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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.250 Lisboa mar. 2024  Epub 31-Mar-2024

https://doi.org/10.31447/2021107 

Artigo

Organização partidária e mudanças estratégicas do Partido Social Liberal (PSL) nas eleições presidenciais brasileiras em 2018.

Party organization and strategic changes of the Social Liberal Party (PSL) in the Brazilian 2018 presidential elections.

Vitor Vasquez1 
http://orcid.org/0000-0002-8334-3548

Vítor Eduardo Veras de Sandes-Freitas2 
http://orcid.org/0000-0002-0186-6709

Rodrigo Dolandeli dos Santos3 
http://orcid.org/0000-0003-1492-088X

1 Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) » Campus Soane Nazaré de Andrade, Rodovia Jorge Amado, km 16, Bairro Salobrinho - CEP 45662-900, Ilhéus, BA, Brasil. vitor.vasquez@gmail.com

2 Universidade Federal do Piauí (UFPI) » Av. Universitária, S/N, Ininga, Campus Ministro Petrônio Portella - CEP 64049-550, Teresina, PI, Brasil. vitorsandes@ufpi.edu.br

3 Universidade Federal do Pará (UFPA) » Rua Augusto Corrêa, 01, Campus Universitário do Guamá, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - CEP 66075-110, Belém, PA, Brasil. dolandeli@ufpa.br


Resumo

Em 2018, o Partido Social Liberal (PSL), até então inexpressivo, conquistou a eleição de Jair Bolsonaro para presidente do Brasil e teve sucesso também nas eleições legislativas estaduais e nacional. Partindo desses resultados, pergunta-se: que aspetos partidários contribuíram para o sucesso nas disputas legislativas? Neste artigo, analisamos os fatores organizacionais e as candidaturas do PSL e apontamos que a coordenação bolsonarista conferiu um perfil centralizador ao partido. Assim, o PSL, mesmo com uma baixa institucionalização, aproveitou os benefícios do fenómeno Bolsonaro para outras disputas além da presidencial.

Palavras-chave: Partido Social Liberal; organização partidária; eleições brasileiras; Jair Bolsonaro

Abstract

In 2018, the Social Liberal Party (PSL), of little relevance until then, secured Jair Bolsonaro’s election as President of Brazil and achieved success in state and national legislative elections. Building upon these results, the question arises: which party aspects contributed to success in the legislative contests? In this article, we analyze the party’s organizational factors and candidacies, pointing out that the Bolsonaro-led coordination conferred a centralizing profile to the party. Thus, despite having low institutionalization, the PSL capitalized on the benefits of the Bolsonaro phenomenon for other contests beyond the presidential one.

Keywords: Social Liberal Party; party organization; Brazilian elections; Jair Bolsonaro

Introdução

Jair Bolsonaro, filiado na época ao Partido Social Liberal (PSL), foi eleito presidente da República do Brasil em 2018. Para concorrer à presidência, o então deputado federal procurou um partido que desse suporte à sua candidatura. Começou este movimento em 2016, quando se desfiliou do Partido Progressista (PP), em busca de outro partido político. Inicialmente, encontrou espaço no Partido Social Cristão (PSC), liderado pelo pastor Everaldo, que fora candidato à presidência da República em 2014. Contudo, incomodado com as alianças celebradas pelo PSC, Bolsonaro desfiliou-se em 2017 e continuou à procura de um partido que se alinhasse ainda mais com os seus propósitos e com as estratégias traçadas para a sua pré-candidatura (Bilensky, 2017).

Neste período, por ainda ser deputado federal, Bolsonaro deveria aproveitar a janela partidária1 para se filiar a um outro partido em março de 2018. Ainda em 2017, firmou um pré-compromisso com o Partido Ecológico Nacional (PEN). Nesta negociação, uma das condições impostas por Bolsonaro foi a mudança do nome do partido (Freitas, 2017), que acabou ratificada em reunião do Diretório Nacional, ocorrida em agosto do mesmo ano. Após a aprovação interna, o PEN solicitou, junto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a alteração do nome para Patriota (PATRI). Todavia, mesmo assim, a filiação não se concretizou. Depois desta longa procura, com diversas possibilidades, Bolsonaro optou pelo PSL, que, assim como o PEN/PATRI, era um pequeno partido no sistema político brasileiro, localizado à direita do espectro ideológico (Bolognesi, Ribeiro e Codato, 2023).

O PSL foi fundado em 1994 por Rogério Tuma, mas o seu registo foi aprovado pelo TSE apenas em 1998. Neste ano, Luciano Bivar foi eleito deputado federal e tornou-se presidente do partido. Em 2006, Bivar concorreu à presidência da República, obtendo somente 0,06% dos votos válidos. O partido, historicamente, não possuía relevância eleitoral e tampouco política, além de contar com uma débil organização partidária, cuja estrutura se caracterizava por ter poucos diretórios municipais e filiados. Dadas estas características, o PSL era classificado como um partido “nanico” (Ev e Melo, 2014).

Uma tentativa de mudar a sua linha política ocorreu em 2015, quando um grupo liberal, mais tarde conhecido como Livres, surgiu no partido, postulando a sua refundação. Contudo, no início de 2018, Bivar acertou a entrada de Jair Bolsonaro no PSL, visando a disputa presidencial. Este acordo gerou a saída dos Livres do partido, em função das divergências políticas. Ao mesmo tempo, abriu espaço para a ascensão do grupo bolsonarista, que logo assumiu a coordenação partidária durante as campanhas eleitorais (Prado, 2019).

Numa resolução publicada pelo PSL - n.º 03/2018 - a Comissão Executiva Nacional (CEN) estabeleceu que Bolsonaro seria candidato à presidência da República pelo partido, e foi instituída uma Comissão de Coordenação da pré-campanha. Esta comissão era composta pelo próprio Jair Bolsonaro, por um dos seus filhos, Eduardo Bolsonaro, e por mais três membros do partido, de entre eles o recém-filiado Gustavo Bebbiano, que, com o afastamento de Luciano Bivar para se candidatar à reeleição, se tornou presidente em exercício do PSL. Esse grupo centralizou as principais decisões do partido no período eleitoral, que culminou na eleição de Jair Bolsonaro para presidente da República.

A vitória de um candidato que não figurava entre os favoritos, concorrendo por um partido até então inexpressivo, fez suscitar incertezas sobre o sistema político brasileiro, sobretudo quanto ao protagonismo de organizações partidárias institucionalizadas e nacionalizadas na coordenação das eleições. Até 2014, a bipolarização entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) estruturava não apenas a competição, mas também as estratégias partidárias de disputa, influenciando o próprio resultado eleitoral. A literatura atribuía este fenómeno à capacidade dos dois partidos de organizarem e coordenarem as candidaturas nos estados brasileiros, desde as eleições gerais de 1994 (Braga, 2006; Cortez, 2009; Limongi e Cortez, 2010; Melo, 2007; Melo e Câmara, 2012; Meneguello, 2010; Sandes-Freitas, 2015).

