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Análise Psicológica
versão impressa ISSN 0870-8231versão On-line ISSN 1646-6020
Aná. Psicológica vol.36 no.3 Lisboa set. 2018
https://doi.org/10.14417/ap.1415
Estilos parentais, adaptação académica e bem-estar psicológico em jovens adultos
Parenting styles, academic adaptation and psychological well-being in young adults
Maria Bárbara Granja1, Catarina Pinheiro Mota1
1UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real, Portugal
RESUMO
O desenvolvimento de relações de vinculação seguras com as figuras significativas e os estilos parentais, sugerem assumir um papel importante para o jovem adulto na transição e adaptação aos desafios externos, nomeadamente, à adaptação ao contexto académico e à manutenção de um bem-estar psicológico. O presente estudo objetivou analisar o papel dos estilos parentais na adaptação académica e bem-estar psicológico de jovens adultos assim como testar o papel moderador do género na associação anterior. A amostra foi constituída por 787 jovens universitários com idades compreendidas entre os 18 e os 25 anos (M=20.07, DP=1.7). Os resultados apontam para um efeito preditor positivo do bem-estar psicológico face à adaptação académica. Verificou-se também a existência de um efeito moderador do género na associação entre o estilo parental autoritativo, face ao pai e à mãe, e a adaptação académica.
Palavras-chave: Estilos parentais, Adaptação académica, Bem-estar psicológico.
ABSTRACT
The development of secure attachment relationships with significant figures and parenting styles suggests that they play an important role for the young adult in the transition and adaptation to external challenges, in particular, adaptation to the academic context and maintenance of psychological well-being. The present study aimed to analyze the role of parenting styles in the academic adaptation and psychological well-being of young adults as well as to test the moderating role of gender in the previous association. The sample consisted of 787 university students aged 18 to 25 years (M=20.07, SD=1.7). The results point to a positive predictor effect of psychological well-being in relation to academic adaptation. It was also found that there is a gender moderating effect on the association between the authoritative parenting style, to father and mother, and academic adjustment.
Key words: Parenting styles, Academic adjustment, Psychological well-being.
Vinculação e estilos parentais
Quando se aborda a dinâmica da relação pais-filhos torna-se inevitável apontar a importância das relações de vinculação construídas ao longo do desenvolvimento da criança. A segurança na vinculação é regulada pela forma como as crianças organizam os seus comportamentos, mantendo um equilíbrio entre a necessidade de conforto e proteção e a necessidade de explorar o mundo (Bowlby, 1969, 1989). Desta forma, a figura de vinculação funciona como uma base segura, sempre que a criança evidencia as necessidades sentidas, o sistema de prestação de cuidados da figura de vinculação é ativado de forma a responder a estas necessidades (Ainsworth, 1967; Ainsworth, Blehar, Waters, & Wall, 1978; Bowlby, 1969, 1989). Uma parentalidade responsiva e sensível parece gerar a segurança das relações de vinculação (Ainsworth & Bell, 1969). Nesta medida, ao longo do seu período desenvolvimental, a criança desenvolve laços emocionais que podem variar face ao ambiente parental em que esta se encontra inserida. Neste sentido, a construção das primeiras representações desenvolve-se a partir do conjunto de interações estabelecidas entre a criança e as figuras de vinculação, podendo existir um contributo da qualidade dos estilos parentais para o desenvolvimento emocional da criança (Roelofs, Meesters, Huurne, Bamelis, & Muris, 2006). Baumrind propôs três tipos de estilos parentais que se tornaram fundamentais para a discussão da importância dos pais no desenvolvimento dos filhos, a saber: autoritário, autoritativo e permissivo (Baumrind, 1967, 1971). Tendo em conta a teoria da mesma autora, os pais com um estilo autoritário apresentam baixa afetividade e elevados níveis de controlo, desencorajam a independência e individualidade da criança e exercendo um controlo psicológico rígido, acabando por dar mais valor à obediência e favorecendo a punição (Baumrind, 1966, 1967, 1971). No estilo autoritativo, as figuras parentais exercem um controlo firme e são afetuosos, acabando por promover a autonomia e individualidade da criança. Desta forma, as figuras parentais possuem elevados níveis de exigência e de afetividade, promovem um ambiente intelectualmente estimulante para os seus filhos e investem na educação dos mesmos (Baumrind, 1967, 1971). Segundo os pressupostos da autora, no estilo parental autoritativo as características das crianças são alteradas e fortalecem as capacidades dos pais como agentes de socialização, aumentando a eficácia da parentalidade (Darling & Steinberg, 1993). Por outro lado, as figuras parentais com um estilo parental permissivo evidenciam uma atitude tolerante face aos desejos e comportamentos da criança, evitando impor restrições aos seus filhos (Baumrind, 1967, 1971).
