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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia

Print version ISSN 0430-5027

Finisterra  no.91 Lisboa June 2011

 

NOTA


 

Determinantes ambientais e sociais na actividade física dos adolescentes utilização de metodologias SIG

 

Environmental and social determinants of the levels of teenage physical activity: the use of GIS methodologies

 

Caractéristiques environnementales et sociales des niveaux d’activité physique des adolescents : l’utilisation de methodologies SIG

 

 

Margarida Miguel Pereira1; Jorge Mota1; Helena Nogueira2; Maria Paula Santos1

1 CIAFEL (Centro de Investigação em Actividade Física Saúde e Lazer). E-mail: mmiguel06@gmail.com; jmota@fade.up.pt; msantos@fade.up.pt

2 CEGOT (Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território) E-mail: helenamarquesnogueira@gmail.com

 

 

RESUMO

A Actividade Física (AF) tem um papel fundamental na melhoria da saúde e no bem-estar. No entanto, nas sociedades modernas, os estilos de vida estão a mudar no sentido de comportamentos mais sedentários, o que contribui para um aumento do risco de desenvolvimento de doenças crónicas, como diabetes tipo II, doenças cardiovasculares, hipertensão, alguns tipos de cancro, doenças músculo-esqueléticas, obesidade, entre outras. Comportamentos como a AF e bons hábitos alimentares, entre outros, são moldados em idades precoces. Pode portanto afirmar-se que os comportamentos adquiridos durante a infância e a adolescência podem ser determinantes dos Níveis de AF (NAF) na idade adulta. Existem evidências científicas que sugerem que o ambiente urbano pode influenciar os NAF da população, comprovando-se que algumas das suas características estão associadas com o transporte activo ou com o desenvolvimento de actividades de lazer. No entanto há poucos estudos sobre elementos objectivos do território e sua relação com os NAF, sobretudo dos realizados fora dos contextos americano e australiano. É importante identificar que variáveis influenciam os NAF dos adolescentes, especialmente em espaços urbanos, a fim de promover áreas e pessoas mais saudáveis.

Palavras‑chave: Ambiente urbano, actividade física, saúde, sistemas de informação Geográfica (SIG).

 

ABSTRACT

Nowadays, the fact that Physical Activity (PA) plays a fundamental role in improving health and well-being is well known. nevertheless in modern society, lifestyles are becoming ever more sedentary, which contributes to an increase in the risk of developing a plethora of chronic diseases, such as type 2 diabetes, CVD, hypertension, some types of cancer, muscular-skeletal diseases and obesity, among others. PA and dieting are habits that are shaped from an early age; thus behaviour as children and adolescents may determine adulthood Pa Levels (PAL). There is scientific evidence to suggest that the urban environment may influence the level of physical activity of the population, proving that some characteristics are associated with active transport or with the development of leisure activities. Despite the evidence, few studies outside the USA and Australia have been performed on objectively measured environmental features and PAL. It is important to identify which variables are more likely to influence adolescent PAL, especially in urban spaces, in order to promote healthier environments and healthier people.

Keywords: Built environment, physical activity, health, Geographic information systems.

 

RÉSUMÉ

On sait que l’Activité Physique (AP) joue un rôle fondamental dans l’amélioration de la santé et du bien-être. Cependant, dans les sociétés modernes, les styles de vie entrainent des comportements plus sédentaires qui augmentent le risque de maladies chroniques, comme par exemple le diabète de type II, les maladies cardiovasculaires, l’hypertension, certains types de cancer, les maladies musculo-squelettiques ou l’obésité. L’AP et le régime se constituent dès la jeunesse. On peut dire que les comportements acquis durant l’enfance et l’adolescence peuvent déterminer les niveaux d’AP (NAP) de l’âge adulte. Des études scientifiques montrent que le milieu urbain peut influencer les NAP de la population et que certaines de ses caractéristiques sont associées au déplacement actif ou au développement d’activités de loisir. Mais il y a peu d’études sur les caractéristiques environnementales et leur relation avec les NAP, sauf dans des contextes américain et australien. Il est important d’identifier les variables qui influencent les NAP des adolescents, surtout en milieu urbain, afin de promouvoir la salubrité des lieux et des gens.

