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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.249 Lisboa dez. 2023  Epub 31-Dez-2023

https://doi.org/10.31447/as00032573.2023249.07 

Artigo

A memória da nação na era planetária. Passados e futuros em debate

Memory of the nation in the planetary era. Debating pasts and futures

1.Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Minho » Campus de Gualtar - 4710-057 Braga, Portugal. cabecinhas@ics.uminho.pt


Resumo

Nos últimos anos, diversas formas de ativismo têm contribuindo para desocultar histórias durante muito tempo silenciadas e recordar algumas histórias de luta quase esquecidas, dando visibilidade a outras memórias da “nação”. Neste texto, após uma breve revisitação de estudos sobre representações sociais da história, refletimos sobre alguns desafios a partir de resultados de um programa de investigação interdisciplinar em curso sobre ativismos decoloniais na esfera pública portuguesa. Os ativismos mnemónicos interpelam-nos a pensar nas histórias que estruturam a memória pública, os seus usos e abusos, assim como as suas interligações com as relações de poder, dentro e fora da nação, num contexto em que os desafios que se colocam nas nossas vidas extravasam claramente as fronteiras nacionais.

Palavras-chave: memória social; representações sociais da história; ativismos decoloniais; ativismo mnemónico; movimentos sociais; identidades sociais

Abstract

In recent years, various forms of activism have contributed to unveiling long-silenced histories and remembering some almost forgotten stories of struggle, giving visibility to other memories of the “nation”. In this text, after briefly revisiting various studies on social representations of history, we reflect on some challenges based on findings from an ongoing interdisciplinary research program on decolonial activisms in the Portuguese public sphere. Mnemonic activisms challenge us to think about the histories that structure public memory, its uses and abuses, as well as its interconnections with power relations, both inside and outside the nation, in a context where the challenges facing our lives clearly go beyond national borders.

Keywords: social memory; social representations of history; mnemonic activism; decolonial activism; social movements; social identities

A memória da nação na era planetária. Passados e futuros em debate

Chamava-se Catarina/ O Alentejo a viu nascer/ Serranas viram-na em vida/ Baleizão a viu morrer/ Ceifeiras na manhã fria/ Flores na campa lhe vão pôr […] Ó Alentejo queimado/ Ninguém se lembra de ti/ Aquela andorinha negra/ Bate as asas p’ra voar/ Ó Alentejo esquecido/ Inda um dia hás-de cantar. José Afonso, Cantar Alentejano (1971)

O maior processo de desumanização dá-se quando nos dizem que nós não temos história, que nós não somos história, e não nos permitem o acesso à história.

Maria Gil (2023)

Respigar memórias

Num tempo acelerado da comunicação instantânea, alegadamente sem fronteiras, proporcionada pelos meios de comunicação digitais, as “guerras de memória” ganharam espaço na agenda mediática, cada vez mais dominada por uma “economia da atenção” em que se privilegia a “efervescência do momento” em detrimento do debate dos argumentos e da sua contextualização histórica.

As profundas desigualdades entre e dentro das nações tornam evidente a necessidade de ultrapassar o “nacionalismo metodológico” que tem caracterizado muitos dos estudos comparativos sobre cultura e sobre memória histórica. A circulação assimétrica de histórias e de memórias, bem como as dificuldades inerentes à tradução linguística e cultural, constituem desafios significativos quando nos focamos na “memória da nação” e nas suas articulações com as “memórias hegemónicas” de um mundo dito globalizado (Liu, 2022), as “memórias subterrâneas” (Pollak, 1989) de grupos ditos “minoritários”, “periféricos” ou “subalternos”, e as “memórias itinerantes” (Erll, 2011) que resultam de trajetórias de migração e interação entre grupos, dentro e fora da “nação”.

Como têm salientado diversos autores, Portugal tem sido imaginado como sendo um país de “brandos costumes”, que deu “novos mundos ao mundo”, pioneiro na interculturalidade, especialmente apto para se relacionar com outros povos e imune ao racismo e a outras formas de discriminação, mas a realidade vivida pelas pessoas que no seu quotidiano são tratadas como “outras”, devido à cor de pele, ao género, à classe social e outros marcadores sociais, contrasta claramente com tais mitos (e. g. Mata e Évora, 2021).

Se durante as primeiras décadas da ditadura salazarista se promoveu o “pânico das nódoas pigmentares” e se projetou uma metrópole alegadamente homogénea biológica e culturalmente (e. g. Cabecinhas e Cunha, 2003), face à nova realidade geopolítica e normativa internacional que emergiu após a Segunda Guerra Mundial, cuja transformação teve como momento simbólico mais pungente a Conferência de Bandung (1955), a propaganda do regime português mobilizou seletivamente algumas dimensões do lusotropicalismo de Gilberto Freyre. Isto aconteceu para celebrar a alegada singularidade do colonialismo português e a inexistência de discriminação racial na grande nação, una “do Minho a Timor”, expressão que se banalizou após a revisão constitucional de 1951 que transforma as “colónias” em “províncias ultramarinas” (Castelo, 1999). Após o eclodir das guerras de libertação na “África portuguesa”, Salazar continuava a insistir que a “maneira de ser portuguesa” e os princípios que “presidiram aos descobrimentos e à colonização fizeram que em todo o território nacional seja desconhecida qualquer forma de discriminação e se hajam constituído sociedades plurirraciais, impregnadas do espírito de convivência amigável, e só por isso pacíficas” (1961). Por seu turno, Franco Nogueira (1967, p. 197), então ministro dos Negócios Estrangeiros, afirmava: “fomos nós, e nós sós, que trouxemos à África antes de ninguém a noção de direitos humanos e de igualdade racial; e somos nós, e só nós, que praticamos o multiculturalismo, havido por todos como a expressão mais perfeita e mais ousada da fraternidade humana e progresso sociológico” (ver Henriques, 2020; Jerónimo e Monteiro, 2020). Tais discursos, destinados tanto a consumo externo quanto interno, fizeram parte de uma poderosa propaganda que ainda hoje tem ecos, como veremos mais adiante.

A Revolução dos Cravos em 1974, o fim da ditadura e a independência das antigas colónias, traduziram-se em mudanças profundas na sociedade portuguesa e na sua política externa. Numa época, a presente, em que se iniciaram as comemorações dos “50 anos de liberdade” e se faz o balanço dos “três D” da Revolução - descolonizar, democratizar e desenvolver -, quais as perceções dos jovens sobre a história da nação e os desafios para o futuro? Esta é uma das questões de pesquisa que orientam um programa de investigação interdisciplinar em curso sobre ativismos decoloniais na esfera pública portuguesa e para os quais muito têm contribuído pessoas que são frequentemente tratadas como “outras” na sociedade portuguesa.

