INTRODUÇÃO
O stresse relacionado com o trabalho, também designado como profissional ou ocupacional, ocorre quando as exigências do emprego excedem a capacidade do trabalhador para lhes dar resposta. A Comissão Europeia definiu este conceito como sendo um padrão de uma reação emocional, cognitiva, comportamental e fisiológica, a componentes deletérios e adversos do conteúdo do trabalho, organização e ambiente laborais.1
A prevalência de stresse ocupacional é bastante relevante: uma recente sondagem de opinião pan-europeia revelou que 51% de todos os trabalhadores dão conta de que o stresse ocupacional é algo prevalente no seu local de trabalho.2 Além disso, a criação de um ciclo vicioso em que stresse gera mais stresse consubstancia um paradigma de cronicidade que exige uma intervenção urgente, ou melhor, uma prevenção eficaz.
Este tipo de stresse figura como uma das mais sérias consequências de um ambiente de trabalho negativo em termos psicossociais, porque os trabalhadores que o experimentam por um período prolongado podem vir a sofrer graves problemas de saúde mental e física.3 A exposição prolongada ao stresse ocupacional pode causar sintomas (físicos, emocionais, intelectuais e comportamentais), com consequências negativas para o rendimento profissional, para a saúde física e psíquica e para a convivência social.4 Os sistemas orgânicos passíveis de ser afetados incluem o cardiovascular, respiratório, endócrino, gastrointestinal, imunitário e músculo-esquelético.5 No que concerne aos comportamentos, sublinha-se a redução da prática desportiva, uma adoção de um regime alimentar desequilibrado e o aumento do consumo de álcool e/ou tabaco, os quais podem influenciar diretamente a saúde.6
Kivimäki M e colaboradores estudaram a mortalidade cardiovascular, entre 1973 e 2001, numa coorte de 812 trabalhadores de uma metalúrgica Finlandesa e concluíram que, após ajustamento para a idade e sexo, aqueles com elevado stresse ocupacional tinham um risco 2,2 vezes superior de mortalidade cardiovascular em relação aos seus colegas de trabalho com um menor nível de exigências laborais.3 Estudos realizados sugerem que 50 a 60% de todos os dias de trabalho perdidos podem ser atribuídos ao stresse ocupacional e a riscos psicossociais.7 Trata-se do segundo problema de saúde relacionado com o trabalho mais frequentemente reportado na União Europeia, a seguir às perturbações músculo-esqueléticas.8
Robert Karasek foi um dos primeiros investigadores a estudar as relações sociais no ambiente laboral enquanto fonte de stresse e a considerar as suas repercussões sobre a saúde. Nos anos 70, propôs um modelo teórico bidimensional que relaciona dois aspetos do trabalho (exigência mental e controlo) ao risco de doença: a exigência mental inclui pressões de natureza psicológica, quantitativas (como tempo e velocidade na realização do trabalho) ou qualitativas (por exemplo, conflito entre ordens contraditórias); o controlo é a possibilidade do trabalhador utilizar as suas competências para a realização das suas tarefas, bem como possuir autonomia para decidir como fazê-lo.9
De acordo com este modelo, os valores médios de uma população em estudo distinguem quatro quadrantes que relacionam a exigência mental do trabalho e o controlo do trabalhador (Figura 1).
A coexistência de grandes exigências psicológicas com baixo controlo sobre o processo de trabalho gera grande desgaste no trabalhador, com efeitos nocivos à sua saúde. Igualmente deletéria é a situação que conjuga baixa exigência mental e baixo controlo, na medida em que pode gerar a perda de capacidades e desinteresse. A situação “ideal”, de pouco desgaste, alia exigência mental reduzida e controlo elevado do processo de trabalho.9
Em 1988, Johnson acrescentou uma dimensão a este modelo (apoio social no ambiente de trabalho), definida como os níveis de interação social existentes, tanto com os colegas como com os chefes, entendendo-se que a sua escassez também pode ter consequências negativas para a saúde. No mesmo ano, Töres Theorell propôs uma versão reduzida da Job Stress Scale (questionário originalmente elaborado por Karasek com 49 perguntas) para efeitos de estudo do stresse ocupacional, a qual se encontra validada para português do Brasil.9
É amplamente reconhecido que o ambiente laboral numa unidade naval em contexto operacional pode aumentar o risco de exposição a situações de stresse. Tanto mais, quando a guarnição do navio está envolvida numa missão de longa duração e empenhada num exercício militar de grande envergadura.
