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Psicologia, Saúde & Doenças
versão impressa ISSN 1645-0086
Psic., Saúde & Doenças vol.18 no.2 Lisboa ago. 2017
https://doi.org/10.15309/17psd180205
Avaliação psicológica para submissão ao procedimento bariátrico sob um enfoque analítico comportamental
Psychological assessment submission to bariatric surgery under a table of behavioral approach
Yara Justino1,2,*, Anna Paula Sampaio Barbosa1,3, &Felipe Pimentel1,4
1Centro Universitário Católico de Vitória, Vitória - Espírito Santo - Brazil.
2E-mail:yarajustino@hotmail.com.
3E-mail:annapsampaio@gmail.com.
4E-mail:felipecpimentel@hotmail.com
Endereço para Correspondência
RESUMO
A obesidade é um problema de saúde pública mundial, que tem sido discutida nos meios científicos, em busca de novas estratégias de prevenção e combate. Considerando a cirurgia bariátrica como uma alternativa para redução de peso, o presente trabalho objetivou conhecer os processos de avaliação psicológica anterior a esta intervenção, atentando-se para a compreensão do processo de análise funcional do comportamento alimentar. Para ò levantamento das informações foi estruturada uma pesquisa de delineamento bibliográfico em bases de dados vinculadas ao campo da análise do comportamento e materiais sobre avaliação psicológica e cirurgia bariátrica. Os resultados indicaram que essa intervenção pode acarretar alterações significativas no repertório comportamental do sujeito, considerando os diferentes domínios de sua vida como pessoal, afetivo, familiar, profissional e social. Também foram identificadas divergências sobre o estabelecimento de um protocolo que investigue e sistematize os dados referentes ao sujeito, seu repertório comportamental e a expectativa que ele faz sobre a cirurgia. Desse modo, analisa-se que uma avaliação que cumpra com esses critérios pode auxiliar na realização de um acompanhamento psicológico preventivo e interventivo mais eficaz, diminuindo-se os dados negativos cada vez mais incidentes a respeito do pós-cirúrgico.
Palavras-chave: avaliação psicológica, cirurgia bariátrica, análise do comportamento; repertório alternativo.
ABSTRACT
Obesity is a global public health problem, which has been discussed in scientific circles, for new prevention and combat strategies. Considering bariatric surgery as an alternative to weight reduction, the present study aimed to understand the psychological evaluation processes prior to this intervention, with attention to the feeding behavior functional analysis. The survey was structured as a bibliographic research on the field of behavioral analysis, on psychological assessment and bariatric surgery. The results pointed out that such intervention can lead to a significant change in the behavioral repertoire of the subject, considering the various aspects of your life. Besides, it was identified a disagreement about the protocol establishment to investigate and sistematize the data referring to the subject, your behavioral repertoire and the expectation about the surgery for an appropriate psychological evaluation.
Keywords: psychological assessment, bariatric surgery, behavioral analysis, alternative repertoire.
A obesidade é um problema de saúde pública mundial, e que tem sido discutida nos meios científicos, em busca de novas estratégias de prevenção e combate. Segundo Fandiño e colegas (2004), a obesidade é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, incluindo os riscos associados, ou cormobidades como hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes tipo 2, apnéia do sono etc.
Nesse sentido, Francischi (2000) discute que o novo padrão de comportamento alimentar adotado nas últimas décadas, composto por um alto consumo de calorias e de baixo valor nutricional, aliado à diminuição progressiva de atividades físicas, tem contribuído de forma relevante para o aumento do número de casos de obesidade em todo o mundo.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2016) 65% da população mundial, vive em países onde o sobrepeso e a obesidade mata mais que a desnutrição, sendo esta apontada como o quinto maior fator de risco de morte global. Dados da mesma organização indicam que 44% da carga de diabetes, 23% da carga de doença isquêmica do coração e entre 7% á 41% dos encargos de câncer, estão relacionados à obesidade. Além disso, verifica-se que este fenômeno, enquanto estigmatizador produz discriminação, preconceito e exclusão social (Fellipe, 2003), comprometendo dessa forma, também a saúde psicológica e o comportamento social da pessoa.
Assim, considerando os diferentes aspectos relacionados ao fenômeno da obesidade, algumas pessoas começam a buscar por diferentes tipos de tratamento, que venham diminuir o excesso de peso, e possivelmente devolver a elas uma vida mais ativa, saudável e com mais qualidade. Dentre essas soluções destacam-se: dietas, exercícios, drogas como anfetaminas, ansiolíticos e antidepressivos, e em última análise: a Cirurgia Bariátrica.
A intervenção cirúrgica bariátrica é composta por algumas técnicas com respaldo científico, destinadas ao tratamento da obesidade e das doenças associadas ao excesso de gordura corporal ou agravadas por ele. Ela é indicada apenas para pessoas com obesidade grau III, ou seja, IMC igual ou superior a 40 – chamados obesos mórbidos ou portadores de cormobidades (OMS, 2016). Tal procedimento se mostra uma alternativa atrativa, pelo fato de que os obesos mórbidos eram pessoas que mesmo com dietas e tratamentos de outros segmentos, continuavam a engordar de forma desmedida, até falecerem em virtude das comorbidades.
