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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica v.28 n.3 Lisboa set. 2010

 

Parcerias e coligações comunitárias: Potencialidades e desafios na criação de respostas articuladas

 

Maria Vargas-Moniz(*), José Morgado (*)

 

(*)  ISPA – Instituto Universitário, Rua Jardim do Tabaco, 34, 1149-041 Lisboa;

E-mail: maria.moniz@ispa.pt / jose.morgado@ispa.pt

 

RESUMO

O artigo procura proporcionar uma panorâmica global sobre o enquadramento conceptual de parcerias e coligações comunitárias e como estas envolvem os esforços de colaboração entre indivíduos, grupos, organizações ou mesmo comunidades constituindo-se como veículos privilegiados para a activação de recursos locais e para a resolução de problemas que uma organização, serviço ou um grupo autonomamente não tem capacidade para resolver ou ultrapassar. Procura também enquadrar o papel das parcerias enquanto elemento crucial do desenvolvimento comunitário e finalmente abordar a investigação e avaliação nesta área, abrangendo estudos com um vasto número de parcerias e estudos de caso documentando histórias e como se tem criado um corpo consistente de evidência científica em torno das dimensões ou factores relevantes na implementação de esforços de colaboração com sucesso, que envolvem o clima social, a estrutura, o envolvimento dos membros e os resultados concretos alcançados em termos de mudança social.

Palavras chave: Colaboração, Eficácia, Mudança comunitária, Parcerias comunitárias.

 

ABSTRACT

The paper presents a panorama on the conceptual Framework of partnerships and coalitions in community contexts and how these involve collaborative efforts among individuals, groups, organizations and communities. Coalitions are seen privileged devices to activate local resources and problem solving that a single organization, service or group cannot autonomously solve or overcome. It is also an aim of this paper to present the role of coalitions within the crucial elements of community development. Finally, there is an overview on the current research and evaluation in the field, and how there is an increasing body of scientific evidence concerning the several dimensions and factors relevant for the successful collaborative efforts implementation, involving issues such as social climate, structure, member involvement, and social change achievements.

Key words: Collaboration, Community coalitions, Effectiveness, Social change.

 

ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL GERAL

Nas últimas duas décadas do Século XX, emergiu um conjunto significativo e diversificado de publicações em resultado de trabalhos de investigação, construção de manuais e histórias de sucesso documentadas sobre parcerias, coligações e outras formas de colaboração numa grande variedade de contextos; desde esforços de micro-escala como grupos de vizinhança ou em pequenas localidades a esforços de carácter regional ou mesmo transnacional.

O interesse crescente em torno dos processos e dos resultados do funcionamento de parcerias resultou também da procura sistemática de estratégias para ultrapassar as dificuldades de operacionalização de inovação ao nível das políticas sociais, para facilitar o envolvimento cívico e como uma forma privilegiada para articular serviços na comunidade para responder a problemas sociais prevalentes e complexos (Chavis, 1995; Roussos & Fawcett, 2000).

As parcerias envolvem os esforços de colaboração entre indivíduos, grupos, organizações ou mesmo comunidades (Wolf, 2001) que encontram um interesse, um desígnio ou um propósito comum ou que são capazes de articular um conjunto de objectivos comuns (Fawcett, Francisco, Paine-Andrews, & Schultz, 2000); são um contexto de participação cívica que se propõe ao desenvolvimento e à consolidação de comunidades mais saudáveis (Berkowitz, 2001). As parcerias e coligações são também veículos privilegiados para a activação de recursos locais (Kretzman & McKnight, 1993) para a resolução de problemas e são habitualmente orientadas para a acção. No que concerne à temporalidade das parcerias, é possível encontrar posições diversificadas desde as temporárias focalizadas em temas ou questões muito concretas, específicas ou mesmo episódicas ou esporádicas (Backer, 2003) até estruturas organizadas para serem sustentáveis no tempo (Wolf, idem), envolvendo um propósito de desenvolvimento comunitário abrangente.

A investigação sugere que as parcerias e coligações podem desempenhar um papel relevante no encorajamento das trocas inter-organizacionais e o desenvolvimento de sistemas integrados de prestação de serviços (Foster-Fishman, Berkowitz, Lounsbury, Jacobson, & Allen, 2001), bem como na melhoria da comunicação entre organizações na comunidade (Abbot, Jordan, & Murtaza, 1995).

Tradicionalmente, as parcerias e coligações integram intervenientes-chave que podem incluir indivíduos, organizações ou grupos de pessoas afectadas ou influenciadas por uma determinada questão ou problema em torno do qual se organizam. Contudo, na actualidade e no contexto da União Europeia, encontram-se para além destas, uma série de parcerias que se podem considerar como induzidas, por serem promovidas com base em propostas legislativas, em áreas como a saúde pública ou a segurança social, ou mandatos na especificidade para a organização de redes sociais formais, comissões e uma diversidade de organismos inter-sectoriais para a promoção do desenvolvimento de intervenções de carácter preventivo ou para a promoção de respostas articuladas a nível local e/ou concelhio em domínios temáticos a protecção de crianças e jovens em risco ou perigo, serviços e suportes para seniores ou ainda sistemas de acompanhamento continuado na comunidade para grupos como pessoas com deficiência, doença mental, entre muitos outros. Um outro catalisador para o surgimento de inúmeras parcerias têm sido os programas europeus para a promoção da coesão social implementados no decurso dos últimos 20 anos e que apresentam como requisito a constituição de parcerias nacionais e/ou transnacionais, abrangendo organismos de natureza jurídica diversificada e provenientes de diferentes sectores da sociedade como Universidades, serviços públicos e organizações da sociedade civil que congregam esforços para prosseguir o que Bond e Keys (1993) apelidaram de objectivos construtivos comuns.

