Introdução
Atualmente, a humanização é entendida como a valorização dos sujeitos envolvidos no processo de saúde/doença, e por conseguinte sustentada no profundo respeito pelas características pessoais, sentimentos e valores de cada um. (Morais, 2016).
A humanização do atendimento em saúde, exige dos profissionais sobretudo da área de enfermagem, o conhecimento técnico-científico e treino, para satisfazer com qualidade as necessidades da população nas diversas fases e contextos da prestação de cuidados e ao longo do ciclo de vida, garantindo um envelhecimento com maior autonomia e independência (Vieira e Almeida, 2020).
A par do envelhecimento da população, o aumento de praticantes de desporto de lazer, o aumento da prevalência da obesidade e o alargamento das indicações cirúrgicas, são razões que conduzem a processos artrósicos e que, por conseguinte, o número de cirurgias continuará a crescer. Paralelamente, o encurtamento do tempo de internamento, induz processos de reabilitação ambulatória, precoces e prolongados (Luthi, 2015).
A enfermagem de reabilitação é uma área de intervenção clínica conhecida, que traz ganhos em saúde em todos os contextos da prática, expressos na prevenção de incapacidades e na recuperação das capacidades remanescentes, habilitando a pessoa a uma maior autonomia (Ordem dos Enfermeiros, 2018).
Por este motivo, a equipa de enfermagem de reabilitação do serviço de ortopedia da Unidade Local de Saúde da Guarda (ULSG) implementou o Projeto “Habilitar” (Saraiva, 2020), com o objetivo de melhor capacitar os doentes submetidos a Artroplastia total da Anca (ATA) e Artroplastia total do Joelho (ATJ).
Na sequência da abordagem ao doente incluído neste projeto, torna-se imperioso avaliar o grau de satisfação dos doentes com os cuidados de Enfermagem de Reabilitação, considerando as expetativas do doente no que respeita à “Qualidade no atendimento” e ao “Ambiente terapêutico”.
O objetivo deste estudo é avaliar o grau de satisfação dos doentes submetidos a ATA e ATJ, relativamente ao programa de reabilitação motora, implementado pelos Enfermeiros Especialistas em Enfermagem de Reabilitação (EEER), no âmbito de um projeto de intervenção clínica atrás mencionado.
1. Enquadramento teórico
O envelhecimento é um processo natural e com o avanço da idade surgem diversos problemas, sendo o sistema locomotor o mais prejudicado. Das doenças articulares, a osteoartrose é a mais comum em pessoas com idade superior a 65 anos. Trata-se de uma doença irreversível que resulta na degeneração da cartilagem da articulação levando ao seu desgaste progressivo, tanto do joelho como da anca. O agravamento desta doença leva ao aparecimento de dor e deformação, condicionando uma diminuição marcada da capacidade funcional da pessoa e da sua qualidade de vida (Pedro, 2019).
Existem várias recomendações que se devem adotar, nomeadamente medidas de tratamento farmacológico e/ou medidas de tratamento não farmacológico como a perda de peso, alterações de estilo de vida e exercício físico. Quando estas medidas não são suficientes para atenuar a sintomatologia, a decisão cirúrgica de artroplastia pode ser uma opção viável para processos de orteoartrose avançada da anca e joelho.
Sendo a cirurgia ortopédica a opção de tratamento, compete à equipa de EEER, avaliar as incapacidades adquiridas e as capacidades preservadas, promovendo o potencial de reabilitação da pessoa, oferecendo-lhe condições que lhes permitam ultrapassar um processo de transição com confiança (Florentino, 2012).
A qualidade da assistência em contexto de doença, pode traduzir-se num elemento influenciador da satisfação dos utilizadores dos cuidados de saúde, portanto, é um indicador importante e legítimo da qualidade dos cuidados em saúde.
O Instituto de Medicina dos Estados Unidos, citado por Pereira (2009, p.80) define qualidade em saúde como “…o grau em que os cuidados de saúde prestados aos indivíduos e populações promovem os resultados desejados e são consistentes com o conhecimento profissional mais atual”.
Segundo Johansson (et al.) referindo-se a Eriksen e Risser, citado por Silva (2013, p.31), o conceito de satisfação pode ser definido como “a avaliação subjetiva da pessoa de acordo com a sua perceção cognitiva e emocional resultante da interação entre as suas expectativas de cuidados e a sua perceção dos cuidados realmente recebidos”.
