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Análise Psicológica

Print version ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica vol.33 no.3 Lisboa Sept. 2015

https://doi.org/10.14417/ap.967 

A confiança em testemunhas: O papel das diferenças individuais

João Fundinho1, Karlos Luna2, Pedro B. Albuquerque1

1Escola de Psicologia, Universidade do Minho, Braga, Portugal

2Department of Psychology, Suleyman Sah University, Istanbul, Turkey

Correspondência

 

RESUMO

Por vezes, a confiança com que uma testemunha recorda um crime relaciona-se com a exatidão da recordação. A investigação sugere que esta relação é complexa e pode ser influenciada por diferenças individuais. Neste estudo procurou-se perceber qual a influência da autoestima, impulsividade e tipo de tomada de decisão nesta relação. No procedimento apresentou-se um vídeo de um assalto, questões sobre este, e pediu-se a atribuição de julgamentos de confiança sobre as respostas. Os participantes responderam e julgaram também questões de conhecimento geral e responderam a escalas de autoestima (Rosemberg Self-esteem Scale), impulsividade (Barratt Impulsiveness Scale) e tipo de tomada de decisão (Cognitive Reflection Test). Os resultados revelam não haver influência das variáveis estudadas na calibração, sobreconfiança e exatidão das respostas, e também mostram maior subconfiança em questões de conhecimento geral comparativamente com as questões de testemunho. Os resultados indicam também que os participantes que utilizam um processo mais racional nas suas tomadas de decisão (sistema 2) apresentam maior exatidão e confiança do que os participantes que utilizam um processo mais intuitivo (sistema 1).

Palavras-chave: Confiança, Calibração, Sub/Sobreconfiança, Testemunho, Conhecimento geral.

 

ABSTRACT

Sometimes, the confidence with which a witness recalls a crime relates to the accuracy of the recall. Research suggests that this relationship is complex and may be influenced by individual differences. In this study we sought to understand the influence of self-esteem, impulsivity, and processing mode in the confidence-accuracy. In the procedure, we presented a video of a bank robbery, and then the participants answered questions about it, and assigned confidence judgments about the answers. Participants also answered and judged questions of general knowledge and answered to scales that measured the variables self-esteem (Rosemberg Self-esteem Scale), impulsivity (Barratt Impulsiveness Scale) and processing mode (Cognitive Reflection Test). The results show that there is no influence of the selected variables in the calibration and overconfidence of the responses. Also, participants show greater underconfidence when answering to general knowledge questions when compared with eyewitness questions. The results also indicate that participants that use system 2 show greater accuracy and confidence than participants using system 1.

Key-words: Confidence, Calibration, Under/overconfidence, Eyewitness, General knowledge.

 

Introdução

Intuitivamente, entende-se que a confiança (C) com que uma testemunha é capaz de recordar detalhes de um crime está relacionada com a exatidão (E) da recordação desses detalhes (Wells, Linday, & Ferguson, 1979). No entanto, a investigação revela que esta relação é complexa (Bornstein & Zickafoose, 1999). Neste estudo procurou-se investigar o papel das diferenças individuais na relação confiança-exatidão (C-E) na memória de testemunhas e com questões de conhecimento geral. Na primeira parte deste artigo começaremos por referir-nos aos estudos já existentes sobre a relação entre confiança e exatidão, depois abordaremos as diferenças entre questões de conhecimento geral e testemunho e terminaremos referindo o efeito das variáveis individuais na relação C-E.

 

Relação entre a confiança e a exatidão das respostas

A literatura tem apresentado resultados contraditórios na procura da relação confiança-exatidão no testemunho. Os dados da investigação são díspares e vão desde afirmar que a relação C-E é baixa ou inexistente (Brown, 2003; Perfect, 2004, Exp. 1; Wells & Murray, 1984) até forte e positiva (Luna & Martin-Luengo, 2012). A investigação sobre a relação C-E em testemunhas tem-se focado no reconhecimento de faces e apresenta resultados fortes (Sauer, Brewer, Zweck, & Weber, 2010), modestos (Brewer & Wells, 2006) ou fracos (Perfect, 2004). Não obstante, em tarefas mais complexas e mais próximas do procedimento de entrevista policial – evocação guiada – os resultados são consistentes e a confiança é um bom preditor da exatidão da resposta (Luna & Martin-Luengo, 2012). Os mesmos métodos aplicados ao conhecimento geral tem demonstrado consistentemente uma relação C-E muito forte (Bornstein & Zickafoose, 1999; Luna & Martin-Luengo, 2012; Pallier et al., 2002; Perfect, 2004). Nos últimos anos, a maioria dos estudos que investigam a relação C-E tem utilizado calibrações (Bornstein & Zickafoose, 1999; Brewer & Wells, 2006; Luna & Martin-Luengo, 2012; Sauer et al., 2010). A calibração refere-se à medida na qual os julgamentos de confiança correspondem à probabilidade objetiva de uma resposta ser correta, por exemplo, um indivíduo que responda corretamente a 70% de um conjunto de questões deverá ter uma confiança média nas suas respostas de 70% (Lichtenstein, Fischhoff, & Phillips, 1982). A calibração apresenta várias vantagens sobre a correlação, na medida em que é mais sensível à deteção da sobreconfiança (maior confiança na resposta do que probabilidade de acerto) e da subconfiança (menor confiança na resposta do que probabilidade de acerto), assim como é mais informativa ao poder ser representada de forma gráfica, o que leva a uma fácil compreensão da relação entre confiança e exatidão (Luna & Martin-Luengo, 2012). Ao analisar a calibração pode-se ainda verificar quanto um dado nível de confiança é bom preditor da exatidão da resposta.