Mots clés: Milieu urbain, activité physique, santé, systèmes d’information géographique.

 

 

I. INTRODUÇÃO

A Organização Mundial de Saúde (OMS) define Actividade Física (AF) como qualquer movimento músculo-esquelético que despenda energia, como caminhar, dançar ou andar de bicicleta (WHO, 2010). É também AF praticar exercício físico como actividade estruturada (planificada); contudo, há que distinguir os dois conceitos, uma vez que, geralmente, têm propósitos distintos. O exercício físico, por norma, é realizado com intuito de aumentar os níveis de aptidão física ou de saúde, enquanto a AF poderá ser apenas o resultado de deslocações activas (a pé ou de bicicleta) entre a residência e o trabalho ou a escola (CDC, 1996).

A AF é considerada um dos comportamentos saudáveis mais importantes no que toca à prevenção de diversas doenças, nomeadamente doenças crónicas, como diabetes tipo II, doenças cardiovasculares, hipertensão, alguns tipos de cancro, doenças músculo-esqueléticas e obesidade, entre outras (CDC, 1996). Apesar dos comportamentos em saúde dependerem, em grande parte, das características intrínsecas do indivíduo e das suas crenças e valores pessoais, os modelos teóricos explicativos em saúde descrevem um conjunto bastante mais vasto de variáveis passíveis de interferir com a saúde individual (Giles-Corti and Donovan, 2002).

Esses modelos designam-se modelos socioecológicos e dividem as variáveis em três grandes dimensões: individual, socioeconómica e ambiental. A dimensão individual integra variáveis biológicas (idade, género, etc.), antropométricas (peso, altura, perímetro da cintura, etc.), comportamentais (comportamentos tabágicos, alimentares, de actividade física, etc.) e atributos psicológicos como a motivação e a auto-eficácia, entre outros aspectos. Na dimensão socioeconómica está incluído o nível de escolaridade, a profissão, o rendimento (individual ou ao nível da vizinhança3) ou até o estatuto social dos familiares e amigos (Cerin, et al., 2009). a última dimensão, a ambiental, engloba todas as características (sociais e biofísicas) do território onde o indivíduo se movimenta, reside e trabalha. Assim, este modelo teórico pressupõe que o território pode condicionar ou proporcionar a prática de AF e, em consequência, “determinar” a saúde pública (Giles-Corti e Donovan, 2002).

Apesar desta área temática ser bastante recente – começou a estudar-se na década de 1980 –, as pesquisas sobre este tema são já inúmeras. A grande maioria tem origem nos estados Unidos da américa (EUA) e na austrália; no entanto, também é feita investigação em Inglaterra, na Bélgica e noutros países europeus. Em Portugal as investigações sobre este tema são ainda limitadas, mas podem-se citar os estudos de santos et al. (2009) Mota et al. (2009) Mota, et al. (2009) Santos, et al. (2009) direccionados sobretudo ao estudo da AF em crianças e jovens.

A informação contextual utilizada nos estudos referidos divide-se em três categorias distintas: informação percepcionada sobre o território em que a pessoa reside e se movimenta diariamente, que normalmente é recolhida por via de inquéritos à população; informação observada, cuja recolha é feita através de auditorias conduzidas por pessoal devidamente formado; informação objectiva, ou seja, informação integrada num sistema de informação Geográfica (SIG). Cada uma destas categorias de informação tem vantagens, mas também limitações, dependendo dos objectivos do estudo, ficando ao critério do investigador a decisão sobre o tipo de informação a utilizar (Brownson, et al., 2009).

