Introdução
O acesso ao ensino superior é caracterizado por uma massa estudantil cada vez mais heterogénea, exigindo das instituições a necessidade crítica de responder às mais diversas instâncias. Com o ingresso neste nível de ensino, o estudante depara-se com um conjunto de novos desafios académicos, mas também pessoais, nomeadamente o distanciamento de familiares e amigos, gestão do seu tempo e recursos, entre outros (Casanova et al., 2020). A conjugação destes fatores pode representar um período complexo e desafiador, uma vez que transporta o aluno para uma nova realidade quotidiana.
Atendendo à multiplicidade de constrangimentos pessoais e académicos que esta nova etapa impõe, esta situação poderá, ocasionalmente, resultar no abandono ou evasão escolar (Ferreira et al., 2019). O abandono escolar pode definir-se pela desistência de um aluno sem concluir o grau de ensino que frequenta, motivado por diferentes condicionalismos que não incluam a sua transferência ou uma situação de gravidade, como o seu falecimento (Benavente et al., 1994), incluindo a sua desvinculação do ensino superior (Casanova, 2018).
Este fenómeno pode acarretar consequências nocivas que se poderão repercutir ao longo da vida, principalmente num contingente tão competitivo em que a formação académica é cada vez mais valorizada. Uma vez que a escolaridade favorece de modo positivo as perspetivas económicas e sociais dos indivíduos, importa conhecer, antecipadamente, fatores que influenciam os motivos de intenção do abandono escolar, sendo este o objetivo primordial do presente estudo.
Enquadramento
O abandono no ensino superior é uma problemática complexa e dependente de múltiplos fatores (Casiraghia et al., 2022). No caso particular de Portugal, esta é uma situação premente, uma vez que, de acordo com os últimos dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), referentes ao ano letivo de 2020/2021, estes indicam um aumento de abandono de estudantes do 1.º ano da licenciatura de 10,8%, representando aproximadamente um aumento de 2% face ao ano anterior (DGEEC, 2022). Neste contexto, e atendendo à diversidade dos estudantes que ingressam e frequentam o ensino superior em Portugal, importa apurar de que forma distintas variáveis ligadas ao foro pessoal dos estudantes podem influenciar os motivos de intenção de abandono escolar. Estes fatores poderão estar associados às suas características sociodemográficas ou competências de ordem emocional. O bem-estar e as relações interpessoais estão dependentes não só das dimensões cognitivas individuais, mas também de competências emocionais e sociais (Faria & Santos, 2006).
No contexto académico, um fator relevante prende-se com a perceção da performance de aprendizagem, ou seja, a autoavaliação dos estudantes relativamente aos conhecimentos adquiridos, às competências desenvolvidas, e o seu esforço (Young et al., 2003). Outro fator pertinente para a investigação relaciona-se com as vivências académicas dos estudantes. As diferentes experiências em ambientes académicos podem resultar em distintos impactos para cada estudante. No ensino superior, esta variável poderá ter um efeito decisivo e influenciador dos motivos de intenção de abandono escolar.
Questão de investigação
Quais os possíveis motivos de intenção de abandono escolar nos estudantes do ensino superior, em Portugal?
Metodologia
O presente estudo é quantitativo, transversal, descritivo-correlacional e analítico e foi realizado com uma amostra não probabilística por conveniência de 1175 estudantes do ensino superior, em Portugal. Os dados foram recolhidos entre janeiro e setembro de 2020, através de questionários online. Os participantes apresentavam uma idade mínima de 17 anos e máxima de 40 anos (M = 20,39; DP = 3,30). O sexo masculino representava 30,7% (n = 361) da amostra e o sexo feminino 69,3% (n = 814). A grande maioria dos participantes (67,1%) encontrava-se deslocado da sua residência habitual ao frequentar o curso. Quanto a benefícios sociais para a frequência do ensino superior, 39,5% recebia bolsa de estudo, 6% usufruía de alojamento no campus e 1,9% recebia apoio social de bolsa de estudo e alojamento. No que se refere à habilitação dos pais, apurou-se que, no caso do pai, a maioria (41,4%) possuía o ensino básico, ou seja, até ao nono ano de escolaridade, seguida dos que possuíam o ensino secundário, até 12 anos de escolaridade (36,1%) e o ensino superior (21,6%). No caso da mãe, as habilitações distribuíram-se pelo ensino secundário (36,3%), ensino básico (34%) e ensino superior (28,7%).