A teoria da vinculação defende que as figuras de vinculação são cuidadores sensíveis, afetuosos, responsivos e parecem promover uma vinculação segura com os seus filhos gerando, desta forma, consequências desenvolvimentais positivas (Cassidy, 1999). Uma menor qualidade da vinculação está relacionada com os estilos parentais caraterizados por níveis elevados de rejeição e baixo suporte emocional, contrariamente, um maior suporte emocional e uma menor rejeição parecem promover uma vinculação segura (Simões, Farate, Soares, & Pocinho, 2011). Karavasilis, Doyle e Markiewicz (2003), numa investigação com 202 crianças e 212 adolescentes, defendem que um estilo parental autoritativo parece promover relações de vinculação seguras, pelo que os autores encontraram associações positivas entre o estilo autoritativo e uma vinculação segura à mãe em crianças e adolescentes. Também Simões et al. (2011), numa investigação com 288 mães de crianças em idade escolar evidenciaram que as mães que prestam um maior suporte emocional aos seus filhos verificam um comportamento de vinculação mais seguro. Pelo contrário, as mães que evidenciam comportamentos de rejeição para com os seus filhos verificam nestes um comportamento de vinculação mais inseguro. Também numa investigação de Neal e Frick-Horbury (2001) com 56 estudantes universitários com idades compreendidas entre os 18 e 22 anos, os autores concluíram que 92% dos estudantes que identificaram os pais com um estilo autoritativo evidenciavam relações de vinculação seguras com os mesmos. Neste sentido, os estilos parentais parecem exercer um papel na qualidade da vinculação criada entre as figuras parentais e os jovens adultos.
Darling e Steinberg (1993) caraterizam os estilos parentais como padrões gerais de características da relação pais-filhos, podendo incluir comportamentos diretivos (como práticas educativas) e comportamentos espontâneos (gesticulação, tom de voz, expressão emocional). Nesta medida, os estilos parentais assumem especial destaque no desenvolvimento de maior ou menor segurança, desenvolvendo-se a transição para o exterior com maior ou menor sucesso, no enfrentar de novos desafios desenvolvimentais como é o caso da adaptação académica. O estilo parental autoritativo apresenta figuras parentais disponíveis e recetivas o que permite equilibrar o controlo e o afeto dirigidos à criança. Desta forma, tendem a preocupar-se com o seu bem-estar, promovem a responsabilidade, autonomia, autoconfiança, assertividade e o autocontrolo, sendo que parecem promover um melhor desenvolvimento biopsicossocial da criança (Baumrind, 1991). Pelo contrário, as crianças que vivenciaram um ambiente parental pautado por um estilo autoritário apresentam valores mais reduzidos ao nível do autoconceito, apresentam insegurança, agressividade, dependência, dificuldades na regulação das emoções, evidenciam níveis reduzidos de responsabilidade social e mais comportamentos de externalização (Baumrind, 1967, 1971). Relativamente ao estilo parental permissivo, este parece comprometer o desenvolvimento académico e social das crianças, estas evidenciam baixos níveis de autocontrolo, autoconfiança, autoestima, baixa autonomia, imaturidade, dependência e mais comportamentos disruptivos ao nível da responsabilidade social (Baumrind, 1967, 1971). O estilo parental autoritativo parece ser o que revela melhores resultados nas crianças ao nível do desempenho académico, competências sociais e menor índice de problemas de internalização e externalização (Baumrind, 1966, 1971).
As figuras parentais constituem a principal base social da criança, mais tarde, as relações primordiais estabelecidas parecem exercer um contributo significativo no que concerne à aquisição de competências sociais do jovem adulto (Bennett & Hay, 2007; Rockhill, Stoep, McCauley, & Katon, 2009). Desta forma, as competências sociais adquiridas através das relações com as figuras de vinculação e com outros significativos ao longo do percurso desenvolvimental, parece ter especial importância no estabelecimento das relações fora do seio familiar, nomeadamente com os pares e professores, sendo relevante para a vivência académica do jovem adulto. Segundo Arnett (2000), por volta dos 18 anos enfatiza-se o processo de separação-individuação das figuras parentais, sendo um princípio fundamental de organização do crescimento humano que tem implicações para o funcionamento adaptativo ao longo do ciclo vital. Sendo assim, a individuação tem como objetivo a obtenção de autonomia e independência por parte do jovem adulto (Lapsley, 2010). Mota e Rocha (2012) evidenciaram a importância da qualidade de relação que o jovem estabelece com as figuras de vinculação, destacando o seu papel de facilitadores no processo de individuação. Neste seguimento e porque existe um processo de transição nas relações, a qualidade do processo de separação e aquisição de autonomia dos jovens face aos pais, poderá ser evidenciada nas relações que o jovem adulto estabelece com o grupo de pares (Mota & Rocha, 2012). A transição para o Ensino Superior, comporta na vivência do jovem um conjunto de mudanças significativas como especialmente quando se afastam da família nuclear, nomeadamente o desenvolvimento de relações íntimas com os pares e a adaptação a novos contextos (Cavanaugh, 2005; Monteiro, Tavares, & Pereira, 2007). A nível académico verificam-se também algumas mudanças, pelo que o jovem adulto é confrontado com novos ritmos de trabalho, novas estratégias de aprendizagem, diferentes formas de avaliação, podendo constituir alguma estranheza face a vivência diversificada e exigente (Almeida, 2007). Os laços afetivos estabelecidos com as figuras de vinculação, bem como a coesão e a expressividade, o suporte por parte destas figuras e a facilitação do processo de separação-individuação, podem desempenhar um papel relevante nos processos de adaptação do jovem adulto, como seja a transição para ao contexto académico. Por outro lado, a ausência de apoio poderão favorecem uma inadaptação do jovem adulto a este contexto bem como dificuldades a nível psicossocial (Silva & Ferreira, 2009). A transição para o ensino superior é vista pelo jovem adulto como sendo uma conquista da liberdade e autonomia, mas por outro lado, é uma situação geradora de ansiedade, face aos novos desafios que o jovem adulto irá enfrentar. Ressalta-se o facto de este evento não assumir o mesmo papel para todos os indivíduos, uma vez que cada um reage a ele tendo em conta as suas estratégias de coping.