Quanto a definições de parceria e coligação é possível encontrar uma enorme diversidade, apesar de se constatar com alguma consistência que a ideia de parceria remete para um estilo de trabalho que procura promover a troca continuada de informação para benefício mútuo, a conciliação ou conjugação de esforços para a resolução de problemas comuns e contextos em que os membros são considerados como parte integrante de uma rede com níveis de poder idênticos. Por seu turno, a ideia de coligação remete para a concepção de uma estrutura formal de colaboração com papéis e funções específicas que são acordados e contratualizados entre os parceiros ou intervenientes.

A palavra coligação tem origem na palavra latina “coalescere” que significa crescer em conjunto e em “coalitio” que significa união assim, uma parceria ou coligação pode ser definida como “... uma aliança temporária de entidades ou partes, de pessoas ou círculos governativos que promovem uma acção conjugada” (Merriam-Webster, 2006). Outras definições de parcerias ou coligações comunitárias enfatizam aspectos que importa realçar como a de Brown (1984) que realça a ideia de uma organização de diferentes grupos de interesse que combinam os seus recursos humanos e materiais para produzir mudanças que os seus membros autonomamente não conseguem alcançar ou como um grupo de indivíduos que representam diversas organizações, facções ou estruturas que concordam em colaborar para alcançar um propósito comum (Feighery & Rogers, 1990). Num trabalho de 1993 Labonte descreve as coligações como grupos com um objectivo partilhado e com a consciência de que... “unidos manter-nos-emos, divididos cairemos”.

Contudo, os elementos “união” e “propósito comum” não são exclusivos das coligações, sendo necessário recorrer a elementos descritivos adicionais como a necessidade de uma estruturação interna, focalizada num tema e num contexto, congregarem grupos diferentes com objectivos diversificados, poder ser multi-propósito, isto é, missão ou conjunto de objectivos que possam concorrer para uma mesma visão acerca de uma realidade que se pretende alcançar e terem uma perspectiva de longo-prazo e de sustentabilidade (cf. Allensworth & Patton, 1990; Bibeau, Steckler, & Glanz, 1988; Black, 1983; Butterfoss et al., 1993; McLearoy, Fagheiry, & Rogers, 1990; Wandersman & Goodman, 1991).

As parcerias ou coligações são deste modo estruturas que se criam em função de domínios temáticos concretos e focalizados em objectivos que estão para além da própria estrutura criada. São habitualmente desenvolvidas como uma estratégia para coordenar respostas comunitárias para problemas sociais complexos (Chavis, 1995; Roussos & Fawcett, 2000), como são por exemplo os esforços para a prevenção e apoio a crianças e jovens em situação de risco ou perigo, as respostas à violência doméstica, a situações de abuso de substâncias, populações sem-abrigo, pessoas em situação de pobreza extrema, grupos migrantes ou ainda situações decorrentes do isolamento social, nomeadamente as problemáticas sociais associadas ao envelhecimento.

 

PARCERIAS, COLIGAÇÕES E DESENVOLVIMENTO COMUNITÁRIO

A articulação conceptual das ideias de parceria e coligação comunitária implica a sua ligação com um conjunto de outros conceitos chave, sem os quais as parcerias ficam destituídas de sentido social e/ou político. Este conjunto de conceitos enquadram e contextualizam as parcerias e coligações comunitárias, fundamentam-nas e conferem-lhes um propósito no âmbito de percursos de desenvolvimento comunitário. As parcerias ou coligações podem ser tanto um catalisador como um resultado da participação dos cidadãos. Para além disso, é crucial perceber o papel das parcerias ou coligações comunitárias na construção da capacidade e da competência comunitárias e como influenciam a consolidação do capital social, elemento fundamental no aprofundamento da democracia e da promoção das comunidades saudáveis.

A Organização das Nações Unidas desde meados da década de 50 adoptou a perspectiva do desenvolvimento comunitário como “... uma forma de criar condições de progresso económico e social para a comunidade em geral, através da sua participação activa e com base nas suas próprias iniciativas” (cf. Brager, Sprecht, & Torczyner, 1987). Esta abordagem do desenvolvimento comunitário assenta em pressupostos como a capacidade das comunidades para lidar com os seus próprios problemas; a relevância da participação dos cidadãos na estruturação, ajustamento e controle das mudanças que têm lugar nas comunidades onde residem ou circulam e ainda que as mudanças desenvolvidas e implementadas pelas pessoas da comunidade têm um significado e uma capacidade de sustentação que as mudanças impostas não conseguem alcançar.