Para a consecução dos objetivos definidos foi construído um questionário dividido em diferentes secções, com recurso a escalas já validadas. A secção A é composta por 11 questões que visam identificar o perfil sociodemográfico dos estudantes. A secção B apresenta a Escala de Performance de Aprendizagem adaptado de Young et al. (2003). Esta, é uma escala unifatorial composta por seis itens, cuja resposta é avaliada numa escala tipo Likert de 5 pontos (1 = extremamente baixo e 5 = extremamente elevado) que inclui itens, como “O conhecimento que adquiriu”, ou “O esforço que despendeu”. A secção C inclui a Escala de Motivos de Intenção de Abandono do Ensino Superior de Ambiel (2015), tendo por objetivo avaliar os potenciais motivos para a desistência do curso. A escala apresenta quatro dimensões: (i) dimensão Organizacional - abrange a relação com a instituição de ensino e comunidade académica, reunindo itens como “A instituição não oferece nenhum programa de acompanhamento pedagógico”, ou “A falta de assistência da coordenação do curso”; (ii) dimensão Gestão da vida - engloba componentes ligados à gestão do tempo e responsabilidades individuais, agrupando itens como “Assumir novas atribuições profissionais que impossibilitem a continuidade dos estudos”, ou “Trabalhar no mesmo horário das aulas”; (iii) dimensão Profissional/carreira - está relacionada com as perspetivas profissionais futuras do aluno, incluindo itens como “Perceber que o curso poderá não ajudar a conseguir um bom emprego no futuro”, ou “A carreira não ser como eu achava que seria”; (iv) dimensão Relacional - remete para as relações interpessoais e perceções sociais do estudante, incluindo itens como “Ter uma classe social diferente dos meus colegas”, ou “Perceber que as pessoas pensam de uma forma muito diferente de mim”.
A secção D expõe a Escala de Competências Emocionais de Takšić (2000), adaptada, para Portugal, por Faria e Santos (2006). Esta, é composta por 45 itens, medidos numa escala de Likert, de 6 pontos, entre nunca e sempre e distribuídos por quatro fatores: (i) perceção emocional, “Torna-se difícil encontrar um colega que me ajude num problema pessoal”; (ii) expressão emocional, “Sinto-me envolvido/a no curso que frequento”; (iii) capacidade em lidar com a emoção, “Conheço bem os serviços existentes no meu instituto politécnico”; e (iv) investimento emocional, “Sinto confiança em mim próprio/a”. Os valores mais elevados na cotação da escala revelam uma maior inteligência/competência emocional por parte do estudante inquirido.
A seção E contém a versão reduzida do Questionário de Vivências Académicas (QVA-r) de Almeida et al. (1999), cujo propósito é o de apurar como os estudantes se adaptam às exigências e expetativas da vida académica. Possui 60 itens de resposta, medidos numa escala tipo Likert de 5 pontos (1 = totalmente em desacordo e 5 = totalmente de acordo). Comporta cinco dimensões - Pessoal, Interpessoal, Carreira, Estudo, Institucional - consideradas pelos autores como determinantes para a adaptação dos estudantes ao ensino superior. A dimensão Pessoal incide na ligação com o self, na forma como os estudantes percecionam o seu bem-estar físico e psicológico e inclui itens como “Tenho momentos de angústia”, ou “Sinto-me fisicamente debilitado”. A dimensão Interpessoal engloba vivências relacionadas com as relações e o envolvimento em atividades extracurriculares e inclui itens como “Faço amigos com facilidade na minha escola”, ou “Os meus colegas têm sido importantes no meu crescimento pessoal”. A dimensão Carreira envolve as expetativas do aluno assim como a sua adaptação ao curso que frequenta, incluindo itens como “Tenho boas competências para a área vocacional que escolhi”, ou “Sinto-me envolvido/a no curso que frequento”. A dimensão Estudo engloba componentes relacionados com métodos de estudo do aluno e a sua gestão de tempo, reunindo itens como “Sinto-me em forma e com bom ritmo de trabalho”, ou “Consigo ter o trabalho escolar sempre em dia”. A dimensão institucional centra-se na relação com a própria instituição de ensino, seja no interesse pela mesma, seja na perceção da qualidade das estruturas e serviços prestados, reunindo itens como “Gosto da escola de frequento”, ou “Gostaria de concluir o meu curso na instituição que agora frequento” (Almeida et al., 1999).
