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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018X

Rev. de Ciências Agrárias vol.42 no.2 Lisboa jun. 2019

https://doi.org/10.19084/rca.17180 

ARTIGO

Desenvolvimento, fisiologia e ocorrência de míldio em videiras cv. BRS Margot tratadas com preparados biodinâmicos

Development, physiology and occurrence of downy mildew in grapevine cv. BRS Margot treated with biodynamic preparations

Rafael Piva1,*, Renato Vasconcelos Botelho1, Patrícia Carla Giloni de Lima2 e Adamo Domenico Rombolà3

1 Universidade Estadual do Centro-Oeste/UNICENTRO, Departamento de Agronomia. Guarapuava-Paraná. Brasil

2 Universidade Estadual do Centro-Oeste/UNICENTRO, Departamento de Biologia. Guarapuava-Paraná. Brasil

3 Universidade de Bolonha/UNIBO, Departamento de Ciências Agrária, Escola de Agronomia e Medicina Veterinária. Bolonha. Itália

(*E-mail: raffaelepiva@gmail.com)


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o desenvolvimento, a fisiologia e a resistência ao míldio de videiras cv. BRS Margot tratadas com preparados biodinâmicos em estufa. Utilizou-se o delineamento experimental inteiramente casualizado com três tratamentos e dez repetições. Os tratamentos foram: 1) testemunha aplicação de água na parte aérea; 2) tratamento orgânico – aplicação de quitosana (Fish Fértil® 200 mL.100 L-1) na parte aérea 3) tratamento biodinâmico – aplicação de preparado biodinâmico chifre sílica (501)(4 g.60 L-1) na parte aérea e adição de composto com preparados biodinâmicos 502 a 507 no adubo. Foram realizadas quatro aplicações foliares de água, quitosana e preparado (501) nas fases de cachos e botões florais separados em  janeiro e fevereiro primeiro ciclo e novembro e dezembro de 2015 (segundo ciclo); e duas aplicações do composto no plantio e em setembro 2015 na fase de gomo de algodão. As plantas foram avaliadas para comprimento e diâmetro dos ramos, diâmetro do tronco, índice SPAD, trocas gasosas e área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD). Os preparados biodinâmicos apresentaram efeito no desenvolvimento da videira cv. BRS Margot, evidenciado pelo aumento do comprimento dos ramos, assimilação de CO2, eficiência da enzima RuBisCO, teor de clorofila e redução na incidência de míldio na parte aérea das videiras.

Palavras-chave: viticultura, Vitis spp., fotossíntese, Plasmopara viticola, produção orgânica.


ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate the development, physiology and resistance to downy mildew of the BRS Margot grapevine treated with biodynamic preparations in a greenhouse. The experimental design was completely randomized with three treatments and ten replications in each treatment. The treatments were: 1) control pots with application of water in the aerial part; 2) organic treatment: application of chitosan (Fish Fértil® 200 mL.100 L-1) in the aerial part; 3) biodynamic treatment: application of biodynamic formulation silica horn (501) (4 g.60 L-1) in the aerial part and compost with formulations 502 to 507. Four leaf applications of the water, chitosan and preparation (501) were carried out in the 8 and 14 leaves separated stages in January and February (first cycle), November and December 2015 (second cycle) and two application of compost in plantation and September 2015 in the wooly bud stage. The plants were evaluated for the length and diameter of the canes, trunk, SPAD index, gas exchange and area under the disease progress curve (AUDPC). Biodynamic formulations had an effect on the development of the BRS Margot grapevine, verified by the increase of the length of the branches, CO2 assimilation, RuBisCO enzyme efficiency, chlorophyll content (SPAD index) and reduced the incidence of mildew.

Keywords: viticulture, Vitis spp., photosynthesis, Plasmopara viticola, organic production.


