaçamento de 50 cm entre elas. A subsolagem (até 50 cm) foi realizada através da utilização de um implemento chamado de adubador de perfil da marca Kamaq®, que possuía distância entre hastes de 70 cm. As hastes de ambos os implementos são do tipo reta-inclinada.

O subsolador utilizado possuía uma caixa armazenadora acoplada e desta forma foi possível realizar a aplicação profunda de corretivos que, por questões operacionais, foi o óxido de Ca e Mg. A aplicação era feita através de aberturas localizadas nas hastes do implemento que aplicava o corretivo no solo, simultaneamente à descompactação, através da ação da gravidade em três profundidades no solo (10, 30 e 50 cm).

O delineamento utilizado foi de blocos ao acaso com três repetições, e os tratamentos utilizados foram: Test. - Testemunha; T1 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm; T2 - Escarificação com espaçamento de 50 cm; T3 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg (1,2 Mg ha-1) com espaçamento de 70 cm; T4 - Escarificação com espaçamento de 50 cm + aplicação superficial de óxido de Ca e Mg (1,2 Mg ha-1); T5 - Aplicação superficial de óxido de Ca e Mg (1,2 Mg ha-1); T6 - Aplicação de calcário (3,0 Mg ha-1) + gesso (3,0 Mg ha-1) em superfície; T7 - Aplicação de óxido de Ca e Mg (1,2 Mg ha-1) + calcário (3,0 Mg ha-1) + gesso (3,0 Mg ha-1) em superfície; T8 - Subsolagem com espaçamento de 35 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg (1,2 Mg ha-1) com espaçamento de 70 cm.

A aplicação do T8 foi realizada através de duas passadas intercaladas do subsolador. No entanto, a aplicação de corretivo foi realizada apenas em uma das passadas do implemento, fazendo que o espaçamento da subsolagem fosse de 35 cm e o da aplicação de corretivo fosse de 70 cm.

Foram realizadas duas coletas de solo (6 e 18 meses após a aplicação) através da abertura de trincheiras no solo de 0,3 x 0,3 x 1 m com o uso de um perfurador de solo. As profundidades de coleta foram: 0,00-0,10; 0,10-0,20; 0,20-0,40 e 0,40-0,60. A análise completa do solo foi realizada no laboratório pertencente à CCGL (Cooperativa Central Gaúcha Ltda) em Cruz Alta e seguiu a metodologia proposta por Tedesco et al. (1995).

A avaliação da resistência à penetração do solo (RP) foi realizada nos mesmos momentos das coletas de solo através do uso de um penetrômetro automático (SoloTrack PLG5300 da marca Falker®). As leituras foram realizadas a cada centímetro até 60 cm de profundidade através de uma célula de carga e inserção da haste a uma velocidade de 0,024 m s-1. Como o solo era argiloso, a ponteira utilizada foi do tipo cone 2 (de diâmetro 12,83 mm) com um ângulo de 30º (ASABE, 2009). As leituras foram feitas em transectos de modo a realizar 20 leituras por tratamento. Para determinação da umidade do solo no momento das leituras, foram coletadas amostras de solo (3 repetições) nas camadas de 0,00-0,10; 0,10-0,20; 0,20-0,40 e 0,40-0,60 que foram secas em estufa de ar forçado à 65ºC até peso constante. A umidade do solo na primeira e na segunda avaliação era de 0,25 g g-1 e de 0,23 g g-1, respectivamente.

A determinação da produtividade da soja foi realizada através da colheita de 3 repetições de 4 metros lineares de soja. A umidade dos grãos foi determinada em cada repetição e a produtividade foi corrigida para a umidade de 13%.

Os resultados da análise química, de resistência à penetração e produtividade foram submetidos ao teste de normalidade de Shapiro-Wilk, análise de variância (ANOVA) e posteriormente, tiveram suas médias comparadas pelo teste de Tukey à 5% de significância, utilizando o software R (R Core Team, 2019).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização química e física do solo anteriormente à aplicação dos tratamentos

O solo selecionado para a realização do experimento foi um Latossolo Vermelho Distrófico típico (EMBRAPA, 2018), o qual naturalmente é mais ácido e pobre em nutrientes nas suas camadas mais profundas, apresentando uma redução da qualidade química com o avanço da profundidade do solo, principalmente quando os mesmos são manejados sob SPD de longa duração (Amado et al., 2009). Pode-se verificar no Quadro 1, que todas as camadas amostradas apresentaram atributos do solo, tais como o pH e a saturação por bases, abaixo do limite proposto pela CQFS-RS/SC (2016) (pH < 5,5 e V% < 65%). A saturação por alumínio (m) nas camadas abaixo de 20 cm também estão acima do limite proposto pela CQFS-RS/SC (2016) (m < 10%). Estas condições evidenciam a necessidade da aplicação de corretivo no solo capaz de promover a atenuação das limitações anteriormente descritas.

