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e-Pública: Revista Eletrónica de Direito Público

versão On-line ISSN 2183-184X

e-Pública vol.4 no.3 Lisboa dez. 2017

 

DESTAQUE

(Re)ordenamento florestal: Alguns instrumentos de conformação da ocupação florestal em Portugal

Forest (re)organisation in Portugal: Some instruments that influence forest occupation in Portugal

 

Dulce Lopes1  

Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
R. do Norte 37,
3000-295 Coimbra
E-mail: dulcel@fd.uc.pt

 

RESUMO

O presente artigo analisa a complexidade do ordenamento florestal dando conta dos principais instrumentos jurídicos que conformam a ocupação do mosaico arbóreo em Portugal. Em especial serão considerados os planos e projetos especificamente desenhados para enquadrar o interesse florestal, assinalando as suas virtualidades mas também as suas imperfeições.

 

Palavras-Chave: Floresta, incêndios rurais, planos florestais, ações de arborização, eucalipto.

 

ABSTRACT

The present article analysis the complexity involved in forest organisation, by examining the main instruments that regulate the Portuguese arboreal mosaic. In particular, we will consider plans and projects that are deliberately intended to embody the forest interest, pointing out their propensities but also their flaws.

 

Keywords: Forest, wildfires, forest plans, arborisation actions, eucalyptus.

 

Sumário

1. Ordenar o quê?; 2. Planos de Ordenamento, Gestão e Intervenção Florestal; 3. Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios; 4. Ações de arborização e rearborização; 4. Notas conclusivas.

 

1. Ordenar o quê?

As florestas são um recurso ambiental que se apresenta no plano legal e na consciência colectiva como um importante bem jurídico carecido de tutela, não só porque pode ser objecto de apropriação e de aproveitamento individualizado, gerando  rendimento, mas também porque desempenha funções essenciais à preservação e promoção de um ambiente equilibrado e sadio. 

Se esta qualificação não suscita quaisquer dúvidas ou resistências, quando se trata de indagar qual a tutela que deve ser deferida a este específico bem jurídico, a comunhão de ideias quebra-se e, quando muito, consegue-se uma difícil convergência de posições. 

E isto porque, ao contrário do que acontece com outros bens jurídicos mais fluídos ou menos tangíveis como a água e o ar, as florestas (e, na mesma ordem de ideias, os solos), as florestas, ao permitirem um domínio mais imediato e concreto pelo Homem, são tradicionalmente alvo de pretensões e intervenções que escapam de forma quase incontrolável às exigências de um desenvolvimento sustentado.

E se é certo que, com Gérard Buttoud, a política pública das florestas deve garantir que todas as utilizações florestais possam estar, ainda que de forma diferenciada, ao serviço de todos os utentes, de uma forma que garanta a perenidade dos recursos a longo prazo2, nem sempre se consegue "ordenar" devidamente esta panóplia de interesses, procedendo a uma sua adequada composição e territorialização.

A complexidade e dificuldade da tarefa começa logo quando se pergunta: afinal, ordenar o quê?

As respostas são múltiplas consoante a perspetiva que se adote: ou se ordenam tipos concretos de ocupação (ocupação especificamente florestal – e dentro desta, vários modelos, espécies e finalidades de intervenção florestal e de redes de defesa da floresta – e outras ocupações que a complementam ou prejudicam, como a agrícola, habitacional, turística, industrial, etc.); ou se ordenam grandes zonamentos (de risco ou, melhor, de perigosidade de incêndio, a par da regulamentação dos demais usos urbanísticos e ambientais do solo, que são competência dos planos municipais e intermunicipais); ou se ordenam, ainda, restrições próprias da atividade florestal, sejam elas gerais (como sucede com a proibição quase integral de edificação em zonas de perigosidade alta e muito alta), específicas (isto é determinadas em função de certas atividades, como as queimadas, ou de certas espécies, como as limitações ao abate dos sobreiros e das azinheiras) ou relacionais (como sucede com a exigência de previsão de distanciamentos à estrema dos prédios ou de obrigações de limpeza relativamente a edificações). Não é por acaso que o Capítulo III do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, que estabelece o Sistema Nacional De Defesa Da Floresta Contra Incêndios, alterado por último pelo Decreto-Lei n.º 10/2018, de 14 de fevereiro, se intitula genericamente "medidas de organização do território, de silvicultura e de infraestruturação", demonstrando a imbricação entre estas diferentes temáticas.

E sem nos embrenharmos no mundo que é a vigilância, deteção e combate de incêndios, que carece também de uma dose massiva de planeamento, sobretudo operacional, a atividade de ordenação pode igualmente referir-se, de forma mais ampla, à titularidade, à gestão dos espaços florestais e ao seu financiamento.

No primeiro polo, sabendo que o regime jurídico de propriedade florestal se subdivide em propriedade privada, pública ou comunitária (os baldios), e que qualquer um destes regimes apresenta problemas relacionados, sobretudo, com a destinação efetiva dos solos ao uso florestal e com a sua conservação e valorização, tem ganhado terreno a necessidade e política pública de ordenamento do espaço rural. Política esta que se sucede a um paradigma em que os instrumentos jurídicos, essencialmente de planeamento, se debruçavam quase exclusivamente ou pelo menos de forma mais orientada para o ordenamento urbanístico. 

Para tanto, mencione-se a aprovação do regime jurídico da estruturação fundiária pela Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, que estabelece um conjunto amplo de instrumentos de reorganização dos solos com o objetivo de criar melhores condições para o desenvolvimento das atividades agrícolas e florestais: o emparcelamento rural; a valorização fundiária; o regime de fracionamento dos prédios rústicos; os planos territoriais intermunicipais ou municipais; e a bolsa nacional de terras para utilização agrícola, florestal ou silvopastoril, designada por «bolsa de terras». Esta bolsa estabelecida pela Lei n.º 62/2012, de 10 de dezembro, tem como objetivo facilitar o acesso à terra (do Estado, das autarquias, de baldios ou de privados que nisso concedam) através da sua disponibilização a terceiros, sobretudo quando aquela não esteja a ser utilizada. 

Este diploma previa inclusive um processo de reconhecimento da situação de prédio rústico e misto sem dono conhecido que não esteja a ser utilizado para fins agrícolas, florestais ou silvopastoris, que viabilizaria, cumpridos certos trâmites e decorrido o prazo de 15 anos, a sua aquisição, através de justificação administrativa, pelo Estado e a sua disponibilização obrigatória na bolsa de terras (cfr. a regulamentação promovida pela lei n.º 152/2015, de 14 de setembro). Não obstante, esta regulamentação foi revogada pela Lei n.º 78/2017, de 17 de agosto, que criou o sistema de informação cadastral simplificado, inviabilizando, para já, aquela aquisição pública (esta terá de esperar pela avaliação da Lei, a realizar pelo Governo, após o decurso de um ano de vigência do diploma)3.