INTRODUÇÃO

Cada vez mais os consumidores vêm exigindo, além da aparência externa dos produtos agrícolas, o controlo sobre todo o sistema de produção, com redução dos malefícios à saúde humana e do impacte ambiental. Dentro deste contexto, sistemas mais sustentáveis vêm-se expandindo em todo o mundo, com mais de 170 países desenvolvendo a agricultura orgânica, em mais de 43 milhões de hectares, com destaque para a Austrália (17,2 milhões de hectares), Argentina (3,1 milhões de hectares) e EUA (2,2 milhões de hectares), o que representa 1% da área agricultável no mundo (Willer e Lernoud, 2016).

Dentre as diferentes vertentes de produção orgânica, a agricultura biodinâmica merece destaque, tendo surgido a partir de uma série de oito palestras ministradas pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), em 1924, na cidade de Koberwitz, hoje Wroclaw na Polônia. O curso foi um pedido dos próprios agricultores que estavam percebendo um declínio da qualidade dos produtos agrícolas (aroma e paladar), do solo (fertilidade) e animais (saúde) com a utilização de novas tecnologias (Koepf et al., 1983; Scheller, 2000).

Segundo Steiner (2010), o método de cultivo biodinâmico consiste em ver a propriedade como um organismo agrícola, em que seus diferentes componentes (solo, água, plantas, animais e homem) trabalham em conjunto e conhecem seus potenciais e suas limitações. A fertilização dos solos é considerada uma prática duradoura, buscando alta atividade biológica e produtiva. Os preparados biodinâmicos contribuem para melhoria no sinal entre os diferentes componentes do sistema. Pode ser utilizado ainda, um calendário agrícola astronômico, que orienta o manejo de todas as atividades do campo.

Cerca de 164.000 hectares em todo o mundo são certificados pela Demeter como áreas biodinâmicas em 4.956 propriedades (Demeter, 2016). A Alemanha tem a maior área certificada com 67.000 hectares, seguido pela França, Itália, Holanda, Espanha, Hungria e Índia. Segundo a Demeter Internacional (2016), o Brasil tem hoje uma área certificada de 3.765 hectares em mais de 30 propriedades. A viticultura biodinâmica está se difundindo mais rapidamente na Argentina, Chile e França, e hoje são mais de 708 propriedades certificadas pela Demeter em mais de 9.533 hectares de área para produção de uvas para vinho (Demeter, 2016).

Nesse sistema, os preparados feitos de plantas medicinais e minerais são aplicados em doses bem diluídas (homeopáticas), podendo ser utilizado nas plantas, no solo e nos compostos feitos para adubação. Alguns trabalhos demonstram a influência dos preparados nas características químicas e biológicas de compostos orgânicos, na microbiologia do solo, no desenvolvimento das culturas agrícolas e na redução do impacte ambiental (Zaller e Köpke, 2004; Turinek et al., 2009; Botelho et al., 2016).

O preparado chifre sílica (501) possui silício na sua composição (586 µg.g-1) e, segundo Steiner (2010), é essencial para a estruturação interna das plantas e seu desenvolvimento, assim como para a qualidade nutritiva das plantas e a resistência a doenças. O preparado é elaborado com cristais de quartzo moído e chifres de vacas bem formados com no mínimo 3 anos de idade. Os cristais são moídos até o ponto de farinha fina e colocados dentro dos chifres de vacas. Quando o pó estiver pronto, deve-se fazer uma massa com água para preencher os chifres. Ele deve ser enterrado no verão e retirado no outono, e armazenado em pote de vidro transparente em presença de luz natural.

Os preparados de composto  foram desenvolvidos para contribuir no processo de fermentação e decomposição . São seis os constituintes usados no composto, usados em partes iguais e com material vegetal fresco : flores de mil folhas –Achillea millefolium L. (502), flores de camomila –Chamomilla recutita (L.) Rauschert (503), planta  de urtiga –Urtica dioica L. (504), casca de carvalho–Quercus robur L. (505), flores de dente-de-leão –Taraxacum officinale Wiggers (506) e fermentado das flores de valeriana –Valeriana officinalis L. (507) (Steiner, 2010).