Em relação aos atributos físicos do solo, pode-se verificar no Quadro 1, o aumento dos valores de RP do solo até os 40 cm de profundidade, ao passo que, nas camadas de 0,10-0,20 e 0,20-0,40 m estes valores ultrapassaram o limite crítico proposto por Klein e Camara (2007), que determinam que resistências superiores à 2,0 MPa são limitantes para o crescimento e desenvolvimento, tanto das raízes, quanto da parte aérea das culturas.

Para superar o problema da compactação subsuperficial do solo, algumas práticas de manejo podem ser utilizadas, tais como a rotação de culturas, a escarificação e a subsolagem. Botta et al. (2010) reportaram em seu trabalho que o uso da escarificação e da subsolagem foi eficiente na atenuação da compactação do solo e pode acarretar no incremento da produtividade das culturas (Liu et al., 2016).

Variabilidade da precipitação pluvial durante o ciclo da soja

A disponibilidade hídrica é um dos fatores climáticos que mais afetam a produtividade agrícola, sendo este o fator que rege a distribuição das espécies em diferentes zonas climáticas (Morando et al., 2014). A produtividade da cultura da soja pode variar conforme a quantidade e a distribuição da precipitação durante o ciclo da cultura (Franke e Dorfman, 2000) e, para possibilitar a obtenção de elevadas produtividades em áreas não irrigadas, é necessário que a oferta hídrica permaneça entre 650 e 700 mm (EMBRAPA, 2007). A cultura da soja necessita em média 7,5 mm dia-1 de água no seu período mais crítico (florescimento) e, se neste período a disponibilidade de água for insuficiente, as plantas podem ter seu crescimento e desenvolvimento prejudicados, refletindo diretamente na sua produtividade.

Na Figura 1, é possível observar a diferença da disponibilidade hídrica à cultura da soja entre as safras avaliadas. Na safra 2016/17, a precipitação acumulada foi de 688,5 mm e o ciclo da soja foi de 146 dias, o que forneceu em média 4,71 mm dia-1. Na safra 2017/18, a precipitação acumulada durante o ciclo de 132 dias foi de 499 mm, o que forneceu em média 3,78 mm dia-1 de água às plantas.

Resistência mecânica à penetração do solo após a aplicação dos tratamentos

O uso de ferramentas mecânicas de descompactação foi eficiente para reduzir os valores de RP do solo (Figura 2), pois, de acordo com Abreu et al. (2004), ao realizarem a mobilização, essas ferramentas atuam na redução da coesão do solo. Reinert et al. (2008) também relatam a eficiência destas ferramentas para a mitigação da compactação, as quais afetam também a taxa de infiltração, a capacidade de armazenamento de água no solo, reduzem a densidade do solo e aumentam a macroporosidade do solo (Colussi et al., 2014).

Figura 2 Teste de DMS (Tukey à 5% de significância) da resistência à penetração do solo; a) 6 meses após a implantação dos tratamentos; b) 18 meses após a implantação dos tratamentos. DMS - diferença mínima significativa; esp. - espaçamento entre passadas da haste subsoladora. 

É possível observar na Figura 2a que os valores de RP até a camada de 35 cm não ultrapassaram os 2,0 MPa quando utilizadas estratégias de manejo mecânico de descompactação do solo, sendo que este valor é considerado como limite crítico para o crescimento radicular e desenvolvimento das culturas. No entanto, pode-se verificar que após 18 meses da descompactação mecânica (Figura 2b), este efeito foi reduzido. Esse comportamento corrobora com o observado por Busscher et al. (2000), os quais afirmam que solos profundos como os Latossolos com precipitação abundante durante o ano, possuem elevado risco de re-compactação após serem realizadas operações mecânicas de descompactação do solo. De acordo com Drescher et al. (2016), os efeitos da escarificação mecânica sobre a resistência à penetração do solo vão sendo atenuados ao longo do tempo e podem persistir por até 24 meses. Reichert et al. (2009b) reportam que os efeitos da escarificação não são observados a médio ou longo prazo, podendo persistir no solo por período igual ou inferior a um ano.