A abordagem holística aos problemas tem maior probabilidade de sucesso do que perspectivas fragmentadas e o enquadramento democrático proporcionado por esta perspectiva implica a necessidade de cooperação no contexto da comunidade, tornando-se relevante aprender a trabalhar em colaboração. Neste contexto socio-político estabelece-se uma relação muito estreita com a importância atribuída à participação dos cidadãos definida por Tocqueville (1835)1 como sendo uma forma de “os cidadãos poderem ultrapassar o seu sentimento de isolamento e de falta de poder através do seu envolvimento activo na resolução de preocupações comuns... as associações cívicas e a governança local poderão funcionar como estruturas mediadoras entre o indivíduo e o Estado”. Um outro documento relevante publicado em 1977 por Peter Berger e Richard Neuhaus (Novak, Berger, & Neuhaus, 1996) que ficou conhecido como “o panfleto” e que é amplamente citado sobre a necessidade de revitalização da participação dos cidadãos, concluindo que “... um dos resultados mais desoladores da modernização é o sentimento de falta de poder dos cidadãos face a instituições controladas por quem não se conhece ou por pessoas cujas ideias e valores não partilhamos... devemos acreditar que os seres humanos, onde quer que estejam, são os que melhor compreendem as suas necessidades”. Numa profusão muito substantiva de estudos provenientes de vários ramos das ciências humanas, particularmente na área da Psicologia Comunitária, podemos identificar trabalhos mais recentes, como Checoway (1995), Florin e Wandersman (1990), Perkins, Brown, e Taylor (1996), Foster-Fishman e Behrens (2007), entre muitos outros, onde é possível associar, de forma consistente, a ideia de participação dos cidadãos à estruturação e implementação de acções conducentes à melhoria das condições de vida na comunidade.

Muitos destes trabalhos sugerem que as condições físicas e o ambiente social que se caracteriza por redes informais de vizinhança, pelo envolvimento em organizações da comunidade, são factores com muito maior impacto na participação efectiva dos cidadãos do que características demográficas, como por exemplo, os índices de rendimento, o grupo étnico, o número de anos de residência num determinado local, os regimes de propriedade ou mesmo as taxas de criminalidade. Estes resultados remetem para a necessidade de renovação de acções de envolvimento das populações para a construção de comunidades saudáveis.

Um outro conceito relevante para a compreensão do significado contemporâneo de parceria ou de coligação comunitária bem como desta realidade sociopolítica é o de empowerment. Apesar das múltiplas definições que podem ser encontradas, há algum consenso quanto aos seguintes elementos conceptuais da ideia de empowerment como sendo “o processo através do qual os indivíduos, os grupos, as organizações ou comunidades podem conduzir as suas próprias vidas numa perspectiva de mudança dos contextos sociais e políticos onde se encontram no sentido de melhorar a equidade e a qualidade de vida”. Minkler e Wallerstein (2005, p. 34), definição inspirada em Cottrell (1983), Rappaport (1984), GEUC (1989) ou ainda Wallerstein (1992). A partir deste constructo procura dar-se a oportunidade para que os indivíduos possam ganhar o controlo social, político, económico e psicológico através do acesso à informação e ao conhecimento; da aquisição de competências, da participação activa nos processos de tomada de decisão, aumentando o seu sentido de auto-eficácia, os seus índices de participação comunitária e de controlo efectivo sobre o que lhes diz respeito.

Segundo Zimmerman e Rappaport (1988) e Zimmerman (2000), podem identificar-se três níveis essenciais ligados à ideia de empowerment. O nível individual que remete para variáveis de carácter interpessoal, o nível organizacional associado às oportunidades de participação e mobilização e ainda o nível comunitário ligado à mudança social operada na estrutura socio-política. Como características essenciais da ideia de empowerment realçamos ainda o facto de ser uma variável contínua (por oposição a uma variável dicotómica – Sim/Não), por ter um carácter dinâmico, assumindo formas e significados diferentes consoante as pessoas e os contextos. Pode ser observado através de processos (que remetem para o exercício de capacidades e/ou competências, para a observação de uma ligação emocional positiva expressa através de uma história ou relato de experiências comuns e de suporte mútuo, para processos de gestão de talentos, bens ou recursos) e através de resultados (percepção de controle efectivo, influência nas decisões que afectam a vida dos indivíduos, grupos e/ou comunidades, maior conhecimento e domínio dos recursos disponíveis, além de maior capacidade de captação e sustentabilidade de recursos).

As características das comunidades que afectam as suas possibilidades para identificar, mobilizar recursos e enfrentar os seus problemas sociais ou de saúde pública são, segundo Chavis (2001), Kegler, Steckler, Malek, e McLeroy (1998) ou, ainda, Goodman (1998) associadas à ideia de capacidade comunitária, que remete para capacidades concretas associadas à participação, à liderança, às redes sociais e/ou de organizações, ao sentimento de comunidade, ao entendimento da história comum da comunidade, o seu poder, os seus valores e a sua capacidade de reflexão crítica sobre a situação vivenciada. Está também ligada à capacidade colaborativa e às condições necessárias para a emergência de processos colaborativos sustentáveis e conducentes à mudança comunitária.

