Introdução
A necessidade de debater estratégias de desenvolvimento regional - visão modificada gradativamente ao longo do século XX - agregou diversas abordagens, teorias e modelos para compreender e estimular as trajetórias alternativas possíveis para a promoção do desenvolvimento no âmbito regional (Capello, 2009; Filho, 2002). Conforme Resende e Hasegawa (2020), este tema tornou-se foco dos debates no contexto de Economia Regional - também desenvolvido no século XX para tratar das disparidades socioespaciais (Alves et al., 2024) - para o estabelecimento de elementos que incentivassem o crescimento do produto regional e seus benefícios.
Dentre os debates, podem-se mencionar os seminais que surgiram nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial, a saber: i) década de 1950 - "pólo de crescimento" a partir da observação de concentrações industriais na Europa (França e Alemanha) de François Perroux, em 1955; ii) década de 1960, com a teoria da “Causação Circular Cumulativa” (CCC) de Myrdal (1972) para explicar a dinâmica econômica regional de um sistema econômico instável e desequilibrado; iii) efeitos para trás e para frente, elaborado por Hirschman (1961), que considera as indústrias-chave (ou indústrias motrizes de Perroux) como propulsoras do potencial crescimento do produto; iv) teoria de “produtos de exportação” (década de 1960), referindo-se aos bens de forma coletiva de uma região, elaborada por Douglas North e conhecida como a “Teoria da Localização e Crescimento Regional” (North, 1977).
Este quadro mostra a preocupação existente com os problemas regionais, o que culminou, na década de 1980, com a ideia de economias externas em cinco abordagens, dentre elas, a Nova Geografia Económica (NGE), cujos principais autores foram Brian Arthur e Paul Krugman (Fochezatto & Valentini, 2010). Os estudos advindos da NGE, indicavam o destaque da proximidade geográfica dos agentes como estreitamento de laços de confiança e cooperação, potencializando parcerias e compartilhamento de recursos entre os agentes locais, além de incentivar inovações e sinergia coletiva (Diniz et al., 2006; Silva & Pascuci, 2020; Tahim et al., 2024). Assim, nota-se que a discussão sobre Economia Regional foi resgatada da Teoria Económica por essa NGE (Alves et al., 2024).
Desde o surgimento da NGE, com contribuição do estudo de Krugman (1991), muitos pesquisadores direcionaram atenção em fornecer fundamentos teóricos e elementos empíricos para colaborar com pesquisas sobre distribuição geográfica de atividades económicas com uso de modelos estatísticos de variáveis espaciais (Fujita et al., 2000; Krugman & Venables, 1995; Puga & Venables, 1999). Além disso, a NGE trabalha as disparidades no desenvolvimento econômico regional - dada a falta de continuidade espacial e a não-monotonicidade no crescimento econômico - tornando-se, ao mesmo tempo, um campo de pesquisa de difícil compreensão, mas atrativo para os pesquisadores (Gaspar, 2018). Esta distribuição espacial das atividades económicas é influenciada pelas características naturais (clima, relevo, vegetação, solos) e pela qualidade de instituições políticas específicas, causando efeitos em outras regiões. Assim, as redes espaciais formadas entre os locais criam interações ricas que impactam em locais próximos (Allen & Arkolakis, 2023).
Neste contexto, o setor turístico ganhou interesse em diversas áreas de conhecimento (sociologia, geografia, administração, economia) e permitiu reflexões e produções importantes, adquirindo um lugar relevante nas produções científicas. Estas áreas trouxeram contribuições significativas para o entendimento do turismo como fenómeno que envolve uma abordagem holística a partir de seus aspetos económicos, sociais, culturais, ambientais e espaciais, de modo a permitir a construção de resultados e relacioná-los com múltiplos impactos nas localidades, regiões e/ou países (Williams & Shaw, 1999). Por estas questões, o setor turístico permeia debates políticos a nível federal, estadual e municipal, mostrando ser um elemento importante para estimular a criação de emprego e renda, uma vez que se capitaliza, direta e indiretamente, em diversas outras atividades económicas heterogéneas (Brasileiro, 2012; Viana et al., 2020).