Cabe ressaltar que o sucesso eleitoral do PSL em 2018 não se restringiu ao principal cargo eletivo do país. Além da presidência da República, o partido conquistou 52 vagas de deputado federal, formando a segunda maior bancada da Câmara, inferior somente à bancada petista. Ainda na esfera federal, o PSL elegeu quatro senadores, a mesma quantidade que o PSDB, o PT e os Democratas (DEM). Nesse mesmo ano, o número de filiados aumentou significativamente, e o partido obteve a maior fatia do Fundo Partidário para 2019, devido à votação alcançada para deputado federal, criando-se condições para que pudesse ampliar a sua força eleitoral nos pleitos subsequentes.

Nos estados, o PSL elegeu três governadores, um patamar idêntico ao alcançado pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pelo PSDB e inferior apenas ao do PT, que elegeu quatro. Por fim, o partido conquistou 76 cadeiras em assembleias legislativas, número inferior somente ao obtido pelo MDB e pelo PT. Apenas em cinco unidades federativas e no Distrito Federal o PSL não elegeu deputado estadual ou distrital. Em quatro estados - Espírito Santo, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo - foi o partido que mais cadeiras conquistou.

O PSL tirou proveito do fenómeno Jair Bolsonaro, expandindo as suas conquistas para além da conquista da presidência da República. Dessa forma, mesmo que hoje Jair Bolsonaro já não integre os quadros do partido, as eleições de 2018 geraram recursos que permaneceram a longo prazo. Até agora, os estudos têm analisado sobretudo fatores ligados ao comportamento dos eleitores, procurando identificar as características sociais e económicas e as atitudes dos apoiantes de Bolsonaro (Amaral, 2020; Rennó, 2020). Neste artigo, procuramos analisar o modo como o PSL, um partido com baixa institucionalização, proporcionou condições para a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro em 2018 e conquistou um resultado expressivo nas disputas legislativas. Assim, oferecemos uma contribuição inédita sobre a compreensão da vitória eleitoral de Bolsonaro em 2018, uma vez que nos focamos nos aspectos partidários associados a esse fenómeno.

O objetivo do artigo, portanto, é descrever as estratégias eleitorais e as características organizacionais que permitiram ao PSL lograr êxito não só na disputa presidencial, mas também nas eleições proporcionais. Especificamente, investigamos como a abrangência territorial, a estrutura organizativa e a articulação política - através da candidatura e da coligação - influenciaram o bom desempenho eleitoral do PSL, inclusive nas eleições para o legislativo. Dada a regularidade da disputa alicerçada na bipolarização PT-PSDB por mais de duas décadas, é necessário analisar o modo como um partido com pouca relevância transpôs a força da coordenação eleitoral promovida por essas duas organizações políticas e, além de ter vencido a eleição presidencial, foi capaz de obter resultados expressivos em todas as outras áreas de competição em 2018.

PSL - Um partido pertinente para Jair Bolsonaro

A fundação de um partido político pode ser incentivada por três fatores: transformações socioestruturais, como clivagens, crises, alterações nos valores da sociedade, conjunturas políticas etc.; condições institucionais, como as leis e os demais regramentos que ordenam a criação de partidos; e a dinâmica dos atores, a partir da ponderação, pelas elites, sobre a possibilidade de criar ou não uma nova fação (Kestler, Krause e Lucca, 2013). No Brasil, este terceiro fator de incentivo merece destaque, pois a criação de um partido político permite o acesso a recursos públicos para a sua própria manutenção, por meio do Fundo Partidário. Por outras palavras, muitos atores políticos consideram positivamente a possibilidade de fundar e manter um partido político no Brasil, dado que existe uma garantia de recursos mínimos fornecidos pelo Estado.

No entanto, para que um partido ganhe relevância no sistema político, mais do que continuar a existir, é fundamental que seja eleitoralmente competitivo. Para tanto, um partido pode passar por profundas transformações, inclusive em termos programáticos. Isto é, o programa partidário pode passar para um plano secundário, em relação ao propósito de um partido de se tornar eleitoralmente mais viável. Não que flexibilize a sua orientação ideológica a ponto de causar rompimentos e de ser deslocado de um extremo ao outro do espectro ideológico de maneira repentina. Mas o partido pode ser levado a realizar mudanças na sua fisionomia, a fim de transpor desafios colocados, como, por exemplo, uma mudança de regra eleitoral, ou de tentar ocupar um espaço de destaque no cenário político nacional.

Uma possibilidade para lidar com os desafios é mudar a sua estratégia de oferta eleitoral, com a entrada de um líder carismático situacional que possa promover candidaturas do partido, tornando-o eleitoralmente mais relevante e, por consequência, permitindo-lhe o acesso a mais recursos para a sua manutenção e fortalecimento. De acordo com Panebianco (2005), o líder carismático situacional é aquele capaz de oferecer uma solução ao partido durante uma conjuntura difícil, como um contexto eleitoral, em que o desempenho do partido pode afetar diretamente a sua existência. Logo, um líder carismático situacional poderá promover o sucesso eleitoral do partido num determinado momento. Por outro lado, apesar de oferecer uma solução numa determinada conjuntura, esse líder não tem a capacidade de modelar a organização de acordo com os seus desígnios. Este seria o caso de Jair Bolsonaro, produto de um contexto social e político particular, que mobilizou o eleitor pelo sentimento antissistema e antipetista (Hunter e Power, 2019).

Um incentivo para que Bolsonaro se filiasse ao PSL foi o baixo grau de institucionalização que o partido possuía. Se tivesse uma forte institucionalização, haveria demasiada discricionariedade e sistematicidade na organização partidária, independentemente dos membros que ocupassem os postos de liderança ou de quem executasse as tarefas (Panebianco, 2005); isso dificultaria a Bolsonaro controlar o partido durante as eleições de 2018. Entretanto, não era esse o caso do PSL, que, ao invés de apresentar uma organização complexa e territorialmente estruturada, tinha as suas decisões concentradas nas mãos do seu principal líder até então, Luciano Bivar. Justamente por essa baixa institucionalização, havia espaço para acomodar uma liderança carismática situacional no interior do partido.

A baixa institucionalização do PSL permitiu que Bolsonaro se utilizasse da organização, promovesse a sua candidatura e constituísse o seu discurso, coordenando a campanha em todo o território nacional. Por outro lado, o carisma situacional de Bolsonaro não foi suficiente para alterar totalmente o controlo do partido. Tanto que, mesmo diante do sucesso eleitoral obtido pelo PSL na esteira do presidente eleito, Luciano Bivar continuou como protagonista, o que levou, inclusive, à desfiliação de Jair Bolsonaro em 2019 (Onofre e Moura, 2019).

Assim, ao mesmo tempo que a origem do PSL propiciou a inserção e eleição de Bolsonaro, a centralidade que Bivar possuía nas tomadas de decisão no partido criou obstáculos para que um líder carismático situacional pudesse assumir definitivamente as suas rédeas. Entretanto, mesmo marcado pela baixa institucionalização e pela presença de uma liderança carismática situacional, o partido não só conseguiu a eleição de Bolsonaro como presidente da República, como também teve sucesso em todas as outras disputas eleitorais de 2018. Isto leva-nos a questionar quais as características organizacionais que o PSL adotou para alcançar essas vitórias.

