Introdução
A prática de cuidado de enfermagem, com consequente transmissão de conhecimentos, relação terapêutica de ajuda e trabalho em equipa, centra-se na comunicação. Neste processo partilham-se informações capazes de influenciar indivíduos e comunidades na promoção da saúde e prevenção da doença. Daí a importância da comunicação na cultura de segurança do local de trabalho (Nakamura et al., 2017).
O recurso à assertividade permitirá exprimir claramente sentimentos e desejos e defender os direitos individuais, garantindo a liberdade do outro (Alves, 2016), maior respeito, satisfação do indivíduo nas atividades diárias e segurança do utente (Nakamura et al., 2017), a aceleração da sua recuperação e a proteção do profissional da pressão diária a que está exposto (Alves, 2016).
Existe uma crescente preocupação na Enfermagem, sobre as posturas excessivamente racionais e relações marcadas pelo egocentrismo que podem resultar na desumanização de cuidados e em conflitos interpessoais. O desenvolvimento de habilidades sociais poderá ajudar a diminuir um comportamento distante e frio, por parte do profissional, reduzindo, consequentemente, reações de frustração ou cólera em doentes e famílias (Alves, 2016). Inserida nestas classes de comportamentos sociais adequados está a assertividade que se destaca como uma das mais importantes (Montezeli et al., 2018). Tornar-se mais assertivo é uma das chaves para o sucesso das relações com utentes e famílias, por potenciar um maior reconhecimento e respeito do enfermeiro, enquanto pessoa e profissional (Haladin et al., 2015).
Tendo em conta o supracitado, o presente estudo tem como objetivo analisar a relação entre as características sociodemográficas e profissionais dos enfermeiros das Unidades de Saúde Familiar de um Agrupamento de Centros de Saúde (ACeS) do norte de Portugal e a adoção de comportamentos assertivos.
Enquadramento/fundamentação teórica
Comunicar assertivamente assegura eficácia e eficiência na transmissão de informação (Montezeli et al., 2018). A falta de assertividade precipita conflitos, frustrações e perda primordial de informação, podendo colocar em causa o processo de cuidados (Nakamura et al., 2017). Comunicar assertivamente significa defender e expressar, aberta e honestamente, direitos, sentimentos e desejos pessoais, sem que se violem os direitos do outro. Implica a responsabilidade pelas ações tomadas, o respeito pelas opções e pontos de vista dos restantes, clareza no uso das palavras e saber escutar (Alves, 2016). Ser assertivo poderá contribuir para um maior reconhecimento, para a satisfação no desempenho de tarefas e no relacionamento com equipa e utentes (Haladin et al., 2015; Nakamura et al., 2017) e para o progresso de cura e bem-estar do utente (Alves, 2016).
Por tudo isto e para assegurar uma abordagem holística, a comunicação assertiva é essencial na Enfermagem. Contudo, a literatura não clarifica se, atualmente, os enfermeiros são ou não assertivos (Marinho & Borges, 2020). Também foi escassa, nem sempre concordante e pouco atual os estudos identificados que abordassem a influência de características sociodemográficas e profissionais nesta habilidade social. Variáveis como a idade, sexo, estado civil e habilitações literárias foram as mais reportadas, embora a evidência não seja consensual. No que concerne à idade, por um lado, investigadores defendem que indivíduos mais velhos tendem a ser mais assertivos, já que indivíduos mais novos ficarão desconfortavelmente tensos quando adotam a assertividade como resposta (Vagos & Pereira, 2010); por outro lado, persiste a crença de que enfermeiros mais velhos serão menos assertivos, dada a evolução da independência que a profissão tem vivido (Kilkus, 1993).
Em relação ao sexo, alguns estudos reportam não haver relação entre essa variável e o nível de assertividade (Kılıç & Sevinç, 2017; Silva et al., 2017). Outros estudos, consideram que indivíduos do sexo feminino tendem a adotar com maior frequência comportamentos assertivos, já que são mais emocionais (Vagos & Pereira, 2010). Igualmente para o estado civil. Algumas investigações evidenciaram que não apresenta relação com o nível de assertividade (Vagos & Pereira, 2010), outras (Sousa & Araujo, 2015) demonstraram que as pessoas casadas adotam menos comportamentos assertivos, devido à diminuição do repertório de habilidades sociais, pelo decremento da rede social onde se envolvem para favorecimento da relação com o cônjuge.