Nessa esteira, a variável económica “emprego” desponta como uma das principais para aferir o dinamismo e a performance de uma região económica num determinado período, pois à medida que o seu volume quantitativo aumenta, espera-se melhoras nos indicadores de crescimento geral (Monte et al., 2017). Por este motivo, esta temática tem vindo a estimular estudos sobre a dinâmica regional da criação de trabalho, os quais se assemelham no método analítico escolhido: método Shift-Share ou diferencial-estrutural (Monte et al., 2017; Resende & Hasegawa, 2020; Viana et al., 2020, 2024). Este método consiste na análise de componentes de variação baseada nas teorias sobre estudo regional de Perroux, Myrdal e Hirschman, oferecendo bons indicadores de desempenho de crescimento regional (Simões, 2005).
Diante da complexidade do setor de turismo, em especial o cearense, ainda existem lacunas que necessitam de novos aprofundamentos, tais como: qual a dinâmica do emprego formal no setor turismo dos municípios turísticos do litoral cearense? Neste contexto, o objetivo é examinar a dinâmica dos setores turísticos específicos dos municípios costeiros (litoral Leste e Oeste) do Estado do Ceará que contribuíram para o crescimento ou declínio do emprego formal entre 2010 e 2019.
Destarte, analisar a dinâmica produtiva e a evolução do mercado formal do turismo nas cidades turísticas litorâneas do Ceará é importante para a compreensão das possibilidades de crescimento e desenvolvimento regional, principalmente dentro de um panorama em que esse litoral foi priorizado por políticas públicas e de financiamentos nacional e internacional para reordenamento territorial (Dias & Coriolano, 2019). Isto demonstra que o turismo litorâneo foi pensado como um setor estratégico para promoção do desenvolvimento económico do estado, o que o colocou como um dos principiais destinos de sol, mar, praia e vento do Brasil, resultado da competitividade e dinamismo económico e socioespacial (Dias & Coriolano, 2019). Estes elementos reforçam o ineditismo deste estudo e na sua relevância para a compreensão da estrutura produtiva dos municípios turísticos, de modo a subsidiar políticas públicas.
Além desta introdução teórica, o estudo está estruturado em três secções. Na segunda, apresenta-se o percurso metodológico realizado. Em seguida, na terceira secção, realizou-se a apresentação dos resultados e a discussão referente a aplicação do método Shift-Share para a exposição da dinâmica produtiva dos municípios selecionados. Por fim, a quarta secção traz as considerações finais.
Metodologia
O Estado do Ceará é composto por 184 municípios, divididos em 14 regiões de planejamento, dentre elas, as duas selecionadas para este trabalho (fig. 1): Região de Planejamento do Litoral Leste (Aracati, Beberibe, Fortim, Icapuí, Itaiçaba e Jaguaruana) e a Região de Planejamento do Litoral Oeste/Vale do Curu (Amontada, Apuiarés, General Sampaio, Itapipoca, Itapajé, Irauçuba, Miraíma, Pentecoste, Tejuçuoca, Tururu, Umirim e Uruburetama) (Ceará, 2019).
Esta pesquisa é exploratória, descritiva e quantitativa. É de natureza quantitativa pois demonstra a importância dos dados secundários recolhidos para medir, inferir e compreender a relação entre eles de forma precisa e objetiva (Creswell & Clark, 2017; Proetti, 2018). Quanto à tipologia desta pesquisa - exploratória e descritiva - procura-se descrever e entender os fenómenos na forma em que eles se apresentam na realidade (Gray, 2012).
Para a análise macroeconómica dos municípios (variável emprego), foram utilizados os cinco grandes setores econômicos (Indústria, Construção Civil, Comércio, Serviços e Agropecuária), conforme definidos e disponibilizados no Relatório Anual de Informações Sociais (RAIS) e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para a compreensão da estrutura produtiva de turismo dos municípios que compõem as regiões selecionadas (Leste e Oeste), em especial os municípios turísticos costeiros de “sol, praia, mar e vento” (Amontada, Aracati, Beberibe, Fortim e Icapuí), optou-se pelo método Shift-Share ou diferencial-estrutural para os dados de emprego da divisão de CNAE2.0 referentes ao turismo em 2010 e 2019. A opção por este período deve-se à possibilidade de compreender a caracterização da estrutura produtiva no período pré-pandemia da COVID-19, que causou efeitos em muitos setores económicos, principalmente no turismo (quadro I). Neste ponto, deve-se ressaltar que a divisão de Classificação Nacional de Atividades económicas (CNAE) é realizada no Brasil pelo IBGE, sendo utilizado, também, pela International Standard Industry Classification (ISIC) (Oliveira & Knuth, 2024).