A estruturação do sistema eleitoral via PT-PSDB e a estabilização do sistema partidário brasileiro (Arquer e Vasquez, 2019; Braga, 2006; Braga, Ribeiro e Amaral, 2016; Zucco Jr., 2013) sugerem que o sucesso eleitoral do PSL, sobretudo nas disputas proporcionais da esfera estadual, não se deveu apenas ao carisma situacional de Bolsonaro, tendo sido também consequência de incrementos organizacionais do partido. Por outras palavras, o caso PSL ou confirma que os aspetos organizacionais são essenciais para o sucesso eleitoral em diferentes áreas, em sistemas partidários com alguma estabilidade (Tavits, 2013), ou nos faz refletir sobre quais os contextos em que estes aspetos perdem relevância, tencionando o próprio entendimento sobre o grau de estabilidade do sistema partidário brasileiro. Neste artigo, demonstramos que as variáveis organizacionais - como as estratégias de financiamento e de lançamento de candidaturas - foram levadas em conta pela coordenação eleitoral do PSL em 2018. Estes recursos, tradicionalmente mobilizados apenas por partidos com competitividade eleitoral, contribuíram para que o PSL expandisse o sucesso de Bolsonaro para outras esferas, mesmo considerando que o contexto antipolítico e antipetista era favorável à inserção de atores externos no sistema político.

A eleição de Bolsonaro rompeu a bipolarização PT-PSDB no âmbito nacional. Essa estrutura de competição presidencial vigorou entre 1994 e 2014, influenciando também as disputas eleitorais para os governos estaduais ( Cortez, 2009, Limongi e Cortez, 2010; Meneguello, 2010; Sandes-Freitas, 2015). A bipolarização gerava incentivos para que os atores políticos estaduais se alinhassem com um dos dois blocos existentes, em termos de alianças: um constituído pelo PSDB e pelo DEM; outro pelo PT, pelo PSB e pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Esta influência da disputa partidária nacional na coordenação das eleições estaduais estabeleceu uma “presidencialização da competição eleitoral” (Sandes-Freitas, 2015).

As alianças eleitorais (coligações), portanto, além das motivações ideológicas que conformavam os dois grupos, contavam também com razões pragmáticas, levando os partidos a organizarem-se eleitoralmente, nos estados, conforme a movimentação política em torno dos dois polos. Isso não era necessariamente uma regra, pois, dadas as “racionalidades políticas contextuais” - isto é, as histórias políticas particulares de cada estado (Lima Júnior, 1983; 1997) -, esta tendência era mais ou menos contornada. Todavia, estabeleceu-se um padrão observado na maioria dos estados durante esse período.

Em 2018, no entanto, o PSDB perdeu espaço junto do eleitorado na disputa presidencial. A candidatura petista permaneceu viável e disputou um segundo turno, sendo desta vez derrotada. Assim, o espaço deixado pelo PSDB foi preenchido pelo candidato do PSL, Jair Bolsonaro, vitorioso nesse pleito para a presidência da República. Isto rompeu a bipolarização PT-PSDB, iniciando um novo capítulo na história política do país, e indicou que outros atores já aprenderam o jogo político que o PT e o PSDB protagonizaram durante quase 25 anos.

Lançando-se como candidato “de fora” do sistema político, apesar de ter quase 30 anos de carreira política, Jair Bolsonaro escolheu filiar-se e lançar-se como candidato por um partido pequeno de direita, com baixa institucionalização e sem projeção nacional, o que lhe possibilitou traçar uma estratégia centrada na sua figura. O nosso argumento é que Bolsonaro precisava de estar vinculado a um partido deste tipo, que permitisse um controlo total sobre os recursos e as candidaturas, inclusive nas esferas subnacionais. Assim, as características organizacionais do PSL permitiram que a dinâmica eleitoral se presidencializasse mais uma vez. Para terem sucesso, Bolsonaro e o PSL optaram por se descolar dos partidos tradicionais, lançando-se isoladamente e com poucos parceiros nos estados.

Metodologia e dados

Para demonstrar que o PSL é um partido pouco significativo, centralizado num líder e com baixa institucionalização, analisamos o seu estatuto - aprovado em 2011 e que teve validade até 2019 -, além de documentos partidários sobre as orientações para as eleições de 2018, bem como as resoluções aprovadas pelo partido. Em seguida, destacamos como o partido era propício à entrada de um líder carismático situacional, o que permitiu ao grupo bolsonarista assumir o controlo das estratégias eleitorais e das decisões organizativas do partido em 2018.

Analisamos também os dados de filiação, os órgãos partidários, os recursos eleitorais, o lançamento de candidaturas e as coligações eleitorais firmadas pelo PSL. As informações foram obtidas nos bancos de dados disponíveis na página eletrónica do TSE. Quanto à filiação, montamos o histórico de filiados do partido desde a sua origem, em 1994, até 2018, ano que exploramos com mais detalhe. Em relação aos órgãos partidários, comparamos o PSL tanto com o PATRI e o Democracia Cristã (DC) quanto com o PT, o PSDB, o MDB e o DEM.2 Os primeiros, por possuírem características próximas às observadas no PSL; e os últimos, por serem partidos tradicionais e eleitoralmente competitivos. O intuito foi o de observar em que medida as estruturas organizacionais do partido, em 2018, se aproximavam e se diferenciavam das de pequenos partidos semelhantes ao PSL, antes de Bolsonaro, e dos principais partidos brasileiros, em termos de desempenho eleitoral, até então.

Consideramos que o PATRI e o DC se assemelhavam, até antes de 2018, ao PSL, em termos de capacidade eleitoral, espectro ideológico e liderança. Em 2014, por exemplo, o PATRI e o DC elegeram dois deputados federais cada um, e o PSL elegeu apenas um. Além disso, os três partidos foram fundados e presididos pela mesma figura por um longo período: o PSL, por Luciano Bivar (1998-2018) (Folhapress, 2019); o PATRI, por Adilson Barroso (2012-2022) (Martins, 2018); e o DC, por José Maria Eymael (1997-presente) (Arreguy, 2022). Ou seja, os três partidos eram todos eleitoralmente pequenos, centralizados na figura de um único líder e estavam localizados à direita do espectro ideológico.

Por fim, no que diz respeito à distribuição de recursos, ao lançamento de candidaturas e à formação de coligações, comparamos os padrões do PSL, em termos de deputados estaduais e federais, em 2014 com os de 2018. Desta vez, procuramos demonstrar que as estratégias eleitorais de 2018 foram distintas das de 2014, pois procuravam transformar o fenómeno Bolsonaro num sucesso eleitoral também em outras áreas de disputa, e não apenas na presidência. É importante ressaltar que assumimos que as estratégias eleitorais das organizações são constrangidas pelos recursos que cada partido possui e evidenciadas pelo lançamento de candidaturas e pelas parcerias firmadas no período pré-eleitoral, embora o resultado das urnas não garanta o sucesso das estratégias.

Resultados e discussão

Documentos partidários

Em relação às coligações eleitorais, o estatuto do partido, aprovado em 2011 e válido até 2019, indica, no artigo 173.º, § 1.º, que “os Diretórios ou Comissões Provisórias Estaduais, quando se tratar de eleições estaduais, deverão, obrigatoriamente, informar ao Diretório Nacional sobre as coligações proporcionais e majoritárias efetuadas em seus respectivos Estados” (PSL, 2011, p. 37). Assim, haveria margem para o partido se coligar, nas unidades federativas, de acordo com as especificidades estaduais, sem passar necessariamente pelo crivo da Comissão Executiva Nacional. A não-coordenação do partido no que diz respeito às estratégias eleitorais nacional e estadual apontam para uma falta de sistematicidade de atuação, confirmando a sua baixa institucionalização.

