Introdução
No conjunto das perturbações mentais as perturbações da ansiedade são as que apresentam maior prevalência. Mundialmente, cerca de 264 milhões de pessoas vivem com perturbações da ansiedade, correspondendo a 3,6% da população mundial. A nível nacional cerca de 16,5% da população sofre de algum tipo de perturbação da ansiedade (Direção Geral da Saúde [DGS], 2014, citado por Aguiar et al.,2022). Situação que se intensificou devido à pandemia provocada pelo vírus SARS-COV-2, em que 26,9% população portuguesa apresenta sintomas ansiosos ligeiros e 23,1% sintomas ansiosos moderados (Aguiar et al., 2022).
A doença mental é responsável por um grande sofrimento na pessoa e nos seus familiares, o que pode conduzir, entre outros sintomas, a estados de ansiedade elevados. Pode apresentar-se como perturbação de base, pode surgir como efeito secundário da medicação ou ser uma comorbidade de outras perturbações. Trata-se de um problema importante, comum e incapacitante para muitas pessoas (Hardy, 2023).
Sendo a ansiedade uma emoção que interfere na realização de qualquer tipo de atividade de vida, quando em níveis elevados, a probabilidade de se manifestar e poder ser considerada uma perturbação aumenta. Desta forma, a pessoa deixa antever a necessidade de uma abordagem clínica para melhorar a sua situação. O Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica (EEESMP) devido ao conjunto de conhecimentos e capacidades/competências que detém, pode desempenhar aqui um papel fundamental, ao avaliar a situação, e investir na implementação de estratégias que diminuam o sofrimento das pessoas.
Uma dessas estratégias passa pela implementação da técnica de relaxamento que como intervenção especializada é “um método, processo, procedimento ou atividade que ajuda a reduzir os níveis de stress, ansiedade ou raiva”, que, em geral, é associado a um sentimento de paz e conforto, com ausência de tensão no corpo e mente (Ordem do Enfermeiros [OE], 2015, p. 17040). Sendo a sua eficácia na população em geral, corroborada pela evidência científica, nomeadamente um estudo realizado com estudantes de enfermagem revelou que a aplicação da técnica de relaxamento efetivou-se na diminuição dos scores médios da State-Trait Anxiety Inventory (STAI) pós intervenção, transpondo-se em ganhos significativos na diminuição da ansiedade (Korkut et al., 2021), demostrando que sua aplicação traduz-se em resultados eficazes e duradouros na diminuição dos sinais e sintomas de ansiedade. Assim, pretende-se com este estudo sistematizar a evidência científica sobre os resultados obtidos com a utilização da técnica de relaxamento, na redução da ansiedade na pessoa com doença mental.
Metodologia
Foi realizada uma revisão integrativa da literatura, com o objetivo de responder à questão de investigação: “Quais os resultados obtidos com a utilização das técnicas de relaxamento na redução da ansiedade na pessoa com doença mental?”. A pesquisa foi realizada na plataforma EBSCOhost (CINAHL Plus with Full Text; MEDLINE with Full Text), usando os descritores: anxiety, anxiety disorders, mental health, relaxation, relaxation techniques, relaxation therapy. Universo temporal entre 2012 e 2022. Critérios de inclusão: (1) artigos com data de publicação entre 2012 e 2022, (2) em língua portuguesa e inglesa, (3) com texto integral disponível e acesso gratuito, (4) estudos cujas amostras incluam pessoas com doença mental estável/crónica ou aguda e com idade igual ou superior a 18 anos, independentemente do sexo, (6) estudos que apresentem resultados do uso das técnicas de relaxamento em ambiente hospitalar ou comunitário. Foram identificados inicialmente 477 artigos, obtendo-se uma amostra final de 7 artigos de acordo com os critérios de inclusão definidos (Figura 1).