A capacidade das parcerias de produzirem mudança é dinâmica, pois está dependente dos seus membros, do seu propósito e da sua etapa de desenvolvimento, o que se liga com a expressão de competência comunitária que, segundo Cottrell (1983), implica a definição de uma medida de bom funcionamento de uma comunidade. Aqui pode concluir-se que há alguma similitude com o conceito de empowerment e que tal competência pode ser alcançada quando diversos sectores da comunidade colaboram no sentido de identificar os seus problemas e/ou necessidades; quando conseguem um consenso em termos de objectivos e prioridades e concordam acerca dos meios para atingir os objectivos definidos através de uma colaboração efectiva (cf. Eng & Parker, 1994). Podemos identificar ainda segundo Goodman, Speers, Mcleroy, Fawcett, Kegler, Parker, Smith, Sterling, e Wallerstein (1998), algumas dimensões relacionadas com a competência comunitária das quais importa realçar a capacidade de assumir compromissos ou a participação efectiva nos processos de mudança. Ainda segundo Goodman et al. (idem), é necessário visualizar de forma clara as diferenças situacionais em que se encontram os indivíduos ou grupos e a capacidade de contenção ou acomodação das diferenças, ambas associadas à gestão das relações no contexto social, às competências para facilitar as interacções entre os que participam nos processos de tomada de decisão e também às capacidades de comunicação, de articulação, argumentação ou à orientação para a resolução de problemas.

A ligação de todos estes elementos conceptuais com a ideia de capital social fornece uma noção de circularidade e interdependência congruente com os valores da vivência democrática. Assim, o capital social pode ser definido como “a matéria em bruto da sociedade civil, criada pela miríade das interacções quotidianas entre as pessoas. Não se localiza nos indivíduos nem nas estruturas sociais, mas no espaço entre as pessoas. Não é propriedade das organizações, do mercado ou do Estado, embora todos este elementos possam estar envolvidos na sua produção” (Putnam, 1995, 2000). O envolvimento cívico tem impacto positivo e aumenta a probabilidade de sucesso das instituições sociais pois estas tornam-se, segundo Putnam (2000), mais assentes nas redes sociais e promovem a confiança social. Como exemplos de grupos eminentemente comunitários, o autor refere os grupos de afiliação (associações, grupos de voluntariado ou de ajuda mútua) ou outras formas de associação como os grupos de inspiração religiosa, com base no género (p.e., organizações ou grupos de mulheres), de defesa do ambiente, de pessoas reformadas. Putnam (idem). Contudo, enfatiza que o grupo social com maior índice de participação tende a ser o dos adultos casados, com filhos e com um rendimento médio; este é o grupo social que mais tem contribuído para o ressurgimento actual da ideia de capital social através de organizações que promovem o sentimento de reciprocidade, que se orientam para a resolução dos dilemas da acção colectiva, criando novas identidades, normas sociais e uma vida associativa renovada com ênfase nas ligações horizontais com uma larga participação proactiva na concepção, implementação e avaliação de políticas públicas.

Este leque de conceitos-chave permite enquadrar as parcerias ou coligações como percursos complexos de colaboração. São esforços de conjugação profundamente ligados aos pilares onde assenta a organização democrática, sobretudo no que concerne as liberdades de pensamento, de iniciativa e de acção orientadas para a melhoria de contextos concretos. Estão expostas, por um lado, às potencialidades e vicissitudes dos contextos e, por outro, às características e capacidades dos seus membros. É esta diversidade que contribui decisivamente para a complexidade das formas articuladas de intervenção na comunidade e das respostas para os problemas sociais contemporâneos.

 

INVESTIGAÇÃO E AVALIAÇÃO EM PARCERIAS E COLIGAÇÕES COMUNITÁRIAS

Através da análise sistemática da investigação desenvolvida em parcerias e coligações comunitária emerge um corpo consistente de evidência em torno das dimensões ou factores que são relevantes para a implementação de esforços de colaboração com sucesso. Num trabalho de 2001 Foster-Fishman et al., fizeram a análise qualitativa de 80 publicações sobre parcerias e coligações comunitárias, procurando desenvolver um enquadramento em torno da capacidade de colaboração, incluindo as características chave e os processos que facilitam o seu sucesso. Deste estudo emergem quatro níveis gerais fundamentais para o desenvolvimento da capacidade de colaboração que são: a capacidade (a) dos membros; (b) relacional; (c) organizacional e (d) programática, que e podem, por sua vez, serem subdivididas em categorias mais específicas, permitindo identificar mais elementos concretos sistematicamente abordados na investigação sobre parcerias e coligações comunitárias (Quadro 1).

 

QUADRO 1

Capacidade de colaboração das parcerias e coligações

 

Pressupondo que a capacidade colaborativa se refere às condições necessárias para que as parcerias e coligações possam promover mudança comunitária sustentável (Goodman et al., 1998) e reconhecendo-se que não há uma forma única de implementar processos de colaboração em contextos comunitários (Roussos & Fawcett, 2000), esta ênfase na colaboração tem utilidade, porque remete para a possibilidade de influenciar a mudança na comunidade.

