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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.42 no.2 Lisboa jun. 2019

https://doi.org/10.19084/rca.17426 

ARTIGO

Análise sensorial de cachaça produzida em manejo orgânico e convencional

Sensory analysis of organic and conventional cachaça

João Henrique do Nascimento e Silva1,*, Marta Regina Verruma-Bernardi1, Luiz Antônio Correa Margarido1 e Alessandra Lopes de Oliveira2

1 Centro de Ciências Agrárias, da Universidade Federal de São Carlos, Rod. Anhanguera, km 174, Araras, São Paulo, 13600-970, Brasil

2 Departamento de Engenharia de Alimentos, Faculdade de Engenharia de Alimentos e Zootecnia, Universidade de São Paulo, Av. Duque de Caxias Norte, 225, Pirassununga, São Paulo, 13635-900, Brasil

(*E-mail: joao__henrique@hotmail.com)


RESUMO

A cachaça, produzida a partir da cana-de-açúcar, é considerada uma bebida genuinamente brasileira. A melhoria na qualidade da cachaça contribuiu para maior aceitação no mercado e maior volume de produção e exportação. O objetivo deste estudo foi avaliar se as variedades (RB 867515, RB 966928 e RB 855453) e manejos de cultivos da cana-de-açúcar (sem adubação, orgânico e convencional) influenciam nas características sensoriais da cachaça. Utilizou-se a Análise Descritiva por Ordenação (ADO) e a aceitação. Os resultados mostraram a existência de diferenciação sensorial entre as bebidas de diferentes variedades e manejos. Estes, por sua vez, influenciaram os atributos sensoriais, avaliados por meio da ADO. Na opinião dos avaliadores durante a análise sensorial de aceitação, a cor não foi fator de diferenciação entre as bebidas, o aroma, sabor, corpo e impressão global podem ter influênciado na aceitação das cachaças produzidas a partir das variedades RB 855453 e RB 867515, na modalidade de manejo orgânico.

Palavras-chave: bebida, qualidade, variedades, manejos, cana-de-açúcar.


ABSTRACT

Cachaça, produced from sugar cane, is considered a genuine Brazilian drink. The improvement in the quality of cachaça contributed to greater acceptance in the market and greater volume of production and export. The objective of this study was to evaluate if the varieties (RB 867515, RB 966928 and RB 855453) and sugar cane crop management (without organic and conventional fertilization) influence the sensorial characteristics of cachaça. Descriptive Analysis by Ordination (ADO) and acceptance were used. The results showed the existence of sensorial differentiation between the drinks of different varieties and managements. These, in turn, influenced the sensory attributes, evaluated through ADO. In the opinion of the evaluators during the sensorial analysis of acceptance, color was not a factor of differentiation among beverages, aroma, flavor, body and overall impression may have influence of the acceptance of cachaças produced from varieties RB 855453 and RB 867515, in the organic management modality.

Keywords: beverage, quality, varieties, management, sugarcane.


INTRODUÇÃO

Os compostos voláteis encontrados na cachaça, formados durante o processamento, de acordo com Aquarone et al. (2001), são os principais responsáveis pelos atributos sensoriais da bebida. Para Lima-Neto e Franco (1994), fatores como a matéria-prima, a fermentação, o método de condução do processo fermentativo, a destilação, o envelhecimento, entre outros, contribuem para aumentar, diminuir ou gerar novos compostos na bebida, proporcionando diferentes perfis sensoriais e químicos.

O conhecimento do perfil físico-químico e sensorial da cachaça é essencial para avaliar a sua qualidade. A harmonia entre os compostos torna uma cachaça suave e agradável, pela harmonia do seu conjunto de parâmetros sensoriais. A melhoria de sua qualidade contribuiu para maior aceitação no mercado e maior volume de produção e exportação (Alcarde et al., 2010).