Resultados
A amostra final foi constituída por 7 artigos, 1 estudo qualitativo e quantitativo quasi-experimental (Brown et al., 2016), 2 estudos quasi-experimentais (Klainin-Yobas et al., 2016; Shah et al., 2015) e 4 estudos randomizados controlados (Ghadse et al., 2019; Kyrios et al., 2018; Lu et al., 2019; Veling et al., 2021). Os estudos foram realizados nos Estados Unidos da América (EUA), Taiwan, Austrália, Índia, Singapura e Países Baixos. As dimensões das amostras são díspares, desde 18 a 179 participantes. Todos os estudos incluem população com diagnóstico de perturbação mental: ansiedade, stress pós-traumático, depressão, perturbação do humor, esquizofrenia, perturbação obsessivo compulsiva (POC) e outra perturbação psicótica não especificada. Para organização dos dados recolhidos elaborou-se uma tabela para discriminar os elementos mais relevantes de cada artigo, ou seja, uma síntese narrativa (Tabela 1).
Discussão
Dos sete estudos analisados todos corroboram ganhos positivos das diversas técnicas de relaxamento utilizadas, demonstrando-se como eficazes no controlo e redução dos sintomas ansiosos, na diminuição dos sintomas psicóticos e melhoria da qualidade de vida (Lu et al., 2019) e auxiliando no controlo emocional (Brown et al., 2016; Ghadse et al., 2019). A psicoeducação também é referenciada como um complemento bastante eficaz para potencializar os efeitos do relaxamento já que melhora os resultados das aprendizagens através da discussão em grupo e partilha de experiências (Klainin-Yobas et al., 2016). Por outro lado, o recurso à realidade virtual é referenciado como um instrumento fundamental na criação da experiência, durante a prática de relaxamento, produzindo efeitos positivos na audição (Shah et al., 2015; Veling et al., 2021) já que comparando ao relaxamento padrão, o relaxamento com recurso à realidade virtual teve um efeito benéfico mais forte nos sintomas e sinais de ansiedade imediata (Veling et al., 2021).
As evidências do estudo de Kyros et al. (2018) que compara a eficácia de um programa de relaxamento online em relação a um programa de terapia cognitivo-comportamental online, demonstram que o programa de relaxamento muscular online é eficaz na redução da ansiedade, embora menos do que o programa de terapia cognitiva-comportamental online.
Uma das limitações encontradas foi a curta duração dos programas de técnica de relaxamento (Brown et al., 2016; Klainin-Yobas et al., 2016; Sahah et al., 2015) e a curta duração das sessões (Veling et al., 2021), tornando-se necessário realizar um acompanhamento mais prolongado para melhorar a monitorização dos resultados e explorar os seus benefícios a longo prazo.
As evidências encontradas vão de encontro à literatura, pois tendem a apontar tanto para a eficácia da técnica de relaxamento e da farmacoterapia, quanto para a combinação de ambas no tratamento das pessoas com sintoma de ansiedade. Muitas pessoas tomam medicação para diminuir a ansiedade (Slee et al., 2019), tornando-se difícil perceber qual o efeito real das técnicas de relaxamento. Contudo o uso da farmacoterapia deve ser ponderado devido ao elevado risco de dependência deste tipo de fármacos (Slee et al., 2019).
Conclusão
A presente revisão da literatura inclui a análise de 7 estudos com o objetivo de aumentar a compreensão das várias técnicas na redução da ansiedade na pessoa com doença mental. A partir desta análise foi possível obter informações e dados que respondessem à questão de investigação previamente formulada, surgindo resultados positivos relativamente à utilização de diferentes técnicas de relaxamento na redução da ansiedade, em pessoas com doença mental.
Os contributos da investigação desenvolvida e os resultados encontrados neste âmbito indicam que existem diversos métodos que podem ser qualificados como técnicas de relaxamento (muscular, respiração, imaginação guiada, yoga, biofeedback, bodywareness e meditação guiada), tendo como objetivo comum a diminuição dos sinais, sintomas de ansiedade. Devido à ausência de efeitos secundários desta técnica deve-se dar enfâse à mesma em detrimento da terapêutica farmacológica isolada, ou em associação com a mesma nos casos mais graves de perturbação da ansiedade.