A satisfação do doente é particularmente vital para o sucesso da reabilitação, uma vez que a sua participação ativa e cooperação sustentada, são fundamentais para a melhoria e aprendizagem de novas competências. A obtenção de elevados índices de satisfação dos doentes, comprometem os gestores dos programas, na adoção de esforços que potenciam a melhoria dos serviços prestados. (Aboabat e Qannam, 2017).
Atualmente existem muitas lacunas na demonstração de evidência no que concerne a estratégias para a melhoria de qualidade. A própria auscultação dos doentes sobre os cuidados de saúde prestados é escassa (Campos citado por Silva, 2013).
A Ordem dos Enfermeiros (2018) define oito categorias de enunciados descritivos de qualidade de exercício profissional, entre os quais a “satisfação dos clientes”, com o intuito que os mesmos constituam um instrumento importante que ajude a precisar o papel dos enfermeiros junto dos doentes, dos outros profissionais e do público em geral.
A enfermagem de reabilitação constitui uma área de intervenção especializada que decorre de um corpo de conhecimentos e procedimentos específicos, que têm por foco de atenção a manutenção e promoção do bem-estar e da qualidade de vida, a recuperação da funcionalidade, tanto quanto possível, através da promoção do auto-cuidado, da prevenção de complicações e da maximização das capacidades, dando resposta a todos os enunciados descritivos. Desta forma, é “de extrema importância ser capaz de definir, medir e avaliar a qualidade dos cuidados de saúde prestados, a fim de manter e aumentar a satisfação do paciente” (Johansson, Oléni &Fridlund citados por Silva, 2013, p.16).
Os cuidados especializados de Enfermagem de Reabilitação devem ser alicerçados no respeito pelas capacidades, crenças, valores e desejos da natureza individual do doente. Também o respeito pela autonomia da pessoa no processo de reabilitação, o reforço e elogio relativamente aos objetivos do programa de reabilitação alcançados, o esforço desenvolvido pelo doente para os atingir, bem como a discussão e análise do processo de cuidados de enfermagem de reabilitação com o doente e pessoas significativas são aspetos que contribuem positivamente para a satisfação do doente. (OE, 2019).
Os resultados da investigação levada a cabo por Gomes (2008) apontam inexoravelmente para um maior contributo da formação especializada, resultando esta numa maior apropriação, por parte dos EEER, de uma conceção de cuidados, sustentada numa conceptualização científica dos cuidados. Por sua vez, a melhor prática de cuidados é expressa com um elevado grau de satisfação.
Segundo a OE (2010), perante as necessidades de intervenção especializada junto de um doente, o desenvolvimento de programas cujos objetivos assentam na qualidade dos cuidados prestados, contribui para a melhoria da qualidade vida do doente facilitando a sua reintegração e participação ativa na comunidade.
O projeto “Habilitar” visa a implementação de um programa de intervenção que possui como condição essencial, uma prévia e correta avaliação inicial dos doentes, com o propósito de proporcionar cuidados adequados às necessidades de cada um, de forma a obterem o benefício de um programa estruturado de reabilitação e apresentarem uma clara recuperação da Independência Funcional pós cirurgia.
Este projeto está direcionado para os doentes submetidos a ATA e ATJ em contexto de cirurgia programada, contemplando várias fases, estabelecidas sequencialmente. A primeira fase consiste numa abordagem em contexto de Pré-Internamento, na qual é realizada uma visita domiciliária a todos os doentes, com o objetivo de ensinar, instruir e treinar, relativamente a aspetos relacionados com a intervenção cirúrgica e o respetivo processo de reabilitação. Nesta fase são também envolvidos os respetivos cuidadores informais.
Lucas, Cox, Perry, & Bridges (2013) reforçam a importância da educação pré-operatória do doente, enfatizando o aconselhamento e as intervenções pré-operatórias, criando, desta forma, um ambiente facilitador na recuperação dos doentes, com vista à melhoria da funcionalidade.
A segunda fase diz respeito ao Pós-Operatório, ainda em contexto de internamento, em que é dada ênfase a uma reabilitação ativa, cujos objetivos são a aquisição de mobilidade e de capacidades funcionais que permitam um regresso, o mais rapidamente possível ao domicílio. A totalidade dos doentes beneficia de um programa diário de exercícios de reabilitação protocolado no serviço. A preparação para a alta, com ensinos adaptados ao contexto do doente e entrega de panfletos para garantir a continuidade do plano de reabilitação, tornam-se fundamentais.