O Brasil no ano de 2005, colheu 440 milhões de toneladas de cana-de-açúcar (gramíneas perenes altas, do gênero Saccharum) em aproximadamente seis milhões de hectares, com produtividade média de 74 ton [ha.sup.-1] (CONAB, 2005). Todavia, a produção de cana-de-açúcar no Brasil chegou a 694 milhões de toneladas em 2017, um aumento de 4% em relação a safra anterior (CONAB, 2017). O cultivo convencional é o mais utilizado para a produção de cana-de-açúcar. Esse cultivo visa, acima de tudo maximizar a produção, deixando em segundo plano a preocupação com a conservação do meio ambiente e redução do uso de agrotóxicos. Para o preparo do solo necessita de sucessivos procedimentos, sendo a sistematização, distribuição dos corretivos, aração, gradagem pesada, subsolagem e gradagem niveladora operações mais utilizadas (Gonçalves, 2006). Entretanto, devido aos impactos ambientais e econômicos, diversos pesquisadores buscam sistemas alternativos menos prejudiciais, principalmente para o meio ambiente.

A prática de cultivo da cana-de-açúcar sem o uso da adubação diminui os impactos ambientais ocasionados pela agricultura convencional, porém não é utilizada no Brasil, devido aos efeitos negativos no abaixamento de produtividade, em razão, da falta de adubação e da aplicação de fertilizantes de maneira não racional (Duarte Junior e Coelho, 2008). Mas, as características químicas e físicas do solo podem ser melhoradas através do manejo adequado do solo e da cultura da cana-de-açúcar envolvendo a utilização de sistemas conservacionistas.

A agricultura orgânica, tornou-se uma alternativa para minimizar esses impactos, pois não permite o uso de produtos químicos sintéticos prejudiciais para a saúde humana e para o meio ambiente, tem-se destacado em função do volume de produção atual de alimentos orgânicos, com crescimento de 40 a 50% ao ano, índices acima da média mundial. Tal crescimento proporcionou ao país a quinta colocação no ranking mundial em áreas de cultivos administrados organicamente (Brasil, 2015). Para Buzin (2016), a área de produção de orgânicos foi de 705.233 hectares, correspondendo a 1,16% da área total do território brasileiro destinada às lavouras permanentes e temporárias; as vendas de orgânicos em supermercados cresceram com taxas de 30% ao ano.

No Brasil, a cana-de-açúcar é a matéria-prima para diversos produtos agroindustriais, sendo a cachaça, aguardente preparada exclusivamente pelo uso da cana-de-açúcar, uma bebida muito apreciada entre os brasileiros e com potenciais consumidores em países europeus, sul-americanos e norte-americanos (APEX-Brasil, 2016). A produção da cachaça saltou de 1,3 bilhões de litros por ano para 1,8 bilhões de litros em 2015. Desse total, apenas 1% é exportado, o que equivale a 15 milhões de litros oriundos de mais de 40 mil produtores. Esta produção gerou 600 mil empregos diretos com um movimento anual de R$ 7 bilhões de reais (Brasil, 2001, 2015). No ano de 2016, o mercado teve um novo aumento nas exportações de cachaça. Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Cachaça – IBRAC, as exportações cresceram 4,62% em valor e 7,8% em volume, totalizando US$ 13,9 milhões e 8,3 milhões de litros (APEX-Brasil, 2016).

Devido ao aumento da exportação da cachaça e à economia do setor em expansão, intensificaram-se as investigações em instituições públicas, pelos produtores e gestores públicos, fomentando projetos e estudos para aumentar o conhecimento dos parâmetros sensoriais da bebida (Reche e Franco, 2009).Considerando a busca de meios de cultivo menos agressivos ao meio ambiente e aos consumidores de cachaça, o presente trabalho teve por objetivo monitorar a qualidade da bebida obtida de canas-de-açúcar cultivadas com três variedades e sob os manejos orgânico, convencional e sem adubação. Desse modo, o objetivo deste estudo foi avaliar se variedades e manejos de cultivos da cana-de-açúcar para a produção de cachaça influenciam as características sensoriais dessa bebida.