A gestão dos espaços florestais é igualmente uma das áreas em que o legislador tem procedido à criação de figuras inovadoras de exploração florestal, que permitam a superação das dificuldades relacionadas com a dispersão da propriedade rústica e a arduidade, portanto, em proceder a uma conveniente organização da atividade florestal, que permita e promova a viabilidade técnica das explorações. Estes formatos de gestão passam pela promoção de um tipo de associativismo induzido e controlado pelas autoridades públicas (as Zonas de Informação Florestal, reguladas pelo Decreto‐Lei n.º 127/2005, de 5 de agosto, alterado por último pelo Decreto-Lei n.º 67/2017, de 12 de junho) e, mais recentemente, pela criação e reconhecimento de um tipo específico de entidades gestoras: as entidades de gestão florestal e as unidades de gestão florestal, às quais são aliados um conjunto de benefícios inclusive fiscais destinados à sua dinamização, prevendo-se, mesmo, cláusulas de discriminação positiva destas entidades no acesso a apoios nacionais e comunitários, designadamente dos programas de desenvolvimento rural, no âmbito da defesa da floresta contra incêndios e da promoção do investimento, da gestão e do ordenamento florestais (cfr. o Decreto-Lei n.º 66/2017, de 12 de junho, alterado pela Lei n.º 111/2017, de 19 de dezembro, e os benefícios previstos na Lei n.º 110/2017, de 15 de dezembro).

Facilmente se percebe das considerações precedentes que o financiamento de atividades florestais desempenha no nosso ordenamento jurídico uma importância capital, por ser amplamente aduzida a descapitalização dos proprietários florestais e, por isso, a redução do número das explorações agrícolas e florestais. Esta necessidade de financiamento torna-se ainda mais premente numa altura que se avizinha de viragem quanto ao tipo de espécies florestais admitidas ou, mesmo, privilegiadas nas ações de arborização e rearborização, ao anunciar-se o fim da era do eucalipto no nosso país.

É que se a plantação de eucalipto direcionada sobretudo para a indústria da celulose, tinha investimento (e nalguns casos também financiamento público) assegurado4, a arborização com "novas" espécies encerra uma componente de risco ou de salto para o desconhecido, que apenas é vencida com a criação de condições financeiras benéficas para os projetos apresentados, aumentando a probabilidade do seu sucesso. E é esse o principal desafio que se coloca às entidades públicas que também têm de ordenar os recursos financeiros (por exemplo do Fundo florestal Permanente ou de fundos nacionais e comunitários) que são limitados e insuficientes, para com eles promoveram da melhor forma os objetivos de política florestal a que se propõem.

Dada a amplitude potencial do tema que nos foi distribuído5, foi inevitável a opção por apenas uma das perspetivas a que aludimos. Assim, selecionámos o ordenamento que mais diretamente se relaciona com a concreta ocupação florestal solos, procurando determinar quais são os institutos que hoje mais influenciam a transformação do mosaico arbóreo no nosso país.

A noção de que partimos de (re)ordenamento florestal tem precisamente a ver com as formas jurídicas que têm sido mobilizadas para proceder a uma afetação funcional do solo alinhada com os objetivos de uma política florestal sustentável. E, do ponto de vista da legislação setorial, esses instrumentos são, precisamente, os planos de ordenamento, de gestão e de intervenção florestal, os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios e as ações concretas de arborização e rearborização, sobre os quais nos debruçaremos infra.

Note-se que da identificação destes mecanismos de (re)ordenamento florestal não se retira que os demais sejam irrelevantes, pelo contrário. 

Os planos (inter)municipais são essenciais ao definirem vocações do solo que possam permitir e potenciar o uso florestal; todavia, nem sempre têm integrado adequadamente os objetivos e preocupações relacionadas com as ocupações florestais ou se o têm, o seu grau de execução é pequeno. De facto, na maioria dos casos as áreas florestais e agrícolas são vistas pela negativa, como um fator de limitação à edificabilidade, não lhes sendo definida uma estratégia e um programa próprios. Aguarda-se, por isso, que aqueles planos sejam alterados ou revistos de modo a integrar uma estratégia para o solo municipal rústico que seja consonante com os objetivos atuais da política florestal. Só aí contribuirão adequadamente para um sustentável ordenamento florestal.

Também as limitações legais relacionadas com o bem jurídico florestas podem revelar-se importantes mecanismos para o (re)ordenamento florestal. Não tanto pelas condutas que admitem ou impõem, como essencialmente pelas cláusulas de imobilização, permanentes ou temporárias, que estabelecem, impedindo ou tornando menos atrativa a descaraterização (desflorestação ou degradação) da ocupação florestal do solo e, portanto, preservando as condições para um correto ordenamento florestal.  Referimo-nos, designadamente, às restrições aplicáveis a zonas percorridas por incêndios, à legislação de proteção do sobreiro e da azinheira e à proibição de introdução de certas espécies florestais não indígenas.

Contudo, são os instrumentos a que seguir nos referiremos6 que manifestam uma maior vocação para uma ordenação florestal operativa, ao incorporarem metas, parâmetros, regras e obrigações que se concretizam no território, influenciando decisivamente a sua ocupação florestal. E também foram eles objeto de algumas modificações no pacote legislativo aprovado em 2017, de modo a reforçar a sua capacidade de ordenação, alterações estas a que aludiremos.

 

2. Planos de ordenamento, gestão e intervenção florestal

Essencial no domínio de que curamos, ainda que datada já de meados dos anos noventa, é a Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96, de 17 de agosto), que pretendeu contribuir para o encontrar de um equilíbrio entre a satisfação das necessidades da comunidade e as exigências de um correto ordenamento do território (artigo 1.º).

Define esta legislação que as atividades de exploração, conservação, reconversão e expansão da floresta são de interesse público em virtude das múltiplas funções que desempenham, ainda que sejam de propriedade e/ ou de gestão privada, devendo ser regidas, nomeadamente, pelos princípios do desenvolvimento sustentável, da coordenação e integração de atores e políticas sectoriais, da responsabilização social e da cooperação internacional (artigos 2.º e 3.º).

Como instrumento privilegiado de ordenamento e gestão florestal, a referida Lei de Bases prevê a elaboração de planos de ordenamento florestal (artigo 5.º), que se devem articular com os planos regionais e locais (rectius municipais e intermunicipais), previstos, atualmente, no Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio (Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, doravante RJIGT). Do mesmo passo lançou as bases para a regulação dos planos de gestão florestal, enquanto instrumento básico de ordenamento florestal das explorações.

Estes planos de ordenamento e de gestão e, adicionalmente, os planos de intervenção florestal encontram-se regulados no Decreto-Lei n.º 16/2009, de 14 de janeiro, alterado por último pelo Decreto-Lei n.º 65/2017, de 12 de junho, que define as suas caraterísticas particulares.

Vejamos, em traços gerais, os aspetos mais relevantes do regime de cada um deles.

 

2.1 Planos regionais de ordenamento florestal (PROF)

Quanto à qualificação jurídica destes planos, não temos dúvidas, com Alves Correia, em considerar os Planos Regionais de Ordenamento Florestal como planos (hoje programas) setoriais, uma vez que definem, de acordo com o seu conteúdo material típico, cenários e estratégias de desenvolvimento das potencialidades florestais regionais e são elaborados por organismos, ainda que desconcentrados, da Administração do Estado7 [artigo 39.º, n.º 2, alínea a) do RJIGT de 2015].