 

Respostas a perguntas de conhecimento geral vs. testemunho

Por que razão há diferenças entre a confiança nas respostas a questões de testemunho e a confiança nas respostas a perguntas de conhecimento geral? Alguns autores afirmam que a diferença de confiança na resposta a questões de conhecimento geral e de testemunho advém da falta de conhecimento dos participantes sobre a sua capacidade de testemunhar (Perfect, 2004). Assim, pode-se argumentar que dado que o testemunho não é acompanhado de feedback, não permite o ajuste dos níveis de confiança da testemunha, limitando a maior parte das pessoas de conhecerem a sua própria memória (Perfect, 2004). Assim, toa-se compreensível que não haja um conhecimento aprofundado sobre a capacidade para testemunhar, o que dificulta a atribuição de julgamentos de confiança. Em contrapartida, conversas na nossa vida diária oferecem muitas ocasiões para trocar informações de temática geral e saber quando uma determinada resposta é correta ou não. Noutras palavras, as conversas diárias tornam-se fontes de aprendizagem e treino, fornecendo autoavaliação acerca do nível de conhecimento geral (Perfect, 2004).

Para além das diferenças na avaliação da confiança referidas, ainda há uma outra pergunta relevante sobre a relação C-E: existe variabilidade intraindividual na relação C-E? Nesta linha, a investigação sugere a existência de um traço de confiança pelo qual os julgamentos de confiança resultariam da utilização do mesmo mecanismo (Kleitman & Stankov, 2001). Desta forma, prevê-se que o mecanismo subjacente aos julgamentos de confiança seja o mesmo para qualquer contexto ou tarefa, esperando-se estabilidade nos julgamentos de confiança no tempo e no contexto. De facto, Jonsson e Allwood (2003) apoiaram a perspectiva da estabilidade individual dos julgamentos de confiança, uma vez que, das três variáveis utilizadas nos seus estudos (conhecimento para palavras, inteligência cristalizada e a aptidão espacial), apenas a primeira não mostrou estabilidade nos julgamentos de confiança. Da mesma forma, Bornstein e Zickafoose (1999) mostraram que participantes capazes de monitorizar os seus julgamentos de confiança em tarefas de memória do testemunho são também capazes de o fazer em tarefas de conhecimento geral. Da mesma forma, a investigação tem indicado que o viés de atribuição de confiança a uma resposta é estável e influenciado por algumas características do participante (e.g., Kleitman & Stankov, 2001; Pallier et al., 2002), ou seja, há participantes com maior tendência para apresentar sobreconfiança e outros com tendência para a subconfiança (Crawford & Stankov, 1996). Estas investigações suportam a ideia de que a confiança pode ser definida em termos de um traço psicológico. Assim, torna-se relevante verificar que variáveis individuais se encontram relacionadas com este traço da confiança para poder identificar testemunhas com uma relação C-E alta ou baixa.

 

Variáveis individuais na relação C-E

A influência de algumas variáveis individuais na relação C-E tem vindo a ser estudada com diversas variáveis. A relação C-E tem sido estudada em relação a dois grandes constructos psicológicos: a inteligência e a personalidade. Quanto à personalidade a investigação revela que esta não prediz os julgamentos de confiança (Pallier et al., 2002). No que diz respeito à inteligência, a investigação mostra que a relação é muito fraca. Pallier e colaboradores (2002) verificaram que a inteligência parece estar relacionada com a metamemória ao encontrarem uma relação positiva entre os julgamentos de confiança e a inteligência. Na mesma linha de investigação, Jonsson e Allwood (2003) oferecem suporte à relação entre inteligência e metamemória. Apesar de a relação ser fraca, os autores verificaram que há uma melhor calibração para a inteligência cristalizada do que para a fluída.

A idade é outra das variáveis estudadas e os resultados mostram que participantes mais velhos tendem a ser mais sobreconfiantes (Crawford & Stankov, 1996). Também foram estudadas diferenças de sexo e quanto a estas parece que indivíduos do sexo masculino têm maior tendência para a sobreconfiança (Stankov & Lee, 2008). Concluindo, nem a inteligência, nem a personalidade afetam os julgamentos de confiança, pelo que a chave para os compreender encontra-se na zona que Stankov (1999, p. 316) enominou como a “terra de ninguém entre a personalidade e as habilidades”. É deste mote que parte esta investigação ao procurar o efeito de três diferenças individuais que não foram ainda testadas – autoestima, tipo de tomada de decisão e impulsividade –, nos julgamentos de confiança atribuídos a questões de conhecimento geral e de testemunho.