No entanto, a resolução n.º 02/2018 da CEN do PSL, publicada em 28 de março e assinada pelo seu presidente, Gustavo Bebianno, indicava no artigo 1.º, § 2.º, que as coligações para as disputas das eleições maioritárias e proporcionais deveriam ser previamente autorizadas pela Comissão, por maioria simples. Caso contrário, a deliberação da convenção estadual poderia ser anulada pela CEN (PSL, 2018). Nesse sentido, a Comissão Executiva Nacional do partido passou a ter mais controlo sobre as decisões locais, participando ativamente no processo de definição das coligações eleitorais estaduais, e procurou tirar o máximo proveito do carisma situacional de Jair Bolsonaro. Assim, o partido centralizou as suas decisões com base no pleito de 2018, sem passar necessariamente por uma mudança estatutária. Esse processo foi facilitado pela abertura que a organização deu ao grupo de Bolsonaro, que, por sua vez, se apossou do partido nesse ano e criou condições propícias nos estados para coligações com perfis de interesse da CEN e coordenadas com as estratégias eleitorais mobilizadas na disputa nacional.

A comissão de coordenação dos atos de pré-campanha eleitoral do partido foi instituída também no dia 28 de março, por meio da resolução n.º 03/2018 CEN/PSL (PSL, 2018). Esta comissão passou a ser presidida por Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Jair Bolsonaro, Waldir Luiz Ferraz (PSL-RJ), Gustavo Bebianno (PSL-RJ) e Gulliem Charles Bezerra Lemos (PSL-PB). Todos os membros se tinham filiado ao partido naquele ano, segundo dados do TSE.

De acordo com a resolução, caberia ao partido “o planejamento, a coordenação e a execução dos encontros, seminários, congressos, reuniões e demais eventos de pré-campanha, a serem realizados por todo o Brasil, a fim de divulgar as propostas partidárias para as eleições de 2018” (PSL, 2018, p. 1). A entrega do controlo ocasionou até mesmo a mudança da sede do partido do Recife - reduto eleitoral de Bivar - para Brasília, visando priorizar a campanha presidencial (Goulart, 2018). E, além de os cargos na coordenação da campanha estarem concentrados em pessoas próximas a Bolsonaro, os assessores do então deputado federal passaram a controlar toda a comunicação partidária do PSL durante esse período (Benites, 2018). Isto sugere que a estrutura partidária do PSL, até então liderada por Luciano Bivar, se abriu para que um grupo estranho ao partido controlasse as suas estratégias eleitorais nesse ano, ambicionando o crescimento eleitoral e a ampliação de recursos da organização.

Filiação partidária

A filiação partidária tem sido um elemento importante para compreender a institucionalização dos partidos políticos. O PSL, enquanto partido pouco significativo, contou com oscilações na filiação ao longo do tempo, motivadas sobretudo por razões eleitorais. No entanto, houve um aumento relevante do número de filiados em 2018 - justamente quando o partido passou a contar com uma candidatura eleitoralmente viável para a presidência da República -, conforme demonstramos no Gráfico 1.

Os incrementos de novos filiados do PSL ocorreram de quatro em quatro anos, sempre nas vésperas das disputas municipais (1995, 1999, 2003, 2007, 2011 e 2015), o que indica o caráter eleitoral destas filiações. Nesse sentido, 2018 foge à regra do partido até então, tanto pelo período em que ocorrem as novas filiações quanto pela dimensão do crescimento.

Os dados de filiação ao PSL em 2018 encontram-se detalhados, mês a mês, no Gráfico 2. É possível observar que, apesar de o grupo bolsonarista ter passado a controlar a Comissão Executiva Nacional do partido logo em março desse ano, foi apenas em outubro - mês das eleições presidenciais - que a maior parte das filiações aconteceu. Portanto, as filiações ocorreram mais fortemente no contexto eleitoral, num momento de intensa mobilização em torno do nome de Bolsonaro.

Gráfico 1 Total de novos filiados ao PSL por ano (1994-2018). Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE. 

Gráfico 2 Total de novos filiados ao PSL por mês em 2018. Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE. 

As informações sobre a filiação aqui apresentadas estão em consonância com o que argumenta Speck (2013). Segundo o autor, a taxa de filiação aos partidos brasileiros é elevada, quando comparada com a de outros países. As motivações para a filiação, no entanto, não seriam explicadas apenas por envolvimento político, mas estariam relacionadas sobretudo com aspetos eleitorais. Assim, a filiação ocorre, em grande medida, nas vésperas das eleições, impulsionada por convenções partidárias nas quais as pessoas se filiam, tanto para se candidatarem como para apoiarem as candidaturas de outros (Speck, 2013).

Dito de outra forma, a entrada no partido não representa uma ligação estreita com a organização, mas sim uma atividade especificamente eleitoral. Nesta mesma direção, Speck, Braga e Costa (2015) interpretaram dados do Estudo Eleitoral Brasileiro (ESEB)3 da campanha de 2014. Os autores identificaram dois grandes conjuntos de motivações dos filiados: um, mais tradicional, impulsionado pela identificação partidária por proximidade e/ou afetividade; e outro com menor apelo ideológico e maior influência de aspetos profissionais, sobretudo em termos de atuação nas campanhas durante os ciclos eleitorais (Speck, Braga e Costa, 2015). Este segundo conjunto de motivações é o predominante no país, justificando a sazonalidade das filiações, que se concentram em períodos que antecedem as convenções partidárias (Speck, 2013).

Este perfil é, de facto, observável no Gráfico 1 - os picos de filiação ocorrem sempre nas vésperas das eleições municipais, indicando um caráter mais profissional e menos militante da filiação. No entanto, ao observarmos em simultâneo os gráficos 1 e 2, torna-se percetível que os dados de filiação do PSL em 2018 não acompanham este padrão, pois houve um incremento no ano eleitoral e especificamente no mês de outubro, o mês da eleição. Portanto, conclui-se que, em 2018, o PSL mudou o seu tipo de filiação, mobilizando também um perfil mais ideológico, o que confirma o forte apelo eleitoral que o fenómeno Bolsonaro suscitou.

Porém, somente uma mudança no perfil de filiação não seria o suficiente para que o PSL alcançasse o sucesso eleitoral nas disputas para deputado federal e estadual. Além disso, seria necessário que o partido atuasse de forma abrangente, marcando presença nos diferentes estados do país. Assim, outro aspeto a ser analisado é a presença de estruturas partidárias do PSL no território brasileiro, especialmente nos municípios.

Estruturas organizacionais partidárias

Toda a estrutura organizacional partidária está localizada em algum município. Quanto mais um partido possuir órgãos definitivos em diferentes municípios do país, maior tende a ser a autonomia partidária local e, consequentemente, menor a necessidade de centralização da tomada de decisões no interior do partido. De forma análoga, partidos com maior incidência de comissões provisórias nos municípios são classificados como menos institucionalizados, por apresentarem um baixo nível de sistematicidade (Panebianco, 2005) e possuírem um alto grau de centralização, ao serem organizados “do topo para baixo” (Guarnieri, 2011).