Quanto à respetiva eficácia jurídica, os programas setoriais vinculam todas as entidades públicas, mas não são diretamente vinculativos para os particulares: a sua integração atual na categoria dos programas é prova disso, bem como a circunstância de o próprio diploma setorial (o artigo 4.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 16/2009) expressamente determinar que as normas do PROF vinculam as entidades públicas, não mencionando a sua eficácia plurisubjetiva.

Naturalmente que esta asserção só valerá para as normas dos planos setoriais que tenham “incidência territorial urbanística” e que, por isso, condicionem a ocupação, uso e transformação do solo: com efeito, as normas destes programas que perdem o seu carácter diretamente vinculativo dos particulares (e que apenas o produzem por via da sua integração nos planos municipais) são aquelas que relevam no âmbito da gestão urbanística, isto é, no âmbito dos procedimentos de licenciamento, autorização (ou de outra natureza) tendentes a controlar a ocupação do território, em regra da responsabilidade dos municípios.

Porém, grande parte dos planos (agora programas) setoriais, designadamente os do domínio das florestas, contêm ainda um conjunto de normas que não se prendem, pelo menos diretamente, com a ocupação, uso e transformação do território, mas antes com a gestão dessas áreas – como as referentes às regras de plantação, proteção e corte de determinadas espécies ou como as relativas aos tipos de desportos ou atividades de fruição admitidos na floresta –, normas essas cujo local adequado para constarem são, precisamente, os planos (hoje programas) setoriais.

O que significa, portanto, que nesta dimensão de mera gestão de atividade, os planos (programas) setoriais podem conter normas que, atenta a sua finalidade específica − precisamente a gestão daquelas áreas − se apliquem diretamente aos particulares, designadamente aos proprietários e produtores florestais.

Nas demais situações em que em causa estejam disposições com incidência territorial, isto é, que condicionem de forma decisiva a afetação e utilização do solo e não apenas as formas da sua gestão, continuam as normas dos planos regionais de ordenamento florestal a depender, em princípio, da sua integração em planos municipais. 

Julgamos que é o que sucede com as disposições sobre corredores ecológicos ou sobre a delimitação de florestas de proteção, produção e conservação, uma vez que estas normas impõem a sua integração/articulação com as classes e categorias de uso do solo definidas nos planos municipais. 

No demais, apesar de o n.º 3 do artigo 3.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial de 2015 referir que “[o] disposto nos números anteriores não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente às normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais”, não se pode considerar que esta disposição se alargue a todas as normas dos PROF, convertendo-os em planos setoriais com uma força similar aos planos municipais e intermunicipais (únicos que gozam de eficácia plurisubjetiva quanto às regras urbanísticas de ocupação do solo).  Tal desvirtuaria todo o regime legal do planeamento, o que é inaceitável. Exige-se, por isso, para que o artigo 3.º, n.º 3 do RJIGT possa ser adequadamente aplicado, que a legislação e o próprio PROF venham definir quais as disposições que, para além da mera gestão da atividade florestal, podem vincular direta e imediatamente privados8.

Julgamos inclusive que se deveria aproveitar o ensejo da revisão dos PROF em curso para proceder à clarificação destas questões, bem como para repensar globalmente a política florestal nacional e regional. É que, se em 2013 e 2015 houve bons motivos (factos relevantes, como então foram designados), para suspender parcialmente os PROF (cfr. a Portaria n.º 78/2013, de 19 de fevereiro, alterada pela Portaria n.º 141/2015, de 21 de maio), não há menos motivos para, nos tempos que correm – sobretudo depois dos catastróficos incêndios de 2017 –, proceder à reponderação das opções tomadas, ajustando-as às necessidades de regulação do mosaico florestal. Em particular, é essencial que os PROF contenham disposições normativas que permitam, de forma operativa e o mais precisa possível, definir critérios para a aceitação de projetos que venham a ser submetidos a autorização do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (doravante ICNF, I.P.), ou que lhe sejam comunicados.

Quanto à qualificação jurídica destes planos, não temos dúvidas, com Alves Correia, em considerar os Planos Regionais de Ordenamento Florestal como planos (hoje programas) setoriais, uma vez que definem, de acordo com o seu conteúdo material típico, cenários e estratégias de desenvolvimento das potencialidades florestais regionais e são elaborados por organismos, ainda que desconcentrados, da Administração do Estado7 [artigo 39.º, n.º 2, alínea a) do RJIGT de 2015].

Quanto à respetiva eficácia jurídica, os programas setoriais vinculam todas as entidades públicas, mas não são diretamente vinculativos para os particulares: a sua integração atual na categoria dos programas é prova disso, bem como a circunstância de o próprio diploma setorial (o artigo 4.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 16/2009) expressamente determinar que as normas do PROF vinculam as entidades públicas, não mencionando a sua eficácia plurisubjetiva.

Naturalmente que esta asserção só valerá para as normas dos planos setoriais que tenham “incidência territorial urbanística” e que, por isso, condicionem a ocupação, uso e transformação do solo: com efeito, as normas destes programas que perdem o seu carácter diretamente vinculativo dos particulares (e que apenas o produzem por via da sua integração nos planos municipais) são aquelas que relevam no âmbito da gestão urbanística, isto é, no âmbito dos procedimentos de licenciamento, autorização (ou de outra natureza) tendentes a controlar a ocupação do território, em regra da responsabilidade dos municípios.

Porém, grande parte dos planos (agora programas) setoriais, designadamente os do domínio das florestas, contêm ainda um conjunto de normas que não se prendem, pelo menos diretamente, com a ocupação, uso e transformação do território, mas antes com a gestão dessas áreas – como as referentes às regras de plantação, proteção e corte de determinadas espécies ou como as relativas aos tipos de desportos ou atividades de fruição admitidos na floresta –, normas essas cujo local adequado para constarem são, precisamente, os planos (hoje programas) setoriais.

O que significa, portanto, que nesta dimensão de mera gestão de atividade, os planos (programas) setoriais podem conter normas que, atenta a sua finalidade específica − precisamente a gestão daquelas áreas − se apliquem diretamente aos particulares, designadamente aos proprietários e produtores florestais.

Nas demais situações em que em causa estejam disposições com incidência territorial, isto é, que condicionem de forma decisiva a afetação e utilização do solo e não apenas as formas da sua gestão, continuam as normas dos planos regionais de ordenamento florestal a depender, em princípio, da sua integração em planos municipais. 

Julgamos que é o que sucede com as disposições sobre corredores ecológicos ou sobre a delimitação de florestas de proteção, produção e conservação, uma vez que estas normas impõem a sua integração/articulação com as classes e categorias de uso do solo definidas nos planos municipais. 