Os dados do presente estudo inserem-se no âmbito do projeto “Sucesso Académico no Ensino Superior: Competências Emocionais e Prevenção do Abandono”. Para a sua análise recorreu-se à estatística descritiva e analítica ou inferencial, com o apoio do programa IBM SPSS Statistics, versão 25.0 para Windows. Com a estatística descritiva determinaram-se as medidas resumo, tais como médias, desvios-padrão e coeficiente de variação e medidas de associação, como o coeficiente de correlação de Pearson para analisar o grau de associação entre as variáveis em estudo. A análise inferencial efetuou-se com recurso à estatística paramétrica, concretamente através da regressão linear múltipla. Como método usado para seleção das variáveis independentes optou-se pelo método stepwise, que gera tantos modelos quantos os necessários até à determinação das variáveis preditoras. A variável sexo foi transformada em variável muda (dummy), atribuindo-se o valor 1 ao sexo masculino e 0 ao sexo feminino. Os modelos finais gerados foram, entretanto, submetidos à análise de equações estruturais através do programa Analysis of Moment Structures (AMOS), versão 25 para Windows. Todas as escalas foram objeto do estudo de consistência interna através do cálculo do alfa de Cronbach (α), considerando-se como valores de referência os estabelecidos por Pestana e Gageiro (2014) e Coutinho (2014). O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética do Instituto Politécnico de Viseu (Parecer n.º 08/2017). A investigação assegurou o direito à privacidade, à discrição e anonimato dos participantes, bem como à participação consentida, voluntária e informada, na observância da salvaguarda da proteção dos dados pessoais.
Resultados
A Tabela 1 sintetiza os resultados dos índices de consistência interna (alfa de Cronbach) das escalas utilizadas no estudo. A Escala de Performance de Aprendizagem (Young et al., 2003) apresenta um coeficiente de 0,813. A Escala de Motivos de Intenção de Abandono Escolar do Ensino Superior revela um coeficiente global de 0,938, situando-se os valores dos respetivos fatores acima de 0,809. A Escala de Competências Emocionais apresenta um coeficiente global de 0,909 e, por fatores, valores acima de 0,712. A Escala de Vivências Académicas possui um coeficiente global de 0,849 e, por fatores, valores acima de 0,734.
Escalas | Alphas de Cronbach |
---|---|
Motivos de Intenção de Abandono Escolar | 0,938 |
Fator 1_Dimensão Organizacional | 0,876 |
Fator 2_Dimensão Gestão de Vida | 0,834 |
Fator 3_Dimensão Profissão/Carreira | 0,862 |
Fator 4_Dimensão Relacional | 0,809 |
Performance de Aprendizagem (unifatorial) | 0,813 |
Competências Emocionais | 0,909 |
Fator 1_Perceção Emocional | 0,843 |
Fator 2_Expressão Emocional | 0,863 |
Fator 3_Capacidade de lidar com a emoção | 0,712 |
Fator 4_Investimento Emocional | 0,802 |
Vivências Académicas | 0,849 |
Fator 1_Dimensão Pessoal | 0,873 |
Fator 2_Dimensão Interpessoal | 0,850 |
Fator 3_Dimensão Carreira | 0,863 |
Fator 4_Dimensão Estudo | 0,828 |
Fator 5_Dimensão Institucional | 0,734 |
O estudo da relação entre as dimensões inerentes à variável dependente, motivos de intenção de abandono escolar (Organizacional, Gestão de vida, Relacional e Profissional/carreira) e as variáveis independentes foi efetuado com base numa regressão linear múltipla. Este, é considerado o método mais utilizado quando se pretende analisar, em simultâneo, a relação entre uma variável dependente e duas ou mais variáveis independentes, de natureza quantitativa.
Apresentam-se os modelos refinados (Figuras 1 a 4), que comportam as variáveis preditoras para cada dimensão dos motivos de intenção de abandono escolar gerados pelo programa AMOS. Na dimensão Organizacional, foram quatro as variáveis independentes que se apresentaram como preditoras (Figura 1). No total, o conjunto destas variáveis explica 4,0% da variância. Os coeficientes padronizados Beta indicam que a performance de aprendizagem estabelece uma correlação negativa e as restantes variáveis uma correlação positiva, o que significa que, com o aumento dos índices da perceção emocional e da variável pessoal e a diminuição dos índices da performance, aumentam os índices da dimensão Organizacional. A variável com maior valor preditivo para a dimensão Organizacional é a performance de aprendizagem e a que revela menor valor preditivo é a perceção emocional da Escala de Competências Emocionais.