A influência das habilitações literárias na adoção de comportamentos assertivos é também controversa, verificando-se autores que defendem que as mesmas não se relacionam (Kılıç & Sevinç, 2017) e os que apresentaram correlação significativa, onde mais anos de escolaridade, em especial grau académico superior, se traduzem em maior adoção de comportamentos assertivos (Kilkus, 1993). Uma explicação apontada é o facto do desafio de concluir um curso superior exigir maior assertividade. Por outro lado, um maior nível de formação académica trará mais conhecimento e, com isso, uma autonomia superior, resultando em comportamentos mais assertivos (Kilkus, 1993).
No que concerne a características profissionais, autores defendem que indivíduos com posições de chefia tendem a ser mais assertivos (Amaro & Jesus, 2008), bem como profissionais que apresentem um vínculo ao quadro institucional (Amaro & Jesus, 2007), já que a incerteza contratual poderá ser um elemento destabilizador, por impedir projetos a longo prazo, resultando em comportamentos menos adequados (Cerqueira, 2021). A satisfação laboral também parece relacionar-se positivamente com a adoção de comportamentos assertivos (Amaro & Jesus, 2008).
Metodologia
Estudo quantitativo, transversal descritivo-correlacional, que teve por base as hipóteses: i) há uma relação entre as características sociodemográficas dos enfermeiros e a adoção de comportamentos assertivos; e ii) há uma relação entre as características profissionais dos enfermeiros e a adoção de comportamentos assertivos.
Estudo realizado num ACeS do norte de Portugal, após aprovação da Comissão de Ética para a Saúde (parecer n.º 53/2021). Este ACeS inclui 16 USF, com um total de 108 enfermeiros (94 do sexo feminino e 14 do sexo masculino) em funções como Enfermeiro de Família. Recorreu-se a uma amostragem de carácter não- probabilístico, por conveniência. Definiram-se como critérios de inclusão da investigação exercer funções como enfermeiro em USF do ACeS Maia Valongo e aceitar participar no estudo. O critério de exclusão foi não exercer funções em USF do ACeS Maia Valongo.
Na recolha de dados utilizou-se um questionário constituído por duas partes: (i) questionário sociodemográfico, profissional e de satisfação laboral, para caraterização da amostra, por abordagem de variáveis como sexo, estado civil, idade, habilitações literárias, categoria profissional, vínculo contratual e realização profissional; (ii) Escala de Avaliação dos Comportamentos Assertivos dos enfermeiros, que avalia a adoção de comportamentos comunicacionais assertivos, desenvolvida e validada por Amaro e Jesus (2007). Medida de autorrelato, sob a forma de Likert, com 6 itens, variando entre Nunca (1) e Sempre (6), que inclui duas subescalas: (A) avalia os comportamentos assertivos com os utentes, constituída por 6 itens; (B) avalia os comportamentos assertivos com a equipa multidisciplinar, constituída por 18 itens. As respostas obtidas permitem classificar a adoção de comportamentos assertivos em três níveis: [1-3] pouca frequência; [3-4] alguma frequência; [4-6] muita frequência (Amaro & Jesus, 2007). Os dados de consistência interna (Alpha de Cronbach) para a escala global e subescala A e B foram de 0,898, 0,760 e 0,895, respetivamente (Amaro & Jesus, 2007). Neste estudo obteve-se um Alpha de Cronbach para a escala global, subescala A e B de 0,940, 0,832 e 0,936, revelando muito boa consistência interna para a escala total e para a subescala B e boa consistência interna para a subescala A (Pestana & Gageiro, 2014).
Previamente à recolha de dados, foi solicitada autorização à Direção do ACeS e aos Coordenadores das unidades envolvidas. Na recolha utilizou-se um questionário eletrónico, tendo sido enviado a cada um dos enfermeiros um e-mail com acesso ao link do questionário, onde constava o consentimento informado. Processo que decorreu entre 19 de julho de 2021 e 19 agosto de 2021. Como estratégia de adesão ao estudo, foram enviados lembretes a cada 10 dias. Para analisar as características sociodemográficas recorreu-se a estatística descritiva (frequência e percentagem, média e desvio padrão). O estudo da normalidade da distribuição realizou-se através do Kolmogorov-Smirnov (K-S), não estando os pressupostos da normalidade assegurados foram utilizados testes não paramétricos. Para avaliação de relação de independência entre uma variável quantitativa e uma qualitativa dicotómica recorreu-se ao teste não paramétrico MannWhitney (U). Para avaliar a relação de independência entre uma variável quantitativa e qualitativa policotómica recorreu-se ao teste não paramétrico Kruskal Wallis (H). Para avaliar a correlação de independência entre duas variáveis quantitativas ou entre duas variáveis qualitativas ordinais foi aplicado o teste Pearson (r), ou correspondente não paramétrico Rhó Spearman (rs), sendo que: r < 0,2 - associação muito fraca; 0,2 ≤ r < 0,4 - associação fraca; 0,4 ≤ r < 0,7 - associação moderada; 0,7 ≤ r < 0,9 - associação elevada; 0,9 ≤ r ≤1 - associação muito elevada (Pestana & Gageiro, 2014). No tratamento dos dados utilizou-se o Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 27, e um nível de significância de 5%.