Contudo, apesar de atrativa, a cirurgia bariátrica encontra-se também relacionada a dados negativos no pós-operatório (Fandino, Benchiomol, Coutinho & Apolinário, 2004; Floresi, Machado & Soares, 2006), como suicídio, depressão, dumping, comportamento antissocial entre outros. Dessa forma, tendo em vista as diferentes variáveis que envolvem a obesidade e a dimensão da cirurgia, discute-se a necessidade de processos de avaliação que alcancem maior quantidade possível de aspectos de vida da pessoa, bem como a avaliação de seu repertório atual, à aquisição de comportamentos ao longo de sua vida (mais precisamente seu comportamento alimentar) e suas condições para desenvolver um novo repertório.
De modo geral, observa-se que o paciente que busca pelo procedimento bariátrico, está na maioria das vezes, controlado pelo produto de sua obesidade, isto é, o sentimento de exclusão em situações sociais, a baixa autoestima, o desejo da perda de peso rápida e sem sofrimento, etc. Contudo, sob controle dessas variáveis são produzidas muitas vezes expectativas irreais em relação à cirurgia. Assim, verifica-se a necessidade de avaliar essa expectativa do sujeito com relação ao procedimento, seu repertório para lidar com a nova condição, bem como operacionalizar a função deste comportamento na vida da pessoa, buscando diminuir os possíveis riscos do pós-cirúrgico.
Dessa forma, o presente estudo buscou conhecer os processos de avaliação psicológica anterior a cirurgia bariátrica, a partir de uma revisão na literatura, atentando para a compreensão do processo de análise funcional. Objetivou-se investigar a dinâmica desta avaliação psicológica e as variáveis que estão envolvidas em seus resultados, a fim de fomentar uma discussão a respeito de como tem sido realizadas as avaliações psicológicas anteriores a cirurgia bariátrica - tendo em vista a insipiência da área em especial no que tange á produção e publicação do tema no campo da análise do comportamento.
Para isso, este trabalho foi divido em dois momentos. No primeiro momento, serão apresentados conceitos básicos da análise do comportamento (filogênese, ontogênese e ontogênese cultural), direcionados, mais precisamente as questões que permeiam o comportamento alimentar, para melhor compreensão do leitor. Num segundo momento, serão discutidos os protocolos que envolvem o procedimento cirúrgico bariátrico e os alguns aspectos psicológicos referentes ao pré e pós-operatório. Por fim, será feita uma análise dos dados encontrados na literatura, discutindo-se a partir da perspectiva da análise do comportamento, a avaliação psicológica anterior ao procedimento cirúrgico bariátrico e as contribuições que esta linha teórica pode oferecer no que tange a análise funcional do comportamento alimentar, a construção de uma diretriz avaliativa que auxilie no procedimento de avaliação anterior a cirurgia e no manejo dos dados coletados no que se refere aos pacientes obesos que irão se submeter ao procedimento cirúrgico.
MÉTODO
Esta é uma pesquisa bibliográfica, desenvolvida a partir de um material já elaborado, construído principalmente a partir de artigos científicos (Gil, 2000). Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de trabalho desta natureza, essa é uma pesquisa exclusivamente de fontes bibliográficas, que prezou por uma revisão na área literária.
Foi utilizada como bases de dados, fontes como: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), MEDLINE, Base de Dados Bibliográfica de Psicologia (PSICDOC), Psychological Literature Information (PsycINFO), Index Psi Periódicos, Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC), Scientific Electronic Library Online (Scielo) e Revista Brasileira de Terapia Cognitivo - Comportamental (RBTCC). Além da busca em artigos científicos, também foram realizadas pesquisas em toda a coletânea “Sobre Comportamento e Cognição”, devido a sua importância histórica na produção bibliográfica da Análise do Comportamento no Brasil.
A priori foram pesquisados artigos e trabalhos científicos vinculados aos temas: Obesidade, Comportamento Alimentar e Cirurgia Bariátrica. Depois, foram estabelecidos alguns critérios para refinar a pesquisa e delinear adequadamente o tema, ou seja, trabalhos mais específicos em relação à avaliação para cirurgia bariátrica e os seus aspectos psicológicos, articulados às conseqüências emocionais do procedimento.
Os descritores utilizados nas bases de dados foram: comportamento alimentar; cirurgia bariátrica; compulsão alimentar; conseqüências emocionais da cirurgia bariátrica; avaliação psicológica para cirurgia bariátrica e diretriz avaliativa para cirurgia bariátrica. Tendo em vista o delineamento do trabalho, e a forma como foram conduzidas as pesquisas, foram privilegiadas buscas de dados, a partir de descritores que delimitassem melhor o campo pesquisado, ou seja, visando à obtenção referências bibliográficas mais estreitamente relacionadas com o objetivo da pesquisa. Destaca-se ainda, que todas as buscas foram realizadas entre agosto de 2011 á abril de 2012.
Depois de realizada a revisão bibliográfica, o procedimento adotado foi organizar os dados em categorias analíticas e posteriormente, ensejou-se a análise dos dados de forma descritivo-interpretativa. Dessa forma, exploraram-se os aspectos de maior relevância entre os trabalhos, bem como os pontos incomuns que os perpassavam. A partir disso, os dados foram ordenados, de acordo, com os objetivos da pesquisa, discutidos e analisados a luz da teoria do behaviorismo Radical de B. F. Skinner.