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização e preparo da área de experimento

O experimento foi realizado no Centro de Ciências Agrárias (CCA), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Campus de Araras-SP, coordenadas 22º 21’25" S de latitude e 47º 23`03" W, em relevo levemente declivoso e clima classificado como Cwa, tropical úmido com estiagem no inverno e chuva no verão de acordo com a classificação de Köppen. O solo predominante no local é classificado como Latossolo Vermelho-Escuro (EMBRAPA, 2006). A temperatura média no período do experimento foi de 20,3 ºC e precipitação média de 60,6 mm. A área útil do experimento foi de 0,320 hectares e implantado em Abril de 2014, com a produção das cachaças em outubro de 2015. O delineamento do experimento adotado foi o de blocos casualizados, com nove tratamentos e quatro repetições (Figura 1), cultivadas com cana-planta. Cada parcela tinha 37m2, com 5 sulcos de 5,0 m de comprimento e espaçamento de 1,5 m entrelinhas, conforme Figura 2. No experimento foram utilizadas três variedades RB 867515[1], RB 966928 e RB 855453, com caracterização de acordo com a cultivadas sob três manejos (sem adubação, orgânico e convencional) (Figura 1).

As quantidades de insumos para o tratamento orgânico foram calculadas de acordo com Kiehl (1985), e utilizado o fertilizante orgânico composto VisaFertil® na quantidade de 81,67 kg/parcela ou 16,3 kg/sulco de plantio, com aplicação de calcário (PRNT 70) na quantidade de 11,25 kg/parcela. Já para o tratamento convencional, adubação mineral, as quantidades de insumos foram calculadas (Raij et al., 2001) nas quantidades de 22,5 kg 6-30-20 (para N-P-K) e 2,5 kg de cloreto de potássio, total de 25 kg, sendo 2,08 kg/parcela ou 0,42 Kg/sulco com aplicação de calcário (PRNT 70) na quantidade de 11,25 kg/parcela. O controle de ervas espontâneas foi realizado mediante aplicação de herbicida com o glifosato como princípio ativo, denominado Demolidor BR, na dosagem de 2,5 kg/ha.

Produção da cachaça

A produção das cachaças foi realizada na planta piloto do Laboratório de Alimentos Orgânicos da UFSCar. A colheita e a despalhada da cana-de-açúcar foram efetuadas manualmente e a moagem realizada no mesmo dia do corte, em moenda (modelo MBB-E-6x8, número de série 737, Metalúrgica Barro Branco, São Fidélis, BR) com 25 rpm dos rolos e 540 rpm do volante e capacidade de 500 kg/h.

Para o processo de fermentação, se necessário, foi realizado a embibição do mosto com água potável até 16 ºBrix. Em seguida, adicionados 8 g de fermento prensado de levedura, da espécie Saccharomyces cerevisiae,para cada litro de mosto (Silva et al., 2014), conduzidas em dornas de fermentação de 1.000 L (modelo MB-DF 100, Metalúrgica Barro Branco, São Fidélis, BR), em aço inox, sem sistema de refrigeração.

Após a fermentação, o vinho (líquido resultante da fermentação) foi encaminhado para a destilação simples em um alambique tipo cebolão com pré-aquecedor (modelo MBB-AV-300, série 737, Metalúrgica Barro Branco, São Fidélis, BRA), com a capacidade de 300L de vinho, temperatura de trabalho igual a 95 ºC, produção de 60 L/h de cachaça e aquecimento indireto por vapor de caldeira. Durante o processo de destilação da cachaça, utilizou-se 1,8 kgf/cm2 como pressão de trabalho do alambique e foram separadas as frações "cabeça", "coração" – propriamente a cachaça – e "cauda". Estas frações são separadas em função do grau alcoólico que possuem: a cabeça (grau alcoólico de 70 a 50 % v/v), coração (50 a 38 % v/v) e cauda (38 a 14 % v/v) (Serafim et al., 2013). A caldeira utilizada no experimento foi uma multitubular de fornalha externa (modelo MBB-C-80, série 737, Metalúrgica Barro Branco, São Fidélis, BR), utilizou a temperatura de trabalho 130 ºC, pressão de trabalho 7 kgf/cm2 e capacidade de 80 kg/h.