Alguns resultados já foram relatados demonstrando a ação de alguns preparados biodinâmicos em diversas culturas agrícolas. Bertalot et al. (2012) estudaram os efeitos dos preparados biodinâmicos, homeopáticos e calda bordalesa no controlo de mancha de Mycosphaerella [Ramularia grevilleana (Tul. & C. Tul. ex Oudem.) Jørst.] na cultura do morangueiro. Foram testados preparados à base de Equisetum arvense L., E. hyemale L. e E. giganteum L., preparado homeopático de E. hyemale D28, preparado biodinâmico chifre sílica (501) e calda bordalesa. Os resultados demonstraram menor número de manchas foliares com os tratamentos de E. hyemale e preparado biodinâmico chifre sílica (501). Reeve et al. (2010) pesquisaram a ação dos preparados biodinâmicos adicionados no composto formulado de bagaço de uva e esterco. Os resultados demonstraram que os compostos orgânicos tratados com os preparados biodinâmicos apresentaram maior atividade de desidrogenase do que as não tratadas (testemunha), a atividade da desidrogenase do solo reflete a atividade oxidativa total da microbiota, e pode atuar como um bom indicador da atividade microbiana presente no solo .

A quitosana é um produto muito utilizado na agricultura orgânica para o controlo de doenças, sendo um polissacarídeo obtido pela desacetilação parcial da quitina (de 15% a 90%), estando difusa naturalmente em estruturas de crustáceos, insetos e fungos (Tessarin et al., 2016). Yin et al. (2010) concluíram que a quitosana age de forma similar a uma vacina no controlo de doenças, sendo considerada um potente imunoregulador nas plantas.

No contexto apresentado, este trabalho teve como objetivo avaliar o efeito dos preparados biodinâmicos quando comparado ao uso de quitosana no desenvolvimento, fisiologia e incidência de míldio em videiras cv. BRS Margot.

MATERIAL E MÉTODOS

Localização e plantio

O trabalho foi desenvolvido em estufa em Guarapuava-PR, com coordenadas geográficas de 25°41’S e 51°38’O e altitude de 1.100 metros. O clima segundo a classificação de Köppen é do tipo Cfb (Subtropical mesotérmico úmido), temperado, sem estação seca definida, com verão quente e inverno moderado (Wrege et al., 2011).

Em 3 de setembro de 2014, todas as mudas de videira com um ano de idade da cv. BRS Margot enxertadas sobre o porta-enxerto ‘Paulsen 1103’ foram plantadas em vasos de 10 dm3, preenchidos com substrato comercial (MECPLAN, Indústria e Comércio Ltda, Telêmaco Borba, PR) e composto orgânico na proporção 3:1(substrato:composto).

Delineamento experimental e preparados biodinâmicos

O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com três tratamentos e dez repetições (plantas), sendo que cinco delas foram inoculadas com o patógeno Plasmopara viticola Berk. & M.A. Curtis Berl. & De Toni para avaliação da área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD) e as demais avaliações foram feitas nas plantas sem inoculação, sendo colocadas em lados opostos da estufa. Os tratamentos foram os seguintes: 1) testemunha: aplicação de água e composto ; 2) tratamento orgânico – aplicação de quitosana (Fish Fértil® na dose de 200 mL.100 L-1, Fish Indústria e Comércio de Fertilizantes Ltda., Mogi Mirim, SP) e composto ; 3) tratamento biodinâmico – preparado biodinâmico 501 chifre-sílica (4 g.60 L-1) e composto com preparados biodinâmicos (502 a 507).