O fenómeno da colaboração pode ser particularmente elucidativo para se compreender a realidade das parcerias e coligações porque abrange a percepção de mecanismos sociais relacionados com a reciprocidade, a interdependência, o interesse e o potencial que suscitam as diferenças entre os indivíduos e os grupos. Além disso, é também relevante a noção de que a colaboração é um processo gradual e dinâmico que pode ter muitos momentos, alguns pautados por sucessos e outros por insucessos, mas todos alcançados em conjunto. Em termos de características dos processos de colaboração podem incluir-se, segundo Rosenthal (2000), a ideia de criação e acção conjuntas, a promoção da interdependência que se reflecte na reciprocidade, o exercício de autoridade e de responsabilidade conjuntas que implicam a partilha de riscos, mas também de compensações e, finalmente, assumir que as tensões, as divergências ou mesmo os conflitos são inerentes aos processos colaborativos, podendo pela sua natureza dinâmica ser ultrapassados.

Os processos colaborativos podem também ser perspectivados segundo Gray (1989), como etapas que se iniciam pelo reconhecimento da noção de que a interdependência pode ser frutífera, de que as organizações são diferentes, de que se podem liderar os processos de tomada de decisão de forma conjunta, assumir a gestão das dificuldades e, finalmente perceber que a colaboração é um processo gradual e dinâmico.

Os processos de colaboração alteram a forma como as organizações trabalham em conjunto, produzem um movimento de transição da competição para a construção de consensos, de formas de trabalho autónomas para estratégias de fusão de diferentes culturas organizacionais, de campos e de contextos de acção. Deste modo, a colaboração implica que se deixe de estar apenas focalizado em actividades, serviços ou programas para se passar para a concepção de respostas face a situações complexas, para intervenções integradas, ou ainda para a reflexão em torno de situações concretas no sentido de produzir mudança em sistemas sociais ou sistemas de prestação de serviços abrangentes (cf. Winer & Ray, 1994).

Em torno da ideia de colaboração é ainda necessário realçar que na literatura sobre este domínio há um conjunto de modelos de colaboração que remetem para potenciais conteúdos programáticos dos processos de colaboração e que têm impacto nas opções quando à forma que o processo de colaboração deve assumir que é definido consoante o objecto da sua intervenção.

Assim, segundo Rosenthal (2000) ou Kubisch et al. (1995), os percursos colaborativos podem ser identificados como sendo parcerias estratégicas, processos de integração de serviços, colaborações orientadas para a resolução de conflitos e ainda a construção de colaborações abrangentes. A partir destes quatro modelos gerais pode ter-se a noção, por um lado, da sua complexidade e, por outro, dos desafios e oportunidades com que se confronta quem trabalha em parceria, sendo esta uma oportunidade para promover um debate para clarificar alguns domínios estratégicos que podem assim ser consolidados ou mesmo desenvolvidos. Estes modelos de colaboração não devem ser perspectivados como compartimentos estanques em que cada iniciativa apenas se deve circunscrever a um dos modelos, mas têm o potencial de ser utilizados como um menu do qual se podem seleccionar componentes ou elementos que mais se adequam às necessidades concretas e às realidades experienciadas no seio de cada parceria ou coligação.

No universo de estudos sobre parcerias, coligações e iniciativas de colaboração inter-institucional em contextos comunitários podem encontrar-se estudos que variam entre análises comparativas em domínios temáticos de relevância social e estudos de caso que acompanham e documentam o percurso de parcerias comunitárias concretas, sendo de interesse notar que todos realçam ou enfatizam aspectos particulares ou elementos que remetem para os elementos expostos no Quadro 1. Num estudo, com 89 parcerias para a prevenção do HIV-SIDA, Penner (1995) corrobora que o acréscimo de interdependência observável nas organizações intervenientes se constituí como um factor crucial para o sucesso da intervenção, tal como havia sido identificado por Bond e Keys (1993) num estudo aprofundado e longitudinal de uma parceria de familiares de pessoas com deficiências mentais e outras entidades na comunidade em que se concluiu que a colaboração efectivamente acontece quando dois ou mais intervenientes conjugam a sua acção; todo o conjunto pode beneficiar da expansão conjunta de recursos para alcançar os objectivos propostos. Este trabalho conjugado implica a promoção da interdependência funcional, mantendo em simultâneo a importância e os contributos singulares de cada grupo, respeitando-se a diversidade e criando oportunidades concretas para se desenvolver acções concretas e se alcancem os objectivos comuns identificados.

Outros estudos realçam a importância de elementos como o clima social ou a estrutura das parcerias e coligações. O clima social, refere-se ao carácter ou personalidade de um determinado contexto, mencionado inicialmente nos trabalhos de Moss (1973, 1979), considerando cada contexto como um conjunto de características com uma unidade e uma coerência únicas. À semelhança dos indivíduos, alguns contextos são mais promotores de suporte que outros; são mais ou menos orientados para a concretização de tarefas ou acções ou são mais ou menos restritivos na forma como exercem o poder e o controle.