O Exercício NATO Trident Juncture 2015, o maior exercício da história da NATO desde 2002, realizou-se em vários locais de Itália, Espanha e Portugal, entre 3 de outubro a 6 de novembro. Em Portugal, o exercício decorreu nas zonas de Beja, Santa Margarida, Tróia e Setúbal e contou com mais de 10 mil efetivos de 14 países participantes. Um navio da classe Bartolomeu Dias integrou este exercício de 21 de outubro a 6 de novembro, navegando ao largo da costa espanhola e portuguesa. Esta participação fez parte do planeamento operacional da Standing NATO Maritime Group One (5 de junho a 21 de dezembro de 2015) onde a fragata portuguesa exerceu funções de navio-almirante.
A fragata tem capacidade de operar em qualquer parte do mundo. Originalmente concebida para missões antissubmarinas, está também preparada e treinada para levar a cabo um vasto conjunto de missões não combatentes, tais como embargo, antipirataria e combate ao narcotráfico, assistência humanitária, vigilância costeira e salvaguarda da vida humana no mar.
OBJETIVO
Avaliar o stresse ocupacional na guarnição de uma unidade naval da Marinha Portuguesa durante um embarque enquadrado numa missão operacional, designadamente um exercício militar de grande envergadura.
MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de um estudo analítico, observacional e transversal baseado nos militares portugueses embarcados num navio da classe Bartolomeu Dias nas duas últimas semanas do exercício Trident Juncture 2015 (26OUT - 06NOV15).
Este estudo de investigação foi realizado após autorização do Comando do navio, entidade soberana a bordo que tem a responsabilidade de decidir sobre todas as propostas que lhe são colocadas internamente.
A versão resumida da Job Stress Scale contendo 17 questões (5 sobre a exigência mental do trabalho, 6 sobre o controlo do trabalhador e 6 sobre o apoio social) foi previamente adaptada de português do Brasil para português de Portugal pelo primeiro autor (anexo). As opções de resposta foram apresentadas numa escala tipo Likert com quatro opções (“Frequentemente”, “Às vezes”, “Raramente”, “Nunca ou quase nunca” no caso das questões sobre exigência mental do trabalho e controlo do trabalhador e “Concordo totalmente”, “Concordo mais do que discordo”, “Discordo mais do que concordo”, “Discordo totalmente”, no caso das questões sobre apoio social). Foi ainda adicionada uma questão sobre a categoria profissional do inquirido (“Oficial”, “Sargento”, “Praça”).
Mediante disponibilização da lista de militares portugueses a bordo da fragata pela respetiva Secretaria, os questionários foram enviados (26OUT15) através da aplicação “Questionários online” e, numa segunda fase (02NOV15), por correio eletrónico institucional (ficheiro Microsoft Office Excel). A segunda fase foi considerada necessária devido à fraca adesão à metodologia de resposta por via da dita aplicação, sendo solicitada resposta apenas a quem ainda não o tivesse feito. Os questionários enviados pela aplicação ou por correio eletrónico institucional foram recolhidos sob anonimato em formato digital (arquivo dos questionários recebidos somente com numeração da ordem de receção) ou em papel (questionários impressos pelos respondentes e depositados em caixa para o efeito colocada na enfermaria do navio).
A informação recolhida no período considerado foi inserida numa base de dados construída para o efeito em ficheiro Microsoft Office Excel. As respostas foram recodificadas em números (1 a 4) de acordo com a escala Likert aplicada e somaram-se os valores das respostas às perguntas relativas a cada uma das dimensões: “exigência mental do trabalho” (5 a 20), “controlo do trabalhador” (6 a 24) e “apoio social no trabalho” (6 a 24).
Os valores médios de cada dimensão foram calculados para a amostra na sua totalidade e por categoria profissional. Aplicou-se o teste t de student e o teste z para comparação de, respetivamente, médias e proporções entre amostras segundo a categoria profissional.
Posteriormente, foram construídos gráficos representativos do modelo “exigência mental do trabalho - controlo do trabalhador” para a globalidade da amostra e para cada categoria profissional tendo em consideração os valores médios calculados previamente, arredondados à unidade, para construir os quadrantes.
Para efeitos de inferência estatística das prevalências da amostra estudada para a população visada calculou-se o intervalo de confiança a 95% (IC 95%) corrigido para a população mediante aplicação da fórmula IC 95% = p +/- z*√((p*(1-p))/n)*√((N-n)/(N-1)), onde p = proporção; z = 1,96; n = dimensão da amostra; N = dimensão da população.