Esta mudança desenvolvimental traduz para muitos jovens adultos um afastamento do microssistema familiar, bem como das relações securizantes geradas ao longo da infância e adolescência. Desta forma, urge a necessidade de desenvolver novos relacionamentos interpessoais (Soares, Guisande, & Almeida, 2007). Para além deste novo desafio, o jovem adquire autonomia e independência, tendo que desenvolver estratégias que lhe permitam ser capaz de gerir o tempo e os recursos económicos de que dispõe. Neste sentido, o Ensino Superior é responsável por propiciar o desenvolvimento pessoal e da identidade do jovem adulto (Almeida, 2007). Os primeiros dias no Ensino Superior são preponderantes para o desenvolvimento de estratégias de coping adequadas para lidar com as exigências desta nova etapa. O fracasso das mesmas poderá ser um fator de risco para o desenvolvimento de sintomatologia ansiosa e mal-estar psicológico. A continuidade destes poderá despoletar estados de ansiedade, depressão e solidão, com repercussões no sucesso escolar e na permanência dos sujeitos no Ensino Superior (Pereira, 1997; Polo, Hernandéz, & Pozo, 1996).
O bem-estar psicológico do jovem adulto engloba o envolvimento positivo que é estabelecido com os pares, mas também a relação interior que estabelece consigo. É fundamental que o jovem adulto estabeleça boas relações interpessoais, envolvimento social, motivação, para que possa manifestar uma boa saúde mental e consequentemente, um maior bem-estar psicológico (Massé et al., 1998). No mesmo sentido, Monteiro et al. (2007), num estudo com 316 estudantes universitários, constataram que os elevados níveis de evitamento relativamente às figuras parentais e a outras figuras significativas, assim como os níveis de ansiedade em relação a outras figuras, constituem-se como fatores de risco para o surgimento de sintomatologia psicopatológica e para a baixa perceção de bem-estar no decurso da fase de adaptação ao ensino superior. É necessário realçar que a relação com as figuras de vinculação exerce um papel na adaptação académica dos jovens adultos. Também se constatam diferenças ao nível do género, ou seja, o sexo masculino assume condutas e formas de estar mais externalizantes, tendo uma perceção diferente da influência parental, comparativamente com o sexo feminino (Hutz & Bardagir, 2006). Segundo Diener, Suh, Lucas e Smith (1999), estes resultados poderão resultar do facto de as mulheres serem mais sensíveis as emoções negativas do que os homens. Desta forma, o género feminino parece atribuir maior importância a questões relacionadas com a dinâmica relacional, imagem corporal, manifestando uma menor autoestima comparativamente ao género masculino que parece evidenciar maiores sentimentos de aceitação de si, enquanto forte contributo para o seu bem-estar psicológico (e.g., Robins & Trzesniewski, 2005).
Objetivos e hipóteses
O presente estudo tem como principal objetivo analisar o papel dos estilos parentais na adaptação académica e o bem-estar psicológico de jovens adultos. Pretende-se ainda controlar as variáveis género e idade nesta análise. Por último pretende-se ainda testar o papel moderador do género na associação anterior. Face aos objetivos propostos, prevê-se que o bem-estar psicológico prediga positivamente a adaptação académica, que os jovens adultos com idades compreendidas entre os 18 e 20 anos evidenciem níveis mais elevados de sociabilidade e equilíbrio comparativamente com os jovens adultos com idades compreendidas entre os 21 e 25 anos, e que ocorram diferenças na perceção de bem-estar psicológico por parte de ambos os sexos. Por último, espera-se que haja um efeito moderador do género na associação entre os estilos parentais e a adaptação académica, na medida em que se espera que nas raparigas ocorra um efeito do estilo parental na sua adaptação ao contexto académico.
Método
Participantes
No estudo participaram 787 jovens universitários com idades compreendidas entre os 18 e os 25 anos (M=20.07, DP=1.7), dos quais 233 (29.6%) são do sexo masculino e 554 (70.04%) do sexo feminino. Relativamente à idade das figuras parentais, as figuras paternas dos participantes apresentam idades compreendidas entre os 35 e os 76 anos (M=50.40, DP=5.57), enquanto as figuras maternas apresentam idades entre os 35 e 74 anos (M=47.95, DP=5.35). Tendo em conta o rendimento académico, 403 sujeitos referem ter um rendimento académico “médio” (51.2%).
Instrumentos
Questionário Sociodemográfico. Foi construído um questionário sociodemográfico que permitiu obter informações relativas à idade, sexo e recolher informação acerca do meio familiar e académico.