Para a dimensão Gestão de Vida são quatro as variáveis que se manifestaram como preditoras e que explicam, no total, 4,0% da variância (Figura 2). Os coeficientes padronizados Beta indicam que o sexo e a performance de aprendizagem estabelecem uma correlação negativa, enquanto a idade e a carreira uma correlação positiva. Significa, portanto, que os estudantes do sexo feminino com mais idade, com menores índices na carreira e de performance de aprendizagem tendem a revelar melhores índices na dimensão gestão de vida.
Na dimensão Relacional, foram cinco as variáveis que se manifestaram como preditoras (Figura 3). No seu conjunto, estas variáveis explicam 6,0% da sua variabilidade. Os coeficientes padronizados Beta indicam que as variáveis pessoal e estudo se associam positivamente à dimensão Organizacional, enquanto as restantes variáveis apresentam uma correlação negativa. Neste sentido, poderá afirmar-se que ao aumento dos valores das duas primeiras e diminuição dos valores das restantes variáveis corresponde um aumento dos motivos de intenção de abandono ligados à dimensão Relacional.
Por último, a dimensão Profissional/carreira apresenta cinco variáveis preditoras para os motivos de intenção de abandono escolar (Figura 4) que explicam, no seu total, 5,0% da variabilidade. Analisando os coeficientes padronizados Beta verifica-se que as variáveis pessoal e estudo se associam positivamente com a dimensão Profissão/carreira, enquanto as restantes variáveis estabelecem uma correlação negativa, o que significa que a maiores índices nas variáveis pessoal e estudo e menores nas restantes variáveis correspondem maiores índices nos motivos de intenção de abandono ligados à dimensão Profissional/carreira.
Discussão
Os dados apresentados revelam a existência de diversas variáveis de cariz pessoal e académico que se manifestaram como preditoras dos motivos de intenção abandono escolar no ensino superior. Apesar de os dados estatísticos publicados (Instituto Nacional de Estatística, 2021) indicarem uma maior tendência por parte dos estudantes do sexo masculino para o abandono escolar global, os resultados obtidos relativamente às intenções de abandono apontam em sentido inverso. Tal facto poderá estar relacionado com as características inerentes à amostra estudada. Como se constatou, os estudantes do sexo feminino reconhecem como motivos de intenção importantes para o abandono escolar aspetos ligados com a dimensão Gestão da vida, na qual se poderão envolver motivos relacionados com a capacidade de gestão de tempo e balanceamento da vida pessoal e escolar, rendimentos e disponibilidade financeira.
Esta relação sugere constrangimentos sociais que poderão porventura estar associados às problemáticas culturais de género. De acordo com o Boletim Estatístico de Igualdade de Género em Portugal de 2021 (Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género & Unidade de Apoio à Estratégia e Planeamento, 2022), o peso das responsabilidades familiares é ainda mais evidente em indivíduos do sexo feminino. Ainda a acrescentar que, apesar de existir uma maior permanência de mulheres no ensino superior, o desemprego afeta mais indivíduos do sexo feminino. Nesta mesma dimensão, a idade também se apresenta como variável sociodemográfica preditora. Este resultado pode justificar-se uma vez que estudantes mais velhos detêm, habitualmente, maiores responsabilidades profissionais e familiares (Quintas et al., 2014).
Na dimensão Profissional/carreira, mais direcionada para as perspetivas profissionais futuras, as estudantes revelam que as fracas possibilidades de carreira, a perspetiva de baixos salários e oferta limitada, são motivos relevantes para o abandono escolar. A valorização atribuída por parte das estudantes a estes motivos de intenção para o abandono poderá eventualmente relacionar-se com as diferenças salariais entre géneros ainda evidenciada, de acordo com o Boletim Estatístico de Igualdade de Género em Portugal de 2021 (Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género & Unidade de Apoio à Estratégia e Planeamento, 2022). No entanto o nosso estudo não comprova uma ligação causal. Estes fatores alertam para a necessidade de iniciativas e políticas públicas que viabilizem a manutenção de trabalhadores-estudantes, assim como de estudantes com dependentes.
A performance de aprendizagem figura nos resultados como variável preditora nas quatro dimensões dos motivos de intenção de abandono escolar no ensino superior, estabelecendo uma relação negativa. Este resultado indica que a menor performance de aprendizagem está associada a motivos de abandono escolar mais presentes. Esta relação demonstra a valorização atribuída pelos estudantes às competências desenvolvidas e aos conhecimentos adquiridos, assumindo-se como um fator global preponderante nos motivos de intenção de abandono escolar.