RESULTADOS
Obtiveram-se 60 questionários válidos (11 oficiais, 28 sargentos e 21 praças), o que representa 30,6% da população elegível (n=196).
Os limites centrais dos quadrantes do modelo “exigência mental do trabalho - controlo do trabalhador” encontrados para a totalidade da amostra são os seguintes:
Exigência mental do trabalho baixa para valores iguais ou inferiores a 16 e elevada para valores iguais ou superiores a 17 (média 16,12±1,58);
Controlo do trabalhador baixo para valores iguais ou inferior a 20 e elevado para valores iguais ou superiores a 21 (média 19,75±2,24).
Para o caso da dimensão “apoio social no trabalho”, valores iguais ou inferiores a 19 indicam baixo apoio social e valores iguais ou superiores a 20 indicam o oposto (média 18,93±2,92).
A Tabela 1 explana os limiares médios das três dimensões estudadas por categoria profissional.
DIMENSÃO ESTUDADA | CATEGORIA PROFISSIONAL | VALOR LIMIAR MÉDIO | VALORAÇÃO | ||
---|---|---|---|---|---|
BAIXA | ELEVADA | ||||
EXIGÊNCIA MENTAL DO TRABALHO | TOTAL | 16,12±1,58 | ≤ 16 (56,7%) | ≥ 17 (43,3%) | |
Oficiais | 16,27±1,42 | ≤ 16 (36,7%) | ≥ 17 (63,3%) | ||
Sargentos | 15,93±1,54 | ≤ 16 (60,7%) | ≥ 17 (39,3%) | ||
Praças | 16,29±1,76 | ≤ 16 (61,9%) | ≥ 17 (38,1%) | ||
CONTROLO DO TRABALHADOR | TOTAL | 19,75±2,24 | ≤ 20 (56,7%) | ≥ 21 (43,3%) | |
Oficiais | 21,45±1,04 | ≤ 21 (45,5%) | ≥ 22 (54,5%) | ||
Sargentos | 19,64±2 | ≤ 20 (67,9%) * | ≥ 21 (32,1%) | ||
Praças | 19,19±2,23 | ≤ 19 (38,1%) * | ≥ 20 (61,9%) | ||
APOIO SOCIAL NO TRABALHO | TOTAL | 18,93±2,92 | ≤ 19 (56,7%) | ≥ 20 (43,3%) | |
Oficiais | 20,18±2,14 | ≤ 20 (54,5%) | ≥ 21 (45,5%) | ||
Sargentos | 18,71±2,9 | ≤ 19 (57,1%) | ≥ 20 (42,9%) | ||
Praças | 18,57±3,23 | ≤ 19 (61,9%) | ≥ 20 (38,1%) |
Legenda: * diferença estatisticamente significativa (p<0,05). As percentagens apresentadas entre parêntesis reportam a proporção da respetiva amostra alocada a cada tipo de valoração.
Verificam-se diferenças estatisticamente significativas a favor da categoria profissional “oficiais” no valor médio das dimensões “controlo do trabalho” (p<0,01) e “apoio social no trabalho” (p<0,1) comparativamente às categorias profissionais “sargentos” e “praças”. Apesar de não haver diferenças estatisticamente significativas entre a grande maioria das percentagens de indivíduos com valoração baixa/elevada em cada dimensão por categoria profissional, destacam-se os antagonismos das maiorias percentuais, nomeadamente:
Exigência mental do trabalho: elevada para “oficiais” versus baixa para “sargentos” e “praças”;
Controlo do trabalhador: elevado para “oficiais” e “praças” versus baixo para “sargentos”.
A Figura 2 apresenta a representação do modelo “exigência mental do trabalho - controlo do trabalhador” para a totalidade da amostra e por cada categoria profissional. Notar a manutenção do separador vertical entre categorias profissionais (valor médio para a exigência mental do trabalho) e a descida do separador horizontal (valor médio para o controlo do trabalhador) no percurso “oficiais” > “sargentos” > “praças”.
Atendendo a que a situação laboral “ideal” alia exigência mental reduzida e controlo elevado do processo de trabalho, verifica-se que apenas 38,3% da amostra se encontrava alocada no quadrante correspondente. Considerando as categorias profissionais, os valores encontrados apontaram para que 36,4% dos “oficiais”, 39,3% dos “sargentos” e 33,3% das “praças” vivenciavam o melhor contexto ocupacional. Além disso, 18,3% da amostra estava sujeita a um ambiente de elevado desgaste, nomeadamente 27,3% dos “oficiais”, 28,6% dos “sargentos” e 19,0% das “praças”. Por outro lado, 21,7% da amostra estaria num contexto passivo: 18,2% dos “oficiais”, 46,4% dos “sargentos” e 33,3% das “praças”. As diferenças entre os valores percentuais das diferentes categorias profissionais não se revelaram estatisticamente significativas.