Silva et al. (2010), realçam a importância da reabilitação funcional dos doentes no pós-operatório pois auxilia na realização das atividades diárias melhorando a funcionalidade, com contributos evidentes para um aumento da qualidade de vida.
Após a abordagem do EEER nestas fases, surge o propósito de avaliar o grau de satisfação dos doentes submetidos a ATA e ATJ, relativamente ao programa de reabilitação motora, implementado pelos EEER, no âmbito de um projeto de intervenção clínica, denominado “Habilitar”.
2. MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo, transversal.
2.1 Amostra
Tipo de amostragem não probabilística por conveniência.
A amostra do estudo incluiu todos os doentes abrangidos no projeto “Habilitar”, no período compreendido entre Janeiro 2018 e Dezembro 2019, num total de 85, tendo todos eles respondido de forma integral ao questionário.
2.2 Instrumento de recolha de dados
No campo da avaliação da satisfação é comum o debate acerca dos métodos mais adequados para a sua avaliação: métodos quantitativos vs os métodos qualitativos. Para o presente estudo optou-se pela metodologia quantitativa através da aplicação de um Questionário de Satisfação SNQ-10 (Satisfaction with Nursing Questionnaire).
A seleção deste questionário, prendeu-se com o fato de ser um instrumento específico de avaliação da satisfação do doente relativamente aos cuidados de enfermagem de reabilitação. Este instrumento de colheita de dados foi traduzido para português e validado através de um estudo realizado, no âmbito do curso de Mestrado em Enfermagem de Reabilitação (Lopes, 2012), com autorização da sua aplicação pelo autor. Este questionário utiliza uma escala de Likert com quatro alternativas de resposta, em que: 1- Muito insatisfeito, 2- Pouco satisfeito, 3 - Satisfeito e 4- Muito satisfeito.
Este instrumento permite avaliar duas dimensões da satisfação: “Qualidade no atendimento” e “Ambiente Terapêutico”. Fazem parte da “Qualidade no atendimento” as variáveis: a) Relações interpessoais relativamente a si; b) Interesse demonstrado relativamente a si como pessoa e não apenas pela sua doença; c) Profissionalismo demonstrado. Relativamente ao “Ambiente terapêutico”, consideram-se as variáveis: a) Capacidade de reconforto; b) Tempo dedicado a si; c) Rapidez na resposta às suas solicitações; d) Clareza da informação que recebeu; e) Quantidade de informação que recebeu; f) Co-organização no trabalho da equipa de enfermagem; g) Relacionamento entre os enfermeiros.
No instrumento de colheita de dados, é garantida a confidencialidade dos doentes.
De forma a não comprometer a honestidade das respostas com consequente enviesamento dos dados, adotou-se a estratégia de entrega do questionário por outros profissionais, que não os EEER. A entrega do questionário aos doentes é feita no momento da alta e preferencialmente na presença da família.
De realçar que foram cumpridos os procedimentos éticos legais da ULSG e obtido parecer favorável pela Comissão de Ética da mesma instituição, relativamente ao projeto “Habilitar”, estando este questionário incluído neste projeto.
2.3 Análise estatística
Foram calculadas frequências absolutas e relativas para cada um dos itens do SNQ-10. Para estes itens, bem como para as duas dimensões do SNQ-10, foi testada a normalidade da distribuição através do histograma com curva de normalidade e aplicado o teste Kolmogorov-Smirnov. Relativamente à análise inferencial, estudou-se a correlação entre a idade e o sexo com o SNQ-10, através do Coeficiente de Spearman, e a diferença de resultados no SNQ-10 com essas variáveis, através da aplicação do teste não paramétrico de Mann-Whitney. Foi assumida uma significância estatística quando p<0,05.
O tratamento estatístico dos dados foi realizado através dos programas Excel® e SPSS®.
3. Resultados
O tratamento dos dados obtidos pela aplicação do questionário de satisfação SNQ-10 a 85 doentes, apurou 37% do sexo masculino e 63% do sexo feminino (gráfico 1), com uma média de idade de 68,9 ± 9,4 anos. Relativamente ao tipo de cirurgia efetuada, 53% foram submetidos a ATJ, e os restantes a ATA (gráfico 2).
No que respeita às variáveis sociodemográficas, não se encontrou nesta amostra nenhuma associação significativa (p>0,05) entre a satisfação dos doentes e estes parâmetros (quadro 1).