Quadro I Divisão de CNAE 2.0 referentes ao turismo.
| Divisão | Fonte/período |
|---|---|
| Transporte Terrestre | BBrasil (2023) |
| Transporte Aquaviário | |
| Transporte Aéreo | |
| Armazenamento e Atividades Auxiliares dos Transportes | |
| Alojamento | |
| Alimentação | |
| Agências de Viagens, Operadores Turísticos e Serviços de Reservas | |
| Atividades Artísticas, Criativas e de Espetáculos | |
| Atividades Ligadas ao Patrimônio Cultural e Ambiental | |
| Atividades de Exploração de Jogos de Azar e Apostas | |
| Atividades Esportivas e de Recreação e Lazer | |
| Atividades de Organizações Associativas |
Fonte: Relatório Anual de Informações Sociais (Brasil, 2023)
O método diferencial-estrutural consiste em observar o que a região de estudo possuiria, caso o seu crescimento ocorresse com as mesmas taxas da região de referência, que neste estudo considerará o Ceará (Vieira et al., 2017). Contudo, apesar da simplicidade do método, pode-se extrair e sugerir insights para debates de política de desenvolvimento regional, sendo dividido em três efeitos, a saber: i) o efeito estrutural ou proporcional mostra se a estrutura indica setores mais ou menos dinâmicos em relação à região de referência, revelando, inclusive, o grau de especialização dessa região nos setores considerados; ii) o efeito regional reflete a capacidade de uma determinada região ofertar vantagens comparativas para determinados setores em relação a outras regiões, uma vez que valores positivos demonstram que a região possui setores ou indústrias com vantagens comparativas em relação a outras; iii) o efeito diferencial, por conseguinte, mostra se a região teve maior crescimento do que teria se obtivesse as mesmas taxas que a região de referência (Costa & Costa, 1996; Viana et al., 2020).
Assim, a variável emprego entre dois períodos “p” (0 e 1) pode ser demandada para mensurar os três efeitos ou variações, que são: efeito estrutural/proporcional (P j ), efeito regional/diferencial (R j ) e efeito total (D j ) (Viana et al., 2020, 2024).
Em que “i” se refere aos setores e “j” diz respeito às regiões consideradas. O P j - efeito proporcional/estrutural - representa, de maneira geral, o volume marginal de emprego ou renda que o município “j” adquiriu entre os períodos considerados por conta da composição da sua estrutura produtiva, podendo assumir valores positivos (estrutura produtiva de setores em que o emprego/renda crescem a taxas superiores à estadual) ou valores negativos. Este efeito é dado por:
O Rj (efeito regional/diferencial) representa a taxa de crescimento hipotética, ou seja, a variação do emprego (ou da renda) no setor da região que teria acontecido se o crescimento ocorresse conforme a taxa estadual. Assim, caso a variação real for maior que a variação teórica, isso significaria que o emprego (ou renda) do setor “i” no município “j” cresceu acima da média estadual e que há elementos dinâmicos internos e/ou externos atuando na região de forma positiva. O inverso acontecerá caso a variação real seja inferior à hipotética (Viana et al., 2020). Este efeito pode ser aferido da seguinte maneira:
Por último, o efeito diferencial (Dj) expressa as possibilidades de vantagens (ou desvantagens locacionais) de um determinado setor em uma dada região, considerando as suas especificidades locais (Costa & Costa, 1996; Viana et al., 2020, 2024).
O efeito Dj pode ser mensurado a partir da aplicação da equação 4:
Isto posto, pode-se aferir a taxa de crescimento do emprego/renda a partir da equação 5 (Vieira et al., 2017; Viana et al., 2020, 2024):
Em seguida, aferiu-se a variação proporcional revertida, em que se considera como peso o ano final em vez do inicial para gerar a variação proporcional revertida e a variação líquida resultante (Haddad, 1974; Viana et al., 2024). Estas alterações adicionadas a este método resultam no efeito ou variação estrutural/proporcional revertida
(Equação 6).