No estudo do clima social é assim relevante integrar elementos de análise do funcionamento de parcerias e coligações como a partilha de uma missão conjunta e a capacidade de lidar eficazmente com a divergência e com o conflito, elementos estes que têm sido consistentemente identificados nos processos de colaboração com maiores índices de sucesso (Butterfoss et al., 1993). Nas parcerias colaborativas Gray (1985) sugere que os intervenientes devem procurar desenvolver uma apreciação coincidente acerca do problema e um conjunto similar de valores para guiar a sua pesquisa de potenciais soluções; contudo, nenhum processo de colaboração está imune à divergência ou mesmo ao conflito, mesmo que se partilhe uma visão inicial do problema, na construção dos planos de operacionalização, tendem a surgir problemas concretos inerentes à implementação ou execução.

Para além da eficácia na resolução de problemas, a necessidade de partilha do poder e influência, no âmbito das parcerias comunitárias, tem sido explorada em diversos estudos de caso como o de Bartunek, Foster-Fishman, e Keys (1996), enfatizando que cada grupo interveniente deve manter o carácter único da sua voz, ou da perspectiva que representa no contexto da parceria comunitária.

O estudo de parâmetros como resolução eficaz de conflitos, a presença de uma missão e processos de decisão partilhados, a eficiência (orientação para tarefas) e a liderança inclusiva permite, segundo Allen (2005), aferir em que medida os diversos pontos de vista dos intervenientes são tidos em consideração e se se observa o desenvolvimento de uma visão comum.

Sobre a liderança inclusiva e eficiente no contexto das parcerias, estudos como o de Butterfoss, Goodman, e Wandersman (1993), Kumpfer, Turner, e Libret Jr. (1993), Foster-Fishman et al. (2001), concluíram que um estilo de liderança empowering estava associado a um maior índice de satisfação dos membros da parceria e a percepções mais positivas da eficácia do trabalho conjunto.

A análise integrada dos elementos do clima social da parceria é relevante, pois estão conceptualmente relacionados e o desenvolvimento de uma visão acerca da missão da parceria implica um esforço para ultrapassar pontos de vista e prioridades divergentes (Fargason, Barnes, Schneider, & Galloway, 1994; Gray, 1985). Por vezes, estes processos implicam a resolução de conflitos que alguns autores consideram como endémicos aos processos colaborativos (Byles, 1985; Gray, 1989) ou, aprofundando a reflexão que o poder e o conflito são intrínsecos, as variações de poder determinam os resultados nos processos de tomada de decisão, como refere Pfeffer (1996).

Há ainda a considerar relevância da eficácia do(a) líder da parceria no desenvolvimento de todo o processo de colaboração na promoção da eficiência e a orientação para tarefas e a sua capacidade de incorporar os desejos e expectativas de todos os intervenientes (Butterfoss et al., 1993).

Para além do clima social, as características das parcerias que surgem associadas à eficácia (Chrisplip & Larson, 1994; Huxham & Vangen, 2000) são a estrutura ou a tipologia dos membros. Num estudo de Kegler, Steckler, McLeroy, e Libret Jr. (1998), conclui-se que as estruturas tendencialmente mais complexas, que sejam, por exemplo, regidas por diplomas legais ou estatutos, que têm agendas mais explícitas ou mantêm registos ou actas de reuniões, têm maior capacidade de mobilizar recursos e de concretização. Outros estudos enfatizam que o contributo dos membros é fundamentalmente um trabalho colaborativo.

Butterfoss et al. (1993) descreve os membros da parceria como um bem primordial para as parcerias, pois cada interveniente traz um conjunto único de competências e recursos para o trabalho em colaboração. Contudo, Huxham e Vangen (2000), alertam para a necessidade de uma análise mais detalhada da natureza e tipologia dos membros, como por exemplo, os que estão oficialmente integrados e os que desempenham papéis mais activos.

A investigação recente no domínio das parcerias comunitárias tem vindo a realçar a necessidade de utilização de níveis múltiplos de análise (Allen, 2005; Luke, 2005), o que permite agrupar as variáveis em clusters que se enquadram em níveis diversificados. Esta metodologia permite analisar os impactos das parcerias em cada comunidade e também extrapolar os impactos numa perspectiva transversal num conjunto de parcerias com características similares.

Kumpfer et al. (1993), analisou o papel da liderança nas equipas de trabalho num conjunto de dez parcerias e a sua relação com a comunidade mais alargada. Por seu turno, Allen (2005) analisou 43 parcerias na área da prevenção e intervenção na violência doméstica, conjugando parcerias compostas por entidades diversificadas como a justiça, a saúde, a educação, serviços de segurança social, organizações da sociedade civil, incluindo organizações religiosas e ainda empresas, concluindo que o clima inclusivo é crucial para o funcionamento de uma Parceria e em particular a existência de (a) uma liderança inclusiva e encorajadora da participação dos parceiros; (b) de partilha de poder no processo de tomada de decisão e (c) a presença de uma missão partilhada. Novamente se constata uma centralidade atribuída ao clima social, facto que não é surpreendente considerando-se a necessidade de colaboração para promover uma resposta articulada para um problema ou situação de natureza complexa. A qualidade da liderança desempenha um papel relevante na formação do clima social (Giamartino & Wandersman, 1983) e promove o empowerment de quem exerce a liderança, a coesão e o envolvimento no trabalho em parceria. Para Allen (2005) o factor tempo de funcionamento da parceria foi também considerado como relevante na capacidade para alcançar objectivos e para a construção do sentido de missão partilhada.