Nos últimos anos, movimentos sociais como #BlackLivesMatter, #MeToo, #NiUnaMais, #wearethe99percent, #FridaysForFuture, entre outros, têm fomentado uma reflexão crítica sobre as profundas desigualdades e sobre as formas de discriminação que continuam a moldar o quotidiano das sociedades ocidentais, mas também a uma escala global, e a condicionar a construção de futuros alternativos. Tais movimentos internacionais contribuíram para dar uma visibilidade mediática sem precedentes a algumas lutas antigas em território nacional que, contudo, raramente tinham a devida atenção na agenda mediática. Diversas formas de ativismo, na internet, na rua, etc., têm contribuído para desocultar histórias durante muito tempo silenciadas e recordar algumas quase esquecidas histórias de luta (e. g. Roldão, Pereira e Varela, 2023; Sousa, Khan e Pereira, 2022), dando visibilidade a outras memórias do mundo e da nação, na sua diversidade e complexidade, tornando evidente a necessidade de uma abordagem situada e interseccional (e. g. Haraway, 1988).

Nas secções seguintes, depois de uma brevíssima contextualização, iremos revisitar alguns trabalhos sobre a memória histórica, tendo como pano de fundo a investigação realizada no quadro da psicologia social e dos estudos culturais, em diálogo com outras áreas de conhecimento.

Memória histórica, corpo e cultura

No espaço público é frequente as palavras “memória” e “esquecimento” serem usadas como antónimos, tomando a palavra “memória” como sinónimo de “recordação” ou “lembrança” e a palavra “esquecimento” como sinónimo de “amnésia” ou “desmemória”. No nosso entendimento, a memória diz respeito a um processo em que lembrança e esquecimento estão intimamente ligados. Quando falamos da esfera pública, o “esquecimento” não é aleatório nem inócuo, pois resulta de processos de seleção e filtragem, deliberados ou não, que reduzem substancialmente o espectro das recordações possíveis num dado contexto histórico.

Como salientámos em trabalhos anteriores, a memória social é dinâmica, complexa e multifacetada - simultaneamente material e imaterial, viva e virtual, intencional e involuntária, consciente e inconsciente, visível e invisível. É visível nas suas manifestações - sejam a lembrança ou o esquecimento -, e invisível nas suas estruturas (estruturas de poder, macroeconomia, algoritmos de inteligência artificial e outros).

A memória histórica é simultaneamente causa e efeito das dinâmicas sociais, moldando e sendo moldada pelas desigualdades materiais e simbólicas. Assim, não é possível compreender as dinâmicas da memória histórica no quadro dos usuais dualismos que têm caracterizado os estudos da memória humana, alguns dos quais têm também caracterizado outras áreas de conhecimento: cultura/natureza, razão/emoção, produção/consumo, homem/mulher, humano/máquina, etc.

Por exemplo, Jan Assmann (2008) estabeleceu a distinção entre a “memória comunicativa”, que vive da interação social quotidiana, e a “memória cultural”, institucionalizada e preservada através de um conjunto de símbolos estáveis. Enquanto a memória comunicativa seria limitada no tempo (cerca de 80 anos, o tempo de três gerações), a memória cultural teria uma duração potencialmente ilimitada. Nesta aceção, a primeira corresponde a uma “memória viva” sobre o passado recente, partilhada através da comunicação interpessoal quotidiana. Algumas memórias sobrevivem para lá deste horizonte temporal enquanto “memória cultural”, sendo o passado convertido em símbolos, representado em “mitos de origem” - transmitidos em comemorações, em museus, e nos meios de comunicação social, entre outos. A estrutura de participação da memória cultural é tendencialmente elitista, exigindo o domínio de registos linguísticos e de “conhecimento diferenciado” (Assmann, 2008).

Como salientam diversos autores, a distinção entre “memória comunicativa” e “memória cultural” não deve ser considerada em termos dualistas, já que comunicação é interação e sem interação não há recordação. Salientando a estreita ligação entre memória e emoção, Mariana Hirsch cunhou o conceito de “pós-memória” para se referir à relação das pessoas com experiências que não viveram, mas que foram transmitidas em ambiente familiar com elevada intensidade emocional, “de modo tão profundo que parecem constituir memórias em si mesmas” (2008, p. 103). Como salientam Margarida Calafate Ribeiro e Fátima Rodrigues (2022, p. 21), auscultar essas pós-memórias pode permitir desvelar “uma outra história, oculta, silenciosa ou silenciada, ou até ativamente rasurada, por trauma, pudor, vergonha, ressentimento, mas que os/nos explica hoje”.

A distinção entre “memória” e “pós-memória” parece partir do pressuposto de que a “memória” diz respeito apenas aos acontecimentos vividos diretamente, sendo necessário colocar o “pós” para distinguir entre memórias vividas “em primeira mão” e memórias “herdadas” por uma segunda ou terceira geração. No entanto, é importante salientar que a memória está em permanente (re)construção através da comunicação quotidiana, de modo que a “pós-memória” é de facto “memória”, sem o prefixo. Como salienta António Sousa Ribeiro (2022), o uso do conceito de “pós-memória” pode suscitar equívocos, nomeadamente os que decorrem de se considerar “geração como um simples dado biológico” (p. 15). Ora, como salienta o autor, são “as práticas de relacionamento com o passado que singularizam o assumir de uma identidade geracional” pelo que “a pós-memória não é uma fatalidade geracional, mas uma escolha e uma construção” (p. 16), não podendo ser desligada dos processos de luta por uma esfera pública mais plural (e. g. Khan, 2023).

Tais aspetos são da máxima relevância quando hoje se fala, por exemplo, da “pós-memória do 25 de Abril” e da “pós-memória da descolonização”, fazendo referência a “gerações” como se fossem definidas simplesmente como grupos etários, sendo frequentemente denominadas a partir de designações importadas de outros contextos - nomeadamente o norte-americano (baby boomers, geração Y, geração Z, etc.). Por exemplo, num programa de televisão recente (RTP, 2022b), na sinopse refere-se “Têm os Z’s o direito de questionar os heróis nacionais, querer mudar a forma como se ensinam os Descobrimentos, por exemplo, e acabar com a glorificação de tipos problemáticos?”, assumindo que os “Z’s”, definidos pela idade, são “transformadores”.