A variação estrutural/proporcional modificada
é expressa por:
. Se
, a região se especializou em setores cuja taxa de crescimento do emprego é favorável em nível estadual, enquanto a variação diferencial residual (
) é expressa por:
(Resende & Hasegawa, 2020; Viana et al., 2020).
Além dessas informações, foram elaborados dois indicadores adicionais que evidenciam a (in)existência de atividades produtivas fortes nos municípios. O primeiro indicador mencionado é o Quociente Locacional (QL) para representar a especialização relativa de uma localidade em relação a um setor específico ou atividade económica. É calculado como a razão entre duas estruturas económicas: o numerador representa a "economia" em estudo (municípios selecionados), enquanto o denominador representa uma "economia de referência", que pode ser o próprio estado do Ceará, ou região Nordeste ou Brasil. Este indicador metodológico é amplamente utilizado na literatura para investigações de especialização de aglomerações de atividades económicas produtivas (Filho, 2006).
Haddad (1974) explica que o QL compara a participação percentual de estabelecimentos ou empregos formais de uma região económica selecionada em um setor específico com a participação percentual dessa mesma região no total de estabelecimentos ou empregos da economia de referência. A fórmula para calcular o QL é a seguinte equação 7:
Em que: E j i é o estabelecimento/emprego do setor "i" na região "𝑗"; E j é o estabelecimento/emprego total na região "𝑗"; E BR i é o estabelecimento/emprego do setor "𝑖" no Brasil; e, por fim, E BR é o estabelecimento/emprego total no país. O Brasil foi considerado a referência neste indicador, pois caso o valor esteja acima de 1, evidenciará que a atividade realmente possui representatividade em termos de estabelecimento ou empregos.
O resultado do QL é uma fração que varia de 0 a 1, indicando que o setor em estudo na região em questão é menos representativo do que na economia de comparação, quando o valor é menor que 1. Por outro lado, se o valor for maior que 1, isso indica que o setor em estudo na região é mais representativo do que na economia de comparação. Portanto, valores acima de 1 sugerem uma concentração do setor específico na região focalizada (Haddad, 1974).
No entanto, o uso do QL apresenta algumas limitações. Esta metodologia deve ser aplicada de forma exploratória, pois ela apenas indica a localização das concentrações de setores produtivos e/ou de serviços, sem fornecer informações sobre a densidade da atividade em questão ou o grau de complexidade da aglomeração. Além disso, o QL não leva em conta os estabelecimentos e empregos informais existentes na localidade, deixando algumas aglomerações ou parte delas fora do campo de observação. Estas limitações ressaltam a necessidade de uma análise cuidadosa e complementar ao interpretar os resultados obtidos por meio desta metodologia.
Para contornar esta limitação, é comum o uso do indicador de Densidade da Atividade (DA) de forma complementar nas análises. Neste caso, o indicador leva em consideração municípios que possuem um mínimo de cinco estabelecimentos e 50 empregados para o setor em análise, sinalizando a presença de um grupo produtivo local. O DA é um indicador absoluto que identifica a densidade da aglomeração produtiva, sem considerar, no entanto, o grau de especialização em relação a outras aglomerações. Desta forma, municípios com alta densidade de empresas e trabalhadores são incluídos no mapeamento com o objetivo de identificar conjuntos produtivos locais (Filho, 2006). Este método, ao complementar o QL, oferece uma visão abrangente das concentrações de atividades económicas em uma determinada região.
A limitação desta escolha metodológica está, ainda, na abrangência, pois os dados oficiais recolhidos são restritos ao trabalho formal com defasagem de dois anos e excluem a massa trabalhadora que atua na informalidade, principalmente em setores económicos específicos como comércio e serviços (Resende & Hasegawa, 2020).
Resultados e discussão
Esta secção apresenta os resultados da pesquisa divididas em duas subsecções. No primeiro faz-se uma análise comparativa dos indicadores sociais e económicos dos municípios pertencentes às regiões de planejamento dos litorais Leste e Oeste. A segunda subseção apresenta os resultados analíticos e discussão dos métodos Shift-Share e QL dos municípios turísticos do litoral Leste e Oeste do estado do Ceará.