As publicações que utilizam informação geográfica percepcionada indicam que o número de locais a visitar, o trânsito, o acesso a ciclovias e a presença de pessoas activas na vizinhança estão associadas positivamente com o transporte activo, seja a pé ou de bicicleta (Hoehner, et al., 2005). Segundo esta lógica, alterações na percepção da vizinhança são cruciais para as oscilações dos níveis de AF. De acordo com Humpel (2004), apesar de homens e mulheres percepcionarem a sua vizinhança de forma diferenciada, alterações no conforto4 da vizinhança (no caso dos homens e mulheres) e alterações na sua estética5 (somente para os homens), teriam provavelmente duplicado as suas deslocações a pé (Humpel, et al., 2004). Ainda utilizando informação percepcionada, Shigematsu (2009), realça a importância dos locais não residenciais a visitar, e a disponibilidade de infra-estruturas recreativas numa distância “caminhável” como atributos territoriais capazes de aumentar a AF dos indivíduos (Shigematsu, et al., 2009). Em Portugal, Mota (2009) e Santos (2009) destacam que a percepção de pessoas activas, ou a presença de coisas interessantes (lojas) ou espaços gratuitos para a prática de AF na vizinhança, se relacionam positivamente com a AF dos jovens (Mota, et al., 2009; Santos, et al., 2009), à semelhança do que acontece noutros países (Scott, et al., 2007; Hume, et al., 2009; Tucker, et al., 2009).

As publicações que utilizam informação recolhida através de auditorias são em número bastante inferior àquelas que utilizam os outros dois tipos de informação. Este aspecto poderá estar relacionado com o facto de as auditorias serem bastante morosas e onerosas (é necessário que os técnicos tenham formação especifica para as efectuarem). McKenzie et al. (2006) desenvolveram um instrumento de auditoria que designaram por SOPARC (System for Observing Physical Activity and Recreation in Communities – sistema de Observação da actividade física e recreação na Comunidade). Este instrumento permite, através de observação directa e sistemática, recolher informação sobre o tipo de actividade física dos indivíduos num determinado local, bem como sobre as características desse mesmo local. Por exemplo, num determinado parque público é possível identificar quais os locais (relva, descampados ou campos de jogos, entre outros) onde as pessoas são mais activas. Este facto é, sem dúvida, uma enorme mais-valia para o planeamento de parques cujo objectivo seja a participação dos indivíduos em actividades físicas variadas (McKenzie, et al., 2006).

No estudo realizado por Crawford et al. (2008) foi utilizado o C-POst (Children Open Space Tool), um instrumento de auditoria composto por vários itens, nomeadamente o número de cada tipo de campo de jogos (basketball, futebol, etc.), o número de bebedouros, caixotes do lixo, etc. este instrumento foi desenvolvido com base em pressupostos teóricos criados a partir de revisões sistemáticas sobre o tema (Crawford, et al., 2008). Timperio et al. (2008) também utilizaram este instrumento, mas nesse estudo, o objectivo da utilização da auditoria foi complementar à informação geográfica objectiva já recolhida (Timperio, et al., 2008).

A informação geográfica objectivamente recolhida e analisada é cada vez mais utilizada na investigação sobre as determinantes em AF. Lin et al. (2010) consideram que “… as medidas objectivas dos atributos do ambiente construído têm associações mais fortes com andar a pé do que as medidas subjectivas dos mesmos atributos ambientais” (Lin and Moudon, 2010). No entanto, a carência de bases de dados geográficas, ou o facto de não ser exequível o cálculo de determinados índices num determinado local, criam a necessidade de obter informação percepcionada (Leslie, et al., 2005).

Nos estudos com origem nos EUA e na austrália, as variáveis territoriais objectivas mais utilizadas são: o uso do solo, a rede viária (sobre a qual é calculada a quantidade de intersecções) e a densidade de área residencial à escala das secções estatísticas (census track). Estas três variáveis são frequentemente utilizadas para a construção do “índice de pedonalidade” que distingue áreas com maior aptidão para caminhar de áreas onde a utilização de outros tipos de transporte é necessária. Os estudos realizados têm concluído pela existência de associações positivas entre o “índice de pedonalidade” e os níveis de AF da população (Frank, et al., 2005; Leslie, et al., 2005; Kligerman, et al., 2007).