A autoestima foi escolhida por ser uma variável individual abrangente e de elevado impacto na definição da pessoa enquanto indivíduo (Santos & Maia, 2003). A autoestima implica o recurso a capacidades metacognitivas, uma vez que requer que o indivíduo conheça as suas próprias capacidades e fraquezas (Borkowski, Carr, Rellinger, & Pressley, 2013). A autoestima é considerada uma autoavaliação com uma componente predominantemente afetiva, manifestada numa atitude de aprovação/desaprovação em relação ao próprio (Rosenberg, 1965). Como tal, colocamos a hipótese que os indivíduos com elevada autoestima apresentam maior sobreconfiança, ou seja, apresentam mais confiança do que exatidão. Uma vez que uma elevada autoestima se encontra também associada a um sentimento de aprovação do próprio, espera-se que indivíduos com elevada autoestima sejam mais confiantes na generalidade.

Outra das diferenças individuais investigadas neste estudo é o tipo de tomada de decisão. O tipo de tomada de decisão envolve a ativação de um conjunto de mecanismos durante uma decisão (Kahneman, 2003). Assim, torna-se interessante verificar se esta variável influencia a relação C-E. De acordo com a teoria do processamento dual (Kahneman, 2003), existem dois tipos de processamento cognitivo: o sistema 1 e o sistema 2. O sistema 1 é intuitivo, automático e dirigido emocionalmente e, por isso, difícil de modificar. O sistema 2 é mais lento e monitorizado de forma deliberada, considerando-se as respostas providenciadas pela utilização do sistema 2 como mais racionais (Kahneman, 2003). Segundo a investigação, participantes que utilizam predominante -mente o sistema 2 tem uma predisposição para estabelecer julgamentos de confiança mais realistas do que os participantes que utilizam o sistema 1 (Mata, Ferreira, & Sherman, 2013). Esta ideia vai ao encontro do efeito de Dunning-Kruger, onde indivíduos com mais competências numa dada tarefa desenvolvem mais competências metacognitivas o que ajuda no reconhecimento das suas capacidades/limitações (Kruger & Dunning, 1999). Assim, espera-se que os participantes que utilizem o sistema 2, e, por conseguinte indivíduos mais racionais, apresentem uma calibração muito próxima da teórica e melhor, ou seja, mais próxima de zero, do que os que utilizam o sistema 1. Da mesma forma, esperamos que indivíduos que utilizam o sistema 1 apresentem uma maior tendência para a sobreconfiança.

A última característica individual que decidimos estudar na relação C-E foi a impulsividade. A impulsividade é um constructo multifacetado que pode ser definido como uma inibição comportamental deficitária ou uma debilidade no processo de tomada de decisão (Moeller, Barratt, Dougherty, Schmitz, & Swann, 2001). Pode também ser descrita em termos de tendência para agir sem deliberação adequada ou como predisposição para agir rapidamente, sem planeamento, não tendo em conta as possíveis consequências (Moeller et al., 2001). Desta forma, a impulsividade pode afectar na relação C-E ao limitar a mobilização de recursos metacognitivos. Assim, hipotetizamos que indivíduos com elevada impulsividade reflitam menos sobre as suas respostas, apresentando uma pior calibração do que o grupo de baixa impulsividade.

Resumindo, este estudo procurou perceber qual a influência variáveis acima mencionadas na relação C-E. Para alcançar este objetivo, apresentou-se um vídeo de um assalto. Depois os participantes responderam a questões sobre o vídeo e julgaram a sua confiança nas respostas. Os participantes realizaram o mesmo procedimento em questões de conhecimento geral e responderam ainda às escalas das variáveis referidas.

 

Método

 

Amostra

Setenta e seis estudantes (13 do sexo masculino e 63 do sexo feminino) da Escola de Psicologia da Universidade do Minho, com idades compreendidas entre os 17 e os 46 anos (M=21,54; DP=4,69) participaram na experiência.

 

Materiais

Nesta experiência foram utilizadas questões de conhecimento geral, selecionadas a partir de um estudo piloto, e questões sobre um vídeo de um crime. Foram também utilizados três instrumentos: a Rosenberg Self-Esteem Scale (RSES; Rosenberg, 1965), a Barratt Impulssiveness Scale (BIS; Patton, Stanford, & Barratt, 1995) e o Cognitive Reflection Test (CRT; Frederick, 2005).

As questões de conhecimento geral foram criadas com base numa versão online do jogo Trivial Pursuit, pesquisa na internet e no conhecimento geral dos investigadores (e.g., “Que descobridor introduziu o porco na América?” Resposta: Colombo). Assim, foram selecionadas 40 questões com diferentes níveis de dificuldade distribuídos de forma o mais equilibrada possível.