Parental Styles and Dimensions Questionnaire: Short Version (PSDQ – traduzido para a população portuguesa por Nunes & Mota, 2013, a partir da versão original de Robinson, Mandleco, Olsen, & Hart, 1995). Consiste uma versão reduzida composta por 32 itens, o instrumento original era composto por 133 itens. Este questionário apresenta uma versão para a “Mãe” e outra para o “Pai” em que apenas difere o género na formulação das afirmações. É um instrumento de autorrelato no qual as respostas se apresentam numa escala tipo Likert que varia entre 1 – “Nunca” e 5 – “Sempre”. As respostas são elaboradas tendo em conta a frequência com que ocorrem as situações referidas nos itens. O instrumento organiza-se em três dimensões: o estilo autoritativo, o autoritário e o permissivo, que vão de encontro à tipologia de Baumrind (1971). Cada dimensão organiza-se em subdimensões, sendo que, do estilo autoritativo fazem parte as escalas: apoio e afeto, regulação e cedência de autonomia; do estilo autoritário fazem parte as escalas: coerção física, hostilidade verbal e punição; e do estilo permissivo apenas a escala indulgência. Ainda que esta seja a organi zação original do instrumento, neste estudo, tendo em conta as propriedades psicométricas, procedeu-se à agregação das dimensões coerção física e punição numa só, pelo que sob o ponto de vista semântico e estrutural obtiveram-se índices de ajustamento mais adequados à amostra em estudo. Destaca-se ainda que, através das análises confirmatórias de 1ª ordem, se constatou que a dimensão hostilidade verbal, nesta amostra, não se encontra ajustada face ao constructo originalmente estabelecido pelo autor, sendo que foi retirada da análise por forma a não enviesar os resultados. A análise da consistência interna revelou um alpha de Cronbach de .89 para o Pai e .85 para a Mãe, relativamente à totalidade dos itens do instrumento. Analisados os valores relativos às dimensões, verificam-se valores de alpha de .95 e .93 no estilo autoritativo, .77 e .77 no estilo autoritário e .62 e .60 no estilo permissivo, quanto ao Pai e à Mãe, respetivamente. Os modelos apresentaram índices de ajustamento dentro dos valores de referência, os índices de ajustamento GFI, AGFI e CFI estão acima de .90, assim como os índices de RMR e RMSEA com valores abaixo de .080 (Fan, Thompson & Wang, 1999). Quanto às análises fatoriais confirmatórias verificaram-se índices de ajustamento adequados para os modelos χ2(78)=334.55, p=.001, χ2(77)=360.14, p=.001, Ratio=4.29/5.42, SRMR=.093/.081, RMSEA=.07/.07, CFI=.97/.95 quer da versão da mãe, quer do pai, respetivamente.
Questionário de Vivências Académicas (QVA – versão reduzida de Almeida, Ferreira, & Soares, 2002). Constituído por 60 itens que abrangem cinco dimensões da adaptação académica dos estudantes: interpessoal, pessoal, carreira, estudo-aprendizagem e institucional. Os itens do questionário estão organizados em respostas do tipo Likert de cinco pontos, variando desde 1 – “Nunca” até 5 – “Sempre”. A dimensão interpessoal é constituída por 13 itens, aponta para as relações de amizade dos jovens em contexto académico como também em relações mais íntimas e significativas; a dimensão pessoal evidencia aspetos associados à perceção de bem-estar pelo jovem, é constituída por 13 itens; a dimensão carreira é constituída por 13 itens, remete para os projetos vocacionais do jovem e satisfação pelo curso em que se encontra; relativamente à dimensão estudo-aprendizagem, é composta por 13 itens, refere aspetos de competências de estudo mas também em rotinas de estudo, gestão do tempo, utilização da biblioteca para estudo e outros recursos de aprendizagem; a dimensão institucional foca o estabelecimento de ensino como um todo, os vários serviços e estruturas que o estabelecimento disponibiliza, está organizada por 8 itens. A análise da consistência interna revelou um alpha de Cronbach de.76 para a totalidade dos itens do instrumento. Relativamente à análise por dimensão verificam-se valores de .58 na dimensão interpessoal, .85 na dimensão pessoal, .75 na dimensão carreira, .67 na dimensão estudo, .50 na dimensão institucional. Os índices de ajustamento GFI, AGFI e CFI estão acima de .90, assim como os índices de RMR e RMSEA com valores abaixo de .080 (Fan, Thompson, & Wang, 1999). Quanto às análises fatoriais confirmatórias verificaram-se índices de ajustamento adequados para os modelos χ2(80)=323.16, p=.001, Ratio=4.04, RMR=.02, RMSEA=.06; CFI=.93, encontrando-se dentro dos valores de referência.
Escala de Medida de Manifestação do Bem-estar Psicológico (traduzida e adaptada para a população portuguesa por Monteiro et al., 2007, a partir da versão original da Échelle de Mesure des Manifestations du Bien-Être Psychologique de Massé et al., 1998). Esta escala é constituída por 25 itens, organizados em 6 escalas que avaliam fatores como a autoestima, equilíbrio, envolvimento social, sociabilidade, controlo de si e acontecimentos, felicidade. A escala autoestima é constituída por 4 itens; a escala equilíbrio é composta por 4 itens; envolvimento social, composto por 4 itens; sociabilidade, também composta por 4 itens; controlo de si e acontecimentos, com 4 itens, e por último a escala felicidade, composta por 5 itens. A resposta aos itens é atribuída numa escala tipo Likert que varia de 1 – “Nunca” a 5 – “Quase Sempre”. A análise da consistência interna revelou um alpha de Cronbach de .95 para a totalidade dos itens do instrumento. Relativamente à análise por dimensão verificam-se valores de .91 na dimensão felicidade, .85 na dimensão autoestima, .87 na dimensão controlo de si e dos acontecimentos, .71 na dimensão envolvimento social, .75 na dimensão equilíbrio e .85 na dimensão sociabilidade. Os índices de ajustamento GFI, AGFI e CFI estão acima de .90, assim como os índices de RMR e RMSEA com valores abaixo de .080 (Fan, Thompson, & Wang, 1999). Quanto às análises fatoriais confirmatórias verificaram-se índices de ajustamento adequados para os modelos χ2(120)=487.30, p=.001, Ratio=4.06, RMR=.03, RMSEA=.06, CFI=.96), apresentaram índices de ajustamento dentro dos valores de referência.