A fim de investigar o grau de estruturação partidária do PSL no âmbito municipal, comparamos a quantidade de órgãos definitivos (direções partidárias) que o partido possui com o número de comissões provisórias.4 Consideramos somente os órgãos partidários em funcionamento no período de julho a outubro de 2018, para nos focarmos no grau de estruturação municipal do PSL durante a campanha eleitoral. Não comparamos os dados de 2018 com os de outros anos, porque há inúmeras inconsistências na informação relativa a anos anteriores nas bases disponibilizadas pelo TSE. Em alternativa, comparamos os dados das estruturas organizacionais do PSL com os de dois grupos distintos: os principais partidos do Brasil, em termos eleitorais, até 2018 (MDB, PSDB e PT); e dois partidos menores de direita (DC e PATRI), cujos perfis são semelhantes ao do PSL no período pré-Bolsonaro. Além desses partidos, incluímos o DEM, o antigo PFL, que, embora se encontrasse em declínio eleitoral no período investigado, possui uma trajetória política de destaque no sistema partidário. Nesse sentido, a fusão entre o DEM e o PSL - dois partidos localizados à direita do espectro ideológico -, em 2022, pode ser entendida como um movimento de complementação. Enquanto o primeiro detém uma maior institucionalização em termos de estrutura organizativa, o segundo possui mais recursos eleitorais, como consequência do seu bom desempenho nas eleições gerais de 2018.

Estas estruturas estão distribuídas por partido e por estado na Tabela 1. Para a elaborar, calculámos a percentagem de municípios nos quais cada partido possuía um órgão provisório e um definitivo. Utilizámos a percentagem para padronizar a discrepância do número de municípios nos estados brasileiros, que varia de 15, em Roraima, até 853, em Minas Gerais.

Na Tabela 1, verificamos uma distribuição bastante limitada da estrutura organizacional partidária do PSL, quando comparada com os principais partidos do país. Considerando o sucesso eleitoral conquistado pelo partido em 2018, chama a atenção o facto de este contar com uma média de órgãos provisórios e definitivos por município, nos estados, de apenas 6,3% e 15,2%, respectivamente, mesmo estando presente em unidades federativas de todas as regiões do país. Contudo, em alguns estados - Alagoas, Sergipe, Tocantins e Amapá -, não havia sequer uma única cidade com o mínimo de estruturação.

Tabela 1 Estrutura organizacional partidária municipal (2018), por UF e região: PSL, DC, PATRI, DEM, PT, PSDB e MDB. 

Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE.

Ainda assim, mesmo com a baixa abrangência territorial, o PSL obteve um amplo sucesso eleitoral nas eleições proporcionais, conquistando a segunda maior bancada da Câmara de Deputados em 2018, apenas inferior à do PT. Parte desse bom desempenho é explicado por um deslocamento da preferência política do eleitor brasileiro rumo à direita do espectro ideológico (Fuks e Marques, 2020), o que se associa a uma queda no desempenho eleitoral dos partidos brasileiros mais tradicionais. Comparando o desempenho do PT, do PSDB e do MDB com partidos como o DEM, os Republicanos e o PSL, em 2014 e 2018, é possível observar essa dinâmica. Segundo dados do TSE, ao passo que os três primeiros alcançaram, respetivamente, 13,3%, 12,7% e 10,5% da Câmara dos Deputados, em 2014, os três últimos conquistaram 4,1%, 4,1% e 0,2% dos assentos. Por outro lado, em 2018, os valores do PT, do MDB e do PSDB caíram para 10,5%, 6,6% e 5,7%, respetivamente. Já os do DEM, dos Republicanos e do PSL subiram para 5,7%, 5,8% e 10,1%, equiparando-se às forças partidárias dominantes no sistema político brasileiro até então.

Apesar do sucesso eleitoral nas proporcionais, o perfil de estrutura organizacional exibido pelo PSL é semelhante aos padrões dos partidos DC e PATRI, contando com pouca presença nos estados e priorizando, inclusive, órgãos provisórios. Assim, os dados do PSL indicam um partido com pouca sistematicidade e baixa institucionalização. Tal perfil é o inverso do que se observa ao considerar as três principais forças eleitorais do Brasil até então. O MDB, o PSDB e o PT, além de estarem presentes em todos os estados do país, priorizam a instalação de órgãos definitivos, apresentando médias de 53,1%, 41,3% e 53,1%, respetivamente, seguidos do DEM, com 17,5%, em termos de municípios por estado.

Apesar da baixa institucionalização das estruturas organizacionais partidárias, o PSL mostrou-se mais efetivo no que diz respeito aos órgãos definitivos justamente em São Paulo, estado com o maior número de eleitores do país, onde esteve presente em 19% das cidades. Estruturou-se fortemente também no Rio de Janeiro, o segundo maior colégio eleitoral do Brasil, estando presente em quase metade dos municípios (49%), ainda que dando preferência a instalações provisórias. Ou seja, embora o partido não se tenha organizado em municípios localizados em estados de todas as regiões do país, o PSL procurou estruturar-se de maneira consistente nos dois maiores colégios eleitorais. Nesse sentido, a estratégia organizativa do partido priorizou essencialmente a disputa presidencial, optando por uma concentração em locais que alcançassem um número de eleitores mais elevado, em detrimento de uma maior dispersão territorial. Tal movimento era esperado, se considerarmos o escasso tempo que a nova coordenação partidária teve para atuar.

A estruturação organizativa focada na capacidade eleitoral dos municípios pode ser mais bem descrita se ponderarmos a importância dos municípios onde cada partido atua de forma mais incisiva. Para estabelecer a relevância de cada município, tivemos em atenção as Regiões de Influências das Cidades (REGIC/IBGE)5 e, para estabelecer a atuação incisiva do partido, considerámos a percentagem de órgãos definitivos, agrupada por tipo de município: metrópole, capital regional, centro sub-regional, centro de zona e centro local. No Gráfico 3, apresentamos estas informações, separadas por partido.

O padrão aqui apresentado reflete o que foi observado na Tabela 1, confirmando uma estratégia partidária hierárquica por parte do PSL, voltada sobretudo para a formação de comissões provisórias. Além disso, demonstra que em metrópoles e capitais regionais, o PSL atuou de forma mais incisiva, instalando uma percentagem superior de órgãos definitivos relativamente aos centros menores, ao contrário do DEM, que priorizou a instalação de órgãos definitivos em regiões menores, como os centros de zona e os centros locais. Portanto, ainda que a sua estrutura partidária definitiva seja bastante inferior quando comparada com as do MDB, do PSDB e do PT, se considerarmos apenas o PSL, verificamos que há, proporcionalmente, uma maior presença de órgãos definitivos nas regiões mais influentes do país, em comparação com as demais localidades.

Gráfico 3 Órgãos definitivos por partido (%), distribuídos por REGIC (2018). Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE/IBGE. 

Quanto às estruturas organizativas partidárias, o PSL optou prioritariamente por instalar órgãos provisórios nos municípios em 2018, o que destoa dos padrões adotados pelos maiores partidos do país e se assemelha aos adotados pelo DC e pelo PATRI, sobretudo o segundo. Em termos territoriais, o partido focou-se nos grandes colégios eleitorais do país, o que se refletiu tanto na atuação em municípios localizados em estados com grande quantidade de eleitores, como São Paulo e Rio de Janeiro, quanto na proporção de órgãos definitivos instalados nas regiões mais influentes do Brasil. Portanto, o partido procurou atingir o maior número de eleitores possível a curto prazo, priorizando os municípios que concentram eleitores e influência, em detrimento de uma distribuição territorial mais homogénea por todo o país.