No demais, apesar de o n.º 3 do artigo 3.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial de 2015 referir que “[o] disposto nos números anteriores não prejudica a vinculação direta e imediata dos particulares relativamente às normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais”, não se pode considerar que esta disposição se alargue a todas as normas dos PROF, convertendo-os em planos setoriais com uma força similar aos planos municipais e intermunicipais (únicos que gozam de eficácia plurisubjetiva quanto às regras urbanísticas de ocupação do solo).  Tal desvirtuaria todo o regime legal do planeamento, o que é inaceitável. Exige-se, por isso, para que o artigo 3.º, n.º 3 do RJIGT possa ser adequadamente aplicado, que a legislação e o próprio PROF venham definir quais as disposições que, para além da mera gestão da atividade florestal, podem vincular direta e imediatamente privados8.

Julgamos inclusive que se deveria aproveitar o ensejo da revisão dos PROF em curso para proceder à clarificação destas questões, bem como para repensar globalmente a política florestal nacional e regional. É que, se em 2013 e 2015 houve bons motivos (factos relevantes, como então foram designados), para suspender parcialmente os PROF (cfr. a Portaria n.º 78/2013, de 19 de fevereiro, alterada pela Portaria n.º 141/2015, de 21 de maio), não há menos motivos para, nos tempos que correm – sobretudo depois dos catastróficos incêndios de 2017 –, proceder à reponderação das opções tomadas, ajustando-as às necessidades de regulação do mosaico florestal. Em particular, é essencial que os PROF contenham disposições normativas que permitam, de forma operativa e o mais precisa possível, definir critérios para a aceitação de projetos que venham a ser submetidos a autorização do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (doravante ICNF, I.P.), ou que lhe sejam comunicados.

 

2.2 Planos de gestão florestal e planos específicos de intervenção florestal

Em contraponto com os PROF, os planos de gestão florestal (PGF) e os planos específicos de intervenção florestal (PEIF) são instrumentos mais voltados para a administração e atuação sobre espaços florestais, definindo regras concretas sobre o modelo de exploração e de proteção a levar a cabo. 

As questões colocadas supra a propósito da eficácia direta dos PROF em relação aos particulares também se põem em relação a estes instrumentos de planeamento, ainda que estes tenham particularidades que lhes conferem uma maior aptidão para produzir efeitos diretos em relação aos seus destinatários na medida em que, de acordo com o Decreto-Lei 16/2009, executam as orientações dos PROF’s, correspondendo, por isso, a planos mais concretos, voltados para a administração e gestão florestal e por isso, mais próximos do conceito de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais.

Porém, eles não são instrumentos de gestão territorial (ainda que devam obediência a estes, sob pena de nulidade, e estejam sujeitos a requisitos de participação dos interessados, designadamente de apresentação pública, sempre que incidam sobre territórios geridos pelo Estado, pelas autarquias locais e nos baldios, artigo 20.º), mas não deixam por isso de vincular direta e imediatamente os seus destinatários.

Claro que os destinatários das regras de gestão são, em primeira linha, os proprietários de tais terrenos ou responsáveis pela sua gestão, sendo eles que os elaboram, submetendo-os posteriormente a aprovação do ICNF, I.P. Assim, os PGF e PEIF incidentes sobre terrenos do Estado competem a este Instituto; sobre os terrenos das autarquias locais, a estas; nos baldios, aos respetivos órgãos de administração; nas explorações privadas aos proprietários ou outros produtores florestais e nas zonas de intervenção florestal, à entidade gestora.

O que significa que, quer estes planos sejam de elaboração obrigatória ou de elaboração facultativa, a sua eficácia jurídica está (ou deve estar) assegurada à partida, pela adesão “voluntária” que a eles é feita pelos seus destinatários, que assim assumem a obrigação de se comportar de acordo com as regras de gestão ou de propostas e aprovadas pelo ICNF, I.P. Por isso não se prevê a publicação destes planos, mas apenas a sua aprovação pelo ICNF, I.P. (tanto expressa como tácita, neste caso sempre que haja decorrido o prazo de 30 dias, descontando eventuais suspensões, sem comunicação daquele ato). 

Por isso, a outro propósito já os designámos de instrumentos jurídicos sui generis ou “actos-plano”, por serem, em algumas hipóteses, de iniciativa e elaboração privadas e por integrarem uma componente muito importante de execução das suas disposições9.

O reforço do papel destes planos parece-nos evidente, estejam eles ou não relacionados com figuras como as ZIF e com as mais recentes entidades e unidades de gestão florestal, pois só por seu intermédio se pode especializar e espacializar as opções de ocupação florestal, garantindo que elas se conformam com as disposições legais e regulamentares aplicáveis.

 

3. Planos Municipais de Defesa da Floresta contra Incêndios

Nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, a defesa da floresta contra incêndios assenta, entre outros, em níveis de planeamento (o nacional, distrital e municipal), que asseguram a consistência territorial de políticas, instrumentos, medidas e ações. 

Trata-se, sobretudo ao nível municipal – coincidente com os Planos Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) –, de instrumentos com importantes repercussões territoriais, que regulam as condições pelas quais são admitidas atividades humanas, inclusive urbanísticas, tendo em consideração a necessidade da defesa da floresta (e de pessoas e bens) contra incêndios.

Quanto a estes planos coloca-se igualmente a questão de saber qual a sua natureza e eficácia jurídica. Ora, a resposta a esta questão terá de ser dada diferenciadamente consoante o momento temporal a que nos reportamos e o regime jurídico então vigente.

Sucintamente, antes das alterações introduzidas ao Decreto-Lei n.º 124/2006 pela Lei n.º 76/2017, de 17 de agosto, os PMDFCI eram um instrumento de planeamento que não estavam (e continuam a não estar) integrados no sistema de gestão territorial, nem como planos municipais de ordenamento do território, nem como planos setoriais. Para o efeito e sobretudo para poderem produzir efeitos diretamente vinculativos dos particulares, necessário seria que cumprissem exigências mínimas, de ordem legal e constitucional, designadamente: i) as exigências de publicidade essenciais à produção de efeitos por qualquer ato normativo − artigo 119.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP); e ii) a exigência de participação dos interessados (discussão pública), elevada atualmente a exigência constitucional (n.º 5 do artigo 64.º da CRP). 

Por este motivo, as determinações constantes dos PMDFCI só produziam efeitos depois de integradas nos planos municipais, umas vezes deixando discricionariedade ao município quanto à solução a determinar para o território (por exemplo, nas questões que se referiam à cartografia de perigosidade de incêndio, valendo assim como meras diretrizes de planeamento), outras vezes sem deixar essa margem de discricionariedade (como, por exemplo, nos casos das servidões constantes do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 124/2006). 

É certo que nem todas as disposições constantes dos PMDFCI tinham de ser “integradas” nos planos municipais: nestes não tinham, por exemplo, de ser inseridas as disposições que criassem obrigações para os seus destinatários sem uma imediata repercussão na ocupação, uso e transformação do solo.

Acresce que os PMDFCI também não podiam ser assumidos, dada precisamente falta de publicidade e de participação, como as “normas de intervenção sobre a ocupação e utilização de espaços florestais” a que se refere o n.º 3 do artigo 3.º do RJIGT de 2015 como tendo efeitos diretamente vinculativos dos particulares.