Para a investigação e avaliação dos processos e resultados do trabalho em parceria, importa reflectir e identificar níveis ecológicos de mudança que promovem. Os processos e os resultados das Parcerias e das coligações podem ser observados a nível individual, organizacional, inter-organizacional e comunitário ou de sistemas (cf. Butterfoss, 2007).

Os resultados observados a nível individual incluem as mudanças nas circunstâncias concretas da vida dos habitantes ou dos membros de uma determinada comunidade, no seu estatuto social, nos índices de qualidade de vida das pessoas concretas ou de determinados grupos, na articulação entre vários sectores da comunidade, na mudança de atitudes ou comportamentos, na sensibilidade e aumento do conhecimento, bem como nas capacidades de transferência de informação.

Os resultados organizacionais incluem a defesa pública de uma determinada causa ou a adopção de novas políticas ou práticas, bem como a possibilidade de implementar novos programas ou serviços com o correspondente reforço de apoios financeiros ou da produção de inovação no financiamento de iniciativas consideradas como inovadoras.

Podem também incluir mudanças nas carreiras dos profissionais envolvidos ou na melhoria das capacidades de intervenção por parte dos profissionais, bem como a possibilidade de influenciar alterações ao nível da missão, ajustamentos ou mesmo alterações ao nível dos parceiros.

Os resultados inter-organizacionais focalizam-se na observação da construção e manutenção de ligações entre entidades públicas, privadas, sem fins lucrativos ou de base comunitária e os resultados específicos podem incluir o número de novas relações estabelecidas entre organizações na comunidade e em que medida essas interacções progrediram em termos de colaboração. Podem também abranger as relações estabelecidas entre os vários sectores da comunidade sem experiência anterior de colaboração e as novas relações estabelecidas entre a Parceria e outras organizações fora da comunidade. As melhorias na comunicação, o fortalecimento de, por exemplo, relações entre as famílias e a escola, o aumento do envolvimento e da participação cívica, a redução da violência, a maior responsabilização das instituições na comunidade e dos grupos de residentes são; todos estes elementos podem contribuir para o aumento da partilha de responsabilidades e para a promoção da acção coordenada.

Os resultados comunitários ou de mudança de sistemas, incluem resultados alargados junto da população, nomeadamente em índices de saúde, alterações produzidas nos espaços físicos em resultado das mudanças produzidas em regulamentos, políticas ou práticas. O objectivo final é obter mudanças que tenham como resultado ambientes físicos e sociais mais saudáveis. As políticas públicas podem ser acerca de normas para a resolução de divergências ou conflitos na comunidade, no sentido de aumentar o sentimento de comunidade; os ambientes físicos podem também ser transformados através do trabalho em parceria, por exemplo, contribuindo para o aumento da segurança nos espaços públicos de recreio ou lazer, na criação de circuitos pedestres ou de ciclo vias, entre muitos outros, nomeadamente relacionados com as questões de redução da negligência e abuso de crianças, jovens ou idosos e sobreviventes de violência doméstica.

Segundo Fawcett, Francisco, Paine-Andrews, e Schultz (2000) ou Fawcett (2003), ou ainda Butterfoss (2006, 2007), as parcerias comunitárias devem ser avaliadas em pelo menos três níveis principais, ao nível das infra-estruturas e processos, da implementação de actividades e programas e finalmente dos resultados e mudanças na comunidade ou no contexto específico onde a parceria procurou intervir.

A avaliação de parcerias permite evidenciar o que foi alcançado, nomeadamente como se identificaram e se envolveram os intervenientes e se os membros estão a contribuir eficazmente nos esforços de colaboração propostos pela parceria ou coligação. Estes são habitualmente resultados identificados como sendo de curtoprazo no âmbito da operacionalização do trabalho em parceria e permitem essencialmente avaliar como tudo está a funcionar. Este domínio inclui questões de gestão, de organização e implementação das actividades em parceria.

A avaliação de processos das parcerias permite demonstrar como é que os seus esforços contribuíram para mudanças positivas na comunidade, sobretudo quando conjugados com os dados de avaliação que emanam da própria comunidade.

Esta forma de avaliação pode ajudar as parcerias ou coligações a ajustar os seus esforços ao longo do tempo o que pode resultar em melhorias significativas da sua capacidade de alcançar os objectivos a que se propõem.