As questões de testemunho foram as adotadas no estudo de Luna e Martin-Luengo (2012), tendo sido feita a adaptação e tradução das mesmas para Português Europeu. Estas questões foram desenvolvidas a partir de um excerto de 3 minutos do filme ‘The Stick-Up’ (Herrington, 2002). Este excerto mostra como dois seguranças retiram dinheiro de uma carrinha de valores e o depositam no cofre de um banco. Entretanto, um ladrão que se encontra dentro de um carro, corta a eletricidade do banco, entra no banco disfarçado e, após ameaçar as pessoas que se encontram no local, foge com o dinheiro.

A autoestima foi avaliada com recurso à Rosenberg Self-Esteem Scale (RSES; Rosenberg, 1965) adaptada para a população portuguesa por Santos e Maia (2003). Esta escala inclui 10 itens e foi desenhada para obter uma medida unidimensional de autoestima global e permite o cálculo de um valor de autoestima total. Quanto mais elevada a pontuação na escala, maior o nível de autoestima global do indivíduo.

O tipo de resolução de problemas foi avaliado através do Cognitive Reflection Test (CRT; Frederick, 2005), adaptado para português por Mendonça (2012). O CRT mede a capacidade ou disposição para evitar emitir uma resposta intuitiva mas errada em detrimento de uma resposta racional e correta. Este teste consiste em três questões de raciocínio lógico, sem apresentação de alternativas, desenhadas para induzir uma resposta intuitiva e permite-nos distinguir entre os dois tipos de processamento cognitivo: o sistema 1 e o sistema 2 (e.g., “Um taco e uma bola juntos custam 110 cêntimos. O taco custa 100 cêntimos mais que a bola. Quanto custa a bola?”; Resposta intuitiva mas incorreta: 10 cêntimos; Resposta correta: 5 cêntimos). A cotação do CRT prevê um ponto para cada resposta correta. A investigação mostra que responder corretamente a pelo menos uma questão do CRT ativa os processos do sistema 2 nas tarefas subsequentes (Pinillos et al., 2011).

A impulsividade foi medida através da Barrat Impulsiveness Scale (BIS; Patton, Stanford, & Barratt, 1995) adaptada à população portuguesa por Cruz e Barbosa (2012). A BIS inclui 30 itens é uma medida muito utilizada para a quantificação da impulsividade (e.g., Giorgetta et al., 2014; Gullo & Potenza, 2014). Quanto mais elevada a pontuação na escala, maior impulsividade.

 

Planeamento

Neste estudo, foram manipuladas as variáveis autoestima (baixa vs. elevada), impulsividade (baixa vs. elevada) e a tomada de decisão (sistema 1 vs. sistema 2) sob um plano intersujeitos. A variável independente conteúdo das questões (conhecimento geral vs. testemunho) foi manipulada a partir de um plano intrasujeitos. Os grupos de baixa e elevada autoestima foram definidos a partir do método de grupos contrastantes. Assim, foram colocados no grupo de baixa autoestima os 25 participantes (um terço da amostra) com menor pontuação na escala de autoestima e no grupo de elevada autoestima os 25 participantes com a pontuação mais elevada. A definição dos grupos de impulsividade foi feita seguindo o mesmo método. Quanto à variável tipo de tomada de decisão, consideraram-se como utilizadores do sistema 1 os participantes que responderam erradamente a todas as questões do CRT e como utilizadores do sistema 2 os participantes que responderam corretamente a pelo menos uma das questões de CRT (Pinillos, Smith, Nair, Marchetto, & Mun, 2011).

As variáveis dependentes analisadas foram a exatidão das respostas, a confiança média, a calibração e a sobreconfiança. Definiu-se como exatidão a proporção de respostas corretas dadas por cada participante. A confiança média foi definida como a média aritmética da confiança dos participantes nas suas respostas. A calibração pode ser analisada graficamente, através de curvas de calibração, mas também através do índice de calibração (C). O índice de calibração consiste numa fórmula matemática desenvolvida por Lichtenstein, Fischhoff e Phillips (1982) que permite quantificar a diferença entre a curva de calibração de cada participante e a curva de calibração teórica. Dado que o índice de calibração não permite distinguir os participantes quanto à sobreconfiança e subconfiança, recorreu-se a outra medida, o índice O/U1, que consiste na diferença entre a média de confiança e a proporção de respostas corretas, para cada participante. Assim, um valor de O/U positivo indica a presença de sobreconfiança e um valor negativo indica a existência de subconfiança. Um resultado de 0, que é o valor ideal, indica que não existe tendência nem para a sobreconfiança, nem para a subconfiança (Brewer & Wells, 2006).

 

Procedimento

O procedimento foi administrado individualmente, apresentado num computador com recurso à funcionalidade formulário do Googledocs. Os participantes eram voluntários e receberam créditos escolares pela sua participação.