Atributos químicos do solo afetados pela aplicação dos tratamentos

Após 6 meses da aplicação dos tratamentos, não houve efeito significativo dos tratamentos sobre os valores de pH, m e saturações por Ca e Mg a partir de 20 cm de profundidade (Quadro 2). Esse comportamento pode ser atribuído ao pouco tempo decorrido após a aplicação, o qual possivelmente não tenha sido suficiente para possibilitar a completa solubilização e reação dos corretivos utilizados, inclusive daqueles que foram incorporados no solo. Fidalski et al. (2015) também não observaram efeito significativo da incorporação de calcário em um Latossolo argiloso sobre estes atributos após 6 meses da aplicação.

Quadro 2 Efeito dos tratamentos sobre os atributos químicos 6 meses após a aplicação 

Prof. (cm) Tratamentos
Test. T1 T2 T3 T4 T5 T6 T7 T8
pH (H2O)
0-10 10-20 5,25b 5,10ab 5,45ab 5,40a 5,20b 5,10ab 5,13b 4,90b 5,60a 5,25ab 5,33ab 5,23ab 5,25ab 5,10ab 5,45ab 5,20ab 5,28ab 5,43a
20-40 5,18ns 5,35ns 5,08ns 5,20ns 5,25ns 5,30ns 5,18ns 5,33ns 5,53ns
40-60 5,18ns 5,23ns 5,05ns 5,10ns 5,10ns 5,28ns 5,18ns 5,25ns 5,38ns
m (%)
0-10 2,00b 1,13ab 4,08ab 11,95a 0,30b 3,45ab 1,20b 1,20b 3,30ab
10-20 9,95bc 2,18bc 11,25bc 27,93a 6,93bc 13,70b 4,83bc 5,73bc 1,75c
20-40 13,28ns 4,50ns 17,35ns 17,95ns 10,90ns 15,25ns 7,30ns 4,98ns 2,25ns
40-60 16,75ns 12,08ns 22,35ns 23,08ns 22,28ns 22,28ns 13,40ns 9,25ns 7,55ns
Sat. Ca (%)
0-10 41,45abc 47,35ab 40,95abc 32,80c 52,00a 43,75abc 49,23ab 47,48ab 39,15bc
10-20 32,95abc 45,58a 33,48abc 20,83c 36,70ab 32,13bc 37,60ab 37,80ab 40,33ab
20-40 29,83ns 37,30ns 26,08ns 30,80ns 34,10ns 30,73ns 37,43ns 36,20ns 39,45ns
40-60 26,10ns 31,25ns 23,43ns 23,48ns 22,28ns 26,08ns 28,70ns 29,43ns 30,73ns
Sat. Mg (%)
0-10 12,58b 11,58b 9,58b 8,75b 18,33a 12,20b 11,95b 12,48b 9,25b
10-20 9,35ab 12,43a 9,00ab 5,90b 11,25a 9,50ab 9,73ab 9,40ab 10,93a
20-40 9,60ns 11,25ns 8,15ns 11,70ns 11,73ns 9,85ns 11,78ns 10,03ns 12,43ns
40-60 9,55ns 10,88ns 9,00ns 9,88ns 8,58ns 9,68ns 11,23ns 9,73ns 11,10ns
S (mg dm-3)
0-10 7,58ns 9,63ns 8,20ns 6,80ns 8,18ns 6,05ns 11,60ns 12,15ns 9,23ns
10-20 16,50ab 5,10d 8,35cd 17,38a 8,78bcd 9,70abcd 16,60a 15,33abc 11,55abcd
20-40 12,10ab 8,33ab 9,48ab 9,00ab 7,93ab 7,48b 13,73ab 13,93a 11,23ab
40-60 15,53ab 8,95b 12,90ab 12,10ab 13,35ab 14,73ab 15,20ab 18,90a 18,03a

Prof. - Profundidade; m - Saturação por alumínio; Sat. Ca - Saturação por cálcio; Sat. Mg - Saturação por magnésio; S - Enxofre; Test. - Testemunha; T1 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm; T2 - Escarificação com espaçamento de 50 cm; T3 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg com espaçamento de 70 cm; T4 - Escarificação com espaçamento de 50 cm + aplicação superficial de óxido de Ca e Mg; T5 - Aplicação superficial de óxido de Ca e Mg; T6 - Aplicação de calcário + gesso em superfície; T7 - Aplicação de óxido de Ca e Mg + calcário + gesso em superfície; T8 - Subsolagem com espaçamento de 35 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg com espaçamento de 70 cm.