RESULTADOS/ DISCUSSÃO
Análise do Comportamento e Comportamento Alimentar
De acordo com a Análise do Comportamento, ciência fundamentada na filosofia do Behaviorismo Radical, que defende a ideia da multideterminação comportamental dos organismos, identificar as relações funcionais entre padrões comportamentais e variáveis ambientais, através do exame das contingências presentes, se faz relevante na medida em que pode auxiliar o psicólogo a entender alguns comportamentos e sentimentos do cliente obeso, que busca pela intervenção cirúrgica bariátrica (Skinner, 2000) e dessa forma, colaborar com uma avaliação mais consistente, anterior a essa intervenção.
Nesse sentido, para que se possa privilegiar maior quantidade de aspectos possíveis da história de contingências vivenciadas pelo sujeito, e para a compreensão do comportamento alimentar, a análise do comportamento parte da investigação dos chamados níveis de determinação do comportamento humano, ou seja, aquilo que em maior ou menor medida estão sempre relacionados com a emissão ou não de uma dada resposta: filogênese, ontogênese e ontogênese sociocultural, (Andery, 1997).
Especialmente no ser humano, quase todos os comportamentos podem ser caracterizados como apresentando elementos que perpassam estes três níveis. O estudo de um dos níveis freqüentemente exige a identificação do entrelaçamento com elementos dos outros níveis de análise. Entretanto, é comum observar nos estudos a ênfase a um desses três processos, fato que pode levar o pesquisador a um reducionismo em sua análise (Vale & Elias, 2011). Neste contexto, entende-se que o fenômeno da obesidade, assim como qualquer outro evento comportamental, só será adequadamente explicado se sua caracterização englobar esses três níveis determinantes do comportamento.
A filogenia, como sendo o primeiro nível de seleção da espécie a ser discutido, no que tange a análise comportamento alimentar, delineia o repertório de atividades necessárias à sobrevivência de qualquer espécie. Isto é, através de o comportamento alimentar, as necessidades energéticas dos organismos são supridas, possibilitando a manutenção das funções vitais (Vale & Elias, 2011).
A história evolutiva da espécie humana aponta para a existência de um ambiente precário, com pouca disponibilidade de alimentos. Pontua-se que nossos ancestrais sobreviviam basicamente da coleta de frutas e grãos e da caça, com mecanismos rudimentares. Seguindo esta análise, de acordo com Netto (2002) acredita-se que aqueles organismos eficazes no armazenamento de energia sobreviveram.
Assim, considerando o valor de sobrevivência do alimento na história de seleção natural da espécie, Vale e Elias (2011) discutem, partindo de Skinner, seu papel como reforçador incondicionado, isto é, verifica-se como inata a sensibilidade ao alimento como reforçador. Tal sensibilidade biológica, de acordo com os autores, relaciona-se à eliciação de responda\entes de sensações de prazer ao se ingerir os alimentos. Os autores destacam ainda as diferentes sensações, de acordo com a ingestão também diferenciada de alimentos. Neste sentido, alimentos como açúcares, carboidratos e gorduras por terem sido úteis na sobrevivência da espécie, tornaram-se mais capazes que outros grupos de alimentos, tais como, verduras e vegetais na eliciação sensações prazerosas. Desse modo, observa-se a maior propensão de compulsão alimentar em relação a alimentos hipercalóricos.
Partindo dessa análise, observa-se que é comum na prática clínica, o terapeuta observar a utilização da comida como uma estratégia de controle emocional. Isto é, por meio do esquema de reforçamento negativo, a comida pode ser um dispositivo para fugir do contato com emoções aversivas, propiciando contato com reforçadores positivos – o alimento e as sensações produzidas pelo mesmo (Vale & Elias, 2011). Neste sentido, os autores argumentam, partindo de Meyer (2008), que episódios de hiperfagia estão relacionados, em geral, à liberação de opióides endógenos, isto é, neurotransmissores que estão ligados à regulação da ansiedade, humor e mediação das sensações de prazer. De acordo com tal afirmação, analisa-se que ao comer, respondentes reforçadores são eliciados, diminuindo-se a sensação desagradável produzida pelas situações aversivas, em que o cliente possui déficit de repertório ou repertório pouco desenvolvido para lidar, e explicando a manutenção deste repertório de fuga-esquiva ligado a comida.
Desse modo, enquanto no primeiro nível de seleção o foco de análise é a história evolutiva da espécie, no segundo nível de seleção a análise parte da ontogênese, que busca compreender o processo de seleção pelas conseqüências. Skinner (1984) aponta que esse processo coloca “o indivíduo sob controle de ambientes aos quais apenas ele próprio é exposto” (p. 218). Ou seja, as contingências que se discute, têm a ver com a história individual do sujeito. Assim, no que tange ao comportamento alimentar, objetiva-se esclarecer a relação operante estabelecida com o alimento.
Conforme Rossi e colaboradores (2008) o contexto familiar é um dos determinantes para o estabelecimento dos padrões alimentares do sujeito. A família oferece amplo campo de aprendizagem, logo, ao ocorrer um pareamento, entre alimento, que por si só se constitui num reforçador incondicionado como já discutido e reforço social (como afeto, atenção dos pais, etc), a comida passa a poder eliciar respondentes de bem-estar semelhantes aos eliciados por reforço social (Vale & Elias, 2011). Assim, tal condicionamento pode ter sua gênese no contexto familiar, e generaliza-se, posteriormente, para outros contextos.