O procedimento iniciou-se pela apresentação do vídeo sobre o qual incidiram as questões do testemunho. Após a visualização do vídeo, foi apresentado aos participantes uma tarefa distratora, neste caso um exercício de sudoku, com a duração de quatro minutos. O intuito desta tarefa foi permitir a consolidação das memórias para que a resposta às perguntas sobre o vídeo seja feita com recurso à memória de longo prazo. Em seguida os participantes responderam às quarenta questões de evocação guiada sobre o vídeo (e.g., “Qual a cor do casaco dos polícias?”), sendo que para cada uma destas avaliaram a sua confiança na resposta, utilizando para isso uma escala tipo Likert de 11 pontos, de zero (“nenhuma confiança”) a dez (“confiança total”). O julgamento de confiança foi feito imediatamente após a resposta a cada questão. Posteriormente, os participantes responderam às questões de conhecimento geral, nos mesmos termos das questões anteriores. Após a resposta a estes dois grupos de questões, foram administradas aos participantes as escalas de autoestima e de impulsividade, sendo estas contrabalanceadas. Uma vez que a literatura indica que o CRT pode provocar alterações no padrão de resposta dos participantes, foi necessário controlar esta variável através de contrabalanceamento. Para tal optamos por dividir a amostra e metade respondeu ao CRT no início do procedimento, enquanto que a outra metade respondeu ao CRT no final do procedimento. No total, o procedimento teve uma duração aproximada de 45 minutos.

 

Resultados

Foram conduzidas várias análises com o intuito de compreender a relação entre as variáveis estudadas e a relação C-E. Começamos por apresentar as análises da exatidão para todas as variáveis e depois apresentamos as análises para cada uma das variáveis individuais estudadas. Não foi realizada uma ANOVA com todas as variáveis consideradas porque os grupos contrastantes não se sobrepõem, ou seja, os participantes do grupo com baixa autoestima são diferentes dos participantes do grupo com baixa impulsividade e do grupo identificado como utilizador do Sistema 2. Esta não sobreposição faz com que a ANOVA não pudesse recorrer a um efetivo amostral suficiente em cada uma das células (2 x 2 x 2) e, como consequência, seria pouco informativa. Todas as análises foram efetuadas com o apoio do programa IBM SPSS (versão 20). Não foi encontrada qualquer influência da ordem do procedimento (contrabalanceamentos do CRT e das escalas de autoestima e impulsividade) nos dados recolhidos e, assim sendo, decidimos agrupar os dados.

 

Exatidão

Para ser legítimo levar a cabo a comparação entre as médias de confiança das questões de testemunho e de conhecimento geral é necessário que os dois tipos de questão tenham o mesmo grau de exatidão, uma vez que diferenças na dificuldade se encontram associadas a diferenças metacognitivas (Bornstein & Zickafoose, 1999). Uma análise prévia mostrou diferenças na exatidão dos dois tipos de questões, tendo as questões de testemunho uma exatidão maior (MT=0,56; DPT=0,11) do que as questões de conhecimento geral (MCG=0,40; DPCG=0,10), t(75)=10,03, p<0,001, d=1,12. Para igualar a exatidão, foram retiradas 9 questões de conhecimento geral e 4 sobre o testemunho. Para selecionar as questões a eliminar aplicou-se a seguinte regra: eliminar as questões de conhecimento geral com exatidão inferior a 0,11 e as questões de testemunho com exatidão superior a (1 – 0,11). Esta regra foi aplicada por permitir a equivalência da exatidão nos dois tipos respostas eliminando o menor número de questões possível. Após esta eliminação não foram encontradas diferenças entre a exatidão da resposta às questões de testemunho e de conhecimento geral (MT=0,52; DPT=0,12; e MCG=0,51; DPCG=0,12), t(75)=1,07, p=0,29, d=0,07. Também não foram encontradas diferenças na exatidão em função da autoestima ou da impulsividade. No entanto, os participantes que utilizam o sistema 2 apresentam uma exatidão superior do que os participantes que utilizam o sistema 1, F(1,74)=5,21, p=0,03, η²=0,07.

 

Conteúdo das questões

Nas próximas secções apresentamos os valores de confiança como proporções entre 0 e 1 para facilitar a sua interpretação. Os participantes mostraram-se mais confiantes a responder às questões do testemunho (M=0,55; DP=0,17) do que às questões do conhecimento geral (M=0,40; DP=0,16), t(75)=9,13, p<0,001, d=1,00. Ao nível da calibração, segundo o material utilizado, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas no índice C entre as questões de testemunho e as questões de conhecimento geral, t(75)=0,79, p=0,43, d=0,08.