No entanto, ao associar a subsolagem na linha e na entrelinha (com espaçamento de 35 cm) com a aplicação profunda de óxido de Ca e Mg (T8), é possível observar na primeira amostragem o incremento de pH e redução da m na camada de 10-20 cm. No entanto, após 18 meses da aplicação, os efeitos desse tratamento foram ainda mais evidenciados (Quadro 3). Nele foram observados os maiores valores de pH e saturações por Ca e Mg, além da maior redução da m na camada de 10 a 60 cm, o que pode ser atribuído ao maior volume de água infiltrada no solo resultante da redução da coesão, à elevada precipitação no período e à maior interface solo-corretivo, os quais auxiliam na reação e solubilização do óxido de Ca e Mg aplicado em profundidade (Calonego et al., 2017; Mantovani et al., 2017). A granulometria do óxido de Ca e Mg (<0,0053 mm) (CQFS-RS/SC, 2016) é inferior à do calcário e, portanto, também pode ter facilitado a solubilização deste corretivo nesse tratamento.

Quadro 3 Efeito dos tratamentos sobre os atributos químicos 18 meses após a aplicação 

Prof. (cm) Tratamentos
Test. T1 T2 T3 T4 T5 T6 T7 T8
pH (H2O)
0-10 10-20 5,25ns 5,10ab 5,25ns 4,88b 5,10ns 4,78b 5,45ns 5,20ab 5,50ns 5,20ab 5,48ns 5,10ab 5,33ns 5,08ab 5,43ns 5,43a 5,68ns 5,48a
20-40 5,10b 4,83b 4,83b 5,20ab 5,18ab 5,20ab 5,18ab 5,23ab 5,65a
40-60 5,03b 4,80b 4,80b 5,25ab 5,08b 5,23ab 5,20ab 5,35ab 5,75a
m (%)
0-10 4,80ns 3,58ns 7,03ns 0,70ns 2,53ns 1,95ns 4,25ns 3,33ns 0,00ns
10-20 11,4abc 19,30ab 22,73a 6,28bc 9,75abc 9,58abc 15,60abc 4,93bc 2,08c
20-40 15,98ab 29,90a 31,20a 7,38b 13,48ab 13,18ab 14,08ab 8,35b 0,00b
40-60 20,78ab 35,25a 35,98a 11,68b 20,85ab 15,45ab 15,13ab 4,88b 0,00b
Sat. Ca (%)
0-10 44,70ns 38,90ns 38,88ns 48,95ns 43,95ns 48,03ns 43,73ns 42,38ns 46,15ns
10-20 31,43ab 26,28b 24,15b 38,98ab 35,33ab 35,00ab 30,83ab 41,13ab 45,05a
20-40 29,25abc 19,55c 22,28bc 36,65ab 32,50abc 33,95abc 30,18abc 32,95abc 41,55a
40-60 26,28ab 19,00b 18,90b 35,53a 26,33ab 27,38ab 28,65ab 32,50ab 41,88a
Sat. Mg (%)
0-10 12,13ns 9,58ns 9,23ns 11,40ns 13,00ns 11,30ns 8,50ns 14,73ns 10,08ns
10-20 7,43ab 6,55b 6,00ab 8,33ab 10,10ab 8,08ab 7,20ab 12,40a 9,78ab
20-40 7,83ns 5,98ns 5,98ns 8,15ns 9,88ns 10,25ns 8,05ns 8,65ns 9,73ns
40-60 8,33ab 6,35b 5,58b 9,65ab 8,15ab 8,43ab 8,75ab 9,88ab 11,35a
S (mg dm-3)
0-10 13,40ns 14,80ns 12,60ns 14,73ns 12,53ns 15,90ns 17,73ns 15,13ns 16,95ns
10-20 15,28ns 14,45ns 14,38ns 12,80ns 13,08ns 12,00ns 16,40ns 16,05ns 16,08ns
20-40 16,45ab 12,33b 15,03ab 15,05ab 14,40ab 12,30b 21,30a 18,25ab 15,35ab
40-60 14,10ns 13,50ns 13,18ns 14,05ns 13,70ns 13,20ns 19,08ns 19,63ns 18,33ns