Na esfera pública é comum falar-se em “polarização”, “vitimização competitiva”, “visões incompatíveis” sobre o passado e “lutas antagónicas” para o futuro. Como alguns autores têm salientado, o trabalho de memória em comunidade - nomeadamente os “ativismos mnemónicos” - constitui uma forma de tentar desmontar dualismos e polarizações excessivas, o que passaria por fomentar uma memória pública “multidirecional”, articulando as diferentes memórias a partir de uma lógica “não competitiva” (Rothberg, 2009). No entanto, é importante não esquecer que as dinâmicas entre lembrança e esquecimento são fruto de uma relação dialética com a ordem social e política vigente, que se materializa em desigualdades sociais e assimetrias simbólicas (Amâncio, 2017; Pereira, Macedo e Cabecinhas, 2019). Por vezes, memórias longamente silenciadas ou emudecidas, também designadas por “memórias subterrâneas”, depois de um período de aparente adormecimento, despertam como “irrupções de memória” (Ribeiro e Ribeiro, 2016), sobretudo em momentos de “crise”. Tais “irrupções de memória” podem vir a alcançar visibilidade na esfera pública como “contra-memórias” ou continuar a laborar de forma latente, através da comunicação quotidiana em grupos restritos, até que determinado assunto seja percebido como possível de “debatibilidade” ( Appadurai, 1981). Isto configura aquilo que podemos designar como memória “luzecu” (pirilampo ou caga-lume, se preferirem), podendo correr riscos de extinção devido à luminosidade excessiva de outras memórias durante demasiado tempo. Desocultar histórias longamente silenciadas em contexto nacional e interrogar os “regimes de memória” em que vivemos afigura-se como uma tarefa desafiante. De modo a contextualizar a discussão de alguns desses desafios, iremos revisitar brevemente alguns estudos internacionais sobre memória histórica realizados nas últimas décadas e convocar estudos recentes sobre memória histórica em contexto nacional.

A história em discussão. Os jovens e a memória da nação

Victor de Sá (1975) no livro A História em Discussão apelava a uma mudança profunda no modo de ensino, que deveria deixar de ser baseado na memorização e reprodução de mitos, mas estimular os estudantes a refletir criticamente e a produzir novo conhecimento histórico, de modo a superar os mitos enraizados: “Durante as últimas décadas, todos os portugueses foram intoxicados desde a instrução primária, pelo menos, com a deformação alienatória da ‘grandeza’ colonial ou imperial. Portugal não é um país pequeno - era a legenda demagógica afixada nas paredes de todos os estabelecimentos de ensino (p. 12)”.

Se a denúncia do ensino enquanto “intoxicação” mental alerta para os conteúdos e o tipo de ensino dominante nas décadas anteriores ao 25 de Abril de 1974, não podemos deixar de referir, no entanto, que a expressão “todos os portugueses foram intoxicados desde a instrução primária” (destaque nosso) traduz um esquecimento das classes mais desfavorecidas, num país no qual, na época, uma parte significativa da população não teve o direito de ir à escola, sendo forçada a trabalhar desde a tenra infância. Se esta expressão é errónea no contexto da chamada “metrópole”, já que segundo as estatísticas de 1970, cerca de um terço das mulheres com mais de 10 anos nunca tinha frequentado a escola, uma vez que as escassas economias familiares (quando as havia) eram canalizadas para a educação dos filhos varões, é-o ainda mais se considerarmos as estatísticas relativas às antigas “províncias ultramarinas”, então alegadamente consideradas como parte “indivisível da nação multicontinental”, onde a percentagem de pessoas que tinha oportunidade de ir à escola era muito diminuta.

Ao folhear os manuais escolares da época, não podemos deixar de concordar com a ideia de que os conteúdos projetam a “grandeza colonial ou imperial” da nação, contribuindo para aquilo que alguns autores denominam de “intoxicação mental” ou “alienação” (e. g. Fanon, 2021). Não cabe aqui discutir o que diferentes pessoas de facto aprendiam na escola da ditadura, mas a releitura do livro de Victor de Sá (1975) parece-nos particularmente interessante no momento em que se iniciaram as comemorações dos “50 anos de liberdade”. Para aquele, a descolonização “não põe fim apenas à guerra vergonhosa que travámos durante treze anos”, mas, também, “a um ciclo de cinco séculos da história de Portugal […]. Trata-se, portanto, de reconverter o país às raízes da sua nacionalidade genuína” (p. 17). Sá considera que “[a] libertação nacional trouxe consigo uma libertação mental que desbloqueia o pensamento português dos espartilhos e tabus que os tolheram durante meio século” (1975, p. 23). Não cabe aqui discutir o que seriam as “raízes da nacionalidade genuína” (para uma análise crítica, ver Sobral, 2003), mas a partir dos dados empíricos recolhidos junto de jovens, nomeadamente através de questionários e de discussões em grupo, iremos debater a questão da “descolonização” do conhecimento e como poderá contribuir para a “libertação mental”.

O livro A Memória da Nação (1991, resultante de colóquio ocorrido em 1987), oferece algumas reflexões pertinentes. Francisco Bethencourt e Diogo Ramada Curto, organizadores da obra, salientam que “[a] memória da nação está presente um pouco por todo o lado, pontuando de sinais o quotidiano das gentes, enformando a sua maneira de viver e de sentir, balizando o presente e o futuro enquanto forma de representação de uma identidade construída ao longo de oito séculos de forma descontínua”. (p. 7). Referem ainda que a memória está “materializada nos monumentos”, “no traçado urbano, nomeadamente através da toponímia”, “está inserida na paisagem”, na configuração urbana, rural e florestal. Acrescentam que “está incorporada na percepção do passado recente e do passado distante, representando um importante papel na forma como a comunidade histórica se concebe e se posiciona face aos outros. É revelada pelas obras literárias, que fixam momentos de sensibilidade social e exprimem formas de tomada de consciência (p. 7).”