Procedimento
A recolha de dados foi realizada de forma aleatória em diversos cursos, anos e turmas de instituições de ensino superior da zona norte de Portugal que aceitaram colaborar na investigação. Ressalta-se o facto de em cada instituição de ensino superior terem sido contactados os Diretores de escola/curso a quem foram solicitadas as devidas autorizações e clarificados os vários aspetos do estudo. A recolha de dados decorreu entre Outubro de 2015 e Janeiro de 2016. Esta ocorreu em contexto de sala de aula, na presença do investigador responsável, que de forma sucinta realizou uma série de instruções standard onde foram explicitados os objetivos gerais do estudo, assim como, garantidos todos os pressupostos de voluntariedade, privacidade, anonimato e confidencialidade das informações prestadas. O protocolo foi submetido ao conselho de ética da Universidade de Trás-Os-Montes e Alto Douro por forma a garantir todos os pressupostos éticos inerentes ao projeto de investigação, obtendo aprovação.
Estratégia de análise de dados
A avaliação dos sujeitos da amostra foi realizada num único momento, tratando-se, de uma investigação de carácter transversal, não estando prevista uma reavaliação ou seguimento dos sujeitos. Nas várias etapas de desenvolvimento do estudo foram tidos em conta os valores éticos de deontológicos do Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses (CDOPP), nomeadamente no que refere às questões de privacidade, confidencialidade e anonimato. O tratamento de dados foi realizado com recurso ao programa estatístico SPSS – Statistical Package for Social Sciences – na sua versão 22.0 para o sistema Windows. No sentido de identificar e excluir eventuais missings e outliers. Para testar se os dados da amostra seguiam os pressupostos de normalidade, foram analisados os valores de skeweness (assimetria) e kurtosis (achatamento) assumindo-se a normalidade sempre que os valores se encontrassem compreendidos no intervalo da sua unidade (-1 e 1) (Marôco, 2007). Foi realizado um conjunto de análises estatísticas nas quais foram considerados valores de significância de p<.05 para a interpretação dos dados. Destaca-se o recurso a análises correlacionais, análises de variância multivariadas (MANOVAS) e univariadas (ANOVA) e testes t. Testou-se ainda a existência de um papel moderador do género na associação entre estilos parentais e adaptação académica com recurso a análises de regressões múltiplas. O tratamento dos resultados foi realizado com os programas IBM SPSS® – Statistical Package For Social Sciences e IBM SPSS® – Amos ambos na versão 21.0x86 para o sistema Microsoft® Windows®10. Foi utilizado também o plugin PROCESS macro for SPSS and SAS v2.16 (Hayes, 2014, 2016).
Resultados
Papel preditor do bem-estar psicológico na adaptação académica
Com o intuito de dar resposta a um dos objetivos inicialmente propostos, procedeu-se à realização de análises de regressão múltipla hierárquica, nas quais foi utilizada como variável dependente a adaptação académica. De forma a obter resultados mais fiáveis e de se abranger todas as dimensões independentes em estudo, optou-se pelo método hierárquico em detrimento das análises de regressão simples. As análises de regressão múltipla hierárquica foram realizadas mediante a introdução de 3 blocos, especificamente idade, sexo e as escalas do bem-estar psicológico. As variáveis sexo e idade foram controladas e recodificadas em dummy, de forma a analisar qual dos sexos (0 – masculino, 1 – feminino) e idades (1-18 a 20 anos; 2-21 a 25 anos) explicam e predizem melhor as variáveis preditas.
Na análise de regressão múltipla hierárquica face à dimensão pessoal das escalas de vivências académicas foram introduzidos 3 blocos: no bloco 1 a idade (Dummy), não contribui significativamente para a variância do modelo F(1,785)=1.09, p=.30, explica 0.1% da variância total (R2=.001) e contribui individualmente com 0.1% da variância para o modelo (R2 change=.001). No bloco 2 o sexo (Dummy) não apresenta um contributo significativo F(2,784)=.66, p=.52, explica 0.2% da variância total (R2=.002), não apresentando um contributo individual (R2 change=.000). No bloco 3 o bem-estar psicológico contribui significativamente para o modelo F(8,778)=55.41, p=.001 e explica 36.3% da variância total (R2=.363), apresentando um contributo individual de 36.1% (R2 change=.361). Analisando individualmente o contributo de cada uma das variáveis independentes dos blocos, constata-se que duas variáveis apresentam uma contribuição significativa, estas são apresentadas por ordem de importância: felicidade (β=-.495) e equilíbrio (β=-.084) (Tabela 1). Na análise de regressão múltipla hierárquica face à dimensão interpessoal das escalas de vivências académicas foram introduzidos 3 blocos: no bloco 1 a idade (Dummy), contribui significativamente para a variância do modelo F(1,785)=3.49, p=.003, explica 0.4% da variância total (R2=.004) e contribui individualmente com 0.4% da variância para o modelo (R2 change=.004). No bloco 2 o sexo (Dummy) apresenta um contributo significativo F(2,784)=4.42, p=.01, explica 1.1% da variância total (R2=.011), apresentando um contributo individual com 0.7% da variância para o modelo (R2 change=.007). No bloco 3 o bem-estar psicológico contribui significativamente para o modelo F(8,778)=32.775, p=.001 e explica 25.2% da variância total (R2=.252), apresentando um contributo individual de 24.1% da variância para o modelo (R2 change=.241). Analisando individualmente o contributo de cada uma das variáveis independentes dos blocos, constata-se que quatro variáveis apresentam uma contribuição significativa, estas são