Decerto que a tese aqui assumida nem sempre foi consensual, tendo diversas autoridades com responsabilidade na gestão do território assumido posições divergentes sobre a natureza e a eficácia jurídica dos PMDFCI. Porém, a tendência dominante foi, em face do quadro legal em vigor − que deve ser perspetivado na sua globalidade −, de não lhes reconhecer efeitos jurídicos autónomos, apenas os adquirindo por via dos planos municipais. 

Com as alterações legislativas de 2017 visou conferir-se aos PMDFCI maior vinculatividade e operatividade e, deste modo, permitir uma gestão mais eficiente das situações de risco de incêndio.

Atendendo às novidades, começa por se registar que, do ponto de vista do procedimento, as Comissões Municipais de Defesa da Floresta Contra Incêndios (já com uma distinta composição) deixam agora de elaborar os PMDFCI, passando apenas a “avaliar e emitir parecer” sobre os mesmos e a “apreciar o relatório anual de execução do PMDFCI a apresentar pela câmara municipal” (cfr. o novo artigo 3.º-B, n.º 2).

Em consonância com esta alteração, o legislador opta por descentralizar a responsabilidade pela elaboração e aprovação final dos PMDFCI para a esfera dos municípios: os planos passam a ser elaborados pelas câmaras municipais, aprovados pelas respetivas assembleias municipais, devendo ser garantido, no respetivo procedimento de elaboração, o princípio da participação constitucionalmente exigido, uma vez que se determina expressamente que as regras de elaboração, consulta pública e aprovação e a sua estrutura tipo estabelecidas por regulamento do ICNF, IP, homologado pelo membro do Governo responsável pela área das florestas” (cf. artigo 10.º n.º 2).

Deste modo, o impulso inicial e a decisão final sobre a aprovação e entrada em vigor dos PMDFCI passam, agora, para a esfera dos municípios, sem prejuízo de se manter uma clara interferência de entidades de âmbito nacional, com relevo para o parecer vinculativo do ICNF. 

Por outro lado, prevê-se uma fase de consulta pública, o que colmata uma das falhas do regime anterior dos PMDFCI – a ausência de participação dos cidadãos – que constituía um impedimento à eficácia externa direta daqueles planos, isto ainda que a consulta pública esteja sujeita a limitações quanto à disponibilização de informação (apenas incide sobre componentes não reservadas do PMDFCI) e quanto à tomada em consideração das participações recebidas (que só podem ser acolhidas se não contrariarem o parecer vinculativo do ICNF, I.P.).

Ainda quanto ao procedimento de elaboração dos PMDFCI, é de sublinhar uma importante novidade em termos de publicidade: os PMDFCI, de âmbito municipal ou intermunicipal, passam agora a ser obrigatoriamente “tornados públicos, com o teor integral, por publicação em espaço próprio da 2.ª série do Diário da República e por inserção no sítio na internet do respetivo município, das freguesias correspondentes e do ICNF” (cf. artigo 10.º, n.º 12)10.

Trata-se de uma das mais importantes inovações do seu regime jurídico, passando este instrumento a assumir autonomamente efeitos externos. Isto ainda que algumas das suas disposições, precisamente as que contenham normas de ocupação, uso e transformação do território, continuem a dever ser integradas nos planos municipais ou intermunicipais previstos no RJIGT (neste sentido, cfr. artigo 10.º, n.º 5), solução que visa garantir que todas as regras com incidência territorial urbanística que podem ser oponíveis aos particulares constem, por motivos de certeza e segurança jurídicas, nos planos municipais. 

Por último, e ainda quanto à relação entre os PMDFCI e os instrumentos de gestão territorial, passa agora a prever-se, expressamente, que “a desconformidade dos planos municipais de ordenamento do território com os PMDFCI supervenientes não desvincula as entidades e particulares da observância destes últimos e determina a sua conformação no procedimento imediato de alteração que tiver lugar por iniciativa do município, sem prejuízo da eventual decisão de abertura do procedimento de alteração por adaptação daqueles instrumentos de planeamento, previsto no artigo 121.º do Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio” (cf. artigo 11.º, n.º 2). 

Sai, assim, reforçada a operatividade dos PMDFCI e a sua eficácia sobre entidades públicas e particulares, mesmo quando incompatíveis com os planos (inter)municipais, em linha com as novas regras de publicidade e de consulta pública a que estão sujeitos. 

Do que se retira que a mais ampla eficácia jurídica dos PMDFCI insere-se numa lógica necessária de compensação procedimental: o reconhecimento da eficácia plurisubjetiva dos PMDFCI apenas é possível, precisamente, por estes passarem a contar, no seu procedimento de formação, com trâmites relacionados com a participação dos interessados e a ponderação dos seus interesses e com a publicitação das suas disposições normativas, de modo a que estas possam assumir-se como regras de conduta vinculativas para os seus destinatários.

Por este motivo, já nada obsta a que as determinações dos PMDFCI possam ser consideradas como “normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais” a que n.º 3 do artigo 3.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial de 2015 reconhece eficácia plurisubjetiva.

Todavia, há que assinalar que, ao contrário do que sucedia inicialmente no Decreto-Lei n.º 124/2006, no qual algumas disposições de restrição à edificabilidade (como a prevista no então artigo 16.º, n.º 3, relativa aos afastamentos à estrema) eram aplicáveis mesmo sem PMDFCI, por as condições para a sua aplicação resultarem diretamente da lei11, a nova formulação daquele diploma aponta claramente no sentido de necessariamente se elaborarem PMDFCI com efeitos reforçados (imediatos), sendo que, em contrapartida, sem eles não se consegue condicionar a gestão urbanística municipal (comprova-o o facto de o artigo 16.º fazer depender a aplicação de todas as suas disposições da existência de PMDFCI).

Assim, a única consequência jurídica que se retira da ausência de PMDFCI (caso este, por exemplo, tenha caducado, sem que tenha sido aprovado outro que venha preencher o vazio por ele deixado) não é a da impossibilidade de gestão urbanística municipal (isto é a aprovação de operações urbanísticas deixa de estar condicionada por regras relacionadas com a defesa contra incêndios), mas a de deixarem de ser auferidos apoios ligados às florestas. Motivo pelo qual se deve ter especial cautela, assegurando sempre a manutenção em vigor daqueles planos12.

É ainda importante aferir o sentido e função de  um desenvolvimento recente relativamente à prática e regulamentação do PMDFCI: o da exigência do Orçamento de Estado para 2018 segundo a qual os PMDFCI devem estar aprovados ou atualizados até 31 de março de 2018 (artigo 153.º, n.º 6), artigo este complementado pelo artigo 8.º, n.º 4 do Despacho n.º 1222-B/2018, de 2 de fevereiro de 2018, do Gabinete do Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural que, por seu turno, estipula que " para efeitos do n.º 6 do artigo 153.º da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, considera-se que o PMDFCI se encontra aprovado quando obtidos os pareceres favoráveis da CMDF e do ICNF, I. P., previstos nos n.os 3 e 4 do artigo 4.º do presente Regulamento, não podendo a conclusão do processo previsto no n.º 10 do artigo 4.º ultrapassar 60 dias".