O composto orgânico foi preparado com esterco bovino, palha de feijão e milho na proporção 3:1 (palha/esterco, v/v). A palha de milho fez a base da pilha e a cobertura do composto (1,5 m3 - 60 kilos) e o feijão (1,5 m3 - 55 kilos) separou duas camadas de esterco (1 m3 - 110 kilos). Para a compostagem foram feitas duas pilhas de aproximadamente 4 m3, com os mesmos materiais, sendo que uma delas recebeu os preparados biodinâmicos com suas respectivas doses. Em setembro de 2015, foi realizada a adubação de cobertura com aplicação de 1 L de composto por vaso. As plantas do tratamento biodinâmico receberam no composto os seguintes preparados brevemente explicados: flores de mil folhas – Achillea millefolium são colocadas em uma bexiga de cervo macho Cervus elaphus e deixadas exposta à luz durante o verão e enterrada no outono, e só depois pronta para utilização (502), flores de camomila – Chamomilla recutita são colocadas na tripa bovina e enterradas no solo durante o inverno, na primavera está pronta para uso (503), urtiga – Urtica dioica foi enterrada na época da floração e protegida com turfa durante um ano, quando pode ser utilizada (504), casca de carvalho – Quercus robur deve ser esfarelada e colocada na cavidade encefálica de um animal doméstico (bovino, cavalo, potro), enterrada no outono em um lugar com água e lodo e desenterrada na primavera (505), flores de dente-de-leão – Taraxacum officinale são envoltas no mesentério de vaca, costurada como uma bolsa, enterrada no outono e desenterradas na primavera (506) (2 g.25 m-3), e valeriana – Valeriana officinalis  flores são colhidas, moídas bem finamente e espremidas para obtenção do suco floral (507) (2 mL.25 m-3) todos os  preparados formam adquiridos junto a associação biodinâmica em Botucatu, São Paulo (Steiner 2010; Jovchelevich e Vidal, 2016).

Todas as videiras foram deixadas com um ramo principal e conduzidas de forma vertical. Uma vara de bambu, de aproximadamente 1,80 m foi posta em cada vaso no momento do plantio das mudas, para condução das plantas. As brotações laterais foram retiradas em todas as plantas a cada dois meses. A poda foi realizada deixando duas gemas por planta, quando iniciada a sua brotação, em outubro de 2014 e setembro de 2015.

Os produtos foram aplicados via foliar em 12 de janeiro de 2015, 24 horas antes da inoculação do patógeno e em 12 de fevereiro de 2015, nos estados fenológicos de cachos separados e botões florais separados. No segundo ciclo, a primeira aplicação se realizou 65 dias após a poda, no dia 9 de novembro de 2015 (24 horas antes da inoculação) e posteriormente em 10 de dezembro de 2015, nos mesmos estados fenológicos.

Para obtenção do inóculo de P. viticola (agente causal do míldio da videira), folhas de videiras com sintomas da doença foram coletadas em um vinhedo comercial e posteriormente imersas em água destilada e raspadas para facilitar a libertação de esporos. Após este processo foi realizada a calibração do número de esporos com o auxílio da câmara de Neubauer (Blaubrand® melhorada sem pinça, Germany) e microscópio (Kaski K112L São José dos Pinhais-PR, Brasil). Quando as plantas apresentavam aproximadamente oito folhas, inoculou-se a suspensão de esporos na concentração de 5x104 zoósporos.mL-1 em janeiro de 2015 e 1x104 zoósporos.mL-1 em novembro de 2015, pulverizando até ao ponto de escorrimento. As plantas foram cobertas por uma estrutura plástica para manutenção da humidade próxima a 70% e melhor desenvolvimento inicial do míldio, e retirada após o aparecimento dos primeiros sintomas, com posterior regulagem da irrigação em intervalo de 15 minutos (Shaner e Finney,1977).