Caracterização regional descritiva e comparativa
O desenvolvimento económico é um processo complexo, multidimensional, que envolve a necessidade de se compreender as mudanças em várias dimensões, principalmente aquelas relacionadas diretamente com qualidade de variáveis como emprego, renda e estrutura social. Neste ponto, Pelinski (2007) enfatizava a importância da realização de investimentos que promovam o desenvolvimento dos municípios e regiões económicas, principalmente aquelas que são mais periféricas, distantes dos centros urbanos.
No que tange aos aspetos económicos, a quadro II oferece uma visão panorâmica dos municípios das regiões Leste e Oeste. O primeiro indicador evidencia a participação, em termos percentuais, do Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios, em 2019, no total do PIB de suas respetivas regiões de planejamento (PIBmunicípio/PIBRegião). Assim, nota-se que para a região Leste, Aracati e Beberibe despontam como aqueles mais representativos no PIB regional, com 41,48% e 25,77%, respetivamente. Para o litoral Oeste, Itapipoca representa 37,33% do PIB da região, seguido pelos municípios de Itapajé (14,24%) e Amontada (11,49%). No entanto, numa perspetiva estadual, segundo o indicador do quadro II, existe um limite participativo de 1%, em que apenas Itapipoca contribuiu com 1,03% para o PIB cearense em 2019, enquanto os demais municípios ficaram abaixo da unidade.
Quadro II Litoral Leste e Oeste: participação relativa do PIB e PIB per capita.
| Municípios | PIBmunicípio/PIBRegião (2019) | PIBmunicípio/PIBce (2019) | PIBpcmunicípio/PIBpcRegião (2019) |
|---|---|---|---|
| Aracati | 41,48% | 0,86% | 1,25 |
| Beberibe | 25,77% | 0,53% | 1,08 |
| Fortim | 6,06% | 0,13% | 1,03 |
| Icapuí | 10,56% | 0,22% | 1,13 |
| Itaiçaba | 2,05% | 0,04% | 0,58 |
| Jaguaruana | 14,09% | 0,29% | 0,92 |
| Litoral Leste | 100,00% | 2,07% | 1,00 |
| Amontada | 11,49% | 0,32% | 1,13 |
| Apuiarés | 2,53% | 0,07% | 0,76 |
| General Sampaio | 1,55% | 0,04% | 0,93 |
| Irauçuba | 4,19% | 0,12% | 0,74 |
| Itapajé | 14,24% | 0,39% | 1,19 |
| Itapipoca | 37,33% | 1,03% | 1,43 |
| Miraíma | 2,04% | 0,06% | 0,70 |
| Pentecoste | 11,00% | 0,30% | 1,22 |
| Tejuçuoca | 2,95% | 0,08% | 0,62 |
| Tururu | 2,58% | 0,07% | 0,73 |
| Umirim | 3,52% | 0,10% | 0,86 |
| Uruburetama | 6,57% | 0,18% | 1,82 |
| Litoral Oeste | 100,00% | 2,75% | 1,00 |
PIBmunicípio/PIBRegião (2019) - relação entre o Produto Interno Bruto (PIB) do município e o PIB da região analisada. PIBmunicípio/PIBce (2019) - relação do PIB do município e o PIB do Estado do Ceará. PIBpcmunicípio/PIBpcRegião(2019) - relação do PIB per capita do município e o PIB per capita da Região analisada.
Por fim, o terceiro indicador refere-se a quanto cada município participa da média do PIB per capita regional (PIBpcmunicípio/PIBpcRegião), o que evidenciou aqueles municípios que estão acima da média, com valores acima de 1,00. Neste caso, constatou-se que Aracati, Beberibe, Fortim, Icapuí, Amontada, Itapajé, Itapipoca, Pentecoste e Uruburetama apresentam PIBpc acima da média de suas regiões, com destaque para Uruburetama, que ultrapassa a média regional em 1,82. Estes resultados mostraram que o litoral Leste e Oeste possuem, praticamente, a mesma participação no PIB estadual (PIBmunicípio/PIBce), 2,65% e 2,77%, respetivamente.