Cumpre aferir qual o intuito desta "aprovação" (que na verdade consiste apenas num projeto de PMDFCI que conta com dois pareceres favoráveis de entidades externas ao Município, um dele de natureza vinculativa). A nosso ver, os efeitos desta aprovação (que será sempre uma aprovação parcial, uma vez que deve ser complementada pelos restantes trâmites administrativos – maxime a consulta pública e a aprovação pela Assembleia Municipal –, a ser praticados no prazo de 60 dias) cingem-se tão-só ao disposto no artigo 153.º do Orçamento de Estado para 2018.

Ora, as regras previstas neste orçamento, por seu turno, limitam-se às redes secundárias de gestão de combustível, remetendo para o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 124/2006 – e não para o artigo 16.º, que se encontra literal e manifestamente fora do seu âmbito de aplicação. 

E dentro desta temática, de modo a assegurar que as câmaras municipais garantam a realização de todos os trabalhos de gestão de combustível, mesmo que se substituam aos proprietários, a aprovação do PMDFCI até 31 de março tem apenas como efeito a não retenção, no mês seguinte, de 20 % do duodécimo das transferências correntes do Fundo de Equilibro Financeiro.

É portanto este o efeito jurídico da aprovação (que procedimentalmente é apenas parcial) do PMDFCI, não podendo retirar-se dela quaisquer efeitos mais alargados, como os da eficácia imediata e direta face a particulares a que se refere o artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006 na sua versão atual, uma vez que aqueles dependem do cumprimento de requisitos constitucionais que apenas terão lugar posteriormente.

 

4. As ações de arborização e rearborização

As ações de arborização e rearborização do território são uma das medidas que mais impacto têm na gestão e no ordenamento territorial em Portugal.

A preocupação com estas ações deve-se não apenas (ou sobretudo) ao objetivo de promover um melhor ordenamento rural, mas também ao estabelecimento de regimes específicos, mais restritivos, para determinadas espécies que se consideram poder ser nefastas ou, no mínimo, menos adequadas às condições edafoclimáticas do nosso país. Ainda assim, é notório que as ações que na prática mais alteram a imagem do mosaico florestal em Portugal passam pela arborização e rearborização de grandes áreas.

Neste âmbito de pertinência, o Decreto-Lei n.º 175/88, de 17 de maio condicionava a arborização com espécies florestais de rápido crescimento, estabelecendo a Portaria n.º 528/89, de 11 de julho, os critérios mobilizáveis nas operações de florestação ou reflorestação com recurso a estas espécies e a Portaria n.º 513/89, de 6 de julho, os concelhos onde se passam a aplicar estas medidas restritivas13

Aquele Decreto-Lei correspondeu a uma tentativa de ponderar um desiderato claro à altura – o de promover o recurso a espécies de rápido crescimento, visando, através de modelos de silvicultura intensiva, proporcionar elevadas produtividades – com as consequências ambientais daquela opção, sobretudo quanto aos impactes que interferem no regime hidrológico das respetivas áreas (re)florestadas.

Assim decretou-se que as ações de arborização e rearborização com recurso a espécies florestais de rápido crescimento exploradas em revoluções curtas estavam condicionadas a autorização prévia (fosse esta expressa ou tácita) da então Direcção-Geral das Florestas, mas apenas as que envolvessem áreas superiores a 50 hectares (artigo 1.º). 

Acresce que apenas os projetos de arborização que incidissem sobre áreas superiores a 350 hectares ou de que resultassem áreas de idêntica ordem de grandeza na continuidade de povoamentos preexistentes das mesmas espécies teriam obrigatoriamente de incluir um estudo de avaliação do impacte ambiental e um parecer do município ou dos municípios com competência nas áreas abrangidas (artigo 4.º, n.º 1).

O diploma em apreço não deixava, porém, de proceder a uma análise “global” do número de povoamentos de espécies de rápido crescimento, uma vez que sujeitou a autorização estadual os novos projetos de arborização e rearborização, independentemente da sua dimensão, levados a cabo nos municípios nos quais se verificasse um desenvolvimento espacial dos povoamentos de espécies de rápido crescimento explorados em revoluções curtas que excedesse 25% da respetiva superfície (artigo 5.º, n.º 1).

Nas demais situações, aplicar-se-ia apenas o Decreto-Lei n.º 139/89, de 28 de abril, que abrangia as situações de aterro ou escavação que conduziam à alteração do relevo natural e das camadas do solo arável para quaisquer fins (que não os urbanísticos, uma vez que estes são considerados operações urbanísticas à luz do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação), sujeitando-as a licenciamento municipal, ainda que não adiantando critérios de apreciação e decisão para o efeito.

Este panorama veio a ser alterado por intermédio do Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho, que, visando simplificar e tornar mais transparente o quadro legislativo, estabelece o regime jurídico a que estão sujeitas, no território continental, as ações de arborização e rearborização com recurso a espécies florestais, independentemente da área intervencionada, das espécies envolvidas ou da qualidade e natureza do interessado na intervenção.

De acordo com o artigo 4.º da versão inicial daquele diploma, o procedimento genericamente aplicável àquelas ações seria o da autorização prévia, com exceção de duas situações não despiciendas previstas no artigo 5.º às quais se aplicaria a mais simples comunicação prévia, a saber, quando a ação preencha as seguintes condições cumulativas: i) a área de intervenção ser inferior a dois hectares; ii) não se inserirem, total ou parcialmente, no Sistema Nacional de Áreas Classificadas, como tal definido no Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho; iii) não se realizarem em terrenos percorridos por incêndios nos 10 anos anteriores; iv) tratando-se de rearborizações, não alterarem a espécie ou espécies dominantes anteriormente instaladas14

Nos termos do artigo 6.º ficam dispensadas de autorização e de comunicação prévias as ações de arborização e rearborização com recurso a espécies integradas em projetos florestais aprovados no âmbito de programas de apoio financeiro com fundos públicos ou da União Europeia, exceto quando localizadas em área integrada no Sistema Nacional de Áreas Classificadas, uma vez que se pressupõe que esses programas já conterão medidas e exigências que se alinham com as legalmente aplicáveis.

Este diploma sofreu grande contestação por dele parecer resultar a “liberalização” da área de plantação, sobretudo de eucaliptos, sempre que esta fosse inferior a 2 hectares. Todavia, não se deve olvidar que, pelo menos do ponto de vista teórico, seria sempre possível ao ICNF, I.P. determinar a reconstituição da situação anterior nas ações de arborização ou rearborização com espécies florestais que não fossem objeto de comunicação prévia válida, o que aconteceria nos casos em que esta comunicação desrespeitasse normas legais, regulamentares e de planeamento em vigor [alínea a) do n.º 1 do artigo 13.º].