Na população estudada, apenas 28,1-48,6% (IC95%) dos militares cumpria os requisitos de situação laboral “ideal” e 10,2-26,5% (IC95%) estavam sujeitos a um ambiente de elevado desgaste, podendo estar sujeitos aos efeitos adversos do stresse ocupacional.
DISCUSSÃO
A origem do stresse ocupacional reside na décalage existente entre as exigências de uma determinada situação e os recursos comportamentais e cognitivos do trabalhador, sempre sob a subjetividade da interpretação individual. Naturalmente, o receio de fracassar e o excesso de trabalho diminuem o prazer de realizar tarefas específicas; por sua vez, o investimento na formação profissional e a autonomia induzem motivação para a superação no desempenho.
Com base no histórico de publicações internas da Marinha Portuguesa e tanto quanto é do conhecimento dos autores, este é o primeiro estudo de investigação sobre stresse ocupacional realizado na Marinha Portuguesa, com a particularidade de incidir sobre a guarnição de uma unidade naval operacional no decorrer de um exercício de grande envergadura e durante uma missão operacional com meio ano de duração. A sua concretização assume-se como relevante e oportuna considerando a elevada prevalência do stresse ocupacional e, consequentemente, das suas repercussões negativas na saúde e no rendimento dos trabalhadores. Nas Marinhas congéneres, nomeadamente da Índia e da Inglaterra, também têm sido desenvolvidos estudos sobre esta temática, com particular atenção para os submarinistas devido ao seu contexto laboral específico. Pawar A e colaboradores calcularam em dois momentos distintos (2016, n=413; 2011, n=5077) a prevalência de níveis elevados de stresse ocupacional em elementos da Marinha Indiana colocados em navios (24,8%; 66,5%), em unidade em terra (34,5%; 51,6%) e em submarinos (7,7%; 53,7%).10,11 Bridger R e colaboradores calcularam a prevalência de sintomatologia psicológica decorrente da exposição ao stresse ocupacional, como por exemplo ansiedade ou depressão, em 1999, 2004 e 2007 (n= 2194, n=2672, n=4542), no pessoal da Marinha Inglesa e dos Fuzileiros, obtendo taxas globais de 32%, 33,5% e 31,5%, respetivamente.12,13 Brasher K e colaboradores focaram-se na prevalência de stresse ocupacional em submarinistas ingleses comparativamente a outros elementos da Marinha Inglesa e não encontraram diferenças significativas em grupos de caso-controlo.14,15 Wattie S e Bridger R concluíram que o pessoal da Marinha Inglesa e dos Fuzileiros tem melhor perceção das condições de trabalho associadas ao stresse ocupacional do que o pessoal dos outros ramos e do que os civis que trabalham nas Forças Armadas Inglesas.16
As restrições impostas pela aplicação “Questionários online” na resposta ao questionário limitaram a recolha de dados. A obrigatoriedade de aceder ao computador com a conta pessoal e a frequente indisponibilidade da rede de intranet foram os principais fatores dissuasores da resposta após uma ou outra tentativa infrutífera. As dificuldades encontradas foram ultrapassadas pelo envio do questionário utilizando o correio eletrónico institucional com a garantia de confidencialidade e esta acabou por constituir a via preferencial de resposta. Ao todo coligiu-se informação de quase um terço da população. Tal situação, apesar de constituir uma limitação do estudo, é satisfatória considerando o curto intervalo de tempo destinado à obtenção de respostas e o volume de atividades diárias realizadas pela guarnição nesse período.
A proximidade dos valores médios da dimensão “exigência mental do trabalho” entre categorias profissionais indica que os militares, independentemente do seu posto, encaram o seu trabalho com grau similar de exigência. Ainda assim, três quintos dos “sargentos” e três quintos das “praças” enquadram-se numa “exigência mental do trabalho” baixa. Esta realidade pode decorrer da repetição das rotinas laborais diárias e habituação às mesmas, o que a médio e longo prazo propicia a monotonia no local de trabalho.