Ao nível da sobreconfiança (O/U), os participantes apresentam uma maior tendência para a subconfiança nas questões de conhecimento geral (M=-0,11; DP=0,14) do que nas respostas às questões de testemunho (M=0,03; DP=0,14), t(75)=9,82, p<0,001, d=1,13. De salientar que o valor de sobreconfiança apresentado nas questões de testemunho não é diferente de 0, t(75)=1,83, p=0,07, d=0,21.

 

Autoestima

No geral, os participantes mostraram valores similares em todas as variáveis dependentes consideradas (cf. Tabela 1). A não ser que seja de outra forma indicado, as análises desta secção são ANOVAs 2 conteúdo das questões (testemunho vs. conhecimento geral) x 2 autoestima (baixa vs. elevada).

 

 

Ao nível da confiança média, foram encontradas diferenças significativas em função do conteúdo, sendo a confiança nas respostas às questões do testemunho significativamente maior do que nas questões de conhecimento geral, F(1,48)=40,59, p<0,001, η²=0,46. No entanto, não foram encontradas diferenças significativas em função da autoestima (baixa vs. elevada), F(1,48)=0,45, p=0,51, η²=0,01, nem na interação entre material e autoestima, F(1,48)=1,71, p=0,20, η²=0,03. Este resultado refuta a hipótese de que os indivíduos com elevada autoestima são mais confiantes nas suas respostas do que indivíduos com baixa autoestima.

Ao nível da calibração não foram encontradas diferenças significativas em função do material utilizado, F(1,48)=0,001, p=0,98, η²<0,001, nem em função do grupo de autoestima, F(1,48)=0,001, p=0,98, η²<0,001. A interação também não revelou diferenças significativas, F(1,48)=0,01, p=0,92, η²<0,001.

Ao nível da sobreconfiança (O/U) os participantes mostraram mais subconfiança nas questões de conhecimento geral do que nas questões de testemunho, F(1,48)=68,76, p<0,001, η²=0,59. Não foram encontradas diferenças significativas em função da autoestima, F(1,48)=0,79, p=0,38, η²=0,02, refutando a nossa hipótese de que os indivíduos com elevada autoestima apresentam uma maior sobreconfiança. Na interação entre o conteúdo das questões e a autoestima verificaram-se diferenças marginalmente significativas, F(1,48)=3,51, p=0,07, η²=0,07. A interação entre conteúdo das questões e autoestima indica que há uma tendência para a sobreconfiança quando ao grupo de elevada autoestima se encontram associadas as respostas a questões de testemunho.

 

Tipo de tomada de decisão

Os participantes mostraram dados descritivos semelhantes em todas as variáveis dependentes estudadas (cf. Tabela 2). As análises que se apresentam em seguida são ANOVAs 2 conteúdo das questões (testemunho vs. conhecimento geral) x 2 tomada de decisão (sistema 1 vs. sistema 2).

 

 

Ao nível da confiança média, o seu valor foi maior nas questões de testemunho do que nas questões de conhecimento geral, F(1,74)=59,03, p<0,001, η²=0,44, e também maior nos participantes que utilizam o sistema 2 do que nos participantes que utilizam o sistema 1, F(1,74)=4,16, p=0,05, η²=0,05. A interação não revelou diferenças significativas, F(1,74)=0,48, p=0,49, η²=0,006.

Quanto à calibração, não foram encontradas diferenças significativas em função do material utilizado, F(1,74)=0,13, p=0,72, η²=0,002, nem em função da tomada de decisão, F(1,74)=0,935, p=0,34, η²=0,01. A interação não revelou diferenças significativas, F(1,74)=0,52, p=0,47, η²=0,01. Desta forma, refuta-se a hipótese de que a calibração de participantes que utilizam o sistema 2 é melhor do que a de participantes que utilizam o sistema 1. Relativamente à hipótese de que indivíduos que utilizam predominantemente o sistema 2 apresentam uma calibração da C-E próxima da teórica, esta foi também refutada, uma vez que os valores da calibração (C) do grupo que utiliza o sistema 2 são significativamente diferentes de 0 tanto para as questões do testemunho, t(19)=5,36, p<0,001, d=1,20, como para o conhecimento geral, t(19)=5,86, p<0,001, d=1,25.

Quanto à sobreconfiança, as questões do testemunho são enviesadas no sentido da sobreconfiança, enquanto que as questões do conhecimento geral são enviesadas no sentido da subconfiança, F(1,74)=85,50, p<0,001, η²=0,54. Não foram encontradas diferenças significativas em função da tomada de decisão, F(1,74)=0,41, p=0,52, η²=0,01. Também não foram encontradas diferenças na interação, F(1,74)=1,48, p=0,23, η²=0,02. Refuta-se, assim, a hipótese de que indivíduos que utilizam o sistema 1 apresentam uma maior tendência para a sobreconfiança.

 

Impulsividade

Os participantes evidenciaram similaridades em todas as variáveis dependentes, estudadas (cf. Tabela 3). As análises que se apresentam em seguida são ANOVAs 2 conteúdo das questões (testemunho vs. conhecimento geral) x 2 impulsividade (baixa vs. elevada).