Analise sensorial

O estudo foi aprovado pelo comitê de Ética em Pesquisa Nº 48771615.6.0000.5422 da Universidade de São Paulo. Os testes sensoriais foram realizados em Laboratório de Análise Sensorial (CCA/UFSCar) em cabines individuais, com utilização de luz branca. Os avaliadores foram os alunos e funcionários maiores de 21 anos, sem experiência em análise sensorial. Cada avaliador recebeu 10 mL de cada cachaça em copo modelo tulipa. Os avaliadores utilizaram água para lavar o palato entre as provas de uma amostra e outra.

Análise Descritiva por Ordenação – ADO

Utilizou-se a Análise Descritiva por Ordenação (ADO) (Richter et al., 2010) com 21 avaliadores, com o intervalo de idades de 18 a 26 anos, sendo 65% homens e 25% mulheres.

Para o levantamento de atributos foi empregado o Método Rede (Moskowitz, 1983). Realizaram-se três sessões e cada sessão foi apresentado um trio de amostras para levantamento de atributos. Foi solicitado aos avaliadores que anotassem as similaridades e diferenças entre as amostras quanto à aparência, aroma, sabor e textura. Após cada avaliador ter gerado os termos descritivos, realizaram-se duas sessões de discussão em grupo para selecionar os termos mais citados bem como para agrupar os semelhantes e desenvolver uma lista de descritores e as definições. Os critérios para a escolha dos atributos sensoriais foram definidos a partir dos mais citados por, pelo menos, 65% dos avaliadores. Um protocolo foi anexado, juntamente com o glossário, nas cabines a fim de facilitar e padronizar a forma de manipular as amostras durante as avaliações.

Uma sessão foi realizada para a avaliação das amostras na ADO, ocasião em que foram apresentadas simultaneamente, solicitando-se ao avaliador ordenasse em ordem crescente de intensidade de cada atributo.

Análise sensorial de aceitação

Foram utilizados 60 avaliadores (ISO, 2013). As amostras de cachaça servidas de forma balanceada, monádica e utilizando o delineamento de blocos completos. A aceitabilidade das amostras foi realizada utilizando uma escala hedônica de 9 pontos em relação à impressão global, aparência, aroma, sabor, textura.

Análise estatística

Os resultados da ordenação foram avaliados pelo teste de Friedman (Newell e MacFarlane, 1987), para verificar diferenças significativas entre amostras para cada atributo. A diferença entre as somatórias para as 9 amostras e 21 avaliadores será igual a 56 (Quadro 1). Os dados da aceitação foram analisados realizando-se a análise de variância (ANOVA) e teste de médias de Tukey para checar diferenças entre as médias (p≤0,05), considerando amostra e avaliador como causas de variação.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise Descritiva por Ordenação (ADO)

Os atributos mais citados foram: turbidez (88%), aroma de álcool (86%), aroma de cana-de-açúcar (82%), aroma doce (68%), textura adstringente (69%) e gosto de álcool (82%), gosto de cana-de-açúcar (79%), gosto doce (72%) e gosto frutal (68%). Outros autores também encontraram descritores semelhantes em análise sensorial de cachaça (Carvalho, 2001; Yokota, 2005; Dornelles et al., 2009; Bortoletto, 2016).

De acordo com os resultados para turbidez, não houve diferença entre as amostras. Resultado esperado pelo fato de as cachaças não sofrerem nenhum processo de envelhecimento ou armazenamento que conferisse qualquer composto que fizesse aumentar a turbidez da bebida (Silva et al., 2014).

Para o atributo aroma de álcool (Quadro 1), a bebida produzida com a RB 966928 no manejo sem adubação (A1), menor pontuação, diferiu da cachaça produzida com a RB 855453, também no manejo sem adubação (B1) e da bebida produzida com a RB 867515, com o manejo orgânico (C2).