A distinção entre características sociais e biofísicas do território, vantajosa e necessária para a sua sistematização, deve ser complementada com uma abordagem que sublinhe a sua interacção, uma vez que estas se influenciam mutuamente. Refiram-se, como exemplo, os estudos de disponibilidade e densidade de recursos que comprovam a escassez de equipamentos para actividade física nos territórios de maior privação socioeconómica, num modelo designado por “modelo de amplificação da privação” (Boone-Heinonen, et al., 2010; Nogueira, 2010). Parece, pois, que os estudos sobre este assunto devem ser desenvolvidos utilizando, sempre que possível, os dois tipos de atributos do ambiente, evitando a utilização de um grupo em detrimento do outro (Boone-Heinonen, et al., 2010).

Os comportamentos perante a AF são moldados em idades precoces, pelo que se pode afirmar que os comportamentos adquiridos durante a infância e a adolescência são determinantes dos níveis de AF na idade adulta (Tucker, et al., 2009; Wheeler, et al., 2010). Por esta razão os jovens são muitas vezes a população alvo das investigações em que se relaciona a AF e as características de sua vizinhança, tal como acontece neste estudo, cujos objectivos principais foram: (1) utilizar os sistemas de informação Geográfica (SIG) para verificar a associação entre Densidade de Degradação de edifícios (DDE), como um importante aspecto estético e social do meio urbano, e os níveis de AF dos adolescentes no Porto; (2) relacionar o nível de escolaridade dos pais com a participação dos adolescentes em AF formais; e (3) conhecer a distribuição geográfica de ambas as varáveis – nível de escolaridade dos pais e participação dos adolescentes em desporto formal – verificando a existência, ou não, de padrões espaciais convergentes.

 

II. MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo realizou-se no concelho do Porto. Este concelho reúne uma série de características eminentemente urbanas, razão pela qual foi escolhida para se proceder à recolha da amostra populacional e da informação geográfica. Quanto à população, recolheu-se uma amostra em escolas secundárias, dado que o objectivo era estudar os níveis de AF dos adolescentes. A informação geográfica teve como fontes principais o instituto Geográfico Português (IGP) e o instituto nacional de estatística (INE), nomeadamente a informação disponibilizada gratuitamente nos seus websites.

1. Informação individual

Foi utilizado um questionário para recolher informação individual, nomeadamente a residência, o nível de escolaridade dos pais, a prática habitual de actividade física formal e os níveis de actividade física (naf) dos adolescentes. A amostra era constituída por 165 adolescentes, com idades médias de 16,88 ± 1,67 anos.

Os NAF foram avaliados através dum grupo de cinco questões sobre a frequência de tempo dedicado ao desporto fora da escola, os níveis de participação em actividade física nos tempos-livres e o tempo dedicado a actividades desportivas e a desportos competitivos. Cada questão apresentava 4 ou 5 opções de resposta, de acordo com a escala Likert, tendo os NAF sido calculados após pontuação e soma dessas opções de resposta. A amplitude dos valores variava entre 5 a 21 (sendo 5 o valor que indica menos activos), tendo sido posteriormente classificada em três grupos: NAF Baixos (5 a 10), NAF Médio (11 a 16) e NAF alto (17 a 21).

O nível de escolaridade dos pais e a prática formal de actividade física foram operacionalizados como variáveis categóricas, calculando-se, para as mesmas, os coeficientes de correlação de Spearman através do sPss v17. Para mapear os níveis de escolaridade dos pais e os NAF médios dos adolescentes por freguesia de residência (visível na fig. 1) recorreu-se ao arcMap 9.3.