Os autores alertam que a “integração internacional do País coloca novos problemas de representação da comunidade histórica e de afirmação da sua identidade” (p. 10), nomeadamente que “a reorientação dos fluxos emigratórios para a Europa, ocorrida nos anos 60, seguida da ruptura com o antigo espaço colonial e da integração na Comunidade Económica Europeia, provocou profundas alterações no imaginário colectivo que ainda estão por avaliar” (Bethencourt e Curto, 1991, p. 10). Tal contexto poderá contribuir para “problemas da recepção que são bastante mais vastos, envolvendo a apreensão diferenciada das grandes referências históricas, a apreciação do passado recente e a formação das imagens coletivas” (p. 10). Acrescentam que “estes aspectos situam-se muitas vezes num nível afectivo onde se cruza a tomada de consciência dos interesses de grupo, sendo apenas detectáveis através de rigorosos inquéritos de psicologia social” (Bethencourt e Curto, 1991, p. 10), não havendo ainda estudos sobre “as percepções presentes”. Tal foi também salientado por Joaquim Romero Magalhães (1991), lamentando que no colóquio (quase) só se tenha tido em conta “o lado do produtor”, salientando a necessidade de auscultar a perspetiva do “consumidor” das narrativas.

A teoria das representações sociais (e. g. Moscovici, 1988) fornece um quadro teórico para desestabilizar os dualismos entre “produtor” e “consumidor” e outras dicotomias, ao questionar a separação entre “conhecimento científico” e “conhecimento leigo” ou “saber social”, que resulta da atividade criativa de pessoas e de grupos, fornecendo bases para os estudos que abordamos a seguir.

Foi sobretudo a partir da entrada neste milénio que começaram a ser realizados estudos sistemáticos sobre “cognição histórica” (Hegarty e Klein, 2017), isto é, sobre o modo como as pessoas comuns constroem as suas visões do passado e do futuro, ou seja, como pensam, sentem e agem face à história.

A partir da distinção estabelecida por Paul Ricoeur (2000), entre três etapas envolvidas na pesquisa histórica - a documental, a explicativa e a representacional -, Olivier Klein (2013) discute três fases no modo como as pessoas constroem representações da história, dão sentido à história e a mobilizam no quotidiano. Coloca um foco especial na articulação entre os processos de construção de “arquivos”, os processos de explicação da realidade (atribuição causal), e os processos psicossociais de comunicação, salientando que “o modo como as pessoas percecionam e atribuem sentido ao passado é uma questão crucial que transcende a curiosidade académica. As pessoas usam a sua compreensão do passado para avaliar o presente e agir sobre ele” (Klein, 2013, p. 26).

No final do século XX emergiram diversas linhas de pesquisa promissoras por força da sua natureza comparativa, isto é, não se focam apenas num contexto ou grupo específico (uma nação, uma região, uma geração, etc.), mas nas relações entre a memória oficial e a “memória viva”. Seguidamente, iremos revisitar resumidamente alguns estudos sobre as representações sociais da história, focando-nos em particular nos estudos realizados em Portugal no âmbito de estudos internacionais.

Cabe destacar, pelo seu carácter pioneiro, um conjunto de estudos que analisaram a “memória social da descoberta da América”, por ocasião das comemorações do seu cinquentenário, coordenado por Denise Jodelet. Com base em amostras de estudantes universitários de 13 países, oito na América Latina e cinco na Europa, Celso Sá e colegas (1996) verificaram que os participantes portugueses foram os que fizeram uma avaliação menos negativa das consequências de “1492”. Na interpretação de Vala e Saint-Maurice (2004, p. 387), as respostas dos participantes “portugueses visam preservar a sua identidade como país de descobridores, minimizando os aspetos negativos da colonização”. Na sequência deste estudo internacional sobre a memória social de 1492, foi realizado um estudo comparativo semelhante por ocasião das comemorações dos “500 anos do descobrimento do Brasil”, usando as mesmas metodologias no Brasil e em Portugal de modo a permitir comparações.

Sá, Oliveira e Prado (2004), analisando as evocações livres sobre o “descobrimento do Brasil”, evidenciaram uma representação hegemónica, semelhante entre participantes brasileiros e portugueses, refletindo a imagem do “encontro pacífico” transmitida na carta de Pêro Vaz de Caminha, evocando “índios, caravelas, Pedro Álvares Cabral, praia ou mar”. Registaram-se também evocações à “escravatura e exploração das riquezas naturais” em ambas as amostras, embora mais pronunciadas no caso da amostra brasileira, sendo que nesta última deteta-se uma “representação polémica dos descobrimentos”, fazendo referência à “invasão”, “conquista” e ao “massacre dos índios”, sendo esta “crítica recente” mobilizada por “jovens de orientação política de esquerda e que valorizam a identidade latino-americana”. Tal crítica, alegadamente “recente” foi discutida pelos autores como tendo surgido no contexto da polémica instalada durante as comemorações de “1492” na América Latina, numa época de acentuada crise económica e em que os descendentes dos povos originários denunciaram ativamente os efeitos perversos persistentes do colonialismo.

Por seu turno, Vala e Saint-Maurice (2004, p. 388) analisam as representações do processo de colonização, sendo os participantes confrontados com questões fechadas sobre o papel e a caracterização dos diferentes “grupos que estiveram envolvidos na colonização do Brasil” (o questionário apresentava três possibilidades: “colonizadores portugueses”, “índios” e “escravos africanos”), verificando que as representações da colonização se ancoram em princípios identitários. A representação da colonização como “invasão e conquista” está associada “à matança dos índios pelos colonizadores” e a sentimentos de “revolta e vergonha”, enquanto a representação da colonização como “um encontro entre povos” está associada a “orgulho”, sendo esta última predominante junto dos participantes portugueses (Vala e Saint-Maurice, 2004, p. 397). No entanto, os autores salientam alguns significados comuns a Portugal e ao Brasil, nomeadamente “uma visão mítica da colonização, expressa pela ideia de fusão cultural, talvez inspirada pelo lusotropicalismo, que se opõe à de conflitualidade intercultural, expressa pela crença na destruição das culturas indígenas pela cultura europeia” (Vala e Saint-Maurice, 2004, p. 399). Em Portugal, as pessoas inquiridas “expressam muito mais claramente uma representação positivamente idealizada da colonização, de acordo com slogans das comemorações e o registo acrítico das ‘memórias’ constantemente activadas pelas instituições sociais e políticas” (Vala e Saint-Maurice, 2004, p. 399). De um modo geral, as “representações vivas dos descobrimentos” estão em consonância com o conteúdo dos manuais escolares em vigor à época, sendo que os manuais portugueses destacam a esfera económica e política, sendo os reis, os nobres e navegadores apresentados como os atores-chave (Soares e Jesuino, 2004). Num comentário a estes estudos, Pedro Cardim (2004, p. 341) salienta as diferenças entre a história que é relatada nos manuais dos dois países, quer nos temas quer nos protagonistas. Nos portugueses, Portugal é inserido num contexto histórico em que é “protagonista”, enquanto nos brasileiros a abordagem da colonização é mais crítica. No entanto, em ambos os casos, destaca-se a agência europeia e silencia-se a “heterogeneidade” e “muitas das principais iniciativas repressivas contra índios e africanos”.