No âmbito das competências emocionais, a única dimensão que se manifestou como preditora dos motivos de intenção de abandono escolar foi a Perceção emocional, tendo-se apurado existir uma relação positiva e significativa com a dimensão Organizacional. O resultado obtido remete para os motivos de intenção de abandono associados à relação com a instituição de ensino frequentada e comunidade académica.
A perceção emocional compreende a capacidade de reconhecer emoções (Ariza-Hernández, 2017) e, nesse sentido, o resultado sugere que no caso de o estudante percecionar sentimentos negativos, principalmente quando estes sejam acerca da instituição de ensino, tal pode ter um maior impacto nos motivos de intenção de abandono escolar.
As vivências académicas foram as variáveis que se manifestaram como as mais relevantes na predição dos motivos de intenção do abandono escolar. Com exceção da dimensão Interpessoal, todas as restantes evidenciaram uma relação significativa com os diferentes motivos. A dimensão Pessoal remete para a perceção dos estudantes relativamente ao seu bem-estar físico e psicológico, assim como para sentimentos negativos, como por exemplo, tristeza, confusão e angústia. De acordo com os resultados, estes sentimentos reforçam os motivos de abandono ligados às dimensões Relacional, Profissional/carreira e dimensão Organizacional. Verifica-se, deste modo, a necessidade de uma maior atenção e reforço de medidas de manutenção do bem-estar e suporte emocional dos estudantes, com especial incidência na fase inicial deste novo ciclo de ensino.
O estudo avalia a capacidade de organização e concretização do trabalho escolar. Os dados obtidos sugerem a existência de uma relação positiva e significativa desta variável com os motivos de intenção de abandono ligados às dimensões Organizacional, Profissional/carreira e Relacional. Tal, sugere que os estudantes que pontuam mais no estudo, e que estão mais envolvidos nas atividades de índole curricular, estarão mais sensíveis à apreciação das dimensões dos motivos para abandono escolar referidas, apresentando também valores mais elevados nestes parâmetros.
Por último, a dimensão carreira da Escala de Vivências Académicas relaciona-se negativamente com a dimensão Profissional/carreira e a dimensão Relacional dos motivos de intenção de abandono escolar, indicando que quanto menos o curso corresponder às expetativas atuais e futuras do estudante, e quanto menor o seu envolvimento académico com o curso frequentado, maior serão os seus motivos de intenção de abandono no que concerne às suas perspetivas profissionais futuras, assim como a sua relação com os outros. Estes dados apontam para a necessidade de uma maior e prévia orientação vocacional antes da entrada no ensino superior, a fim de os estudantes serem direcionados para cursos superiores que se coadunem com as suas expetativas académicas e profissionais. Esta dimensão correlaciona-se ainda positivamente com a dimensão Gestão de vida dos motivos de intenção de abandono escolar. Os dados sugerem que os estudantes com maiores índices na dimensão Carreira, que inclui um maior investimento no curso e perspetivas de realização profissional, estarão mais propensos aos motivos de intenção de abandono escolar ligados à gestão de vida.
O estudo apresenta algumas limitações que se centram sobretudo nas características e tipo de amostra, nomeadamente uma acentuada predominância de participantes do sexo feminino e o seu carácter não probabilístico, o que impossibilita a generalização dos resultados.
Conclusão
O abandono escolar é um fenómeno cujas causas são multidimensionais. Compreender os fatores preditores do abandono escolar no ensino superior é fundamental, na medida em que pode contribuir para melhores condições de adaptação e de desempenho dos estudantes, aumentando a sua permanência e sucesso académico. Considerando os resultados deste estudo, sugere-se a criação de medidas de mitigação do abandono escolar, nomeadamente a implementação de programas de mentoria, uma vez que que se trata de um grupo tão heterógeno, com diferentes necessidades tanto a nível pessoal como académico. De acordo com os resultados do presente estudo, a intenção de abandono escolar é influenciada pela idade e sexo e pela dimensão pessoal e perceção emocional da qualidade de vida académica, pelo que estas variáveis devem ser consideradas nos planos de intervenção promotores de afiliação institucional preventivos do abandono do ensino superior. Sugere-se ainda um maior envolvimento/acompanhamento dos professores aos estudantes, visando o incremento da performance de aprendizagem. Importa, também, relevar a necessidade de um suporte continuado, tanto no ensino secundário como no ensino superior, como forma de gestão de expetativas, contribuindo assim para o seu desenvolvimento pessoal e académico. De salientar, ainda, a relevância de um maior investimento na promoção do bem-estar e das competências emocionais dos estudantes no sucesso académico, sugerindo-se a oferta de atividades formativas que respondam a este desiderato.