 

 

Também foi analisada uma sub-amostra de escolas localizadas em áreas socioeconómicas (as) distintas: a escola A, onde foram questionados 40 jovens, situada na parte ocidental do Porto, considerada como pertencendo a uma as mais favorecida, e a escola B (n = 30) localizada na parte mais oriental do concelho do Porto, numa área mais desfavorecida.

A média de idades desta sub-amostra foi 16,24 ± 1,35 anos. Calculou-se também o Índice de actividade física (IAF)6, recorrendo às mesmas questões que originaram os NAF, mas agrupadas de forma diferente. Neste caso, dicotomizou-se a variável, considerando-se mais activos os indivíduos que apresentam um IAF igual ou superior a 11 e menos activos aqueles cujo IAF é inferior a 11 (valor médio das pontuações).

2. Informação territorial

As moradas indicadas pelos indivíduos serviram como base para a georreferenciação das residências. Este procedimento foi efectuado através do Google earth, plataforma que permitiu obter as coordenadas de cada residência. Estas coordenadas foram posteriormente exportadas para um ficheiro excel utilizado em ambiente arcMap 9.3 para criar a layer com toda a informação sobre os adolescentes. Com base nesta layer, efectuou-se um buffer com 1km de raio à volta de cada residência, delimitando-se uma superfície considerada como área de vizinhança, admitindo a que 1km corresponde em 15 minutos de caminhada em linha recta.

A Densidade de Degradação dos edifícios (DDE) relativa a sub-secções do concelho do Porto foi recolhida no website do ine. Como se referiu, considerou-se que esta variável era capaz de reflectir atributos físicos e sociais do território pois, por um lado, refere-se a edifícios que são uma característica observável e concreta do território; por outro lado, a manutenção e a estética relacionam-se com o contexto social dos espaços, nomeadamente com a segurança e com o uso potencial desses espaços. Esta informação foi adicionada ao projecto no arcMap em formato vectorial e posteriormente convertida em formato raster com uma grelha de pixéis de 30m². Ao converter a informação para formato raster (matriz de pixéis) é atribuída a cada célula uma pontuação (scores) de DDE (de 1 a 8) calculada automaticamente pelo software de acordo com a informação original em formato vectorial. A pontuação de DDE que potencialmente interfere directamente com os NAF dos adolescentes corresponde à média dos scores de DDE de todos os pixéis dentro do buffer criado à volta da residência – vizinhança.

Por fim, classificaram-se as freguesias de acordo com a média dos valores de DDE de todos os adolescentes residentes em cada freguesia, originando a seguinte classificação: DDE baixa (até 3,17), DDE média (entre 3.17 e 4,1) e DDE alta (superior a 4,1).

 

III. RESULTADOS

O nível de escolaridade dos pais e a prática de AF formal estão correlacionados positiva e significativamente (rho = 0,198; ρ = 0,03), o que quer dizer que quanto mais elevado for o nível de escolaridade dos pais maior será o NAF dos filhos (quadro I).

 

 

Ao cartografar o nível de escolaridade dos pais e os NAF dos adolescentes (valores médios pelas freguesias), verifica-se uma tendência para a sobreposição dos valores mais baixos. A figura 1 (distribuição das variáveis sociais e individuais no território do concelho do Porto) evidencia essa tendência; é possível verificar que as freguesias onde residem os pais com menor nível de escolaridade são aquelas em que os adolescentes apresentam menor NAF.

O quadro II evidencia a relação entre NAF dos adolescentes e a DDE, verificando-se que a proporção de jovens residentes com NAF baixo aumenta em áreas com alto DDE e que, em oposição, a percentagem de jovens residentes com NAF alto aumenta em áreas de baixa DDE.

 

 

Considerando a sub-amostra de escolas localizadas em áreas socioeconómicas díspares, verificou-se que na escola a, situada na área mais próspera, 67,5% dos estudantes apresentam IAF altos, enquanto na escola B, localizada na área mais vulnerável, apenas 60% dos estudantes alcançam o mesmo nível (quadro III).