Estes espaços cearenses das duas regiões de planejamento do Ceará, principalmente os costeiros, atraíram e atraem capital nacional e estrangeiro privado, transformando-os em áreas mais dinâmicas no estado. No caso do litoral Leste, é possível encontrar um maior número de complexos turísticos em comparação com o litoral Oeste, provavelmente devido à maior concentração de investimentos privados. Além disso, o litoral Leste é considerado um dos polos - áreas prioritárias - que o Programa Nacional de Desenvolvimento do Turismo (PRODETUR) nacional atuou para promover e consolidar a imagem de destino turístico e elevar a competitividade regional nesse segmento (PRODETUR, 2014). O fato é que o papel do Estado, por meio de políticas públicas desde a década de 1980, foi primordial para as principais mudanças e dinamização nessas regiões. O PRODETUR Nacional investiu não apenas para estimular o turismo, mas também para fortalecer e qualificar os municípios das regiões analisadas (Silva & Lima, 2015).
Desempenho do mercado formal das regiões de planejamento selecionadas e nos municípios costeiros
A criação de emprego formal é um dos indicadores de crescimento económico de uma determinada região, influenciando na criação de renda e reduz desigualdades. Entretanto, não se pode afirmar que crescimento económico gera, necessariamente, emprego formal, pois este pode ocorrer devido a outros fatores como, por exemplo, crescente formalização dos micros e pequenos estabelecimentos (International Labour Organization [ILO], 2014). Posto isto, é necessário identificar os setores que proporcionaram a criação de empregos formais, o que pode ter acontecido em postos de trabalhos menos qualificados e de baixa produtividade, sendo o caso do setor serviços (Cardoso Júnior, 2007).
Desta forma, ao observar o mercado formal nas regiões Leste e Oeste cearense, entre 2010 e 2019 - considerando os grandes setores da economia - foi possível perceber modificações participativas importantes. Do total de 21 051 empregos formais gerados pela região Leste em 2010, a maior parcela correspondeu ao setor de serviços, representando 45,39% (9556), seguido pelo setor agropecuária, com 26,4% (5558). Em 2019, o total de empregos formais nessa região chegou a 23 886, permanecendo o setor serviços como maior responsável pela geração de postos formais, 49,61% (11 849). No caso da região Oeste, em 2010, foram gerados 26 641 empregos na região, destes, 15 217 (57,12%) empregos foram gerados pelo setor de serviços. Esse cenário regional se manteve constante em 2019, uma vez que foram gerados 33 822 empregos formais, sendo o setor de serviços o maior responsável pela criação de postos de trabalho, representando 18 430 empregos (54,49%).
Quadro III Litoral Leste e Oeste: participação regional dos setores na criação de empregos formais (2010 e 2019) (em %).
| Regiões | Ano | Número de empregos | Participação (%) | Número de empregos | Participação (%) |
|---|---|---|---|---|---|
| Indústria | 2010 | 2730 | 12,97 | 7408 | 27,81 |
| 2019 | 2826 | 11,83 | 10 598 | 31,33 | |
| Construção Civil | 2010 | 377 | 1,79 | 446 | 1,67 |
| 2019 | 585 | 2,45 | 333 | 0,98 | |
| Comércio | 2010 | 2830 | 13,44 | 2837 | 10,65 |
| 2019 | 3975 | 16,64 | 3956 | 11,7 | |
| Serviços | 2010 | 9556 | 45,39 | 15 217 | 57,12 |
| 2019 | 11 849 | 49,61 | 18 430 | 54,49 | |
| Agropecuária | 2010 | 5558 | 26,4 | 733 | 2,75 |
| 2019 | 4651 | 19,47 | 505 | 1,49 | |
| Total | 2010 | 21 051 | 100 | 26 641 | 100 |
| 2019 | 23 886 | 100 | 33 822 | 100 |
No que se refere ao comportamento dos municípios turísticos costeiros do litoral Leste - Aracati, Beberibe, Fortim e Icapuí - observou-se que, em 2019, o setor comercial de Aracati e Fortim passou a contribuir mais para a criação de empregos formais, cerca de 23,3% e 10%, respectivamente. O setor dos serviços mostrou-se importante para os quatro municípios, a saber: o setor de Fortim contribuiu com 61,63% na criação de postos de trabalho formais no município; Beberibe (58,7%); Aracati (48,24%); e o setor dos serviços de Amontada - foco deste estudo para o litoral Oeste - contribuiu, em 2019, com 73% na criação de empregos formais no total do município, revelando que este setor municipal é o mais forte face aos demais grandes setores (Brasil, 2024).