Considerando essa lógica, Vale e Elias (2011) discutem a partir de Green e Freed (1993) a substituição de reforçadores. Tal possibilidade é importante para a compreensão de Transtornos Alimentares, dentre eles, a obesidade. De acordo com a relação estabelecida na história de vida com a comida, em situações de inabilidade social, controle coercitivo, privação afetiva, entre outros, e considerando também sua função como reforçador incondicionado o paciente obeso pode aprender a substituir e, se esquivar de situações aversivas, pelo valor reforçador da comida. Isto é, se o sujeito não possui repertório suficiente frente a certas contingências, o ato de comer torna-se funcional para ele, que consegue atenuar as sensações aversivas de uma experiência, por exemplo, através do reforço proveniente da alimentação.
Nesta perspectiva, foram encontrados na literatura (Floresi et al., 2009) dados que aproximam o ato suicida ao procedimento bariátrico. Acredita-se que para entender tal incidência, é necessária uma análise da relação que o sujeito estabelece com a comida, isto é, em geral de fuga-esquiva, tal como discutida anteriormente.
Assim, Floresi e colaboradores (2009) analisam o risco de suicídio após a cirurgia bariátrica, ressaltando que principalmente no primeiro ano pós-cirúrgico, observa-se uma maior prevalência de suicídio entre os pacientes. Estressores produzidos tanto na esfera pessoal quanto produto das questões sociais podem ser os principais motivadores do ato suicida, contendo diversas facetas, tais como: a pressão social para rápida perda de peso, a falta de repertório para lidar com situações de exposição social, a dificuldade em lidar com as mudanças físicas consequentes da cirurgia e etc.
O boletim da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa (2008), que avalia tecnologias em saúde, também especula acerca do risco de suicídio na população que se submete à cirurgia bariátrica, aconselhando que se acompanhe o pós-operatório de tais pacientes.
Verifica-se que o risco de suicídio está relacionado com a exposição a contingências aversivas e a falta de repertório de enfrentamento para emitir em tais situações. Ou seja, boa parte do comportamento alimentar em obesos é evocado e mantido por contingências aversivas. Em situações de controle coercitivo, as sensações desagradáveis produzidas por tais contingências, podem ser amenizadas pelo valor reforçador do alimento - tanto incondicionado como condicionado. A longo prazo, essa relação passa a ter um caráter de esquiva. Assim, mecanicamente impedido de comer, ou seja, de utilizar o alimento como estratégia de fuga-esquiva, sem nenhum repertório alternativo para lidar com tal contingência, enxerga no ato suicida uma alternativa extrema na classe de respostas de fuga e esquiva.
Assim, ressalta-se que o comportamento alimentar para os obesos é funcional no sentido de livrá-los do contato com os estímulos aversivos. Desse modo, lidar com as mudanças advindas do processo cirúrgico é algo complexo e que exige repertório alternativo por parte do obeso. Por isso, defende-se que a avaliação deve ser criteriosa e que o acompanhamento psicoterápico pré e pós-cirúrgico, deveria incluir o desenvolvimento de repertórios no cliente, ajudando a diminuir o risco de ideação suicida.
O boletim expedido pela Anvisa (2008) cita uma situação denominada como troca de compulsão, por parte do paciente obeso operado, do alimento para o abuso de drogas lícitas ou ilícitas. Autores de perspectivas teóricas não diretamente ligadas à análise do comportamento como Leal e Baldin (2007) também pontuam acerca do abuso de álcool e outras drogas por parte destes pacientes. Eles afirmam que a comida é tida como “fuga” de angústias e estados emocionais desagradáveis, desse modo, ao passo que tais pacientes, submetidos à cirurgia bariátrica não podem repetir este padrão comportamental frente às situações estressoras, observa-se que novos repertórios de esquiva são selecionados, buscando-se uma saída rápida que amenizem estados corporais desagradáveis, como ocorria na relação com alimento, pelo uso de álcool e drogas. Nestes casos, as drogas oferecem o acesso ao reforço que a comida antes propiciava, logo, o repertório de uso de tais substâncias pode ser selecionado.
No último nível de análise, o terceiro nível de seleção, o enfoque a sedimenta-se nas práticas culturais. Os comportamentos comuns aos indivíduos ao passar do tempo, tornam-se objeto de estudo para que se entenda o quão o comportamento grupal influencia na determinação dos comportamentos individuais, articulando à análise dos transtornos alimentares.
Alguns autores (Stenzel, 2002; Felippe, 2003) têm discutido a obesidade como geradora de estigma, isto é, regras sociais partilhadas por significativa parcela da população. Um corpo que não se encaixa nos padrões de beleza estabelecidos pela sociedade torna-se objeto de preconceito e consequentemente sofre coerção nas interações sociais. Neste sentido, destaca-se o papel da mídia como agente controlador e difusor de informações acerca do que venha a ser um corpo caracterizado como atraente. O padrão de beleza feminino, que outrora preconizava formas arredondadas, atualmente valoriza uma figura de um tipo andrógeno, marcadamente mais magra. Assim, de acordo com Stenzel (2002) a cultura ocidental tende a valorizar fortemente a aparência física, e influenciada por tal padrão, a mídia reforça a ideia da magreza como um objeto de felicidade, competência, autocontrole e satisfação (Andrade & Bosi, 2003).