 

 

IV. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A influência do território nos comportamentos relacionados com a actividade física das populações neles residentes, bem documentada em diversos autores (Frank, et al., 2005; Tucker, et al., 2009), foi confirmada neste estudo. Considerando a amostra das duas escolas, localizadas em áreas socioeconómicas díspares (n=70), verificou-se que os adolescentes residentes em áreas caracterizadas por elevada densidade de edifícios degradados apresentam menores iaf, em comparação com os adolescentes que residem em áreas de menor DDE. Este resultado sublinha a importância dos atributos físicos e sociais do território nos níveis de AF dos seus residentes, relação que tem sido enfatizada por vários autores, em diferentes contextos. Refiram-se, como exemplo, os trabalhos de Boone-Heinonen et al. (2010), Giles-Corti and Donovan (2002).

O nível de escolaridade (do indivíduo, de seus pares ou pais), entendido como uma das variáveis mais importantes na definição do estatuto socioeconómico, tem uma clara influência os NAF. Quanto maior é o nível de escolaridade, maior é o NAF (Gordon-Larsen, et al., 2000). A relação entre estas variáveis pode ser explicada de diversas formas: por um lado maiores níveis de escolaridade pressupõem mais conhecimento e ocupações profissionais melhor remuneradas; por outro lado, o acesso a nova informação por parte de indivíduos mais escolarizados é facilitado, quer pelas condições sociais, quer pelas condições económicas e financeiras, que serão superiores para quem tem maiores níveis de escolaridade (Giles-Corti and Donovan, 2002).

As diferenças sociais e socioeconómicas são visíveis ao nível territorial. Indivíduos com características semelhantes tendem a concentrar-se espacialmente, sendo por isso possível distinguir as freguesias do concelho do Porto através deste tipo de informação individual. As freguesias ocidentais e orientais poderão ser diferenciadas através do nível do prestígio social; as freguesias localizadas a ocidente terão um estatuto socioeconómico superior às freguesias localizadas a oriente deste território. Partindo deste pressuposto, compararam-se os NAF dos jovens de duas escolas – uma localizada numa freguesia a ocidente (a) do concelho e outra a oriente (B). Os resultados indicam que os jovens que frequentam a escola B têm menores NAF.

A utilização da DDE, como já foi referido, permitiu distinguir a área de vizinhança dos adolescentes em três categorias: alta, Média e Baixa DDE. As áreas com alta DDE são menos atractivas esteticamente e, ao mesmo tempo, correspondem a áreas de maior privação socioeconómica, enquanto as áreas de Baixa DDE são mais agradáveis, nelas residindo indivíduos menos carenciados. São mais os jovens com NAF elevado a residir em áreas de Baixa DDE do que em áreas de alta DDE.

Os resultados deste estudo vêm confirmar que os NAF dos jovens são influenciados pelo nível de escolaridade dos pais, que esta relação é visível em termos espaciais e que indivíduos que vivenciam territórios diferenciados ao nível socioeconómico revelam comportamentos de AF distintos. estes resultados comprovam que há uma relação entre o ambiente e o indivíduo, no que toca aos seus comportamentos de af, e que ela deve ser tomada em consideração em qualquer estudo de saúde pública com preocupações nas determinantes ambientais.

 