apresentadas por ordem de importância: sociabilidade (β=.326), felicidade (β=.156), equilíbrio (β=-.131) e autoestima (β=.119) (Tabela 1). No que respeita à dimensão carreira das escalas de vivências académicas, foram introduzidos 3 blocos: no bloco 1 a idade (Dummy), não contribui significativamente para a variância do modelo F(1,785)=.02, p=.90, não apresentando um contributo para a variância total (R2=.000) nem apresentado um contributo individual (R2 change=.000). No bloco 2 o sexo (Dummy) apresenta um contributo significativo F(2,784)=5.10, p=.006, explica 1.3% da variância total (R2=.013), apresentando um contributo individual com 1.3% da variância para o modelo (R2 change=.013). No bloco 3 o bem-estar psicológico contribui significativamente para o modelo F(8,778)=18.950, p=.001 e explica 16.3% da variância total (R2=.163), apresentando um contributo individual de 15% da variância para o modelo (R2 change=.150). Analisando individualmente o contributo de cada uma das variáveis independentes dos blocos, constata-se que quatro variáveis apresentam uma contribuição significativa, estas são apresentadas por ordem de importância: envolvimento (β=.194), equilíbrio (β=.155), autoestima (β=.129) e sexo (β=.108) com contributo do género feminino (Tabela 1). No que concerne à dimensão institucional das escalas de vivências académicas, foram introduzidos 3 blocos: no bloco 1 a idade (Dummy), não contribui significativamente para a variância do modelo F(1,785)=.13, p=.72, não apresentando um contributo para a variância total (R2=.000) nem apresentado um contributo individual (R2 change=.000). No bloco 2 o sexo (Dummy) não contribui significativamente para a variância do modelo F(2,784)=.14, p=.87, não apresentando um contributo para a variância total (R2=.000) nem apresentado um contributo individual (R2 change=.000). No bloco 3 o bem-estar psicológico contribui significativamente para o modelo F(8,778)=8.96, p=.001 e explica 8.4% da variância total (R2=.084), apresentando um contributo individual de 8.4% da variância para o modelo (R2 change=.084). Analisando individualmente o contributo de cada uma das variáveis independentes dos blocos, constata-se que duas variáveis apresentam uma contribuição significativa, estas são apresentadas por ordem de importância: equilíbrio (β=.135) e autoestima (β=.121) (Tabela 1). Na dimensão estudo das escalas de vivências académicas, foram introduzidos 3 blocos: no bloco 1 a idade (Dummy), não contribui significativamente para a variância do modelo F(1,785)=.56, p=.46, explica 0.1% da variância total (R2=.001), apresentando um contributo individual com 0.1% da variância para o modelo (R2 change=.001). No bloco 2 o sexo (Dummy) apresenta um contributo significativo F(2,784)=11.38, p=.001, explica 2.8% da variância total (R2=.028), apresentando um contributo individual com 2.8% da variância para o modelo (R2 change=.028). No bloco 3 o bem-estar psicológico contribui significativamente para o modelo F(8,778)=27.93, p=.001 e explica 22.3% da variância total (R2=.223), apresentando um contributo individual de 19.5% da variância para o modelo (R2 change=.195). Analisando individualmente o contributo de cada uma das variáveis independentes dos blocos, constata-se que quatro variáveis apresentam uma contribuição significativa, estas são apresentadas por ordem de importância: envolvimento (β=.293), autoestima (β=.186), sexo (β=.175) com contributo do género feminino e equilíbrio (β=.149) (Tabela 1).
Papel moderador do género na associação entre estilos parentais e adaptação académica
Na sequência das análises realizadas procedeu-se à determinação do papel moderador do género na associação entre estilos parentais (autoritário, permissivo e autoritativo) e adaptação académica. Para determinar este papel moderador do género, foram realizadas regressões tendo por base o programa macro process de Hayes (2014). Para proceder a esta análise, foi criada uma variável única para a adaptação académica, uma vez que as escalas do questionário de vivências académicas são positivas, procedeu-se à junção das mesmas, criando assim, um compósito da variável. Foi testado o efeito moderador do género na associação dos estilos parentais autoritários (pai e mãe) e adaptação académica. Através da análise dos resultados pode-se constatar que o estilo parental autoritário pai contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=2.82, p=.04. Contudo, não existe um efeito moderador do género na associação entre o estilo parental autoritário face ao pai e a adaptação académica, ou seja, o género não tem qualquer efeito nesta predição β=-.035, t(783)=-.923, p=.36. Relativamente ao estilo parental autoritário mãe, os resultados sugerem que este não contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=2.50, p=.06, não existindo um efeito moderador do género na associação entre o estilo parental autoritário mãe e a adaptação académica, ou seja, o género não tem qualquer efeito nesta predição β=-.019, t(783)=-.509, p=.61. No que concerne ao efeito moderador do género na associação do estilo parental permissivo pai e adaptação académica, os resultados sugerem que o estilo parental permissivo pai contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=3.90, p=.01, apesar disto, não existe um efeito moderador do género nesta predição β=.005, t(783)=.136, p=.89. Na associação entre estilo parental permissivo mãe e adaptação académica, os resultados sugerem que o estilo parental permissivo mãe contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=3.32, p=.02, contudo, não se verifica um efeito moderador do género nesta predição β=-.023, t(783)=-.650, p=.52.