As diferenças estatisticamente significativas do valor médio da dimensão “controlo do trabalho” entre categorias profissionais, evidencia uma tendência crescente coincidente com a subida na hierarquia militar. Este facto espelha a distribuição preferencial das responsabilidades de orientação versus concretização ao longo da cadeia de comando. Os “sargentos”, contudo, apresentam a maioria dos seus elementos alocada a um “controlo do trabalhador” baixo. Este resultado não era expectável atendendo a que esta categoria profissional recebe delegação superior de tarefas e tem ao seu dispor um conjunto de elementos que pode orientar com alguma liberdade.
O valor médio da dimensão “apoio social no trabalho” também apresenta diferenças estatisticamente significativas entre categorias profissionais a favor dos “oficiais”, mas a maioria dos elementos da cada categoria profissional vivencia um apoio social no trabalho baixo. Estes indicadores podem consubstanciar relações interpessoais deficitárias no local de trabalho, seja por motivos intrínsecos aos vários elementos da equipa de trabalho, seja por efeitos da convivência mantida 24 sobre 24 horas e confinada ao navio por longos períodos de tempo. Nestas análises comparativas importa notar que não foi verificada a homogeneidade das amostras.
Para efeitos de minimização dos riscos do stresse ocupacional, a situação laboral “ideal” conjuga “exigência mental do trabalho” baixa e “controlo do trabalhador” elevado. Importa sublinhar que mais de 60% da amostra estudada não cumpre estes requisitos. Considerando as categorias profissionais, esse valor agrava-se para 66,7% nas “praças”. Além disso, 18,3% da amostra vivenciava o pior ambiente ocupacional, estando os elementos das categorias profissionais “oficiais” e “sargentos” particularmente em risco (27,3% e 28,6%, respetivamente). Estas percentagens devem motivar uma reflexão por parte das chefias militares envolvidas na gestão de pessoal e na saúde naval.
Os resultados obtidos estão intimamente ligados a um contexto operacional particular e não espelham necessariamente a realidade de outros contextos. Ainda assim, o controlo do stresse ocupacional será eventualmente ainda mais importante nos cenários operacionais.
De acordo com Newman e Beehr, as ações ou estratégias para lidar com o stresse ocupacional têm por alvo a organização e o trabalhador, e orientam-se para os seguintes objetivos:17
Prevenção: através do controlo da exposição aos fatores de risco, nomeadamente intervindo na organização do trabalho e no treino dos trabalhadores de diferentes graus de diferenciação;
Identificação e resolução: utilizando técnicas de grupos de gestão de stresse para melhorar a capacidade de a organização reconhecer e lidar com os problemas, quando estes surgem;
Reabilitação: através do suporte e aconselhamento específico aos trabalhadores para os ajudar a lidar com o stresse adequadamente e recuperar relativamente aos problemas existentes.
Kompier e Levi propõem a metáfora do “pé e do sapato” para efeitos da gestão do stresse ocupacional:18
Procurar o sapato certo para o pé certo: o posto de trabalho e o trabalhador como alvos;
Adaptar o sapato ao pé: o posto de trabalho como alvo, mudando o trabalho ou o trabalhador;
Fortalecer o pé para se adaptar ao sapato: o indivíduo como alvo, dinamizando atividades como técnicas de relaxamento, exercício físico e aconselhamento individual ou coletivo.
A importância de intervir sobre a problemática do stresse ocupacional é reconhecida internacionalmente. Neste contexto, a Agência Europeia para a Segurança e Saúde no Trabalho lançou a campanha “Locais de trabalho saudáveis contribuem para a gestão do stresse” em abril de 2014, culminando na realização da cimeira “Locais de trabalho seguros e saudáveis” em novembro de 2015.
Não existem dúvidas de que a evicção ou controlo da exposição ao stresse ocupacional é benéfica para o pleno cumprimento da missão da Marinha Portuguesa.
CONCLUSÕES
O estudo de investigação realizado é inovador e pertinente devido à necessidade de capacitar guarnições do ponto de vista físico e psíquico compatíveis com os elevados níveis de exigência dos cenários operacionais.
Os resultados apresentados sugerem haver espaço para implementação de intervenções que otimizem a gestão do stresse ocupacional nas unidades navais da Marinha Portuguesa - antes, durante e depois das missões, com eventuais benefícios para os militares e, consequentemente, para a instituição.
Este tema deve ser alvo de investigação complementar por parte das entidades, individuais ou coletivas, que têm missão atribuída nos domínios da Segurança, Higiene e Saúde do Trabalho.