Resultados
Foram enviados 108 questionários tendo-se obtido resposta de 66 enfermeiros (taxa de resposta 61,1%), que constituiu a amostra. A média de idade foi de 47,61±6,5 anos, variando entre os 36 e os 59 anos. A maioria dos enfermeiros eram do sexo feminino (81,8%), casados (74,2%) e licenciados (86,4%).
A amostra dividiu-se entre as categorias de Enfermeiro (50%) e de Enfermeiro Especialista (50%). A maioria tinha experiência em outros serviços (65,15%), não tinha formação em Enfermagem de Saúde Familiar (57,58%) e encontrava-se em contrato em funções públicas (77,27%). As médias de tempo de serviço: na carreira foi de 23,65±6,98 anos (variando entre os 0 e os 37 anos); na categoria profissional foi de 17,39±9,24 anos (variando entre os 0 e os 33 anos); e na USF foi de 11,59±3,43 anos (variando entre os 2 e os 17 anos).
Optou-se por se diferenciar das características sociodemográficas e profissionais variáveis que condicionam a satisfação no trabalho, sendo estas o gosto pelo local de trabalho, a consideração de que as ideias do próprio são escutadas e colocadas em prática e que possui as condições de trabalho adequadas e o sentimento de realização profissional.
Mais de três quartos da amostra (92,42%) gostavam do seu local de trabalho e consideravam que as suas ideias eram escutadas e colocadas em prática (77,3%). Pouco mais de metade (54,5%) considerava ter as condições de trabalho adequadas e 74,2% sentiam-se realizados enquanto enfermeiros.
A adoção de comportamentos assertivos pelos enfermeiros da amostra foi elevada, já que a análise da Escala de Avaliação dos Comportamentos Assertivos dos enfermeiros evidenciou uma média de 4,86±0,65 (mínimo 3,46 e máximo 6). A subescala Comportamentos assertivos com o utente foi a que apresentou o valor mais elevado (5,09±0,63). A subescala comportamentos assertivos com a equipa multidisciplinar obteve valores médios de 4,78±0,73 (Tabela 1).
Ressalva-se que, para teste de hipóteses, na variável estado civil, agruparam-se os elementos da amostra que se encontravam solteiros aos que se encontravam divorciados/separados, formando a variável “não casados”, e agruparam-se os “casados” com os que se encontravam em situação de “união de facto”, formando a variável “casado/união de facto”. Nas habilitações literárias optou-se por se excluir o único elemento com bacharelato e agruparam-se os elementos com pós-graduação aos elementos com mestrado, variável que se denominou “pós-graduada”. Não se verificaram diferenças estatisticamente significavas entre a escala total e subescalas de comportamentos assertivos e o sexo, o estado civil e as habilitações literárias. Também não se verificou correlação estatisticamente significativa entre a variável idade e a escala total de adoção de comportamentos assertivos e cada uma das suas dimensões (Tabela 2).
Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre a escala total e subescalas de comportamentos assertivos e a variável profissional vínculo à USF. Também não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre a escala de adoção de comportamentos assertivos e subescalas com as variáveis: categoria profissional e formação em Enfermagem de Saúde Familiar (Tabela 3). Verificou-se evidência estatística para afirmar que a adoção de comportamentos assertivos difere consoante a experiência em outros serviços para a escala total (U(2)=317,50, p=0,017), para a subescala comportamentos assertivos com o utente (U(2)=330,500, p=0,027) e para a subescala comportamentos assertivos com a equipa multidisciplinar (U(2)=340,00, p=0,037), sendo o valor da mediana mais elevado nos profissionais com experiência em outros serviços (Tabela 3).
Não se verificaram correlações estatisticamente significativas entre a escala total e as subescalas de adoção de comportamentos assertivos e os tempos de serviço na USF e na categoria profissional. Verificou-se correlação significativa, positiva e fraca entre o tempo de serviço na carreira e a escala total de comportamentos assertivos (rs=0,304, p=0,013) e a dimensão comportamentos assertivos com a equipa multidisciplinar (rs=0,333, p=0,006) (Tabela 3).