 

 

Ao nível da confiança média, a confiança nas questões do testemunho foi significativamente maior do que no conhecimento geral, F(1,48)=63,85, p<0,001, η²=0,57. No entanto, não foram encontradas diferenças significativas em função da impulsividade (baixa vs. elevada), F(1,48)=0,00, p=0,99, η²<0,001, nem na interação entre material e impulsividade, F(1,48)=1,55, p=0,22, η²=0,03.

Quanto à calibração, não foram encontradas diferenças significativas em função do conteúdo das questões, F(1,48)=0,19, p=0,66, η²=0,004, nem em função da impulsividade, F(1,48)=0,10, p=0,76, η²=0,002. A interação também não revelou diferenças significativas, F(1,48)=0,44, p=0,51, η²=0,01. Refuta-se, assim, a hipótese de que os participantes do grupo de elevada impulsividade mostrariam pior calibração do que os participantes do grupo de baixa impulsividade.

A análise da sobreconfiança revelou que há diferenças significativas em função do conteúdo das questões, sendo que as questões do conhecimento geral tendem a ser enviesadas no sentido da subconfiança, F(1,48)=59,63, p<0,001, η²=0,55. No entanto, não foram encontradas diferenças significativas em função da impulsividade, F(1,48)=0,57, p=0,46, η²=0,01, nem ao nível da interação, F(1,48)=3,10, p=0,09, η²=0,06.

 

Discussão

Neste estudo procurou-se verificar se a autoestima, a tomada de decisão e a impulsividade influenciam a relação C-E em perguntas de conhecimento geral ou sobre um crime. Neste estudo foram identificados três resultados principais. Em primeiro lugar, foram encontradas diferenças em função do conteúdo das questões, sendo evidente uma maior confiança na resposta a questões de testemunho, bem como uma maior tendência para a subconfiança nas questões de conhecimento geral. Em segundo lugar, indivíduos que utilizam predominantemente o sistema 2 para tomar as suas decisões, e, por isso, mais racionais, apresentam uma maior exatidão e confiança nas respostas tanto nas questões de testemunho, como nas questões de conhecimento geral. Assim, os resultados sugerem que o estilo de tomada de decisão influencia a exatidão e a confiança sem afetar a relação entre estas duas variáveis. Em terceiro lugar, não há diferenças na calibração, nem na sobreconfiança, em função da autoestima, impulsividade ou sistema de tomada de decisão, pelo que se conclui que estas diferenças individuais não influenciam a relação C-E.

A investigação tem mostrado de forma repetida que na resposta a questões de conhecimento geral os participantes evidenciam uma calibração da relação C-E melhor do que na resposta a questões de testemunho (Bornstein & Zickafoose, 1999; Luna & Martin-Luengo, 2012; Pallier et al., 2002; Perfect, 2004). Da mesma forma, a existência de uma tendência para a sobreconfiança na resposta a questões de testemunho tem sido descrita de forma recorrente na literatura (Bornstein & Zickafoose, 1999; Luna & Martin-Luengo, 2012). Ao contrário destes estudos, na presente investigação não foram encontradas diferenças na calibração dos participantes em função do conteúdo das questões. Também não foi verificada a tendência para a sobreconfiança (O/U) no testemunho, tal como vem descrita na literatura. Mais concretamente, no presente estudo não foi identificada qualquer tendência de julgamento de confiança no testemunho, mas sim uma tendência para a subconfiança na resposta a questões de conhecimento geral.

Segundo a abordagem do traço de confiança, onde se afirma que a confiança é um traço metacognitivo estável e guiado por viés pessoal (Kleitman & Stankov, 2001), os participantes deveriam julgar a confiança de forma consistente e independentemente do conteúdo das questões, utilizando um mesmo mecanismo para tecer todos os julgamentos de confiança. Assim, participantes que são capazes de monitorizar as suas respostas na atribuição de julgamentos de confiança em questões de conhecimento geral, deveriam ser igualmente capazes de o fazer ao julgar a confiança em questões de testemunho (Bornstein & Zickafoose, 1999). Da mesma forma, seria expectável uma consistência na sobreconfiança e subconfiança, independentemente do conteúdo das questões, o que não foi observado, uma vez que apenas na resposta a questões de conhecimento geral se verificou subconfiança.

Vários estudos têm seguido a hipótese do traço de confiança, tentando identificar uma ou mais diferenças individuais que possam interferir com a relação C-E (e.g., Crawford & Stankov, 1996; Jonsson & Allwood, 2003; Pallier et al., 2002; Stankov & Lee, 2008). No entanto, a investigação tem mostrado dificuldades em encontrar diferenças individuais que influenciem aquela relação e têm sido mais frequentes os estudos que se referem a variáveis que não tem influência na relação do que o contrário. O presente estudo vai no mesmo sentido já que também permitiu verificar que as diferenças individuais ao nível da autoestima, impulsividade e tomada de decisão não influenciam a complexa relação C-E.