Com a aplicação do método diferencial-estrutural para a variável emprego formal nos setores referentes ao turismo nos municípios de “sol, praia, mar e vento” dos litorais Leste e Oeste cearense, constatou-se que o efeito líquido total foi negativo exclusivamente para Icapuí (quadro IV). Embora o efeito estrutural tenha sido positivo, o seu valor, em termos absolutos, foi inferior ao efeito negativo diferencial, afetando o efeito líquido global negativo.
Quadro IV Método Shift-Share para a Variável Emprego dos municípios turísticos do litoral Leste e Oeste cearense.
| Municípios | Efeito Regional | Efeito Estrutural | Efeito Diferencial | Efeito Total | Efeito Proporcional Modificado | Efeito Diferencial Residual |
|---|---|---|---|---|---|---|
| Amontada | 3,45 | 1,00 | 125,44 | 154,00 | 9,75 | 119,11 |
| Aracati | 149,20 | 38,33 | 119,02 | 322,67 | 43,55 | 116,28 |
| Beberibe | 84,96 | 22,65 | 45,89 | 151,35 | 23,89 | 46,03 |
| Fortim | 11,74 | 4,85 | 112,00 | 125,15 | 7,86 | 108,75 |
| Icapuí | 47,66 | 17,15 | -161,96 | -111,15 | 0,05 | -147,37 |
Além disso, todos os municípios analisados apresentaram efeitos regionais e estruturais positivos, o que sugere crescimento do emprego formal superior ao esperado caso acompanhasse a tendência das taxas de crescimento do Estado do Ceará no mesmo período. Em outras palavras, o cenário mostra que existem fatores dinâmicos internos e/ou externos atuantes nos municípios que os colocam em posição de destaque nas atividades económicas (Viana et al., 2020, 2024). Os municípios cearenses podem ainda ser considerados líderes pelo sucesso alcançado na criação de emprego das atividades económicas consideradas deste estudo, indicando possível especialização e vantagem competitiva (Herath et al., 2013; Resende & Hasegawa, 2020).
Os resultados positivos do efeito total dos demais municípios turísticos indicam crescimento superior ao esperado caso acompanhassem as mesmas taxas de crescimento do estado como um todo. Assim, quando os efeitos estrutural e diferencial são positivos - caso de Amontada, Aracati, Beberibe e Fortim - o crescimento do emprego formal ocorre devido ao setor ser caracterizado como dinâmico, na perspectiva estadual, ou porque o município apresenta vantagem competitiva/locacional no setor. Deve-se salientar que a existência de economias de transportes, economias de aglomeração ou vantagens comparativas, podem ter influenciado positivamente os municípios, indicando que estão preparados para o turismo (Nogueira, 2015; Souza, 2009; Viana et al., 2020, 2024).
No que diz respeito ao efeito proporcional modificado, nota-se um padrão, em que o município de Icapuí foi o único que registou valor negativo, ou seja, entre 2010 e 2019, o município ainda não estava especializado nos setores turísticos que favorecem o estado do Ceará. Neste caso, é possível que o turismo em Icapuí ainda seja uma atividade marginal dentro da estrutura produtiva do estado, até mesmo para o próprio setor de serviços municipal. Este comportamento mostra que os demais municípios analisados estão em patamares acima do que foi observado em Icapuí, ou seja, já possuem vantagens de localização e especialização nos setores turísticos e contribuem para a estrutura produtiva cearense como um todo (Costa & Costa, 1996; Viana et al., 2024). Por fim, o efeito diferencial residual positivo para os municípios de Amontada, Aracati, Beberibe e Fortim indicam que a estrutura construída para a atividade turística pode alavancar a taxa de crescimento do setor de serviços dessas localidades. As principais atividades que registaram crescimento por fatores internos e externos foram aquelas relacionadas a hotéis e hospedagem, nos municípios de Fortim, Aracati e Amontada, e estabelecimentos de alimentação, em Fortim e Amontada.