Para o atributo aroma de álcool, os resultados mostraram que as cachaças elaboradas no manejo orgânico e convencional não apresentaram diferença entre si, ressalvo a bebida produzida com a RB 867515, com o manejo orgânico (C2), apresentou o maior pontuação entre as cachaças e diferiu das demais. Ao contrário, os autores Yokota et al. (2003) avaliaram sensorialmente o aroma alcoólico de cachaças orgânicas e convencionais e não encontraram diferenças significativas entre as bebidas. Verruma-Bernardi (2012), também não encontrou diferenças expressivas entre as amostras de cachaça orgânicas para o mesmo atributo.

Para o atributo aroma de cana-de-açúcar, não foi encontrada diferença significativa entre as bebidas. A não diferenciação significativa entre as bebidas para esse atributo pelos avaliadores pode ser atribuída ao fato, mencionado por Scamparini e Attilio (1992), de que a cachaça sem descanso ou maturação tem o atributo sensorial de cana-de-açúcar acentuado, independente da origem.

Para o atributo aroma doce, foi encontrada diferença significativa (Quadro 1) entre a bebida elaboradas com a RB 966928, no manejo sem adubação (A1), das bebidas produzidas com a RB 867515, no manejo convencional (C3) e no manejo orgânico (C2). Destaca-se o resultado (Quadro 1) para o mesmo atributo, as cachaças elaboradas com a RB 867515, os manejos diferiram entre a bebida com o manejo sem adubação (C1), com a menor pontuação, dos manejos convencional (C2) e orgânico (C3), com maior pontuação, mas os dois últimos não diferiram entre si. Esse resultado evidencia a influência da adubação na intensidade desse atributo para essa variedade.

Com relação ao atributo textura adstringente, verificou-se diferença significativa (Quadro 1). Os avaliadores identificaram maior intensidade na bebida produzida com a RB 855453, no manejo orgânico (B2), que diferiu da cachaça elaborada com a mesma variedade, mas no manejo sem adubação (B1), com menor pontuação entre as amostras e da cachaça produzida com a RB 966928, com o manejo sem adubação (A1). Tal resultado mostrou que para a RB 855453 o manejo influenciou na intensidade desse atributo.

Para o atributo gosto de álcool encontrou-se diferença significativa. A cachaça produzida com a RB 855453e a RB 867515, ambas com manejo orgânico (B2) e (B3), diferiram das bebidas elaboradas com a RB 966928, com o manejo sem adubação (A1) e com a o manejo orgânico (A2). Destaca-se que no gosto de álcool a cachaça (B2) apresentou a maior intensidade e a bebida (A1) menor intensidade.

No atributo gosto de cana-de-açúcar também foi encontrada diferença. Os avaliadores consideraram a cachaça elaborada com a RB 867515, com o manejo sem adubação (C1) diferiu da bebida produzida com a RB 855453, com o manejo sem adubação (B1). Resultado que, segundo Scamparini e Attilio (1992), a cachaça sem descanso ou maturação tem sabor acentuado de cana-de-açúcar. Assim, a dificuldade dos avaliadores em diferenciar as bebidas em relação ao sabor cana-de-açúcar é devido à similaridade das intensidades desse atributo encontrado entre as diferentes amostras.

Para o atributo gosto doce, a bebida produzida com a RB 855453, com o manejo orgânico (B2) diferiu da cachaça elaborada com a RB 855453, com o manejo sem adubação (B1). Esse resultado mostrou que para a variedade RB855453 o manejo influenciou na intensidade desse atributo identificado nas cachaças. As bebidas elaboradas com as canas-de-açúcar no manejo convencional (A3, B3 e C3) não diferiram entre as variedades, resultado encontrado diferentemente nos demais manejos.