O Decreto-Lei n.º 93/2013 foi alterado recentemente pela Lei n.º 77/2017, de 17 de agosto, que veio introduzir regras especiais para as plantações de eucaliptos, impedindo a arborização com esta espécie (exceto quando se trate de projetos de compensação autorizados, nas quais a plantação de áreas de eucalipto é acompanhada de um compromisso de investimento em áreas que garantam o uso agrícola ou pecuário ou com rearborização com espécies autóctones, em caso de uso florestal − cfr. artigos 3.º-B e n.os 5 a 10 do artigo 3.º-A15). A rearborização, por seu turno, só é permitida quando a ocupação anterior constitua um povoamento puro ou misto dominante, tal como definido em sede do Inventário Florestal Nacional, de espécies do mesmo género, e orientada de forma a aproximar-se progressivamente dos valores fixados na versão mais recente da Estratégia Nacional para as Florestas (aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 6-B/2015, de 4 de fevereiro de 2015)16. Note-se, porém, que no quadro 12 daquela Estratégia, o que se prevê é a manutenção no período temporal entre 2010 e 2030 da área florestal ocupada por eucaliptos (812), ainda que se preconize que os mesmos venham a ter uma participação cada vez menor na percentagem total das áreas florestais. Não nos parecem, por isso, ser objetivos e valores muito ambiciosos, sendo exigível que os PROF em revisão venham incluir metas mais ajustadas às suas áreas e objetivos de intervenção no que se refere à plantação de eucaliptos e de outras espécies (sobretudo se indesejadas).

Também a figura da comunicação prévia (artigo 5.º) sofreu algumas alterações, ampliando-se o prazo da sua entrega relativamente ao início da respetiva ação de arborização e de rearborização de 20 para 45 dias (n.º 3)17, e indiciando-se, ao contrário da solução legislativa anterior, que a comunicação passa a ser uma comunicação prévia com prazo. De facto, nos termos do artigo 10.º, n.º 5, prevê-se uma avaliação aleatória de 20% das comunicações prévias, emitindo o ICNF sobre elas decisão de rejeição, se for o caso. Ou seja, a comunicação prévia, na medida em que pode ser objeto de um ato expresso de rejeição (ainda que incidente sobre um universo menor de comunicações do que as inicialmente apresentadas) enquadra-se na figura legalmente prevista e regulada no artigo 134.º, n.º 2 e 3 do Código de Procedimento Administrativo. Nestas situações de comunicação prévia com prazo, a ausência de pronúncia do órgão competente não dá origem a um ato de deferimento tácito, mas habilita o interessado a desenvolver a atividade pretendida, sem prejuízo dos poderes de fiscalização da Administração e da possibilidade de esta utilizar os meios adequados à defesa da legalidade. 

Em particular, ainda, a comunicação prévia deixa de ser aplicável a rearborizações sempre que se trate de plantação de eucaliptos, o que significa que estes estarão sempre sujeitos a autorização.

Em qualquer caso, porém, a previsão legal de deferimentos tácitos ou de atos ficcionados, não parece acautelar da melhor forma os interesses que o legislador pretende agora tutelar de forma mais vigorosa. Isto porque qualquer uma destas soluções desloca o foco do controlo prévio para a fiscalização das ações de arborização e rearborização que se iniciaram sem qualquer pronúncia prévia expressa da Administração, remetendo, portanto, para a necessária adoção de medidas de reposição da legalidade cuja eficácia no nosso ordenamento jurídico tem sido limitada.

No que se refere, precisamente, à reação contra situações constatadas de ilegalidade, a alteração legislativa incluiu, para além das vias preexistentes da reconstituição da situação (artigo 13.º) e do programa de recuperação (artigo 14.º), a possibilidade de uma intervenção de natureza antecipatória e provisória: o embargo de quaisquer ações em curso, que estejam a ser efetuadas com inobservância do estabelecido no decreto-lei e na demais legislação aplicável, de modo a evitar que a situação de ilegalidade seja agravada pela conclusão da ação de arborização ou rearborização iniciada (artigo 15.º).

Especial referência, dentro do âmbito da presente análise – que se prende com o impacto territorial das operações de arborização e de rearborização – deve ser feita à coordenação entre a política florestal e a de urbanística, em especial ao modo como a mesma é perspetivada no artigo 10.º que se debruça sobre os critérios para a análise e decisão fundamentada dos pedidos de autorização18.

Efetivamente este artigo faz depender a autorização da conformidade do pedido com as disposições legais, regulamentares e técnicas com incidência nas ações de arborização e rearborização (n.º 1). E se do ponto de vista da ocupação racional do solo alguns desses critérios são evidentes (como o necessário respeito pelos instrumentos de gestão territorial e das servidões e restrições de utilidade pública aplicáveis), já nos suscita mais dúvidas a aplicação de outros, em especial o disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), que permite que os atos autorizativos relativos a ações de florestação e reflorestação, tenham como fundamento as “demais disposições orientadoras dos planos regionais de ordenamento florestal, dos planos diretores municipais, dos planos de gestão florestal e dos planos específicos de intervenção florestal, quando aplicável”. 

Se a remissão nesta disposição para os planos específicos de intervenção florestal e, sobretudo, para os planos de gestão florestal, nos termos atrás analisados, não nos levanta particulares apreensões dada a sua vinculatividade imediata, já a remissão para o disposto nos planos regionais de ordenamento florestal tem como função conferir-lhes uma eficácia direta relativamente aos particulares que, de outra forma, não teriam.

Ou seja, a norma em apreço, ao tomar em consideração as disposições orientadoras dos planos regionais de ordenamento florestal como fundamentos para a apreciação dos projetos de arborização ou rearborização, permite que estes, sem serem diretamente aplicados, possam, ainda assim, conformar decisivamente o sentido do ato (de autorização ou de indeferimento desta) a proferir. 

Deste modo, sem formalmente colocar em causa a regra da eficácia plurisubjetiva reservada aos planos (inter)municipais, uma vez que os planos regionais de ordenamento florestal não são, qua tale, aplicados às pretensões urbanísticas, chega-se aos mesmos efeitos: isto é, a consideração dos planos regionais de ordenamento florestal como forma de preenchimento normativo das causas de indeferimento previstas no artigo 10.º permite, afinal, usá-los para “indeferir” ou “autorizar” os projetos apresentados, mesmo antes da sua integração em planos (inter)municipais19

O que significa, enfim, que a formulação legal daquele artigo 10.º, n.º 1, alínea a), permitirá utilizar, como base de trabalho e de argumentação, as disposições orientadoras dos planos regionais de ordenamento florestal. 

Este exercício (de Berücksichtigung, ou de tomada em consideração, e não de Anwendung, ou de aplicação), implica, desde logo, que as normas do plano regional não sejam usadas diretamente com fundamento auto suficiente para o indeferimento, mas como elemento valorativo para a tomada de decisão.

Esta diferenciação poderia parecer espúria, por o resultado poder ser, em ambas situações, o mesmo (ou muito similar); todavia não o é. Isto porque se o plano setorial fosse diretamente aplicável (sem mediação de norma legislativa e/ou de atuação autorizativa da Administração), a sua violação geraria a nulidade; enquanto que se for mobilizável como referente normativo, por interposição legal, a violação das disposições do plano apenas será relevante se e na medida em que implique, igualmente, uma violação dos critérios legais de decisão (o que, geralmente, apenas conduz à anulabilidade).