Para as eleições presidenciais, esta decisão pode ser eficiente; porém, no caso das disputas proporcionais, é necessário marcar presença nos diferentes locais para ter possibilidades de sucesso eleitoral. No entanto, sabemos que esta disputa trouxe novos elementos às campanhas, como a propaganda eleitoral a partir das redes sociais e o contexto de baixa confiança dos eleitores em relação aos partidos, que danificou sobretudo a imagem dos partidos tradicionais.

De qualquer modo, é possível afirmar que o controlo exercido pelo grupo de Bolsonaro sobre o PSL se caracteriza por uma forte centralização, com decisões tomadas de cima para baixo, o que parece ser o mais adequado para um partido que, até então, possuía uma baixíssima institucionalização. Isto deve refletir-se também no controlo e na administração dos recursos financeiros partidários, principalmente os do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Distribuição de recursos financeiros para candidaturas do PSL

Desde 2015, as empresas privadas foram proibidas de realizar doações para as campanhas eleitorais no Brasil. Esta medida, provavelmente a mais impactante para o sistema eleitoral nas últimas décadas, foi tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 4650, que tornou inconstitucional o financiamento empresarial. Somado a isso, a Lei n.º 13.487 de 6 de outubro de 2017 criou o FEFC, uma nova fonte de recursos públicos que injetou 1,7 mil milhões de reais nas eleições de 2018. Como se decretou a proibição do financiamento por parte de empresas privadas e se criou um novo fundo público, administrado pelos partidos, as mudanças recentes nas regras institucionais consolidaram a posição central dos partidos políticos enquanto principais provedores de recursos eleitorais6 para os seus candidatos.

Em 2014, por exemplo, o financiamento partidário, composto pelo Fundo Partidário, por doações de pessoas físicas e, sobretudo, pelas contribuições empresariais, representava cerca de 50% das receitas dos candidatos. Deste montante, mais de 30% advinham de empresas privadas. A partir de 2018, sem o aporte empresarial, os partidos passaram a administrar diretamente a principal fonte de recursos eleitorais: o FEFC. Nesta última eleição geral, cerca de 65% do financiamento dos candidatos teve origem partidária, provindo principalmente do FEFC, além de uma pequena parcela proveniente do Fundo Partidário.

Tendo isto em conta, investigámos a distribuição dos recursos eleitorais feita pelo PSL para os cargos de deputado federal e deputado estadual, em 2014 e 2018.7 Esses dados representam o impacto do financiamento partidário sobre a receita dos candidatos. Argumentamos que esta é a maneira mais confiável para a observação das estratégias partidárias em termos de distribuição de recursos, pois utiliza justamente as informações de prestação de contas relativas às candidaturas. Como os recursos empresariais saíram de cena, o dinheiro partidário ocupou parte desse espaço, embora de maneira desigual entre os partidos (Dolandeli, 2020). O PSL é um exemplo desse padrão desigual de distribuição dos recursos, pelo menos até à eleição de 2018, por ter sido, até então, um partido menor.

Na Figura 1 analisamos em que medida a distribuição de recursos feita pelo PSL foi centralizada a nível nacional ou repartida pelos estados. Para tanto, comparamos, nos anos de 2014 e 2018, a percentagem de recursos que foram distribuídos pelo diretório nacional do partido e a percentagem de recursos repartidos pelos diretórios estaduais.

A partir da Figura 1, constatamos que, nas eleições para as assembleias legislativas, os candidatos do PSL receberam maior aporte dos diretórios estaduais, sendo que mais de 60% do dinheiro partidário foi repassado por órgãos subnacionais do partido. Por outro lado, de 2014 para 2018, houve um incremento significativo dos recursos oriundos do diretório nacional sobre o montante total destinado às candidaturas para deputado federal, com o partido praticamente a inverter, de uma eleição para a outra, o padrão observado nas candidaturas para a Câmara dos Deputados. Em 2014, os recursos dos órgãos subnacionais representavam 79% do dinheiro partidário investido nesta disputa; em 2018, a proporção caiu para apenas 25,8%. Estes dados indicam uma estratégia delineada do topo para baixo em relação à distribuição dos recursos em 2018, alinhando-se com o que tinha sido observado relativamente às estruturas organizacionais partidárias.

Figura 1 Financiamento eleitoral partidário (%) por tipo de diretório: candidatos a deputado estadual e deputado federal do PSL (2014 e 2018). Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE. 

É importante ressaltar que o deputado federal Luciano Bivar recebeu, sozinho, 1,8 milhões de reais do diretório nacional, em 2018. Este valor corresponde a 19,4% do total de 9,3 milhões de reais do FEFC destinados ao PSL nesta eleição. Além disso, cabe destacar que, mesmo que o PSL não tenha apresentado uma estratégia partidária financeira tão centralizada na instância nacional para os seus candidatos a deputados estaduais, as suas listas partidárias foram bastante competitivas também nestas disputas. Assim, é essencial compreender a distribuição dos recursos do PSL a partir dos estados, a fim de delinear de forma mais precisa a estratégia financeira eleitoral do partido. Isto é feito a partir dos dados da Tabela 2, na qual podemos observar em quantos candidatos para deputado federal e estadual o diretório partidário investiu por cada estado.

Na Tabela 2, comparamos as eleições de 2014 com as de 2018 e contamos o número de candidatos a deputado estadual e federal, respetivamente, que o diretório nacional do PSL financiou de forma direta. Nas colunas à esquerda, para cada eleição, encontra-se o total de candidaturas e de eleitos do partido por unidade federativa. Paralelamente, nas colunas da direita, a tabela informa sobre o total de candidatos e de eleitos que foram financiados diretamente pelo diretório nacional do PSL em cada estado.

Considerando as disputas estaduais, identificamos que, em 2014, a direção nacional financiou 16 candidatos, mas 13 apenas num único estado, Pernambuco, justamente a unidade federativa do então presidente do partido, Luciano Bivar. Destes candidatos financiados pela elite partidária, apenas um foi eleito para a assembleia estadual de Pernambuco, e um total de 16 candidatos foi eleito pelo PSL em todo o país. Na campanha seguinte, o diretório nacional investiu em 105 candidaturas, alcançando 12 estados. Este salto representou uma maior presença do centro político partidário nos estados, embora o total ainda seja muito inferior aos níveis alcançados por outros partidos. Em 2018, o PSL elegeu 75 deputados estaduais, mas apenas seis receberam dinheiro do diretório nacional.