O gosto frutal apresentou diferença significativa. As cachaças produzidas com a RB 855453, com o manejo orgânico (B2), apresentou maior pontuação entre as demais e diferiu da bebida elaborada com a mesma variedade, mas com o manejo sem adubação (B1), com menor pontuação. Igualmente, a bebida (B2) diferiu da cachaça elaborada com a RB 867515, com o manejo convencional (C3).Esse resultado mostrou que o manejo influenciou na RB 855453 (B) para o sabor doce identificado na cachaça.

A bebida que apresentou menores intensidades entre todos os atributos sensoriais avaliados foram as bebidas produzidas com a variedade RB 966928 no manejo sem adubação (A1), seguida da bebida produzida com a variedade RB 855453, no manejo sem adubação (B1). As bebidas de maiores intensidades dos atributos sensoriais foram as cachaças preparadas com a variedade RB 855453 no manejo orgânico (B2), seguida pela bebida preparada com a variedade RB 867515, no manejo orgânico (C2).

Análise sensorial de aceitação

O procedimento da experimentação de um novo produto compreende, em princípio, etapas relacionadas aos atributos sensoriais, podendo ou não condizer com a lealdade de consumo desse produto. Nesse procedimento, a sensação cognitiva é essencial, pois o consumidor, fundamentado em suas experiências e vivências anteriores, delibera se aceita prosseguir nas demais etapas e participar ou não da experimentação. No Quadro 2, apresentam-se os resultados do teste de aceitação e, entre cachaças, não houve diferença para a aceitação de cor. Este efeito era esperado pelo fato de as cachaças não sofrerem nenhum processo de envelhecimento ou armazenamento capaz de conferir qualquer composto suscetível de provocar alteração na aparência da bebida.

 

 

Para aceitação do aroma, a cachaça produzida com a variedade RB 867515, no manejo orgânico (C2), foi igual à bebida produzida com a variedade RB855453, também no manejo orgânico (B2). Tal resultado corrobora os dados encontrados no Quadro 1., pois os avaliadores classificaram essas bebidas sem diferenças para a intensidade dos aromas de álcool, cana-de-açúcar e doce. As bebidas produzidas com as variedades RB 966928, no manejo orgânico (A1) e convencional (A3), e a bebida com RB 867515, no manejo convencional (C3), apresentaram diferença das demais bebidas (Quadro 2). Esse resultado também foi evidenciado na Quadro 1, uma vez que os avaliadores classificaram as bebidas produzidas com adubação orgânica e convencional com intensidades dos aromas de álcool, cana-de-açúcar e doce com maiores pontuações. As cachaças produzidas com a variedade RB 867515, no manejo sem adubação (C1), e a variedade RB 855453, no manejo convencional (B3) não diferiram entre si, mas apresentaram diferenças significativas das outras bebidas. Ao contrário deste trabalho, os autores Margarido et al. (2008) empregaram diferentes variedades de cana-de-açúcar para produção de cachaça orgânica e, no teste de preferência, as amostras de cachaças não apresentaram diferenças significativas para o atributo aroma.

Para sabor, destacou-se a cachaça produzida com a variedade RB 867515 no manejo orgânico (C2) e apresentou diferenças em relação às outras (Quadro 2). Dado corrobora o resultado da ADO (Quadro 2), pois apresentou maior pontuação das médias, para os sabores álcool, cana-de-açúcar e doce. As bebidas produzidas com as variedades RB 855453 e RB966928, respectivamente, no manejo orgânico (B2) e convencional (A3), e a RB 867515, no manejo convencional (C3), não diferiram significativamente entre si (Quadro 1), provavelmente em razão de os avaliadores também não indicarem diferenças entre a intensidade dos gostos álcool, cana-de-açúcar e doce nessas cachaças.

Ainda para o atributo sabor, a bebida produzida com a variedade RB 855453, no manejo convencional (B3), não diferiu das cachaças produzidas com as variedades RB 867515, no manejo sem adubação (C1), e a RB 966928, também sem adubação (A1). Todavia, essas bebidas (RB 867515 no manejo sem adubação (C1) e a RB 966928 também sem adubação (A1) também não diferiram entre si e nem da bebida produzida com a variedade RB855453, no manejo sem adubação (B1).