Variáveis | Valor do teste | Sig |
---|---|---|
Idade* | -0,086 | 0.434 |
Sexo** | -0,162 | 0.871 |
*R de Spearman; **U de Mann Whitney
No que respeita às dimensões em análise pelo SQN-10, “Qualidade no atendimento” e “Ambiente Terapêutico”, as respostas variaram entre o “Satisfeito” e “Muito Satisfeito”.
A avaliação individual de cada item, recaiu também entre o “Satisfeito” e “Muito Satisfeito”; apenas um dos itens foi pontuado no nível “Pouco Satisfeito” (“Capacidade de reconforto - apoio que recebeu”), embora não traduza alteração dos valores medianos em cada item (Md=4).
De realçar que nenhuma resposta recaiu na opção “Muito Insatisfeito”.
Os dados podem ser consultados no quadro que se segue (quadro 2):
Questionário de Satisfação: SNQ-10 | “Pouco Satisfeito” | “Satisfeito” | “Muito Satisfeito” | Mediana (Md) | Mínimo (min) | Máximo (max) | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Freq. | % | Freq. | % | Freq. | % | |||||
Qualidade no atendimento | Relações interpessoais relativamente a si (delicadeza, respeito, simpatia, paciência, cuidado) | 8 | 9,4 | 77 | 90,6 | 4 | 3 | 4 | ||
Interesse demonstrado relativamente a si como pessoa e não apenas pela sua doença | 16 | 18,8 | 69 | 81,2 | 4 | 3 | 4 | |||
Profissionalismo demonstrado (capacidade, precisão) | 12 | 14,1 | 73 | 85,9 | 4 | 3 | 4 | |||
Ambiente Terapêutico | Capacidade de reconforto (apoio que recebeu) | 1 | 1,2 | 15 | 17,6 | 69 | 81,2 | 4 | 2 | 4 |
Tempo dedicado a si | 20 | 23,5 | 65 | 76,5 | 4 | 3 | 4 | |||
Rapidez na resposta às suas solicitações | 16 | 18,8 | 69 | 81,2 | 4 | 3 | 4 | |||
Clareza da informação que recebeu | 18 | 21,2 | 67 | 78,8 | 4 | 3 | 4 | |||
Quantidade de informação que recebeu | 10 | 11,8 | 75 | 88,2 | 4 | 3 | 4 | |||
Co-organização no trabalho da equipa de Enfermagem | 8 | 9,4 | 77 | 90,6 | 4 | 3 | 4 | |||
Relacionamento entre os Enfermeiros (harmonia, colaboração, boa disposição) | 8 | 9,4 | 77 | 90,6 | 4 | 3 | 4 |
4. Discussão
Vários estudos no domínio da satisfação dos doentes com os cuidados de saúde e com os cuidados de enfermagem em concreto, revelam que são múltiplos os fatores que influenciam esta variável.
Para avaliar e melhorar a qualidade dos cuidados de saúde prestados é de importância vital conhecer o grau de satisfação com os cuidados de saúde (Silva, 2013). No caminho da excelência do cuidar é tão importante conhecer a satisfação dos doentes, como realizar um bom planeamento do programa de reabilitação, tendente à promoção da qualidade de vida, constituindo este, um aspeto fulcral deste estudo.
Segundo Aboabat e Qannam (2017), a satisfação com a reabilitação pode ser influenciada pela idade uma vez que as pessoas mais idosas têm tendência a ficar mais satisfeitas, no entanto, esta variável não é preditora do nível de satisfação. Também um estudo comparativo de satisfação dos pacientes com cuidados de reabilitação, refere que não houve uma diferença significativa entre os níveis de satisfação dos doentes com os serviços de reabilitação no que diz respeito a variáveis demográficas: idade, educação e sexo (Amrevani, 2017).
Relativamente às variáveis sociodemográficas incluídas no estudo, sexo e idade, não têm influência estatística significativa no grau de satisfação dos doentes. Estes resultados são corroborados por Lopes (2012), que refere existirem vários fatores que influenciam o grau de satisfação, tais como: as caraterísticas do indivíduo, as experiências anteriores, as variáveis do contexto sociocultural e as expetativas dos sujeitos sobre as diferentes dimensões da satisfação. Numa síntese de estudos sobre satisfação dos doentes e aspetos a serem valorizados nos cuidados de enfermagem, constata-se que as competências técnico-cognitivas, as competências relacionais e a continuidade/organização dos cuidados são os aspetos mais relevantes para a satisfação dos doentes face aos cuidados recebidos (Silva, 2013). Também no presente estudo, as competências relacionais, “Relações interpessoais relativamente a si” e “Relacionamento entre os enfermeiros”, bem como a competência técnico-cognitiva, “Profissionalismo demonstrado” e a capacidade de promover a continuidade/organização dos cuidados, nos itens “Tempo dedicado a si”, “Rapidez na resposta às suas solicitações” e “Co-organização no trabalho da equipa de enfermagem”, obtiveram elevado grau de satisfação por parte dos doentes (Md=4, min=3 e max=4).