As trocas gasosas foram monitoradas com o uso de um analisador infravermelho de gases Li-cor LI6400XT (Biosciences Inc., Lincoln, NE, USA). O fluxo de fótons foi fixado em 500μmol.m-2 s-1. As avaliações foram realizadas em folhas completamente expandidas, localizadas no terço médio do ramo, obtendo-se as medidas no período da manhã entre nove e dez horas, em 13 de fevereiro de 2015 com temperatura entre 26ºC a 28°C, pressão parcial de vapor entre 2,1 a 2,9 kPa e em 11 de dezembro de 2015, com temperaturas entre 28ºC e 31°C e pressão parcial de vapor entre 1,8 e 2,8 kPa , 24 horas após a segunda aplicação dos tratamentos foliares em cada um dos ciclos. Foram determinados os seguintes parâmetros: assimilação líquida de CO2 ou rendimento fotossintético (A, µmol CO2.m-2.s-1), concentração intercelular de CO2 (Ci, µmol CO2.mol-1), condutância estomática (gs, mol H2O.m-2.s-1) e taxa de transpiração (E, mmol H2O.m-2.s-1). A eficiência do uso da água (WUE x10-3 CO2/H2O) foi estimada por meio da relação entre assimilação de CO2 e taxa de transpiração (A/Tr). A eficiência da RuBisCO (EF RuBisCO) foi estimada pela relação entre assimilação de CO2 e concentração intercelular de CO2 (A/Ci) (Hall et al., 1993).

As medições de comprimento e o diâmetro dos ramos foram realizadas mensalmente, de dezembro de 2014 a fevereiro de 2015 e de novembro de 2015 a janeiro de 2016, com o uso de uma fita métrica e um paquímetro digital, sendo os resultados expressos em centímetros e milímetros, respetivamente (Lorenz et al., 1995). O índice SPAD foi determinado com o uso de um medidor portátil de clorofila, CFL1030clorofiLOG, (Falker Automação Agrícola, Porto Alegre-RS, Brasil). As avaliações do índice SPAD foram realizadas mensalmente no mesmo período que as avaliações de comprimento e diâmetro de ramos, sempre utilizando a primeira folha completamente expandidas a partir do ápice (Porro et al., 2001).

O diâmetro do tronco foi avaliado duas vezes durante o experimento, em dezembro de 2014 e dezembro de 2015, com o auxílio de um paquímetro digital. O diâmetro foi avaliado a 10cm acima do ponto de enxertia.

Para a severidade do míldio, todas as plantas inoculadas foram avaliadas semanalmente com o auxílio de escala diagramática de Azevedo (1997), a partir do surgimento das primeiras manchas (28/01/2015 e 23/11/2015, primeiro e segundo ciclo, respetivamente) até à desfolha ou paralisação da progressão dos sintomas. Foram avaliadas seis folhas por vaso (terço médio das plantas) para posterior cálculo da área abaixo da curva de progresso da doença baseado na fórmula: AACPD = Σ(y+ y+1)/2 * (t+1 – t ), onde: y = crescimento micelial do patógeno (%); t = tempo (dias) (AACPD) (Shaner e Finney, 1977).

Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância, modelo two way  e as médias foram comparadas pelo teste de T – LSD a 5% de probabilidade, utilizando-se o programa SISVAR versão 5.3 (Ferreira, 2014).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os parâmetros fotossintéticos de assimilação de CO2 (A) e eficiência da RuBisCO (Ef. RuBisCO) foram influenciados pela utilização dos preparados biodinâmicos (501 a 507) apenas no primeiro ciclo vegetativo, onde A CO2 foi 22% superior no tratamento biodinâmico em relação à testemunha (Figura 1A e 1B). Os preparados biodinâmicos promoveram maior eficiência da enzima RuBisCO, uma vez que diferiu do tratamento testemunha, com valor 31% superior. Não houve diferença significativa entre o tratamento orgânico e biodinâmico.

Na eficiência no uso da água (WUE), transpiração (E) e condutância estomática (gs) não foram observadas diferenças significativas em nenhum dos anos estudados (Figura 1C, 1D, 1E e 1F).