Por último, no que respeita ao efeito moderador do género na associação do estilo parental autoritativo pai e adaptação académica, os resultados sugerem que o estilo parental autoritativo pai contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=10.67, p=.001, verifica-se a existência de um efeito moderador do género nesta predição β=.052, t(783)=2.182, p=.03, IC [.005, .099]. Através da análise dos resultados constata-se que quanto mais elevado for o estilo parental autoritativo pai, maior é a adaptação académica dos jovens adultos do género feminino. Por outro lado, nos jovens adultos do género masculino, não se verificam alterações na adaptação académica quando o estilo parental autoritativo pai aumenta. Contudo, quando o estilo autoritativo pai é baixo, as jovens adultas do género feminino parecem ter menor adaptação académica do que os jovens do género masculino (Figura 1).
No que concerne ao efeito moderador do género na associação do estilo parental autoritativo mãe e adaptação académica, os resultados sugerem que o estilo parental autoritativo mãe contribui significativamente para a variância do modelo F(3,783)=12.43, p=.001, verifica-se a existência de um efeito moderador do género nesta predição β=.068, t(783)=2.454, p=.01, IC [.014, .122]. Através da análise dos resultados, verifica-se que quanto mais elevado for o estilo parental autoritativo mãe, maior é a adaptação académica das jovens adultas do género feminino. Por outro lado, nos jovens adultos do género masculino, não se verificam alterações na adaptação académica quando o estilo parental autoritativo mãe aumenta. Quando o estilo parental autoritativo mãe é baixo, as jovens adultas do género feminino parecem ter menor adaptação académica, comparativamente com os jovens adultos do género masculino (Figura 2).
Discussão
O presente estudo teve como principal objetivo testar o papel dos estilos parentais no desenvolvimento de adaptação académica e bem-estar psicológico, bem como analisar o papel moderador do género na associação entre os estilos parentais e a adaptação académica.
Os resultados permitiram também verificar que a adaptação académica é predita positivamente pelo bem-estar psicológico. Nesta medida, parece que uma perceção de maior bem-estar psicológico constitui um fator protetor da adaptação académica, uma vez que a perceção positiva que o jovem adulto tem ao nível da sua felicidade, autoestima, envolvimento social, sociabilidade, controlo de si e acontecimentos e equilíbrio, parece gerar um efeito positivo na adaptação ao contexto académico. Estes resultados vão ao encontro dos pressupostos de Coleta e Coleta (2006) que constataram que a forma como o jovem perceciona a sua felicidade poderá interferir em todos os seus comportamentos académicos pelo que poderá causar efeitos ao nível do seu ajustamento académico. O ingresso no ensino superior acarreta uma relevância psicológica, na medida em que esta transição evidencia uma série de mudanças que coincidem com as modificações desenvolvimentais despoletadas pelo final da adolescência e início da idade adulta (Diniz & Almeida, 2006). Chickering e Reisser (1993) defendem que a faixa etária do jovem adulto, no que concerne ao contexto universitário, é um período de desenvolvimento individual, através do qual surgem vetores do desenvolvimento psicossocial, entre os quais o desenvolvimento da autonomia, o desenvolvimento das relações interpessoais, a construção de uma identidade sólida, o desenvolvimento da integridade e o desenvolvimento de ideais. A preocupação nos primeiros meses de frequência no ensino superior é direcionada para o investimento nas relações interpessoais. Posteriormente, poderá assumir-se que os jovens estão mais focados nas responsabilidades a nível universitário quando consideram que o contexto de relações sociais está estabelecido (Diniz & Almeida, 2006; Ferreira, Almeida, & Soares, 2001). Também num estudo com uma amostra de 68 jovens realizado por Fernandes e Almeida (2005), os resultados revelaram que os alunos com melhor rendimento no final do ano preocupavam-se mais com tarefas curriculares, associando-se desta forma, a índices mais baixos de fadiga e sonolência diária, comparativamente com os alunos com pior rendimento académico. Pelo exposto, constata-se que a integração e a aceitação social são fatores fundamentais com que o jovem adulto se depara quando ingressa no ensino superior.
Por último e de encontro aos objetivos propostos, verificou-se um efeito moderador do género na associação entre o estilo parental autoritativo, face ao pai e à mãe, e a adaptação académica. Foram realizadas outras moderações entre o estilo parental autoritário pai e mãe e a adaptação académica e entre o estilo parental permissivo pai e mãe e a adaptação académica, contudo, não se verificou um efeito moderador do género nesta associação. Ou seja, o género parece não exercer qualquer diferença na associação dos estilos parentais permissivo e autoritário (pai e mãe) na adaptação académica dos jovens adultos. Por outro lado os resultados sugerem que quanto mais elevada for a perceção de um estilo parental autoritativo (pai e mãe), maior é a adaptação académica das raparigas, ao mesmo tempo, parecem não existir alterações na adaptação académica dos rapazes quando aumenta a perceção do estilo parental autoritativo. Desta forma, parece que uma maior perceção de um estilo parental autoritativo parece ser um fator preponderante para o desenvolvimento de uma maior adaptação académica nas raparigas. Estes resultados são consistentes com a literatura que evidencia que os rapazes parecem estar mais voltados para o contexto, na sua generalidade, ao passo que as raparigas estão mais voltadas para as relações de afeto. Esta afirmação é justificada pelo facto de o sexo feminino evidenciar uma socialização pautada pela dinâmica relacional, constatando-se uma maior perceção dos estilos parentais (e.g., Muris, Meesters, Merckelbach, & Hülsenbeck, 2000). Também se verifica na literatura que um estilo parental autoritativo parece favorecer uma maior adaptação académica, neste sentido, o sexo feminino parece evidenciar