Nas eleições para deputado federal, a dinâmica foi similar, com a direção nacional a aumentar a sua influência nos estados em 2018. Na primeira campanha analisada, o PSL financiou oito candidatos através do seu órgão nacional, e nenhum deles foi eleito. Contudo, na disputa posterior, a direção nacional financiou 61 candidatos. Deste total, 52 deputados federais foram eleitos, dos quais dez receberam repasses diretos da organização central do partido. Além disso, assim como o PSL priorizou o financiamento de candidaturas pernambucanas em 2014, no ano de 2018, o partido, sob controlo do grupo de Jair Bolsonaro, direcionou os seus recursos maioritariamente para candidatos do Rio de Janeiro, a sua base política e eleitoral quando era deputado federal. A concentração não foi tão intensa como ocorrera em 2014 em relação a Pernambuco, porém o Rio de Janeiro contou com o maior número de candidatos financiados de entre todos os estados, inclusive em comparação com São Paulo, que detém o maior colégio eleitoral do país.

Candidaturas e coligações do PSL

O último ponto que analisámos, em termos de organização partidária e estratégia eleitoral em 2018, foi o lançamento de candidaturas e o perfil de coligações firmadas pelo PSL para deputado federal e estadual. Comparámos as informações desta eleição com as da anterior, disputada em 2014. Em todos estes casos, comparámos as tendências de distribuição territorial das candidaturas e o grau de protagonismo nas coligações firmadas, bem como a frequência das parcerias que o PSL estabeleceu com os demais partidos em cada pleito.

Tabela 2 Candidatos a deputado estadual e federal do PSL por UF e financiamento partidário do diretório nacional (2014 e 2018). 

Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE.

Inicialmente, analisámos os padrões de distribuição territorial, por estado e região, das candidaturas dos pleitos proporcionais de lista aberta. Separámos os lançamentos de candidatos pelas seguintes categorias: candidatura apoiada, quando o candidato do PSL foi apoiado por uma coligação; isolada, quando o candidato do PSL participou no pleito sem coligação; e apoiadora, quando o PSL apoiou, via coligação, uma candidatura de outro partido.

Portanto, num mesmo estado, quando o PSL participou numa coligação, o partido pode apresentar tanto candidaturas apoiadas quanto apoiadoras. Por outro lado, nos estados onde atuou de forma isolada, somente este tipo de candidatura foi possível. As informações que se seguem, na Tabela 3, apresentam as taxas do tipo de candidatura por número de cadeiras disponíveis em cada estado (magnitude eleitoral).

A partir da Tabela 3, observa-se que, em 2014, o PSL participou em candidaturas em todos os estados, com exceção de Goiás, no pleito nacional, e Amapá, nos âmbitos estadual e nacional. Contudo, na maioria das vezes, o partido participou nas candidaturas apenas como apoiador, ou seja, dando suporte a um candidato de outro partido. Nesse sentido, considerando todas as candidaturas em eleições proporcionais em que o PSL esteve envolvido em 2014, observa-se que o partido foi predominantemente apoiador nas disputas estaduais e federais, nas quais o perfil foi ainda mais pronunciado. Isto, por um lado, indica uma boa dispersão territorial do partido, por estar presente em todas as regiões do país e em quase todos os estados. Por outro, demonstra que tem um papel eleitoral essencialmente de coadjuvante, por se prestar, na maioria das vezes, a apoiar candidaturas alheias. Este último fator é corroborado pela ausência de candidatura própria, em 2014, em dois estados no âmbito estadual (Amapá e Alagoas) e em seis unidades federativas no âmbito federal (Amapá, Roraima, Alagoas, Piauí, Goiás e Santa Catarina).

Outro fator que chama a atenção no pleito de 2014 é que, nos estados onde ofereceu uma maior taxa de candidaturas de deputados estaduais por vaga, o PSL tendeu a agir de forma isolada. Isto ocorreu no Maranhão, no Rio de Janeiro e no Paraná. Houve apenas um estado em que o partido ofereceu, proporcionalmente à magnitude, mais candidatos a deputados federais do que nestes - justamente em Goiás, onde não ofereceu nenhum postulante a deputado estadual. Por fim, cabe destacar a importância do Rio de Janeiro para o PSL, pois neste estado o partido atuou de forma mais assídua em termos de candidatura própria, tanto no cenário estadual como no federal.

Tabela 3 Deputados estaduais/distritais e federais - perfis de candidaturas do PSL, por vaga, em 2014 e 2018. 

Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE.

O padrão de lançamento de candidaturas para as eleições proporcionais de 2018 é distinto do que descrevemos anteriormente. Primeiro, porque o PSL esteve presente em todos as unidades federativas, fosse com candidaturas a deputado estadual ou a deputado federal. Além disso, o partido atuou não só ao apoiar candidaturas alheias, mas também ao apresentar candidaturas próprias em todos os estados. Isto reflete-se no protagonismo que o PSL assumiu em 2018, em comparação a 2014. O quadro inverteu-se, e 64,3% das candidaturas nas quais participou para deputado estadual foram próprias (26,3% apoiadas + 38% isoladas). O mesmo ocorreu em 63,6% das candidaturas a deputado federal (29,3% apoiadas + 34,3% isoladas). Destaca-se ainda a atuação contundente nos maiores colégios eleitorais do país localizados na região sudeste (Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo), em que o partido apresentou as maiores taxas de candidaturas para as duas disputas e sempre concorrendo de forma isolada.

A comparação entre 2014 e 2018 mostra como, no último pleito, o PSL atuou de forma mais dispersa em termos territoriais, participando em candidaturas em todos os estados e colocando-se numa posição de maior protagonismo; apresentou candidatos próprios em todas as unidades federativas e conformou a maioria das candidaturas nas quais participou. Assim, torna-se patente que as candidaturas do PSL para deputado federal e estadual ganharam outra dimensão em 2018, aproveitando o embalo da candidatura de Bolsonaro a presidente.

Esse fortalecimento refletiu-se também no padrão de coligação que o PSL passou a estabelecer em 2018, comparando com 2014. Conforme indicam os dados da Tabela 4, o partido tornou-se um competidor com maior poder de negociação, ajustando as suas alianças de forma a fazer prevalecer as suas preferências, situação menos possível quando atuava como coadjuvante. A partir desses dados, apresentamos em sequência os parceiros de coligação do PSL em 2014 e 2018. Nos gráficos abaixo, consta o número de estados onde o PSL esteve coligado a cada partido nas disputas analisadas anteriormente. No caso em que o partido indicado é o próprio PSL, trata-se do total de unidades federativas nas quais atuou sozinho, isto é, sem parceiro de coligação. Os dados estão ordenados de forma decrescente, dos partidos com os quais o PSL mais se coligou para aqueles com que menos firmou acordos, no ano de 2018.

A primeira informação que é evidente na Tabela 4 é a decisão do PSL de concorrer sozinho na maior parte das vezes em 2018. Isto ocorreu em nove estados nas disputas para deputado estadual e em sete para deputado federal; em 2014, este número era de quatro e dois, respetivamente. Outra estratégia marcante em 2018 diz respeito ao estabelecimento de alianças mais padronizadas, em relação às que tinham sido firmadas em 2014. Nesse sentido, destaca-se que, na última eleição, o PSL não se alinhou com partidos localizados mais à esquerda do espectro ideológico, nas disputas proporcionais de âmbito estadual e federal. Mais do que isso, nestas áreas, o PSL não se coligou praticamente com nenhum dos partidos presidenciáveis, incluindo o PT, o PSDB, o MDB e o NOVO. Importa destacar que, para estas eleições, houve um elevado número de parcerias celebradas com partidos de direita, com destaque para o Partido Humanista da Solidariedade (PHS), o Patriota, o DC e o Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB).