Vala e Saint-Maurice (2004, p. 400), salientam a consonância com os resultados obtidos num estudo sobre a “consciência histórica” (Pais, 1999), realizado junto de amostras de jovens de vários países, tendo-se verificado que Portugal, a par da Inglaterra, foi o país em que os participantes menos associaram o período da colonização ao “desprezo e preconceitos contra outras culturas e raças”, resultados que indicam uma “idealização da colonização”, com silenciamento dos seus efeitos negativos. Ora, estudos comparativos posteriores, realizados no âmbito do International Social Survey Programme (ISSP, 2003, 2013) e do European Social Survey têm vindo a indicar uma estabilidade nos níveis de autoidentificação em Portugal, apesar de ligeiras flutuações conjunturais, sendo consistentemente um dos países com elevados mais níveis de “orgulho” nacional, e a maior fonte de orgulho reside na sua história (Sobral, 2020). Nas palavras de Sobral (2020), “[o]s portugueses foram socializados, durante séculos, na ideia de que possuíam um passado nacional glorioso - e a ideia de que as nações possuem ‘Idades do Ouro’ é comum nas narrativas nacionalistas” (p. 178). No caso português, alimentou-se “a ideia de uma história excecional protagonizada pelos habitantes de um país pequeno e pobre que levara o seu domínio a diversos continentes” (p. 178).

Estudos recentes têm vindo a demonstrar a que a mitologia lusotropicalista persiste na sociedade portuguesa (e não só), continuando a ser mobilizada no discurso público (pelas elites políticas e outras), estando as crenças lusotropicalistas fortemente correlacionadas com a discriminação de grupos racializados, que continuam a ser percebidos como “outros” na sociedade portuguesa (e.g. Silva e Sobral, 2012; Valentim e Heleno, 2018).

Nas últimas duas décadas, foram também realizados diversos estudos comparativos sobre memória histórica envolvendo recolha de dados junto de estudantes universitários em diversos países de língua oficial portuguesa (e. g. Cabecinhas, Lima e Chaves, 2006; Mendes, Silva e Cabecinhas, 2010). A principal diferença, face aos estudos supramencionados, prende-se com o facto de terem sido colocadas questões abertas sobre a história do país respetivo. Assim, era pedido aos participantes que escrevessem livremente os acontecimentos que consideravam mais importantes na história do país, sendo que terminada essa tarefa de nomeação espontânea era solicitado que avaliassem cada um dos acontecimentos por si nomeados e reportassem as emoções que suscitavam. Seguidamente, o mesmo procedimento era pedido em relação às “personalidades” que consideravam mais importantes na história do país. Tais estudos apontaram para ambiguidades, ambivalências e contradições nas representações sociais do passado colonial (Cabecinhas, 2019). No âmbito do primeiro desses estudos (Cabecinhas, Lima e Chaves, 2006), cujos dados foram recolhidos no Brasil e em Portugal (2003/2004), observou-se, de um modo geral, um “desencontro” de memórias sobre o passado colonial. Em Portugal, os resultados indicam a persistência da idealização do período dos “descobrimentos”, dos quais são dissociados os efeitos mais brutais do colonialismo - configurando aquilo que Ana Stoler (2011) denomina como “afasia colonial”. Já no Brasil, o padrão de resultado foi muito mais diverso, apontando para diferentes ancoragens: os participantes que mencionaram espontaneamente a “descoberta”, “achamento” ou a “vinda da família real” entre os acontecimentos mais importantes na história do Brasil associaram tais acontecimentos a emoções ambivalentes enquanto os que evocaram espontaneamente a “invasão” ou “colonização” mencionaram emoções negativas. Diversas revoltas contra o regime colonial foram mencionadas e foram evocados espontaneamente alguns dos seus atores-chave, sendo estes associados a emoções positivas (Cabecinhas, Lima e Chaves, 2006).

Tendo em conta que estes estudos foram já reportados em outros trabalhos, focamo-nos aqui em alguns resultados obtidos em Portugal, dando conta de algumas tendências discerníveis nos estudos realizados com estudantes sobre representações sociais da história. Tal como noutros contextos nacionais, verificou-se um “efeito de recência”: ao evocar a história de Portugal, os participantes destacaram diversos acontecimentos que faziam parte da agenda mediática no momento de recolha de dados. No entanto, o “efeito nostálgico” foi também muito pronunciado, traduzindo-se em uma avaliação muito positiva do passado remoto em contraste com o passado recente. Por exemplo, a grandiosidade imperial passada é confrontada com a pequenez do presente (nas palavras de um participante: “Já fomos um império gigante mas que foi diminuindo e ficando sem as nossas colónias, como Angola, Moçambique. Éramos muito ricos e agora somos um país pobre”, 2023).

Ao pensar a “História de Portugal”, a grande maioria dos participantes portugueses destacou o “25 de Abril” (designação mais presente do que “Revolução dos Cravos”) e os “descobrimentos”. A maior parte dos participantes referiu genericamente os “descobrimentos”, mas foi também comum a referência a “descobrimentos portugueses” a “descoberta do caminho marítimo para a Índia” ou a “descoberta do Brasil”. Como foi referido, na primeira fase de recolha de dados (2003/2004), os “descobrimentos” foram considerados pelos participantes de forma consensualmente positiva e associados a emoções positivas (orgulho, alegria, felicidade). As referências ao “colonialismo” e à “descolonização” assumiram também um papel importante nestas evocações. O “colonialismo” foi avaliado negativamente e à “guerra colonial” foram associadas emoções negativas, sobretudo revolta e frustração. Por seu turno, a “descolonização” configurou-se como o acontecimento mais polémico, suscitando um variado espectro de emoções e de avaliações, desde as mais positivas às mais negativas.