V. CONCLUSÕES

Os atributos individuais e familiares influenciam os comportamentos individuais. A escolaridade dos pais, considerada como uma determinante socioeconómica da actividade física (de nível familiar), influencia a actividade física dos adolescentes. Pais mais instruídos, com maior capacidade de aceder e compreender a informação, influenciam positivamente os comportamentos dos seus filhos. Todavia, para além das determinantes individuais, a AF dos jovens é também contextualmente determinada. Áreas de residência caracterizadas por elevada densidade de degradação de edifícios (DDE) parecem ser um obstáculo à actividade física dos adolescentes na cidade do Porto. A DDE mede a atractividade geral das áreas, representando quer o ambiente físico, quer o ambiente social das comunidades. DDE elevadas sugerem a presença de um ambiente desagradável, hostil, inseguro, caracterizado pela desorganização social, por incivilidades e vandalismo, como lixos, grafittis, ou seja, um ambiente afectado por processos de degradação física e estrutural que podem inibir a actividade física da população, formal ou informal, diminuindo os NAF. a percepção da população quanto às características físicas e sociais da sua vizinhança é determinante da sua saúde e dos seus NAF. É natural que os residentes em vizinhanças caracterizadas pelos processos de degradação descritos se sintam menos motivados, e até inibidos, para desenvolver actividades físicas informais na sua área de residência, como por exemplo, a proporcionada por passeios e caminhadas com o intuito de fazer compras, descansar, conviver ou apenas relaxar. Insatisfação com a vizinhança, não gostar da “paisagem”, percepções de insegurança são potenciais mecanismos que ligam a DDE e os NAF.

O objectivo do presente estudo, que procurava avaliar se o método desenvolvido utilizando SIG poderia fornecer variáveis ambientais consistentes e aprofundar a investigação acerca da influência do contexto ambiental na actividade física foi atingido. Mas há necessidade de aprofundar este tema, desenvolvendo estudos que incluam outras variáveis territoriais.

A maior limitação deste estudo prende-se com a última afirmação, uma vez que teria sido importante incluir outras variáveis, quer como varáveis independentes quer como variáveis de controlo ou ajuste (variáveis passíveis de causarem “ruído”). Na realidade, tendo em conta os resultados atingidos, fica por saber que outros aspectos específicos do território, referenciados em estudos já publicados (como as características dos arruamentos, a existência de infra-estruturas e equipamentos para a actividade física e desportiva, etc…) podem estar a influenciar os NAF da população.

Futuras investigações passam por integrar um maior número de variáveis territoriais, quer objectivas, quer percepcionadas ou observadas numa só base de dados, a par das varáveis individuais (demográficas, biológicas e socioeconómicas) e analisar toda esta informação com modelos/análises estatísticas diversas.

 

AGRADECIMENTOS

Este estudo foi parcialmente financiado pela FCT, projecto “actividade física objectivamente avaliada e obesidade em adolescentes: estudo dos determinantes pessoais, sociais e ambientais” (PTDC/DES/099018/2008).

Agradecemos a todos os que connosco colaboraram e aos revisores deste artigo que permitiram a publicação neste número da Finisterra, aos quais exprimimos o nosso reconhecimento pelo seu valioso contributo.

 

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Recebido: Janeiro 2011. Aceite: Maio 2011.

 

 

NOTAS

3O rendimento individual é obtido através de questionário à amostra em estudo e o rendimento ao nível da vizinhança é obtido no ine por área de residência (secção ou subsecção estatística).

4Três itens questionavam especificamente sobre o “conforto” das oportunidades na vizinhança: “Como classificaria a distância a pé do parque ou praia mais próxima?”, “Quão acessível é o caminho pedonal ou a ciclovia?” e “no geral, quão confortável é caminhar no seu bairro?”

5Dois itens classificaram o conceito de “estética”: “Como classificaria a simpatia geral das pessoas?” e “Quão agradável é a paisagem?”

6Índice de actividade física (iaf) = ∑ respostas às 5 questões sobre actividade física* iaf ≥ 11 = activos iaf < 11 = Menos activos * a AF foi avaliada através dum grupo de cinco questões sobre a frequência de tempo dedicado ao desporto fora da escola, os níveis de participação em actividade física nos tempos-livres e o tempo dedicado a actividades desportivas e a desportos competitivos. Cada questão apresentava 4 ou 5 opções de resposta, de acordo com a escala Likert, tendo o IAF sido calculado após pontuação e soma dessas opções de resposta. A amplitude dos valores variava entre 5 a 21.

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