Johansson citado por Silva (2013) aponta que os fatores importantes para a satisfação do doente foram os conselhos fornecidos pelos profissionais de enfermagem e o cuidar de forma tecnicamente correta. Já a falta de informação é apontada como uma das causas mais comuns de insatisfação. Pereira referenciado por Silva (2013, p.33), referindo-se a uma meta-análise de 41 estudos verificou que o “fator mais importante na satisfação do cliente era o fornecimento de informação por parte do profissional em relação ao seu problema e tratamento”. Relativamente ao fornecimento de informação, no presente estudo, nos itens estudados, “Clareza da informação que recebeu” e “Quantidade de informação que recebeu”, a maioria das respostas recaiu no nível “Muito Satisfeito”, 78,8% e 88,2% respetivamente.
Ribeiro citado por Silva (2013, p.34) refere que “as competências relacionais referem-se à forma como os profissionais de saúde atendem e acolhem os clientes, valorizando aspetos que dizem respeito às características pessoais dos profissionais de saúde, a atitude, o tom de voz e a postura”. Johansson citado pelo mesmo autor acrescenta o entendimento mútuo, o respeito, a confiança, a honestidade, a cooperação e o humor como aspetos determinantes na relação interpessoal doente-enfermeiro. Neste estudo poder-se-á fazer uma analogia com os itens “Interesse demonstrado relativamente a si como pessoa e não apenas pela sua doença” e “Capacidade de reconforto” (apoio que o doente recebeu), que obtiveram uma avaliação de 81,2% no “Muito Satisfeito”; no entanto, a “Capacidade de reconforto” (apoio que o doente recebeu) obteve a avaliação de “Pouco Satisfeito”, embora apenas, por um único doente.
No que respeita aos cuidados de reabilitação, Gomes (2008) desenvolveu um estudo em que procurou identificar os contributos da especialização em enfermagem para o desenvolvimento de competências técnico-científicas, cujas conclusões apontaram para a enfermagem de reabilitação como uma área de intervenção clínica reconhecida, que contribui fortemente para a obtenção de ganhos em saúde, expressos na prevenção de incapacidades e na recuperação das capacidades remanescentes, habilitando a pessoa para maior autonomia, tendente a maior satisfação. Os resultados deste estudo mostram um contributo significativo da formação especializada em enfermagem, nomeadamente a enfermagem de reabilitação, na satisfação dos doentes.
Lui et al, citados por Silva (2013, p.35), concluíram que o sucesso do processo de reabilitação depende da forma como os profissionais avaliam as necessidades dos doentes e como desenvolvem esforços nas questões da continuidade de cuidados e mecanismos de suporte na comunidade. Estes itens tiveram uma avaliação muito satisfatória pelos doentes abrangidos pelo estudo, nomeadamente, “Profissionalismo demonstrado” e “Co-organização no trabalho da equipa de Enfermagem”.
A comunicação, a partilha de informação e a participação são aspetos comuns que condicionam a satisfação dos doentes, e também neste estudo se verifica, tal como já foi referido, um elevado grau de satisfação nos itens coincidentes, nomeadamente “Tempo dedicado a si”, “Rapidez na resposta às suas solicitações” e “Clareza da informação que recebeu”.
De acordo com o estudo acima referido, a informação foi considerada fundamental, concluindo-se que os doentes informados se mostraram mais satisfeitos, ao passo que a falta de informação se revelou ser a maior causa de insatisfação. Decorrente das várias etapas do projeto “Habilitar”, pensamos que o fato de o doente receber ensinos, material de leitura (panfletos com os cuidados a ter na ATA e ATJ, visualização de vídeos) e instrução e treino dos exercícios que fazem parte do programa de reabilitação ainda no seu domicílio, ou seja, num momento de menor debilidade, influenciou positivamente na avaliação da satisfação nas variáveis “Profissionalismo demonstrado”, “Clareza da informação que recebeu”, “Quantidade de Informação que recebeu” e “Co-organização no trabalho da equipa de Enfermagem” (Md=4).