Importa, contudo, salientar que, ao nível da tomada de decisão, os dados mostram que participantes que utilizam o sistema 2 mostram maior exatidão e confiança do que os participantes que utilizam o sistema 1. Segundo Mata, Ferreira e Sherman (2013), os participantes que utilizam o sistema 2 tecem julgamentos de confiança mais realistas do que os participantes que utilizam o sistema 1. No entanto, e uma vez que não foram encontradas diferenças na calibração e sobreconfiança, não nos é permitido chegar a esta mesma conclusão. Embora o tipo de tomada de decisão não influencie a relação C-E, este resultado não deixa de ser relevante, na medida em que permite verificar que os participantes que utilizam o sistema 2 recordam mais informação correta do que os participantes que utilizam o sistema 1. Desta forma, os resultados deste estudo são congruentes com o modelo de processamento dual (Kahneman, 2003), uma vez que os participantes que utilizam predominantemente o sistema 2, ao serem racionais, recordam mais informação correta. É, também, relevante verificar que participantes racionais, embora apresentam uma maior exatidão e uma maior confiança, estas são maiores na mesma proporção, continuando a verificar-se os mesmos vieses de confiança encontrados nos participantes mais intuitivos.

Comparando os resultados dos estudos que evidenciam o papel da inteligência na relação C-E (Jonsson & Allwood, 2003; Pallier et al., 2002), este estudo contraria resultados anteriores que mostram que participantes com competência numa tarefa desenvolvem competências meta -cognitivas sobre a mesma, permitindo-lhes identificar com maior facilidade as suas capacidades e limitações, fenómeno conhecido como efeito de Dunning-Kruger (Kruger & Dunning, 1999). Ainda assim, devemos salientar a relevância deste efeito no estudo da metamemória, pelo que talvez fosse relevante em futura investigação sobre julgamentos de confiança controlar a habilidade dos participantes nas tarefas.

O resultado evidenciado de que a exatidão e confiança dos participantes que utilizam predominantemente o sistema 2 é superior à exatidão e confiança dos participantes que utilizam o sistema 1 reveste-se ainda de uma relevância prática. Verificando-se as referidas diferenças de exatidão, esta informação é relevante para os técnicos envolvidos no processo de inquirição de testemunhas, uma vez que permite distinguir testemunhas com maior probabilidade de evocar informação correta, de testemunhas com menor probabilidade de o conseguir. Assim, uma das formas de distinguir informação correta de incorreta num depoimento pode passar pelo tipo de tomada de decisão adotado pela testemunha, pelo que a investigação desta temática é relevante. A identificação do tipo de tomada de decisão é de fácil acesso quando se recorre ao CRT. Este teste apresenta vantagens de cariz prático, tais como a rapidez de aplicação e simplicidade da sua cotação. Assim, com 3 questões apenas é possível aceder ao tipo de tomada de decisão de uma testemunha e auxiliar os técnicos na identificação de informação correta.

Uma limitação deste estudo prende-se com as diferenças entre sistema 1 e sistema 2. Foram encontradas diferenças entre os dois sistemas na exatidão e na confiança, mas não na calibração e sobreconfiança. O índice de calibração e a sobreconfiança são medidas muito utilizadas na investigação como forma de aferir a relação C-E. No entanto, e devido a uma condição inerente ao próprio cálculo dos índices (que se baseiam na diferença entre confiança e exatidão), estes tornam-se pouco sensíveis à variação de exatidão, quando acompanhada por uma variação em igual proporção de confiança. Assim, embora o índice de calibração e a sobreconfiança indiciem que o sistema utilizado não provoca diferenças na confiança e exatidão, estas diferenças são encontradas ao analisar as médias de confiança e exatidão, o que indica que o tipo de tomada de decisão pode alterar a confiança e a exatidão na mesma medida, não interferindo na relação.

Em suma, a investigação evidencia a complexidade da relação C-E, não sendo evidente que diferenças individuais influenciem esta relação. A compreensão desta relação é fundamental para auxiliar os profissionais que trabalham em contexto judicial a utilizar a confiança das testemunhas com precisão, minimizando a probabilidade de erros decorrentes de testemunhos com elevada confiança e baixa exatidão. Também relevante para o contexto judicial seria identificar diferenças individuais que tornam as testemunhas mais exatas, permitindo desta forma distinguir testemunhos com maior probabilidade de estarem corretos de testemunhos que podem evidenciar mais erros. Assim, é importante a investigação que se centre na procura destas diferenças individuais, prestando assim um auxílio fulcral à maior eficácia do sistema judicial.

 

Referências

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CORRESPONDÊNCIA

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: João Fundinho, Escola de Psicologia, Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga. E-mail: jfmfundinho@gmail.com

 

Submissão: 31/10/2014 Aceitação: 15/04/2015

 

NOTAS

1 O/U é um acrónimo das expressões inglesas “overconfidence” e “underconfidence”.

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