Um dos fatores que pode ter contribuído para a maior eficiência fotossintética proporcionada pelo tratamento biodinâmico pode estar relacionado à melhoria da nutrição das plantas. Segundo Reeve (2003), os preparados biodinâmicos contribuem para que os compostos orgânicos para fins de adubação apresentem maiores teores de cátions, concentração total de azoto, matéria orgânica e de forma mais significativa os teores de potássio. O potássio é considerado um ativador enzimático, sendo essencial para a fotossíntese, respiração, assim como o crescimento das plantas (Bavaresco et al., 2010). Gago et al. (2016) relataram que vários fatores interferem na concentração de CO2, tais como a atividade fotossintética, luminosidade, temperatura foliar, assim como a cinética e atividade da enzima RuBisCO.

Os resultados de comprimento e diâmetro de ramos e índice SPAD, são apresentados na (Figura 2). Foram observadas diferenças estatísticas para comprimento dos ramos e índice SPAD apenas no segundo ciclo (Figura 2A, 2B e 2F). Para diâmetro dos ramos não foram observadas diferenças significativas (Figura 2C e 2D).

No segundo ciclo, houve diferença para o comprimento dos ramos apenas na terceira avaliação em janeiro de 2016, em que o tratamento biodinâmico foi 21,2% e 23,4% superior aos tratamentos testemunha e orgânico, respectivamente (Figura 2B).

O maior comprimento dos ramos no segundo ciclo pode estar relacionado ao maior acumulo de carboidratos no primeiro ciclo, e menor incidência de doença. Segundo Smith e Holzapfel (2009) a dinâmica do conteúdo de reservas na videira é influenciada por variações sazonais e fenológicas. De acordo com Giovaninni (2008), para um adequado desenvolvimento da videira na primavera, recomenda-se a manutenção das folhas na planta por maior tempo possível no outono, para a realização de fotossíntese e acúmulo de reservas nos tecidos.

Os tratamentos não influenciaram o índice SPAD no primeiro ciclo (Figura 2E). No segundo ciclo, em novembro de 2015, os tratamentos biodinâmico e orgânico tiveram, respectivamente, valores 13,4% e 17,5% superiores à testemunha (Figura 2F). Em dezembro de 2015, o tratamento biodinâmico e testemunha foram inferiores ao tratamento orgânico, no entanto, em janeiro de 2016, os tratamentos não diferiram estatisticamente.

O aumento do índice SPAD verificado para o tratamento orgânico em uma das avaliações pode estar relacionado ao conteúdo de azoto na quitosana, que é um elemento essencial na molécula de clorofila. De acordo com Ohta et al. (1999), a quitosana pode incrementar o crescimento das plantas devido ao seu conteúdo de azoto, fósforo e potássio, proporcionando maior matéria seca e fresca da parte aérea e raiz e floração mais precoce.

Plantas sob tratamento biodinâmico também apresentaram maiores valores de índice SPAD em algumas avaliações. O preparado (501) é importante para a estruturação interna das plantas e seu desenvolvimento, assim como para a qualidade nutritiva das plantas e para a resistência a doenças (Miklós, 2001; Steiner, 2010). Segundo Ma e Yamaji (2008), o silício exerce efeito benéfico sobre o crescimento e a produção, pois tem ação sobre doenças, insetos, seca e desequilíbrio nutricional. Adatia e Besford (1986), trabalhando com pepino, observaram vários efeitos benéficos devido à adição de silício (100 mg kg1) em meio nutritivo, como: aumento no teor de clorofila, maior massa foliar fresca e seca, atraso na senescência e aumento da rigidez das folhas.

No primeiro ciclo, em dezembro de 2014, foi possível observar aumento do diâmetro de tronco para o tratamento orgânico (Figura 3A), no entanto, em dezembro de 2015, os valores de diâmetro do tronco se igualaram e não diferiram estatisticamente (Figura 3B).