Tabela 4 Total de estados onde cada partido se coligou com o PSL em 2014 e 2018 - deputados estaduais/distritais e federais. 

Fonte: Elaboração dos autores a partir de dados do TSE.

Em contrapartida, é difícil identificar padrões mais regulares a partir dos dados de 2014. Como se pode observar, o PSL coligou-se em proporção semelhante com vários partidos - incluindo importantes partidos da esquerda, como o PT e o PCdoB - nas disputas para deputado estadual e federal. Ainda em relação a 2014, chama a atenção a falta de parceria com o MDB. Por fim, destacamos como as barras referentes a 2014 são, de modo geral, maiores do que as barras referentes a 2018, com exceção da própria barra do PSL (candidaturas isoladas). Isto confirma o aumento do protagonismo do partido nas disputas proporcionais, demonstrando que o PSL tentou aproveitar o fenómeno Bolsonaro para se expandir nos diferentes níveis de competição eleitoral.

Considerações finais

O controlo exercido pelo grupo de Bolsonaro sobre o PSL, inclusive através da alteração de estatuto, refletiu-se em termos organizacionais, na distribuição dos recursos e no padrão das candidaturas e coligações. As estruturas organizacionais internas do partido em 2018 foram maioritariamente provisórias, apresentando um perfil centralizado; a distribuição de recursos foi concentrada na executiva nacional, sobretudo na disputa para deputado federal; o partido lançou várias candidaturas isoladas nos estados, coligou-se com menos parceiros e não se aliou a presidenciáveis nem a partidos de esquerda. Ou seja, houve uma concentração de poder no órgão nacional, e isso refletiu-se em estratégias homogéneas de candidatura em todo o país.

Os resultados destacam que o PSL tinha uma baixa institucionalização, com pouca presença de Diretórios Municipais e Comissões Provisórias, além de uma menor presença de quadros eleitorais competitivos, até à entrada de Jair Bolsonaro. O facto de mais de 50% dos deputados federais eleitos (precisamente 55,8% dos 52) não terem exercido cargos eletivos anteriores contribui para ilustrar isso. Somente seis já eram deputados federais, a maior parte dos políticos de carreira eram vereadores (13), e os demais eram prefeitos (três) e um deputado estadual. Assim, o partido foi promovido pela liderança carismática situacional de Bolsonaro, que levou o PSL a tornar-se uma sigla relevante a nível nacional. Isso demonstra uma estratégia partidária extraparlamentar, bem diferente na média dos partidos brasileiros.

Este recomeço do PSL em 2018 configurou praticamente um novo partido, que se formou com um forte apelo extraparlamentar - apesar de o clã Bolsonaro ser um grupo profissional histórico - e com uma ampla penetração territorial, nos termos de Panebianco (2005), isto é, em que um centro político controla e organiza o processo de expansão do partido. Por outro lado, os dados também apontam para uma mudança no controlo do centro sobre o lançamento das candidaturas nos estados, que aumentou, o que indica a existência de um nível organizado de coordenação. Isso ocorre porque o PSL optou por não se aliar a nenhum dos dois polos estruturantes da competição partidária até então (PT-PSDB), mas sim estabelecer estruturas independentes em todos os estados, o que se diferencia do seu padrão de aliança observado em 2014.

Em 2018, houve o maior pico de filiações ao partido, sobretudo no período imediatamente anterior às eleições, indicando o efeito da liderança carismática situacional sobre a organização. Com mais filiados, espalhados por todo o território nacional, maior seria a possibilidade de o partido aumentar a sua institucionalização. Porém, como isso sucedeu com uma forte dependência em relação ao carisma situacional de Bolsonaro, que saiu do partido, o desafio de institucionalização aumentou. Não foi por acaso que o PSL se fundiu com o DEM, procurando outras formas de administrar os recursos que conquistou a partir do FEFC, com vista a potencializar a sua presença territorial em termos de estrutura organizacional e a ocupação de cargos eletivos nos âmbitos federal, estadual e municipal.

A baixa institucionalização do PSL constituiu um obstáculo para que Jair Bolsonaro e seu clã assumissem o controlo definitivo do partido após as eleições. Ao retomar o comando do partido, em 2019, um movimento acordado entre ambas as partes, Luciano Bivar não deu oportunidades a Bolsonaro, mesmo com as tensões internas e a fração parlamentar que isso causou, especialmente na Câmara dos Deputados. Isso evidencia a necessidade de aprofundar a agenda de estudos acerca das organizações partidárias no Brasil, uma vez que os incentivos seletivos dentro dos partidos, neste caso, do PSL, conseguiram sobrepor-se à força política de Bolsonaro, já na presidência da República.

O facto de Bolsonaro se ter vinculado a um partido de baixa institucionalização, com poucos entraves à entrada de uma liderança carismática situacional, foi positivo para ele, enquanto candidato, e para o partido. Do lado de Bolsonaro, o seu grupo político controlou a organização, apostando em candidaturas com menos alianças e atuando de forma incisiva em grandes colégios eleitorais. Do lado do partido, o PSL, até então um partido “nanico”, aproveitou-se do efeito coattail gerado pelo fenómeno Bolsonaro sobre as candidaturas para cargos proporcionais, o que resultou no sucesso eleitoral que obteve, para além da disputa presidencial, e, consequentemente, na obtenção de mais recursos junto do Estado, para serem utilizados em pleitos posteriores.

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Notas

1A janela partidária é o prazo estabelecido pela Justiça Eleitoral brasileira para que o parlamentar mude de partido, sem risco de perda de mandato em anos eleitorais. Para mais informações: https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Maio/entenda-o-que-e-janela-partidaria [consultado em 26-08-2023].

2O DEM fundiu-se com o PSL em fevereiro de 2022, originando o União Brasil.

3O ESEB é uma pesquisa pós-eleitoral de abrangência nacional, feita através de inquérito, coordenada pelo Centro de Estudos de Opinião Pública (CESOP).

4Não incluímos as “comissões interventoras” por representarem uma quantidade apenas residual, não chegando a 0,5% dos casos.

5Optámos pelo REGIC por duas razões: primeiro, porque as regiões mais influentes do país são aquelas que comportam os maiores colégios eleitorais. Segundo, porque, ao incluir a influência da região, consideramos o quanto a atuação partidária naquele local pode ter impacto nas cidades vizinhas.

6Até à campanha de 2014, uma fatia considerável do dinheiro na política já era administrada pelos partidos. As empresas, sobretudo as maiores, davam um elevado suporte financeiro aos órgãos partidários, que, por sua vez, repassavam os recursos às candidaturas - dinâmica apelidada de “doações ocultas” pela opinião pública e pelos meios de comunicação em geral. Por meios indiretos, o dinheiro privado empresarial era a principal fonte de recursos dos candidatos, mas os partidos controlavam o seu acesso, mantendo, assim, uma posição estratégica nessa divisão de tarefas.

7As eleições de 2018 movimentaram aproximadamente 3,3 mil milhões de reais, cifra abaixo dos 4,4 mil milhões gastos na campanha de 2014. A queda já era esperada, em razão da ausência, pelo menos oficialmente, das contribuições de companhias privadas.

Recebido: 27 de Julho de 2021; Aceito: 12 de Maio de 2023

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