A época dos “descobrimentos” continua a ser percebida como a “idade de ouro” da nação, sendo associada a emoções muito positivas e dissociada dos efeitos mais brutais da “colonização”. Por exemplo, são residuais as referências espontâneas à “escravatura” e outras formas de trabalho forçado. Registaram-se algumas referências à “abolição da escravatura”, destacando o papel pioneiro de Portugal (ou especificamente de Marquês de Pombal, reproduzindo uma crença bastante disseminada que oblitera a história da efetiva abolição tardia da escravatura, das diversas lutas e o facto de o trabalho forçado ter sucedido à escravatura até muito tarde; ver Jerónimo e Monteiro, 2020). Globalmente, apesar das referências críticas serem visíveis na recolha de dados realizada depois da pandemia, a época dos “descobrimentos” continua a ser representada sobretudo como uma “aventura” na qual os portugueses foram “pioneiros” ao “dar novos mundos ao mundo”. A “grandeza da nação” é associada a emoções muito positivas e os efeitos mais brutais do colonialismo tendem a ser esquecidos. Por exemplo, continuam a ser residuais as referências espontâneas ao “tráfico de escravos” e às diversas formas de extrativismo.

Os acontecimentos que sinalizam a (re)conquista da nacionalidade, nomeadamente a “Fundação” e a “Restauração”, foram também destacadas, assim como a “Ditadura”, o “Fim da ditadura”, o “Salazarismo”, a “Entrada na CEE/UE”. De um modo geral, os acontecimentos referentes a direitos humanos, questões socioeconómicas e ambientais, foram preteridos face a eventos políticos e desportivos.

No que diz respeito à evocação de “personalidades” ou de “pessoas ou grupos” (juntando os resultados obtidos nos vários momentos de recolha de dados ao longo destas duas décadas), Salazar foi a personalidade mais nomeada, sendo avaliado de modo negativo e associado a emoções negativas, configurando o papel de vilão. Entre as demais personalidades nomeadas pelos participantes, os reis e os nobres associados a momentos-chave da nação, nomeadamente os referentes à conquista da nacionalidade - com claro destaque para D. Afonso Henriques - e à “gesta dos descobrimentos”, nomeadamente o Infante D. Henrique, os navegadores Vasco da Gama e Pedro Alvares Cabral, cujo impacto na história de Portugal foi considerado muito positivo. Foram ainda destacados escritores, especialmente Camões, Pessoa e Saramago, e futebolistas como Eusébio e Cristiano Ronaldo, para além de alguns governantes em exercício de funções recentemente. Os nomes de pessoas ligadas à luta contra a ditadura e a conquista da liberdade têm decrescido na lista de referências, com exceção de Salgueiro Maia, que obteve maior percentagem de nomeações espontâneas na última recolha de dados, o que poderá estar ligado ao facto de se ter tornado um ícone da Revolução dos Cravos.

As personalidades nomeadas espontaneamente pelos jovens como sendo importantes para a História de Portugal são na sua esmagadora maioria homens. A assimetria nas nomeações espontâneas revela-se não só a nível quantitativo, mas também a nível qualitativo: não só são nomeadas poucas mulheres, como as escassas que são nomeadas tendem, salvo raras exceções, a estar alinhadas com os estereótipos tradicionais de género.

A fadista Amália Rodrigues (1920-1999) é a única mulher entre as personalidades mais nomeadas. De um modo geral, as escassas mulheres evocadas são rainhas ou membros da alta nobreza, associadas a funções de caridade (Rainha Santa Isabel), sendo avaliadas muito positivamente. Já as mulheres que se destacaram na agência política, tendem a ser esquecidas ou a ser avaliadas menos positivamente. Como salientámos em trabalho anterior ( Cabecinhas, 2018), num quadro em que dominam as referências a governantes, as mulheres que exerce(ra)m funções políticas tendem a ser esquecidas ou a ser avaliadas de modo menos positivo do que as que se destacam em funções de cuidado ou de expressividade. Por exemplo, Maria de Lourdes Pintasilgo (1930-2004), que foi primeira-ministra de Portugal, tem sido esquecida. As exceções a este padrão são mulheres “míticas” que lutaram contra a invasão estrangeira (por exemplo, a célebre “padeira de Aljubarrota”) ou que morreram jovens, recordadas como vítimas de histórias de amor impossível (Inês de Castro). Já as que morreram, igualmente jovens, na luta pela liberdade e pela dignidade humana, nomeadamente em contexto laboral, são esquecidas (por exemplo, Catarina Eufémia, que não foi mencionada espontaneamente).

Resumindo, as escassas mulheres evocadas espontaneamente como importantes para a história nacional foram sobretudo aquelas que se distinguiram em domínios tradicionalmente associados ao “eterno feminino”, ou aquelas que são percecionadas como a expressão da “alma da nação” (Amália Rodrigues). De um modo geral, tal padrão de resultados demonstra que as mulheres continuam excluídas da História da nação, sendo recordadas pela “expressividade”, caridade ou bondade enquanto os homens são sobretudo evocados pela agência política, militar ou desportiva.

Este padrão de resultados inicialmente observado junto de estudantes do ensino superior foi replicado em estudos recentes com estudantes do ensino secundário (11.º e 12.º ano de escolaridade). Tal como foi observado nos estudos em contexto universitário, o apagamento quase total das mulheres na história tem sido considerado como um simples “espelho” da “natural” falta de agência histórica das mulheres ou como um problema que já está em vias de ser ultrapassado devido à crescente participação das mulheres nas diversas áreas de atividade. O apagamento das mulheres nas representações sociais da história sinaliza a persistência da forte assimetria, que continua a moldar o quotidiano laboral e não só. A este propósito recordamos as palavras de Isabel do Carmo, durante a greve estudantil, em 1962, em Lisboa, quando afirmava que as mulheres têm de deixar de ser apenas o repouso do guerreiro para ser o guerreiro (RTPa, 2022). Parece que 60 anos depois este apelo não perdeu atualidade.

Nos estudos em que se deu oportunidade para os participantes nomearem espontaneamente as “pessoas ou grupos” (e não simplesmente em “personalidades”), os resultados evidenciam também um “efeito de solipsismo”: os participantes tenderam a recordar a agência individual em detrimento da agência coletiva, isto é, a maioria das conquistas (militares, políticas, científicas, etc.) são lembradas como se tivessem sido alcançadas graças à ação de uma só pessoa, recordando-se geralmente apenas o momento que é percecionado como o ponto de viragem entre o “antes” e o “depois”. Por exemplo, a “conquista da liberdade” é percebida como um acontecimento que se travou no território da antiga metrópole (sobretudo Lisboa), esquecendo o contributo do longo lastro de luta das populações nas colónias e também as lutas que não foram protagonizadas por políticos ou militares.