No atributo corpo, as cachaças produzidas com todas as variedades no manejo orgânico não apresentaram diferenças entre si. Ao analisar as cachaças produzidas no manejo convencional destaca-se a bebida produzida com a RB 855453 (B2), pois diferiu das variedades RB 966928 e RB 867515 com o mesmo manejo (A1 e C1) (Quadro 2). As bebidas produzidas com as variedades RB 867515, no manejo sem adubação (B1), e RB 855453, no manejo convencional (B3), não diferiram entre si. Esta última também não diferiu da bebida produzida com a variedade RB 966928, no manejo sem adubação (A1), mas diferenciou-se das demais. Para esse atributo destaca-se a cachaça elaborada com a variedade RB 855453, no manejo sem adubação (B1), pois apresentou a menor média (Quadro 2), resultado que corrobora os dados obtidos (Quadro 1), pois apresentou a menor adstringência.

Como a impressão global é o conjunto de todos os atributos sensoriais da bebida, os resultados mostraram que os avaliadores encontraram diferenças nas intensidades dos atributos avaliados entre as bebidas produzidas no manejo orgânico, convencional e sem adubação. Os resultados desse trabalho apresentaram-se ao contrário dos experimentos de Garcia e Janzantti (2011), que empregaram o teste de preferência em amostras de cachaças orgânica e convencional e não encontraram diferença significativa para o atributo impressão global entre as bebidas.

O êxito dessas etapas tem importância na elaboração da lealdade afetiva, proveniente de atitude positiva. Baseado nessas etapas, pode-se despertar o desejo de compra e a perspectiva empresarial é sempre a de conquistar o maior número de consumidores. A empresa sempre necessita procurar a orientação do consumidor na intenção de corresponder aos seus anseios e expectativas com o intuito de fidelizá-lo em relação ao produto (Kotler, 2012). Nesse viés, a lealdade pode ser determinada como a condição da participação e empenho que o consumidor tem, convicto a prosseguir comprando o referido produto, nesse caso, a cachaça. É a resposta comportamental subsequente de um procedimento desenvolvido sobre escolhas disponíveis, fundamentadas em fatores cognitivos, afetivos e avaliativos que são os elementos de uma atitude (Larán e Espinoza, 2004).

CONCLUSÃO

Os resultados da ADO mostraram que as bebidas preparadas com a variedade RB 966928, no manejo sem adubação (A1), e a bebida produzida com a variedade RB 855453, no manejo sem adubação (B1), apresentaram na análise de ADO menores intensidades dos aspectos sensoriais analisados. Ao contrário, as bebidas preparadas com a variedade RB 855453, no manejo orgânico (B2), e a bebida preparada com a variedade RB 867515, no manejo orgânico (C2), apresentaram maiores intensidades dos aspectos sensoriais entre as bebidas avaliadas.

Para a análise sensorial de aceitação, a cor não apresentou diferença entre as bebidas; o aroma, sabor, corpo e impressão global, as bebidas produzidas com as variedades RB 855453 e RB 867515, no manejo orgânico (B2) e (B3), apresentaram  maiores médias. As menores médias foram as das cachaças produzidas a partir das variedades RB 855453 e RB 966928, no manejo sem adubação (B1) e (A1). Dados que corroboram com a Análise Descritiva de Ordenação sensoriais das cachaças.

 

Referências Bibliográficas

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Recebido/received: 2018.10.14

Aceite/accepted: 2019.03.13

[1] De acordo com Oliveira et al. (2015), a definição da nomenclatura das variedades de cana-de-açúcar RB, tem origem no termo "República do Brasil", registrada no Germplasm Committee of International Society of Sugar Cane Technologists – ISSCT. A numeração é seguida do ano de cruzamento (onde foram utilizados apenas os primeiros dois dígitos do ano: ex.: 85 para 1985) e posteriormente do código referente à respectiva Universidade, que representa o local de seleção da variedade.

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