Esta solução legal reitera a convicção, que já manifestámos antes, que os planos regionais de ordenamento florestal em revisão devem incorporar o mais possível indicadores e metas concretas de intervenção, uma vez que a adequada valoração das normas do plano regional de ordenamento florestal depende do seu grau de determinação ou precisão: a densidade normativa é um elemento essencial para que se possa extrair das disposições de planeamento critérios de decisão mais ou menos operativos para orientar a gestão e o ordenamento florestal.

 

5. Notas conclusivas

 O tema das florestas tem recentemente sido objeto de várias alterações legislativas que, ainda que surgidas numa conjuntura particularmente nefanda, tiveram o mérito de repensar instrumentos preexistentes, de modo a torná-los mais eficazes na hora de ordenar o solo florestal. A análise por nós feita de alguns desses instrumentos lança, porém, algumas dúvidas sobre a sua capacidade para corresponder aos novos desafios, sobretudo se não houver real e efetivo compromisso das entidades privadas e, sobretudo, públicas para a adoção de planos e para a tomada de decisões que incorporem critérios normativos adequados e operativos.

 

 

NOTAS

1 Professora Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

2 Gérard Buttoud, Les Politiques Forestières, Collection Que sais-je, PUF, Paris, 1998, pp. 4 e 5.

3 Veja-se ainda que, do pacote de legislação florestal aprovado em 2017, apenas não viu a luz do dia a proposta do Bloco de Esquerda de criação de um banco público de terras para arrendamento rural, visando promover a ocupação agrícola através do redimensionamento das unidades produtivas e da instalação de novos agricultores. O que confirma as dificuldades na instituição de formas mais restritivas ou mesmo ablativas de ocupação dos solos rústicos, como sucede com a declaração de abandono e o arrendamento compulsivo de terras.

4 Cfr. o quadro 6 incluído na Estratégia Nacional para as Florestas, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 6-B/2015, de 4 de fevereiro de 2015, que reconhece que as propriedades florestais  mais amplas correspondem a áreas de eucalipto e de sobreiro e azinheira, sendo estas que mostram mais presença de investimento.

5 O presente artigo tem a sua base no Colóquio "A Floresta e o Novo Pacote Legislativo", organizado pelo Colégio F3, no dia 17 de novembro de 2017, em Lisboa, no qual interviemos na mesa redonda sobre ordenamento do território e a propriedade florestal.

6 A caraterização destes instrumentos tem na base o nosso artigo “Regime Jurídico Florestal: A Afirmação de um Recurso”, Revista do CEDOUA, n.º 11, Ano VI, 1-2003, pp. 59-88, e o recente estudo por nós elaborado em coautoria com Fernanda Paula Oliveira intitulado Florestas – Algumas Questões Jurídicas, Coimbra, Almedina, 2018.

7 Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo, Vol. I, 4.ª ed., Almedina, Coimbra, 2008, p. 318, nota 57.         [ Links ]

8 Sobre a problemática e as dúvidas quanto à eficácia plurisubjetiva das normas de intervenção sobre a ocupação e utilização dos espaços florestais, cfr. Fernanda Paula Oliveira, Direito do Urbanismo. Do Planeamento à Gestão, AEDREL, Braga, 2018, 3.ª Edição, pp. 59 e ss.         [ Links ]

9 Cfr. o nosso “Regime Jurídico Florestal: A Afirmação de um Recurso”, Revista do CEDOUA, n.º 11, Ano VI, 1-2003, pp. 59-88.

10 Estas regras legais foram objeto de regulamentação no Despacho n.º 443-A/2018, de 9 de janeiro de 2018, do Gabinete do Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, alterado pelo Despacho n.º 1222-B/2018, de 2 de fevereiro de 2018, do Gabinete do Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural.

11 Sobre esta disposição cfr. os nossos “Defesa das pessoas e bens contra incêndios: A legislação florestal revisitada”, O Municipal, n.º 316, maio, 2007, pp. 12-13, e “Notas escolhidas sobre a concretização judicial e as alterações legislativas ao regime jurídico florestal”, in O Urbanismo, o Ordenamento do Território e os Tribunais, Coimbra, Almedina, 2010, pp. 65-90.

12 Note-se que a nova regulamentação dos PMDFCI vem confirmar a vigência necessariamente limitada destes, agora pelo prazo de 10 anos. Por isso mesmo, para evitar períodos de desproteção no âmbito da gestão urbanística municipal, exige o Despacho n.º 443-A/2018 que a atualização do PMDFCI ocorra com a necessária antecedência por forma a acautelar a ausência de planeamento (artigos 5.º, n.º 3 e 8.º, n.º 2).

13 Cfr., ainda, o Decreto-Lei n.º 180/89, de 30 de maio, que estabelecia regras para a obrigatória reflorestação de terrenos florestais percorridos por incêndios e sitos em áreas protegidas.

14 Ao que acrescem as situações nas quais a ação se encontre prevista em plano de gestão florestal aprovado em decisão expressa favorável do ICNF, I.P., que integre todos os elementos de conteúdo do projeto de arborização ou rearborização a que se refere a alínea a) do n.º 2 e o n.º 3 do artigo 7.º.

15 Porém, estes projetos de compensação apenas são possíveis seguidamente à incorporação do conteúdo dos PROF nos Planos Diretores Municipais, que definam os critérios e eventual localização das áreas a arborizar.

16 Como forma de evitar que, interregnamente, se procedesse a uma rearborização descontrolada com eucalipto s.p. em áreas com outras plantações, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 148/2017, de 5 de dezembro, que, até à entrada em vigor da Lei n.º 77/2017, de 17 de agosto (que, de acordo com o artigo 5.º, estava sujeita a um período de vacatio legis de 180 dias), passou a prever que aquela rearborização apenas podia ocorrer quando a ocupação anterior constituísse um povoamento puro ou misto dominante, tal como definido em sede do Inventário Florestal Nacional, de espécies do mesmo género.

17 Previu-se ainda a comunicação ao ICNF do início e conclusão dos trabalhos, de modo a viabilizar um mais fácil controlo daquelas ações.

18 Note-se que as comunicações prévias devem obediência aos mesmos critérios de arborização e rearborização, por muito indeterminados que aqueles sejam, como o demonstra hoje o n.º 5 do artigo 10.º.

19 Esta é uma técnica que tem vindo a ser utilizada pelo legislador também no âmbito de outros regimes jurídicos, como sucede com o Regime Jurídico da Reabilitação Urbana, no qual os motivos de indeferimento específicos previstos nesse diploma se alinham com a estratégia ou programa estratégico do instrumento próprio (que não são planos de pormenor de reabilitação urbana, mas cumprem funções similares, ainda que sem a eficácia típica destes), de modo a tomá-la como “parâmetro de apreciação das operações urbanísticas”. Neste sentido, cfr Fernanda Paula Oliveira, Dulce Lopes, Claudia Alves, Regime Jurídico da Reabilitação Urbana. Comentado, Coimbra, Almedina, 2011, p. 229.         [ Links ]