As lutas pela liberdade e pela dignidade humana, quando mencionadas, são lembradas como uma conquista masculina, personalizada em pessoas concretas com nome, tendo a esquecer o longo lastro das lutas e a sua transversalidade, nomeadamente as pessoas que lutaram pela igualdade “quando era crime fazê-lo” (Carmo e Amâncio, 2004). As escassas referências diretas às questões dos direitos humanos centram-se nos direitos políticos em detrimento de direitos socioeconómicos e ambientais.

Recentemente, foram realizados diversos estudos recorrendo a grupos focais em escolas secundárias em Portugal, nos quais os jovens foram convidados a discutir em pequenos grupos as suas representações do passado, presente e futuro. Os estudantes que participaram nos diversos grupos focais tenderam a ser unânimes ao considerar que as pessoas jovens não são “preconceituosas”, rejeitando o machismo, a homofobia, a transfobia, o racismo e outras formas de discriminação, fazendo assim uma forte clivagem entre as gerações mais velhas, alegadamente conservadoras, e a sua geração, alegadamente livre de preconceitos e transformadora (para uma discussão, ver Macedo, Balbé e Cabecinhas, 2023).

Lembrar passados e construir futuros

Os estudos empíricos aqui revisitados sobre representações sociais da história, realizados ao longo de cerca de duas décadas, recorrendo a diferentes metodologias, apontam para uma internalização de uma ordem social dominante, androcêntrica e eurocêntrica (Amâncio, 2017).

Não podemos compreender as dinâmicas do presente sem ter em conta o passado colonial e sem auscultar o que significa esse passado para as diversas pessoas e grupos. A escuta profunda de outras “vozes” sobre o passado constitui sem dúvida um grande desafio, desafio esse essencial para intervir no presente e imaginar futuros mais justos e inclusivos.

Estudos realizados recentemente em diversos países em contexto escolar mostram os efeitos persistentes de diferentes tipos de amnésias societais (e. g. Leone, 2017; Pereira, Macedo e Cabecinhas, 2019) no quotidiano. Tomados no seu conjunto, evidenciam a importância de escutar e de narrar outras histórias (e. g. Khan, 2023). Combater tais amnésias passa por dar visibilidade a histórias que estiveram longamente obscurecidas, o que constitui uma forma de ativismo mnemónico, que pode ser realizado de diversas formas e em diversos contextos (e. g. Roldão, Pereira e Varela, 2023).

Nos últimos anos, diversos autores têm salientado que é crucial debatermos como o passado colonial é interpretado e como é ensinado nas escolas (e. g., Araújo, 2015; Valentim e Miguel, 2018). A complexidade dos desafios com que se defronta a humanidade - nomeadamente as alterações climáticas, fluxos migratórios, epidemias globais, etc. - tornam evidente a necessidade de desfazer algumas fronteiras que continuam a estruturar o ensino e a investigação, como, por exemplo, a dicotomia entre as ciências naturais e as ciências sociais e humanas (Chakrabarty, 2020).

Como refere Marcos Cardão (2023, p. 14), os debates sobre o Antropoceno têm contribuído para expor “os limites das grandes narrativas teleológicas, predicadas numa ideia de progresso e desenvolvimento contínuo, e problematizaram o antropocentrismo que governa as histórias sobre o destino da humanidade”. As “crises” que temos vindo a vivenciar nos últimos anos - “crise pandémica”, “crise migratória”, “crise climática”, etc. -, têm colocado em evidência a necessidade de olhar para uma “História Profunda”, na qual “os humanos desempenham ao mesmo tempo um papel crucial, tardio e muito provavelmente efémero” (Danowski e Castro, 2014, p. 27, citados por Cardão, 2023). Tais debates têm fomentado o diálogo entre diferentes áreas científicas e contribuído para novas formas de pensar a agência humana.

Nas narrativas dominantes, a agência tem sido principalmente pensada enquanto “conquista” (de outros povos, de territórios, de tecnologias para o domínio da natureza, etc.), na aceleração do “progresso” e no crescimento do consumo. A realidade que vivemos atualmente, em Portugal e no mundo, coloca em evidência a necessidade de cuidar, cuidar de nós, dos outros seres humanos e também dos outros seres vivos, que têm sido o suporte da vida humana, mas que são tão esquecidos nas narrativas da história da humanidade.

Trabalhos recentes sobre os manuais escolares portugueses evidenciam que, embora sejam evidentes os esforços de inclusão de outras histórias, as narrativas mestras continuam a reificar de modo implícito - e por vezes de modo bem explícito - hierarquias raciais, de género e de classe (e. g. Araújo, 2015; Cabecinhas et al., 2022; Valentim e Miguel, 2018).

Por exemplo, num estudo em que foram analisados manuais de História em vigor no ensino secundário, constatamos que apesar da inclusão pontual de “visões do outro”, não se observa uma verdadeira transformação das estruturas narrativas. As pessoas nomeadas pelo nome nos manuais escolares portugueses são sobretudo pessoas europeias e norte-americanas, sendo extremamente raras as pessoas não-brancas com rosto e nome. Os manuais não abordam a amplitude, a diversidade e a profundidade dos contributos das mulheres e de pessoas de outros grupos menorizados na história. Destacam algumas escassas mulheres como “pioneiras” ou “as primeiras”, geralmente apresentadas em dossiês especiais em que estas surgem como uma “adenda” na história (e. g. Cabecinhas e Balbé, 2022). Apesar de haver alguns dossiês especiais em que se procura enquadrar a ação das mulheres em contextos económicos ou políticos mais amplos, estas continuam a ser apagadas enquanto agentes his- tóricos.

O mapeamento das ausências e dos silêncios torna evidente um presente marcado pela colonialidade do poder e do saber (Mignolo, 2007), num país percebido como branco, europeu e cristão (e. g. Almeida, 2021; Cabecinhas et al., 2022). Estes regimes de (in)visibilidade são o resultado de uma configuração social complexa, onde se cruzam vários eixos de exclusão. Sabemos que tornar um aspeto visível implica (quase) sempre ocultar outros, e a luz lançada sobre uma certa figura histórica pode obscurecer processos complexos de causalidade histórica, reforçando a ilusão de igualdade e o mito da meritocracia nas sociedades contemporâneas.