Conforme destaca Felippe (2003) a magreza tornou-se uma mercadoria vendida em forma de inibidores de apetite, cirurgias, termogênicos (aceleradores do metabolismo), entre outros mecanismos. Dessa forma, cria-se a ilusão de que todos podem se encaixar no padrão de beleza vigente independente das contingências filogenéticas e ontogenéticas. Desse modo, o estigma do corpo magro e belo, desconsidera as variáveis que retroagem sobre o comportamento individual, selecionando e delineando a relação “indivíduo x comida”.
Avaliação Psicológica para Cirurgia Bariátrica e Análise do Comportamento Alimentar
Considerando estas múltiplas variáveis que regem o comportamento alimentar, verifica-se que a cirurgia bariátrica é uma alternativa atrativa para pacientes com estágio de obesidade avançada que não obtiveram êxito em outros tratamentos. Segundo dados do Consenso Latino Americano de Obesidade são mundialmente reconhecidos três tipos técnicas cirúrgicas bariátricas, existindo algumas variações das mesmas para o tratamento de obesidade mórbida. Essas intervenções podem ser divididas em restritivas, disabsortivas e mistas, cada uma com diferentes riscos, resultados e efeitos colaterais (Consenso Latino Americano de Obesidade, 1999). Neste trabalho, trataremos de abordar, de forma geral o procedimento bariátrico.
O Conselho Federal de Medicina (CFM, 2005) apresenta como condição para esta intervenção cirúrgica: Índice de Massa Corpórea (IMC) acima de 40 kg/m² (independentemente da presença de comorbidades); IMC entre 35 e 40 kg/m² (na presença de comorbidades) e IMC entre 30 e 35 kg/m² (na presença de comorbidades que tenham obrigatoriamente a classificação “grave” por um médico especialista na respectiva área da doença) (Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, 2013). Também se faz necessário apresentar idade maior que 18 anos, obesidade estável há pelo menos cinco anos, ausência do uso de quaisquer tipos de drogas e ausência de quadros psicóticos ou demências graves ou moderados.
Quanto aos critérios de exclusão para pacientes candidatos às operações bariátricas, ainda não há um consenso na literatura. Casos de transtornos psiquiátricos, especialmente do humor, ansiosos e psicóticos são comumente considerados contraindicações para o procedimento (Segal & Fandiño, 2002). Parece que frente ao conhecimento científico acumulado até então, não se pode considerar nenhum tipo de contraindicação psiquiátrica absoluta. “O bom senso clínico nos conduz, entretanto, a uma conduta cautelosa em relação a esta situação” (Fandiño et al., 2004).
Dessa forma, partindo de Skinner (2000), que enfatiza a investigação das variáveis externas das quais o comportamento é função, considera-se fundamental que seja realizada a análise funcional do comportamento para predizê-lo adequadamente. Tendo em vista a análise funcional como mote para o trabalho avaliativo (e interventivo), e utilizando-se do estudo das variáveis externas das quais o comportamento é função, o psicólogo tem a oportunidade de obter informações sem a necessidade de avaliações unicamente subjetivas, elucidando hipóteses, que são necessárias à intervenção (Capitão et al., 2005).
Flores (2014) ressalta ainda importância da avaliação das condições psicológicas e emocionais do paciente candidato à cirurgia bariátrica devido às mudanças psicossociais que o procedimento acarreta. Sendo assim, considera-se necessário utilizar-se de técnicas e procedimentos que possam mensurar e conscientizar o paciente, sobre os efeitos da cirurgia na sua vida, especialmente em termos das mudanças em seu repertório comportamental e as dificuldades que isso acarretará. Ciente dessa necessidade, sob a resolução do Conselho Federal de Medicina 1766/05, entende-se como obrigatória a presença do psicólogo na equipe cirúrgica bariátrica (Machado & Morona, 2008). Neste caso, o psicólogo é solicitado a elaborar um documento psicológico, o laudo, a descrever: as condições sociais e emocionais do paciente, a fim de propiciar diagnóstico e prognóstico para inferir aptidão ou não em relação ao procedimento bariátrico, podendo encaminhar o cliente à cirurgia ou aconselhar o acompanhamento psicoterápico antes de concretizar-se tal intervenção (CFP, 2003; Flores, 2014).
Apesar da relevância dessas informações para o reconhecimento do trabalho do psicólogo, ainda existe uma lacuna no tipo de serviços que tem sido produzido nas equipes de avaliação, a respeito do tipo de trabalho que tem sido realizado com esses pacientes, a forma como são selecionados os pontos mais relevantes a serem estudados e os resultados que tornam o paciente apto ou inapto ao processo cirúrgico.