No que concerne à avaliação associada aos programas e intervenções, esta centra-se nas acções que conduzam a produtos relacionados com o desígnio ou propósito da parceria ou coligação. As actividades desenvolvidas podem ser em áreas como a formação, informação/ sensibilização, defesa pública de uma causa, a implementação de um programa de prevenção ou intervenção. Estas actividades dependem da disponibilidade e apropriação dos recursos, um plano de acção temporizado, bem como de um contexto social e político favorável. É relevante enfatizar que o propósito da avaliação não é somente comprovar se um programa resulta, mas também demonstrar como podem as iniciativas ser melhoradas ou ajustadas ao contexto local.

A capacidade de ajustamento segundo Kubisch, Brown, Chaskin, Hirota, e Joseph (1998), pode estar associada à identificação da necessidade de alterar a população ou grupo prioritário para a intervenção ou alterar as acções passando, por exemplo, incluir intervenções ao nível do contexto que potenciem a obtenção de resultados a longo-prazo.

A avaliação deve ser uma acção continuada, desde a fase de planeamento, passando pela implementação, bem como nas acções que sejam replicadas a partir de outras experiências que tiveram sucesso.

Esta estratégia de avaliação também se focaliza nos processos, isto é, procura compreender como é que os programas funcionam num determinado contexto comunitário, os seus resultados imediatos e intermédios, nomeadamente as mudanças ao nível do (re)conhecimento ou da opinião pública face ao fenómeno abordado pela parceria ou coligação, bem, como a necessidade identificada de produzir alterações em termos das políticas públicas locais.

Outras iniciativas de sucesso identificadas como práticas promissoras podem constituir-se como ilustrações relevantes acerca do que resulta, a partir das mudanças observadas na comunidade.

A avaliação (Allen & Hagen, 2003) permite perceber quais dos objectivos específicos dos programas que foram efectivamente alcançados e qual a eficácia global da iniciativa. Acções concretas de avaliação podem incluir a análise dos registos de reuniões, visitas a pessoas ou a locais, relatos nos vários meios de comunicação social, ou os registos de participação em eventos promovidos pela parceria ou coligação. Todas estas formas de medida podem ser úteis para se proceder a uma verificação da fidelidade, isto é, se a intervenção decorreu de acordo com o planeado; os registos de suporte individual podem permitir perceber como o serviços ou suportes foram proporcionados, a análise dos enquadramentos legais permitem perceber como a este nível foi percepcionada a importância da iniciativa e como foi regulamentada. Estes dois elementos podem ainda ser combinados com entrevistas a informadores chave, essenciais para documentar o percurso de desenvolvimento da parceria.

Quanto aos resultados e mudanças na comunidade, o sucesso depende da capacidade de se obter resultados a longo-prazo, pois a mudança comunitária e de sistemas não acontece rapidamente e muitos resultados são difíceis de medir através de metodologias tradicionais (Allen, 2006, 2008) pelo que metodologias de avaliação participativa e com base em pressupostos de empowerment aumentam a possibilidade de se compreender como é que as iniciativas comunitárias resultam para as populações e como é que a mudança de sistemas pode contribuir para a melhoria global do bem-estar da população.

Em conclusão as parcerias e coligações comunitárias podem ser uma forma de promover a colaboração entre pessoas, organizações ou serviços que habitualmente intervêm isoladamente na comunidade e são uma forma de promover estratégias de co-empowerment (Bond & Keys, 1993), que acontece quando dois ou mais grupos ao colaborar, beneficiam da expansão e activação de recursos de forma conjugada para alcançar objectivos comuns. No Quadro 2 sumarizam-se os elementos substantivos e programáticos que resultam da criação e implementação de parcerias e coligações em contextos comunitários.

 

QUADRO 2

Elementos estruturais das parcerias comunitárias

 

Pressupondo que a capacidade colaborativa se refere às condições necessárias para que as parcerias e coligações possam promover mudança comunitária sustentável (Goodman et al., 1998) e reconhecendo-se que não há uma forma única de implementar processos de colaboração em contextos comunitários (Roussos & Fawcett, 2000), esta ênfase na colaboração tem utilidade, porque remete para a possibilidade de influenciar a mudança na comunidade.

A promoção da interdependência funcional, assenta na valorização dos vários intervenientes das parcerias, procurando potenciar os seus resultados em termos participação cívica e de influência da mudança social e comunitária; reconhece-se, por um lado, a importância dos seus contributos e, por outro, respeita-se a sua diversidade e especificidade. Esta dinâmica de inclusão e interdependência proporciona formas de comunicação directa, de procura de significado partilhado (Krille, Curphy, & Lund, 2006) e de exercício de responsabilidades que sejam equivalentes em termos de exercício do poder.

As parcerias e coligações em contextos comunitários que se orientarem para problemas concretos e formas de os resolver ou ultrapassar, tenderão a ser geradoras de capital social e a criar um propósito comum de mudança sustentável (Pickeral, 2005) e ancorada nos recursos e nos bens das comunidades onde se implementam.

 

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NOTAS

1Inicialmente publicado nesta data, 1835 [Tradução portuguesa Da Democracia na América (2001) S. João do Estoril: Princípia Editora] tem sido um livro recuperado nos últimos 30 anos como uma referência base para a compreensão da participação cívica e as suas implicações do desenvolvimento das comunidades.

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