Uma das medidas que está comtemplada no Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação (2021-2025) é a inclusão de conteúdos “sobre a diversidade e presença histórica de grupos discriminados e relatos de factos históricos como o colonialismo e a escravatura”. No entanto, tal “inclusão” tem sido operacionalizada como um simples adicionar de conteúdos, nomeadamente através de imagens de arquivos coloniais, que conferem uma “ visibilidade aterradora” aos corpos de pessoas racializadas, sem as reconhecer como pessoas com agência histórica (Roldão, 2022). De facto, tal como referimos em relação às mulheres, nos recentes manuais de história em Portugal as pessoas vistas como “outras”, nomeadamente as pessoas racializadas, continuam a aparecer como uma simples “adenda” na “nossa história”. Como salientou Marta Araújo (2015, p. 16), “adicionar sem agitar” tem sido a solução preconizada, mas “é necessário reconstruir as narrativas históricas à luz de uma abordagem que coloque em evidência as conexões entre certos processos e eventos históricos, de forma a desafiar as fórmulas narrativas dominantes”.

Tais questões colocam-se não apenas ao nível dos manuais escolares, mas também nas várias instâncias da “memória pública”, nomeadamente na toponímia urbana, estatuária, nomes das ruas, meios de comunicação social, etc. A esse propósito convocamos uma interrogação de Djay Bee no programa Scroll Geração Z Era uma vez (RTP, 2022b): “Hoje já me cruzei com mais mulheres estátua do que estátuas de mulheres, estou a falar de mulheres a sério, cientistas, escritoras, presidentes, ministras, pintoras, artistas, bora lá desfolhar os livros de história e encontrar […] se está cheia de mulherões porque é que nas nossas ruas só estão os figurões?”.

Cabe interrogar se “mulheres a sério” são apenas as “cientistas, escritoras, presidentes, ministras, pintoras, artistas”, ou seja, aquelas que exercem funções às quais é atribuído prestígio social, mas o apelo de Djay Bee para dar visibilidade à agência de mulheres - com nome, rosto e voz - nas várias arenas da vida pública não poderia ser mais pertinente ao falar de uma cidade como Lisboa (e outras) onde abundam estátuas em que mulheres anónimas são representadas com o rosto voltado para o alto, a olhar em direção a um homem com rosto, com nome e com função identificados; ou a indicar esse olhar de reverência a uma criança nos seus braços. Ironicamente, Fernanda do Vale, que ficou conhecida por “preta Fernanda” e “mulher toureira” - pousou como modelo para uma dessas estátuas, “[a]o general Marquez Sá da Bandeira”, em homenagem à “abolição da escravatura”. Sem desconsiderar os esforços legislativos de Sá da Bandeira, é importante lembrar que a luta de tantas pessoas escravizadas, homens e mulheres, que deram a vida por uma causa que continua a ser representada como tendo sido uma iniciativa europeia.

As perceções do passado e os seus efeitos sobre as relações intergrupais e o bem-estar só recentemente começaram a receber atenção por parte dos psicólogos sociais. De facto, as representações sociais da história constituem um ingrediente crítico para a compreensão das relações interpessoais, internacionais e interculturais no presente assim como para a construção de identidades sociais e sua mobilização, quer para a manutenção do statu quo quer para questionar e tornar saliente a ilegitimidade desse statu.

Respigar memórias constitui um dos passos para a construção de futuros alternativos. Nos últimos anos, as lutas contra as desigualdades de género e outras têm extravasado fronteiras e dado ímpeto a diversas formas de “ativismo mnemónico” nas várias instâncias do espaço público, nas redes digitais, nas ruas, na academia, nas associações, etc. Tais ativismos mnemónicos visam contribuir para desocultar histórias e para resgatar memórias durante muito tempo silenciadas, apelando ao “dever de memória” (Levi, 2011), isto é, à “responsabilidade ética de nunca esquecer” determinados acontecimentos históricos (Sousa, Khan e Pereira, 2022, p. 11). Indo além da simples denúncia, os ativismos mnemónicos traduzem (novos) conhecimentos, esbatendo as fronteiras entre labor manual e intelectual. A desocultação de histórias rasuradas e o processo de comunicação entre diferentes grupos e culturas não é fácil nem está isenta de riscos, mas é indispensável. As pessoas com trajetórias de migração (voluntária ou forçada), ao navegarem entre “mundos diferentes”, podem desempenhar um papel vital nos processos de descolonização do conhecimento.

Hoje, as afterlives do colonialismo continuam vivas nas mais diversas formas, na vida íntima de cada pessoa, na vida social, na vida da terra. A produção de conhecimento a partir da articulação de diferentes saberes, numa lógica não competitiva, é essencial para a construção de futuros mais justos e mais inclusivos. Os ativismos mnemónicos interpelam-nos a pensar nas histórias que estruturam a memória pública, os seus usos e abusos, assim como as suas interligações com as relações de poder, dentro e fora da nação, num contexto em que os desafios que se colocam nas nossas vidas extravasam claramente as fronteiras nacionais.

Embora se tenham registado avanços muito significativos nas últimas décadas, que transformaram profundamente o país - nomeadamente em termos legislativos e na melhoria das condições de vida e da possibilidade de decisão sobre o modo de viver a própria vida -, alguns dos dualismos descritos por Sedas Nunes (1964) continuam a fazer-se sentir de forma insidiosa. Nos últimos anos, as dificuldades sentidas no contexto da crise financeira mundial, da “crise migratória”, da “crise pandémica”, entre outras, trouxeram para a esfera pública discursos virulentos que estigmatizam determinados grupos como “bodes expiatórios” e pretendem legitimar que determinadas pessoas tenham a sua vida confinada para que o país possa “ser grande de novo”, parecendo esquecer que o passado alegadamente glorioso da nação foi glorioso apenas para uma pequena elite, num país onde a esmagadora maioria da população vivia de “asas cortadas”, sem acesso à “paz, pão, habitação, saúde, educação”, mas que apesar das múltiplas adversidades, continuou a lutar pela “liberdade de mudar e de decidir”, como canta Sérgio Godinho.

Agradecimentos

Este trabalho foi realizado no âmbito do projeto MigraMediaActs - Migrações, Média e Ativismos em Língua Portuguesa: Descolonizar Paisagens Mediáticas e Imaginar Futuros Alternativos (ref. PTDC/COM-CSS/3121/2021), financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Agradeço a Isabel Macedo, José Pedro Monteiro, Luís Cunha, Sheila Khan e Sofia Aboim pelos comentários a uma versão anterior deste texto. Agradeço igualmente a todas as pessoas que colaboraram nos diversos estudos mencionados, sem as quais este texto não teria sido possível.

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Recebido: 23 de Maio de 2023; Aceito: 24 de Outubro de 2023

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