Autores como Elias e Tatmatsu (2007), em um trabalho de mesmo seguimento, também defenderam a necessidade de organização e sistematização do trabalho psicológico e o desenvolvimento e a aplicabilidade de um protocolo de psicologia mais específico para avaliar o paciente candidato a cirurgia bariátrica. Assim, concorda-se com os autores, já que a seleção de critérios claros para uma avaliação consistente se faz relevante, na medida em que podem auxiliar na escolha de estratégias terapêuticas mais adequadas e aumentar a eficiência do procedimento, diminuindo também o tempo, os gastos e os possíveis riscos, como na falta de um repertório alternativo e o impedimento mecânico do comer, comportamentos como o de drogar-se, desenvolvimento de transtornos alimentares ou até mesmo o ato suicida.
Entretanto, também foram encontrados trabalhos defendendo a não criação desses protocolos (Machado & Morona, 2008), mas considerando que cada psicólogo deverá estabelecer o seu processo de avaliação, e para isso utilizará os instrumentos que melhor se adequarem para atingir os objetivos por ele traçados, contudo respondendo sempre, de alguma forma a pergunta inicial: o candidato tem condições psicológicas para se submeter à cirurgia e a todos os procedimentos posteriores, assim como adaptar-se a um novo estilo de vida e relacionamento? (Machado & Morona, 2008). Responder a esta questão é relevante, de forma que a resposta positiva da mesma aponta para o sucesso do pós-operatório e maior adesão por parte do paciente, ao tratamento da obesidade.
Os mesmos autores relatam ainda que “com freqüência observa-se a banalização deste processo de avaliação, com atuação de profissionais descuidados. Infelizmente, não é rara a informação de que alguns psicólogos somente fazem entrevistas ou atendem em somente um horário” (Machado & Morona, 2008, p. 55).
Em virtude do levantamento das avaliações mais utilizadas, foram encontrados alguns procedimentos que se repetem no processo de avaliação do candidato à bariátrica como: entrevistas semiestruturadas com os pacientes (Fandiño, et al., 2004), palestras, atendimento com profissionais psicólogos, participação no grupo de conscientização (Protocolo de funcionamento do CCB do HCFMRP) além de orientação multiprofissional e esclarecimentos de possíveis dúvidas, sendo esses pontos uma espécie de consenso entre os avaliadores.
Os grupos de conscientização e apoio aos obesos foram vistos com freqüência nos materiais pesquisados (Cataneo, Carvalho, Galindo & Preto, 2005; Oliveira & Yoshida, 2006; Leal & Baldin; 2007), ao que parecem, esses grupos acontecem de forma a esclarecer não só as possíveis dúvidas relacionadas à cirurgia, como tornar os candidatos ao processo cirúrgico cientes da dimensão dessa intervenção e das mudanças que poderão sucedê-la. Em geral, nesses grupos é obrigatória a presença de um familiar ou cuidador para auxiliar a adesão do paciente ao tratamento e desmistificar a cirurgia (Protocolo de Funcionamento do CCB do HCFMRP-USP).
Segundo o Manual de Avaliação Psicológica, criado pelo CRP de Curitiba (2008), é considerada importante nesse processo de avaliação, a verificação e correta compreensão dos seguintes pontos: os objetivos do paciente com a cirurgia, a sua condição de saúde geral, o prognóstico de indicação a cirurgia, a adaptação do sujeito ao novo estilo de vida e a verificação de possíveis psicopatologias (Machado & Morona, 2008).
Nesse sentido, verifica-se que para Pasquali (2001) a avaliação em Psicologia, refere-se à coleta e interpretação de informações psicológicas, resultantes de um conjunto de procedimentos confiáveis. Partindo de uma perspectiva behaviorista da definição do autor, entende-se que é necessário coletar e operacionalizar as informações, enfatizando a função dessas variáveis na história de contingências do sujeito e a possibilidade de alterar esses repertórios. Travado (et al., 2004) acrescenta ainda que além da utilização de testes psicológicos, deve-se privilegiar instrumentos como entrevistas semiestruturadas, como alternativas que permitem ao profissional psicólogo a análise do comportamento do cliente e, com efeito, a inferência acerca da existência de alterações psicopatológicas ou de personalidade com significado clínico, descritas como relevantes e, que podem comprometer o tratamento.
Assim, nota-se que uma das preocupações na avaliação psicológica, em relação à cirurgia bariátrica, se constitui na definição do que avaliar (Flores, 2014). Nesse sentido, pontua-se que, a não existência de um protocolo que sistematize esse processo, acaba por deixar os profissionais sem um norte, restando ao pesquisador, apoiado em seus conhecimentos e na sua experiência, questionar a relevância do que deve ser levado em conta para o aconselhamento da intervenção bariátrica ou a restrição da mesma. Travado e colegas (2004) sintetizam que a preocupação no prognóstico por parte do profissional de Psicologia, refere-se à adequação cognitiva e comportamental do paciente ao tratamento.
Autores como Cataneo (et al., 2005) procuram investigar os aspectos psicológicos que relacionam-se à prevalência da obesidade nos indivíduos acometidos por tal doença. Para outros autores como Oliveira (2006) interessa entender o modo de funcionamento psicológico e cognitivo de obesos considerados aptos para cirurgia bariátrica, avaliando estes pacientes nos períodos pré e pós-cirúrgico. O fato é que em tais estudos e, em tantos outros que investigam a situação psicológica no contexto da cirurgia bariátrica, no que tange a possíveis contraindicações psicológicas para este método anti-obesidade, não há consenso (Oliveira et al., 2004).