Prof. - Profundidade; m - Saturação por alumínio; Sat. Ca - Saturação por cálcio; Sat. Mg - Saturação por magnésio; S - Enxofre; Test. - Testemunha; T1 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm; T2 - Escarificação com espaçamento de 50 cm; T3 - Subsolagem com espaçamento de 70 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg com espaçamento de 70 cm; T4 - Escarificação com espaçamento de 50 cm + aplicação superficial de óxido de Ca e Mg; T5 - Aplicação superficial de óxido de Ca e Mg; T6 - Aplicação de calcário + gesso em superfície; T7 - Aplicação de óxido de Ca e Mg + calcário + gesso em superfície; T8 - Subsolagem com espaçamento de 35 cm + aplicação profunda de óxido de Ca e Mg com espaçamento de 70 cm.

A aplicação combinada de calcário e gesso agrícola (T6) não foi eficiente para aumentar o pH e reduzir a saturação por alumínio do solo, discordando do encontrado por Dalla Nora et al. (2017), que identificou a redução da saturação por alumínio após 15 meses da aplicação de calcário e gesso agrícola no solo. No entanto, ao associar o óxido de Ca e Mg à combinação (T7), pode-se verificar que houve incremento dos valores de pH e redução da saturação por alumínio, após 18 meses da aplicação, principalmente nas camadas abaixo dos 10 cm. Mantovani et al. (2017) também não reportaram respostas significativas do teor de Ca e Mg no solo com a aplicação de calcário e gesso em superfície.

Após 18 meses da aplicação dos tratamentos (Quadro 3), é possível verificar que o uso isolado de estratégias mecânicas de descompactação do solo (T1 e T2) apresentou os menores valores de pH, maiores valores de m e menores saturações por Ca e Mg em todas as camadas analisadas. Estes resultados corroboram com o observado por Rossato et al. (2009), e podem ser atribuídos à mobilização do solo, que mesmo reduzida, pode aumentar a superfície de contato do solo com os resíduos vegetais e pode incrementar a velocidade de decomposição dos mesmos pelos microrganismos, causando a liberação de ácidos orgânicos e a redução dos valores de pH do solo (Sidiras e Pavan, 1985).

Produtividade da soja afetada pela aplicação dos tratamentos

A produtividade de soja (Figura 3), em ambas as safras avaliadas, não apresentou diferença estatística significativa entre os tratamentos (p<0,05). Este comportamento também foi observado por Purcell et al. (2002) e Fidalski et al. (2015) ao analisar a produtividade de soja em resposta à aplicação de estratégias de melhoria física e química do solo em subsuperfície, respectivamente. Além disso, a determinação da RP pode não ter sido capaz de representar as condições originais do solo, dificultando a interpretação dos efeitos da descompactação mecânica sobre o crescimento de raízes e, consequentemente, sobre a produtividade.

Figura 3 Efeito dos tratamentos sobre a produtividade da soja nas duas safras avaliadas (2016/17 e 2017/18). Letras maiúsculas comparam safras e letras minúsculas comparam tratamentos pelo teste de Tukey à 5% de significância. 

A consequência das limitações químicas e físicas do perfil do solo para a produtividade agrícola baseia-se principalmente na restrição ao crescimento radicular e na absorção de água e nutrientes pelas culturas. Neste estudo, o efeito da redução da resistência à penetração, da acidez e da deficiência de cálcio da subsuperfície poderia ter sido evidenciado se a cultura tivesse sido submetida ao estresse hídrico, como o observado por Hansel et al. (2017) ao incorporar fósforo no solo, pois entre as safras avaliadas houve diferença significativa dos rendimentos da soja, o que pode ser explicado pela diferença de precipitação incidente entre as safras (Figura 1).

CONCLUSÕES

A escarificação e a subsolagem são estratégias eficientes para aliviar a resistência à penetração do solo. No entanto, após 18 meses, este efeito é reduzido.

Após 18 meses da aplicação dos tratamentos, a subsolagem com espaçamento de 35 cm associada à aplicação profunda de óxido de Ca e Mg com espaçamento de 70 cm foi eficiente para aumentar o pH e a saturação por Ca, além de neutralizar a saturação por alumínio até 60 cm de profundidade.

O efeito dos tratamentos não resultou em incrementos de produtividade em ambas as safras avaliadas.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro.

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Recebido: 16 de Janeiro de 2020; Aceito: 22 de Abril de 2020

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