Verificou-se evidência estatística para afirmar que a adoção de comportamentos assertivos varia consoante o gosto pelo local de trabalho, para a escala total (U(2)=52,00, p=0,012) e para a dimensão comportamentos assertivos com a equipa multidisciplinar (U(2)=43,50, p=0,005), sendo o valor de mediana superior nos profissionais que gostam do seu local de trabalho (Tabela 4). Não se verificou relação estatisticamente significativa entre as restantes variáveis de satisfação no trabalho com a escala total de comportamentos assertivos e suas subescalas (Tabela 4).
Discussão
A presente investigação analisou a associação entre características sociodemográficas e profissionais de enfermeiros a exercer funções em USF e a adoção de comportamentos assertivos, com utentes e equipa multidisciplinar.
Obteve-se uma taxa de resposta de 61,1%, justificável pela condição pandémica vivida, que implicou a mobilização de enfermeiros para unidades dedicadas ao acompanhamento de doentes com sintomas respiratórios e à vacinação e, consequentemente, um aumento de trabalho.
Em relação à caracterização da amostra, esta foi na sua maioria do sexo feminino, espelhando a realidade portuguesa (Ordem dos Enfermeiros, 2021), com idade média de 47 anos. A taxa de resposta foi de 61,1%, tendo-se verificado uma taxa superior para indivíduos do sexo masculino - 85,7% para 56,8% no sexo feminino.
Os enfermeiros adotam comportamentos assertivos na sua relação com os utentes e equipa multidisciplinar, sendo o valor médio elevado (4,86±0,65), o que reforça o reportado em outros estudos (Amaro & Jesus, 2008; Costa, 2009; Kilkus, 1993).
Neste estudo não se verificou uma diferença estatisticamente significativa entre a adoção de comportamentos assertivos, com utentes e equipa multidisciplinar, e as características sociodemográficas. Dados que corroboram com resultados de estudos nacionais e internacionais, que não evidenciam diferenças entre a adoção de comportamentos assertivos e a idade, o estado civil, as habilitações literárias (Vagos & Pereira, 2010) e o sexo (Kılıç & Sevinç, 2017; Silva et al., 2017). Não obstante, apesar de não se verificar relação entre a idade e a adoção de comportamentos assertivos, o facto é que a média destes comportamentos foi elevada e as idades,além de apresentarem alguma homogeneidade (mín. 36; máx. 59), implicavam maior maturidade (47,616,5 anos), o que poderá sugerir, tal como defendido por alguns autores (Kilkus, 1993; Vagos & Pereira, 2010) que a maturidade aumenta a assertividade. A ausência de relação entre o sexo e a adoção de comportamentos assertivos poderá justificar-se, como defende Silva et al. (2017), com o facto da assertividade ser independente de questões biológicas e se relacionar com questões comportamentais, apresentando-se como um comportamento aprendido e não como uma habilidade social de natureza fisiológica. Por outro lado, o resultado obtido com o estado civil, pode dever-se à amostra do estudo, que é totalmente constituída por enfermeiros que diariamente lidam com utentes, famílias e equipa multidisciplinar, mantendo uma rede social ampla, que ajuda a trabalhar as habilidades sociais. Por fim, a falta de relação detetada entre as habilitações literárias e os comportamentos assertivos, poderá advir do facto da amostra apresentar grau académico elevado (licenciatura ou superior), parecendo ser certo que o conhecimento aumenta a assertividade (Amaro & Jesus, 2007).
Em relação às variáveis profissionais, neste estudo não se verificou diferença estatisticamente significativa entre a adoção de comportamentos assertivos e a categoria profissional e o vínculo laboral, tal como evidenciado nos estudos de Gerry (1989) e Almeida (2009), respetivamente. Uma possível explicação poderá ser a ausência de enfermeiros gestores neste estudo, que, segundo Amaro e Jesus (2008), tendem a apresentar maior assertividade. Além disso, no caso das USF enfermeiros e enfermeiros especialistas desempenham funções com o mesmo grau de responsabilidade e autonomia. A falta de relação verificada entre a adoção de comportamentos assertivos e o vínculo laboral poderá estar relacionada com o aumento de trabalho motivado pela pandemia, que acarretou alguma estabilidade, e com o facto da filosofia das USF não se alterar consoante o contrato de trabalho do indivíduo.