Houve diferenças estatísticas para área abaixo da curva de progresso da doença (AACPD) nas plantas inoculadas com Plasmopara viticola. A AACPD foi menor para o tratamento biodinâmico no primeiro ciclo para plantas inoculadas com míldio, que foram submetidas aos vários tratamentos. Para as plantas não inoculadas, não houve diferença estatística entre os tratamentos (Figura 4). No primeiro ciclo, em plantas inoculadas, o tratamento biodinâmico teve uma AACPD 55% e 52% inferiores ao tratamento orgânico e da testemunha, respetivamente. O tratamento orgânico com quitosana não apresentou efeito sobre o míldio e isso pode ser explicado pelo tempo entre a aplicação e a inoculação do patógeno que foi de 24 horas, ou as características químicas da quitosana. Di Piero e Garda (2008), ao avaliarem o controle da antracnose em feijão constataram diferença na resposta da planta em relação ao intervalo de tempo entre a aplicação da quitosana e a inoculação do patógeno. A aplicação da quitosana em um intervalo maior antes da inoculação mostrou ser mais efetivo em reduzir a severidade da antracnose e induzir o sistema de defesa da planta. No segundo ciclo, não houve diferença estatístico entre os tratamentos, devido principalmente ao alto coeficiente de variação.

Segundo Botelho et al. (2016), a utilização dos preparados biodinâmicos faz com que as plantas estejam mais preparadas para enfrentar estresses bióticos e abióticos, estimulando assim a defesa natural das plantas. Uma das razões poderia estar ligada à ação do silício na resistência a doenças por meio de dois mecanismos. O primeiro seria uma barreira física, onde o silício é depositado sobre a cutícula, impedindo o processo de infecção, sendo que esta mesma barreira pode também servir contra alguns insetos. O outro mecanismo proposto é que o silício atua como um modulador da resistência do hospedeiro a agentes patogênicos, aumentando a síntese de compostos de defesa das plantas (Ma, 2004).

Segundo Korndörfer e Datnoff (1995), embora o silício não seja considerado elemento essencial beneficia o crescimento e o desenvolvimento da cultura, aumentando a tolerância das plantas ao ataque de insetos e patógenos. Bertalot et al. (2012), trabalhando com a cultura do morango, testou várias alternativas ecológicas no controlo do fungo Mycosphaerella fragariae. Os autores constataram que o tratamento com os preparados de Equisetum hyemale e o biodinâmico com chifre sílica (501) apresentaram menor número de manchas nas folhas em todas as avaliações realizadas, comprovando eficácia destes tratamentos no controlo do fungo.

Baseado nesses resultados verificou-se que os preparados biodinâmicos, embora aplicados em doses homeopáticas, apresentam uma ação marcante no desenvolvimento, fisiologia e resistência a estresses bióticos em videiras, como também demonstrado por outros autores em diversas culturas (Reeve et al., 2010; Bertalot et al., 2012; Botelho et al., 2016) e, portanto, poderia ser uma prática interessante a ser incorporada por produtores em vinhedos comerciais destinados à produção de uvas orgânicas, com evidentes vantagens. Novas pesquisas deveriam ser conduzidas visando verificar os efeitos dos preparados no desenvolvimento de videiras em condições de campo, assim como na produtividade e qualidade da uva.

Conclusões

Os preparados biodinâmicos promoveram maior desenvolvimento das videiras cv. Margot, verificado pelo aumento do comprimento dos ramos e do índice SPAD, principalmente no segundo ciclo (dezembro/2015). O investimento no desenvolvimento ocorreu no primeiro ciclo (dezembro/2014) observado pelo aumento na assimilação de CO2 caracterizado pela maior eficiência da RuBisCO. A redução na incidência do míldio na parte área das videiras cv. Margot demonstra que o tratamento biodinâmico forneceu melhores condições fisiológicas às plantas tornando-as mais propícias a desenvolverem repostas mais efetivas no estresse biótico causado por Plasmopara viticola.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Recebido/received: 2018.07.05

Aceite/accepted: 2018.12.30

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