No estudo desenvolvido por Silva (2013), as dimensões relacionadas com a eficácia na comunicação, qualidade no atendimento, o ambiente terapêutico e a relação interpessoal obtiveram as percentagens mais elevadas. A utilidade da informação e a promoção da continuidade de cuidados representaram as dimensões com menores níveis de satisfação, indicando que os doentes estão menos satisfeitos com a qualidade da informação disponibilizada pelos enfermeiros, para lidar com a sua situação de saúde/doença e com a preocupação do enfermeiro no envolvimento dos familiares ou pessoas significativas no processo de cuidar. No presente estudo, considerando de uma forma global as duas dimensões, “Qualidade no atendimento” e “Ambiente Terapêutico”, as respostas traduzem elevados níveis de satisfação dos doentes submetidos a programa de reabilitação pós ATA e ATJ.
Conclusão
A qualidade dos cuidados de saúde deve ter como premissa a satisfação dos doentes em todo o processo de cuidar. Neste sentido, a satisfação dos doentes é um resultado a concretizar numa prática profissional que se pretende de qualidade.
O presente estudo, levado a cabo por um grupo de seis EEER com uma vasta experiência nos mais variados contextos de trabalho, cujos anos de experiência profissional na área, variam de 23 anos do elemento mais velho a 7 anos dos elementos mais novos. A abordagem estratégica feita por estes, permite capacitar o doente o mais precocemente possível, maximizando o seu potencial funcional e de independência, de modo a facilitar a sua reintegração na sociedade.
Neste estudo constatámos a existência de um elevado grau de satisfação dos doentes englobados no projeto “Habilitar”, relativamente aos cuidados de enfermagem de reabilitação. Todas as dimensões evidenciaram um elevado grau de satisfação, e nenhuma variável ficou aquém das expetativas. É evidente que a prestação de cuidados especializados em enfermagem de reabilitação contribui para o aumento da satisfação dos doentes que participaram no estudo.
Apesar dos resultados evidenciarem um elevado grau de satisfação, após uma reflexão conjunta com vista à melhoria dos aspectos menos positivos, poderá ter interesse a criação de protocolos de uniformização dos parâmetros: sequência dos exercícios e duração do plano em a cada dia do pós-operatório, com incremento gradual e sempre de acordo com o grau de tolerância do doente. O item “Capacidade de reconforto” (apoio que recebeu, será foco de maior atenção pela equipa de EEER do serviço de Ortopedia da ULS.
Consideramos limitações do estudo, a falta de literacia em saúde de alguns doentes submetidos a ATA e ATJ programadas, o que levou necessariamente à entrega do questionário no momento da alta, com a presença da família; não existe um método/ferramenta “standart” para a avaliação da satisfação, no entanto na área da reabilitação apenas se conhece este questionário traduzido e validado para a população portuguesa, que possa quantificar esta variável; apesar do uso de vários questionários e estudos acerca da satisfação dos doentes o número de estudos publicados e consistência das descobertas publicadas na área da reabilitação continuam a ser limitadas.
Apresentamos as seguintes propostas de melhoria. Alteração à metodologia de aplicação do questionário, poderá constituir excelentes resultados e contribuir para a obtenção de conclusões mais consistentes; reformulação do questionário com a inclusão de outros dados, como tempo de internamento, limitação funcional prévia, bem como explorar mais dados sociodemográficos; aplicação do SQN-10 também no momento do pré-operatório, poderá trazer contributos interessantes comparativamente à aplicação do mesmo na alta hospitalar. Entendemos que o momento da alta poderá não ser o momento mais oportuno para a aplicação do instrumento de colheita de dados mas é o último momento em que existe contacto entre profissional do serviço e o doente.
Na procura permanente da excelência no exercício profissional, alcançar um elevado nível de satisfação dos doentes, constitui um indicador válido no que concerne à qualidade dos serviços de saúde, pelo que a sua avaliação deve constituir uma meta em si mesmo.
A avaliação da satisfação percecionada pelos doentes acerca dos cuidados poderá contribuir para a reafirmação da profissão de enfermagem e dos cuidados especializados de reabilitação. A nível da prestação de cuidados pelos EEER no serviço de Ortopedia da ULSG, os resultados deste estudo contribuirão certamente para “dedicar mais tempo” aos doentes incluídos no projeto “Habilitar”.