Já a experiência em outros serviços relacionou-se de forma estatisticamente significativa com a adoção de comportamentos assertivos. Apesar de não se terem encontrado estudos que relacionassem estas duas variáveis, em 1989 Gerry explicava que o conhecimento adquirido através da experiência permite que o enfermeiro ganhe poder e dessa forma resista a situações de exploração, por adoção de respostas mais assertivas, capazes de expor as suas ideias e valores.
A formação em Enfermagem de Saúde Familiar não se relacionou de forma estatisticamente significativa com a adoção de comportamentos assertivos. Também não se encontraram estudos que relacionassem as duas variáveis, contudo esta formação considera-se como um incremento às habilitações literárias por si só elevadas, como já referido.
O tempo de serviço na carreira correlacionou-se positivamente com a adoção de comportamentos assertivos, contrariando o estudo de Costa (2009) que não verificou correlação entre as variáveis. Uma possível explicação poderá ser o facto de o tempo de serviço aumentar conhecimento, levando a um empoderamento do indivíduo e, com isso, uma adoção de comportamentos mais assertivos.
Os tempos de serviço na USF e na categoria profissional não se correlacionaram com a assertividade. A explicação poderá residir, por um lado, no facto das experiências profissionais, com utentes e equipa, decorrerem essencialmente do tempo de serviço como enfermeiros, independentemente do local onde exerçam a sua atividade e do tempo na categoria profissional. Por outro lado, verificaram-se médias elevadas nas duas categorias (tempo na categoria profissional=17,399,24; tempo de serviço na USF=11,593,43) que legitimam um nível superior de confiança, com equipa e utente, e, por isso, uma adoção frequente de comportamentos assertivos.
À exceção do gosto pelo local de trabalho, as variáveis de satisfação laboral não influenciaram a adoção de comportamentos assertivos. Contudo, no estudo com dirigentes de um grupo empresarial Queirós (2015) concluiu que a assertividade se relacionava com a satisfação laboral. A diferença detetada poderá justificar-se, por um lado, pelo elevado nível de comportamentos assertivos da amostra, que se refletirá na diminuição do risco de conflitos laborais e melhores relações interpessoais, aumentando a satisfação e desempenho profissionais (Costa, 2009). E, por outro, porque a adoção de comportamentos assertivos, em contexto laboral, se relaciona mais com capacidade para regular as emoções, conhecimento do trabalhador dos seus direitos assertivos e maior facilidade em expressar assertivamente sentimentos positivos, por uma cultura mais permissiva para os mesmos (Freitas, 2001), e não tanto com o sentimento de ideias escutadas e colocadas em prática, condições adequadas de trabalho e sentimento de realização profissional.
Aliás, o facto de o profissional sentir que as suas ideias não são escutadas, não impede que as exponha assertivamente, quando muito, poderá inibir a sua apresentação.
Conclusão
Os enfermeiros adotam comportamentos assertivos de forma elevada com utentes e equipa multiprofissional. Neste estudo a assertividade não se relacionou com as características sociodemográficas. Contudo, o tempo de serviço na carreira, a experiência em outros serviços e o gosto pelo local de trabalho demonstraram relacionar-se de forma positiva com os comportamentos assertivos dos enfermeiros.
Esta habilidade social, tal como defendido por diversas investigações, previne conflitos, melhora relacionamentos com a equipa multidisciplinar, aumenta a satisfação laboral, permite uma atuação mais crítica, holística e desviada de um modelo biomédico, e pode ser aprendida. Ainda assim, existe uma lacuna no reconhecimento da sua importância para a prática de enfermagem, verificada pela falta de investimento das instituições em formações na área. Este estudo apresenta limitações. A colheita de dados foi realizada por questionários de autopreenchimento e, por isso, as respostas podem estar sujeitas ao viés de desejabilidade. Além disso, o tamanho da amostra e a amostragem de carácter não-probabilístico num único ACeS limitam a possibilidade de generalização dos resultados. Por último, o desenho do estudo não permitiu determinar se os valores obtidos se mantinham constantes ao longo do tempo e/ou se foram influenciados pela pandemia.
Ainda assim, ficou clara a importância da adoção da assertividade para assegurar uma cultura de segurança e qualidade, facto que as instituições de saúde deverão ter em conta. Aliás, considerando os resultados obtidos, devem priorizar a promoção de ambientes favoráveis à aprendizagem e prática e o aumento de experiências dos enfermeiros, nomeadamente por facilitação dos processos de mobilidade entre serviços.