Pelo fato de não haver perfil psicológico único, partir da observação da heterogeneidade em relação à caracterização psicológica destes pacientes, o processo de avaliação se torna um pouco mais complexo, mas não impossível de ser analisado. Mesmo sabendo desta problemática e levando em conta a multiplicidade dos perfis da pessoa obesa, não se pode desconsiderar a relevância de se estabelecer minimamente delineamentos ou critérios de avaliação, que possam nortear esse processo (Flores, 2014).
Travado e colegas (2004) apresentam um trabalho que propõe um protocolo de abordagem e avaliação psicológica no tratamento da obesidade mórbida. O trabalho, frente a esta problemática, pretende realizar a compressão da obesidade através do acompanhamento pré e pós-operatório. De acordo com os autores, a primeira etapa anterior a cirurgia, se constitui no processo de avaliação psicológica e compreensão do tratamento por parte do paciente. Na avaliação, apresentam-se questionários clínicos e entrevistas semiestruturadas, como forma de obter dados qualitativos acerca da história e do repertório do paciente.
Nesse processo, acredita-se que a análise funcional derivada da entrevista, é uma fonte importante não só de coleta de dados, mas também, instrumento de intervenção. Objetiva-se com esta entrevista, de acordo com Bruscato, Benedetti e Lopes (2004): levantar o histórico da obesidade (causas etiológicas e de estilo de vida), verificar qual a perspectiva e demanda do paciente com o emagrecimento, os recursos cognitivos para enfrentamento do pós-cirúrgico, avaliar se o paciente tem alguma psicopatologia impeditiva para a realização da cirurgia, identificar as funções emocionais do comer, entre outros aspectos relevantes (Bruscato, Benedetti & Lopes, 2004). Após este processo, é importante que o clínico sinalize ao cliente os aspectos fundamentais do tratamento, explicitando os pontos negativos e positivos, informando e instruindo quanto ao procedimento cirúrgico (Travado et al., 2004; Flores, 2014).
Após esta etapa, procede-se à confecção do parecer técnico, aconselhando ou desaconselhando à cirurgia. Como discutido, verifica-se que esta pode ser uma etapa difícil, com relação aos critérios para aconselhar ou desaconselhar o procedimento. Contudo, tendo em vista uma coleta de dados consistente e uma análise ampla e cuidadosa do processo, torna-se mais seguro apresentar um parecer. Ainda de acordo com Travado e colegas (2004) são considerados critérios impeditivos para a realização da cirurgia: clientes que apresentem psicose, alcoolismo, atraso mental e a bulimia nervosa. Ressalta-se ainda que para os autores, após ser considerado apto ao procedimento cirúrgico, sucede-se a internação, e logo depois na etapa pós-operatória indica-se psicoterapia cognitivo-comportamental individual e em grupo, e uma reavaliação psicológica, com aplicação de escalas e testes (Travado et al., 2004).
Guisa de síntese, pontua-se que a avaliação psicológica para os obesos mórbidos que serão submetidos à cirurgia bariátrica é um procedimento de fundamental importância e que aumenta as chances do sucesso no pós-operatório. Além de avaliar o repertório do sujeito este procedimento deve conscientizar o cliente sobre a realidade pós-cirúrgica. Concorda-se com Flores (2014) que quanto mais informado sobre o processo e sobre si mesmo o cliente estiver, mais chance de sucesso terá a cirurgia. A preparação, neste sentido, é peça fundamental, para que o paciente após o processo de emagrecimento desenvolva repertório que possibilite lidar com a nova contingência e seu novo corpo.
Benefícios e Limitações de um Protocolo Avaliativo
Considerando a relevância de um protocolo avaliativo que melhor organize a avaliação psicológica anterior à intervenção bariátrica, articulado a análise do comportamento, verificou-se, a partir da literatura, que além de todos os benefícios que se preconiza, esta sistematização pode trazer também mais segurança e precisão no momento da avaliação.
Analisa-se que, a avaliação psicológica para o obeso, candidato a cirurgia bariátrica se faz necessária, uma vez que a cirurgia produz uma nova contingência com a qual o sujeito entrará em contato, e conseqüentemente que exigirá dele um conjunto de novos repertórios, isto é, novos hábitos alimentares, reorganização da sua auto-imagem e instalação e/ou desenvolvimento de repertórios mais adaptativos e que produzam menos prejuízos (Machado & Morona, 2008).
Nesse sentido, considera-se importante explicitar no momento da avaliação psicológica, a função que o comportamento alimentar apresentava para a adaptação do sujeito às contingências em operação e quais as estratégias poderão ser utilizadas para que novos manejos possam ser desenvolvidos, a fim de cumprir esta função na vida da pessoa. Deste modo, poder-se-ia avaliar se o paciente está apto ou não para o procedimento, a partir de critérios funcionais.
Além disso, junto com a nova formatação corporal, as relações familiares e sociais também sofrem alterações. Então, novos fatores estressores podem surgir. Casos de ciúmes, rivalidades, desejos de liberdade etc. Ou o contrário, muitas vezes, as condições de isolamento, depressão, baixa autoestima (dentre outros) permanece, mas agora sem a possibilidade de utilização da comida como fonte de reforço e esquiva. Assim, a ênfase nesse caso é na necessidade de se analisar, como possivelmente este sujeito irá se comportar após a cirurgia e se ele possui repertório para lidar com essa nova contingência, num trabalho avaliativo consistente, que possibilite mensurar e inferir esses dados de forma abrangente.