um maior investimento parental e níveis mais elevados de realização, comparativamente aos rapazes que são mais orientados para a socialização (e.g., Baumrind, 1971; Brand et al., 2011; Olivari, Wahn, Maridaki-Kassotaki, Antonopoulou, & Confalonieri, 2015). Verifica-se um maior investimento parental percecionado pelo sexo feminino, estes resultados são consistentes com a literatura onde é sugerido que nos rapazes comparativamente com as raparigas, é reportada uma maior pontuação para os estilos parentais mais negativos (autoritário e permissivo) (e.g., Brand et al., 2011; Olivari et al., 2015). Hutz e Bardagir (2006) constataram que o sexo masculino assume condutas e formas de estar mais externalizantes, tendo uma perceção diferente da influência parental, comparativamente com o sexo feminino. As conclusões formuladas vão ao encontro da conceção de Baumrind (1985), sugerindo que o estilo autoritativo tem um efeito significativo no desenvolvimento de competências que permitam enfrentar situações geradoras de stress. Os pais autoritários adotam estratégias focalizadas na punição e obediência, não existindo espaço para o diálogo. Desta forma, esse controlo limita o desenvolvimento da autonomia. Derivado desta conduta, surgem comportamentos dependentes, submissos, reações passivo-agressivas e baixas motivações para realizações, gerando desta forma, um baixo bem-estar psicológico e consequente dificuldade de adaptação ao meio académico. Segundo Baumrind (1971), quando comparados com os filhos de pais autoritativos, as raparigas são menos assertivas do ponto de vista social e os rapazes são menos orientados para a realização. As raparigas parecem ser mais dominantes, independentes e orientadas para a realização, ao contrário dos rapazes que parecem ser socialmente mais responsáveis, altruístas e socialmente maduros (Baumrind, 1971). Num estudo desenvolvido por Boeckel e Sarriera (2006), que pretendeu testar o efeito dos estilos parentais, estilos atribucionais e bem-estar psicológico em 323 jovens universitários de ambos os sexos, os investigadores também concluíram que o estilo parental autoritativo prediz o bem-estar psicológico, sendo que uma maior intensidade deste estilo parental corresponde a elevados níveis de bem-estar psicológico. Pelo contrário, concluíram que quanto maior a intensidade do estilo parental autoritário, menor o nível de bem-estar psicológico. Desta forma, verifica-se que as figuras parentais que promovem a responsabilidade, autonomia, autoconfiança e assertividade do jovem adulto, parecem criar condições necessárias para que o jovem adulto tenha um maior rendimento académico comparativamente aos jovens que percecionaram as figuras parentais como pouco apoiantes. Num estudo com 641 jovens, os investigadores Juang e Silbereisen (2002) constataram que as condutas parentais, tais como, o afeto, envolvimento, as discussões acerca dos assuntos académicos e intelectuais estão relacionados com uma maior capacidade académica e melhores resultados escolares evidenciados pelos jovens. Pelo contrário, um estilo parental autoritário estimula comportamentos de evitamento em situações de realização, o que evidencia repercussões negativas nos resultados escolares (Fontaine 1988). Pelo exposto, uma maior perceção de um estilo parental autoritativo revela-se um fator preponderante para o desenvolvimento de uma maior adaptação académica nas raparigas.
Implicações práticas, limitações e pistas futuras
Como apontamentos finais, cabe destacar as implicações práticas inerentes à realização do presente estudo, nomeadamente o contributo positivo na compreensão da importância da adoção de um estilo parental autoritativo no desenvolvimento de uma melhor adaptação académica e consequentemente, uma perceção mais elevada de bem-estar psicológico. Desta forma, é expectável que as conclusões formuladas possam contribuir para uma maior consciencialização, acerca dos estilos parentais na adaptação académica, assim como, para a clarificação de fatores protetores da mesma no decurso da adultícia. Apesar das implicações práticas referidas, a concretização do presente estudo deparou-se com algumas limitações, nomeadamente a sensibilidade denotada pelos participantes face ao questionário de estilos parentais, que pode associar ao enviesamento de resultados pela atribuição de respostas por desejabilidade social. Refere-se também a subjetividade inerente aos resultados, uma vez que estes foram recolhidos sob a forma de questionários de autorrelato. Acresce também o facto de esta investigação ser de cariz transversal, impossibilitando a comparação de resultados ao longo do tempo, bem como o estabelecimento de relações de causalidade. Salientam-se também algumas caraterísticas intrínsecas da amostra, nomeadamente o facto de ser constituída apenas por estudantes universitários. Relativamente a pistas futuras, seria relevante optar por um estudo de cariz longitudinal e contemplar uma população e faixa etária mais abrangente. Também seria relevante, em investigações futuras, a realização de entrevistas aos jovens adultos e às figuras parentais, de forma a obter dados mais objetivos, bem como a análise de outras variáveis relacionais como por exemplo, a presença de psicopatologia, fatores de personalidade e controlar outras variáveis como o nível socioeconómico e o facto de os jovens adultos estarem ou não deslocados de casa. Seria igualmente importante realçar na prática psicológica a importância dos estilos parentais e do bem-estar psicológico na adaptação académica dos jovens.
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A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Maria Bárbara Granja, UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Edifício das Ciências Humanas e Sociais, polo I, Quinta dos Prados, 5000-801 Vila Real, Portugal. E-mail: barbaragranja@hotmail.com
Este trabalho foi parcialmente financiado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia, no âmbito do projeto PEst-C/PSI/UI0050/2011 e fundos do FEDER através do programa COMPETE no âmbito do projeto FCOMP-01-0124-FEDER-022714.
Submissão: 20/04/2017 Aceitação: 20/06/2017