Quando se trabalha com comportamento humano, manejam-se possibilidades. Nesse sentido, alicerçar-se em processos mais científicos, que garantam maior consistência e eficácia, aumentam os dados de resultados mais satisfatórios. Como já discutido, por não haver um protocolo de avaliação estabelecido, configuram-se como complexas as situações de contraindicação para cirurgia, pois alguns profissionais psicólogos ficam inseguros em prever a condição de “sucesso psicológico” de uma cirurgia como essa. Também não há pesquisas consistentes sobre os resultados dessas cirurgias, que possam apontar procedimentos e tomadas de decisão a respeito dos candidatos (Machado & Morona, 2008). Alguns autores defendem que um protocolo de avaliação psicológica anterior ao procedimento bariátrico poderia de alguma forma, limitar o profissional, tornando essa avaliação, um processo fechado. Entretanto, outros defendem que o protocolo é um instrumento e não se constitui como “a avaliação completa”. Sua criação seria um suporte – uma forma de predição, um caminho para sistematização dos pontos a serem avaliados e organizados nesse processo, com critérios mais específicos.
Outras considerações a respeito das limitações que os protocolos podem gerar referem-se à possível produção de regras no avaliador isto é, o profissional pode orientar-se especificamente pelo roteiro avaliativo e deixar de se comportar de acordo com a relação terapeuta-cliente, no caso, produzindo, insensibilidade ao fenômeno, desconsiderando a singularidade da pessoa avaliada e caminhando para avaliações tendenciosas, ou seja, onde a partir de quantidades fixas de critérios preenchidos, é estabelecido um diagnóstico. Além disso, a dificuldade em se alcançar toda a dimensão do sujeito, considerando a quantidade de variáveis que deveriam ser avaliadas, bem como a dimensão do fenômeno do comportamento humano, também dificulta a criação de uma diretriz avaliativa, que não deixe inúmeros aspectos altamente relevantes de lado.
A partir da revisão bibliográfica realizada sob o prisma escolhido, verificou-se que não é possível a compreensão do comportamento alimentar, sem a análise daquilo que Skinner chamou de níveis de causalidade do comportamento: Filogênese, ontogênese e ontogênese cultural. A avaliação deve abranger a análise dos aspectos elencados por Skinner e se beneficiaria com uma sistematização (organização dos pontos a serem avaliados) consistente (abranger a maior quantidade possível de aspectos da história de contingências do cliente), para maior garantia de resultados eficazes. Esta seria, então, uma possibilidade para constituição do protocolo de avaliação.
Considerando os dados revisados, foi verificado que para o obeso, em geral, a alimentação é muito mais do que uma necessidade nutricional e de sobrevivência. Ela é vista como fonte de potentes reforçadores positivos (imediaticidade da conseqüência reforçadora), atuando também como reforço negativo ao competir com estados corporais desagradáveis e tem função de esquiva de contingências aversivas.
Assim, quando este paciente busca a cirurgia bariátrica, nota-se muitas vezes sua falta de repertório alternativo, para lidar com a nova contingência, que será o impedimento mecânico de manter seu comportamento alimentar. Esse novo repertório que o paciente terá que desenvolver e a busca por reforçadores alternativos corroboram mais uma vez com a necessidade de se analisar o padrão comportamental do sujeito e daquele que ele terá que desenvolver para lidar com sua nova condição. Do contrário, é notório o risco que existente, em colocar o paciente em contato com a nova contingência e esperar que ele se comporte de forma adequada, ou seja, que ele siga todas as instruções pós-cirúrgicas - comer pouco e de modo fragmentado – com pouca ou nenhuma conseqüência emocional (alcoolismo, uso de drogas ou mesmo o suicídio).
Nesse sentido, verificou-se que, quando o comportamento alimentar funcional do sujeito é impedido, duas classes de comportamentos são emitidas: ou o sujeito desenvolve outro repertório mais adaptativo, sem tantos efeitos colaterais para lidar com os aversivos; ou busca estratégias de esquiva, mais fáceis (principalmente pela mudança direta de estados corporais) como, por exemplo: uso de álcool e drogas. Em última análise, vimos esse sujeito eliminar o contato com o aversivo, também por reforço negativo, ou seja, através do suicídio (Floresi et al., 2009)
Para diminuir o sofrimento do paciente e fazer cumprir toda expectativa que se coloca em tal cirurgia, ou seja, ganhar qualidade de vida, novos estudos devem ser empreendidos, para que se ofereça melhor atendimento aos pacientes candidatos a cirurgia bariátrica, contribuindo para os resultados mais eficazes da cirurgia e a saúde física e psicológica dessas pessoas.
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Endereço para Correspondência
Faculdade Católica Salesiana do Espírito Santo, Departamento de Psicologia, Vitória - Espírito Santo - Brasil. Telf.: (27) 99690-2048. E mail:yarajustino@hotmail.com
Recebido em 29 de Dezembro de 2014
Aceite em 16 de Março de 2017