A situação do município de Icapuí dista bastante dos seus vizinhos litorâneos, uma vez que se trata de um território com base económica tradicionalmente forte na pesca - com aproximadamente 2000 pescadores profissionais artesanais associados, cujo principal foco é a pesca da lagosta (Filho et al., 2022) - de uma comunidade com vocação marinha. A lagosta do Ceará é um produto com relevância a nível internacional, sendo o município de Icapuí um dos principais responsáveis pelo abastecimento do mercado, seguindo a tendência da produção cearense e do litoral leste no calendário anual da região (Filho et al., 2022). Além disto, a pesca deste crustáceo tem elevado valor agregado e acrescenta maior renda ao pescador desta modalidade. Para além da indústria pesqueira instalada em Icapuí, outros fatores podem colaborar para os resultados observados anteriormente, como: i) baixa promoção e marketing do turismo local; ii) falta de diversidade de hospedagens e serviços; iii) baixa conectividade digital e informações ao turista; iv) falta de uma maior integração com a pesca; v) falta de um posicionamento municipal claro no mercado turístico do Ceará. Neste contexto, Coriolano (2008) destaca que a comunidade pesqueira do Icapuí consegue deter a participação nas atividades turísticas existentes, ligadas, muitas vezes, ao aspecto do turismo mais comunitário.
Os dois últimos indicadores observados foram o QL, sob a ótica do Brasil, e a DA, que refere-se à quantidade de estabelecimentos/vínculos formais dos setores turísticos que, em conjunto, auxiliam na identificação de existência de atividades produtivas fortes nos municípios. Desta maneira, com base em dados formais para estabelecimentos existentes, em 2019, para todo o estado do Ceará, observou-se que 16 municípios cearenses possuem especialização relativa (QL > 1), ou seja, há indícios da existência de aglomerações produtivas desse setor turístico nestas localidades. Destes 16 municípios, apenas sete deles possuem, também, especialização relativa (QL > 1) de vínculos em relação a essa atividade econômica (fig. 2), reforçando a especialização deles com relação ao turismo no estado. São eles: Jijoca de Jericoacoara, Guaramiranga, Cruz, Trairi, São Gonçalo do Amarante, Fortim e Aquiraz.
O primeiro município do rank estadual para QL estabelecimentos é Jijoca de Jericoacoara, que está, também, dentre os dez primeiros municípios brasileiros (8ª posição) com essa especialização relativa em turismo (QL igual a 3,865). Em segundo lugar aparece o município de Guaramiranga, na serra cearense, que ocupa a 16ª posição no rank nacional (quadro V), com QL estabelecimentos igual a 3,126.
Quadro V Ceará: Densidade de Atividade (DA) e Quociente Locacional (QL) de estabelecimentos e vínculos (2019).
| Município | Estabelecimentos (DA) | Vínculos (DA) | Estabelecimento (QL) | Vínculos (QL) | RkCE | RkBR |
|---|---|---|---|---|---|---|
| Jijoca de Jericoacoara | 305 | 2603 | 3,865 | 5,266 | 1 | 8 |
| Guaramiranga | 32 | 164 | 3,126 | 1,771 | 2 | 16 |
| Amontada | 30 | 161 | 1,901 | 0,483 | 3 | 87 |
| Cruz | 46 | 330 | 1,892 | 1,704 | 4 | 90 |
| Trairi | 55 | 386 | 1,712 | 1,011 | 5 | 135 |
| São G. do Amarante | 100 | 2008 | 1,683 | 1,422 | 6 | 143 |
| Baixio | 3 | 12 | 1,623 | 0,154 | 7 | 178 |
| Aracati | 170 | 855 | 1,320 | 0,726 | 8 | 400 |
| Fortim | 20 | 177 | 1,303 | 1,266 | 9 | 425 |
| Beberibe | 61 | 464 | 1,277 | 0,837 | 10 | 461 |
| Aquiraz | 159 | 3674 | 1,258 | 1,932 | 11 | 494 |
| Paracuru | 45 | 200 | 1,236 | 0,531 | 12 | 532 |
| Meruoca | 10 | 44 | 1,192 | 0,351 | 13 | 626 |
| Icapuí | 25 | 66 | 1,164 | 0,196 | 14 | 700 |
| Cariré | 8 | 30 | 1,103 | 0,176 | 15 | 892 |
| Maracanaú | 427 | 5144 | 1,073 | 0,756 | 16 | 985 |
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados de Brasil (2023).
O indicador DA é utilizado, por sua vez, de maneira complementar para a verificação da densidade da aglomeração produtiva nas localidades estudadas. Neste caso, de todos os 16 municípios cearenses que tiveram QL estabelecimentos acima da unidade, exclui-se apenas o município de Baixio, pois registou apenas três estabelecimentos no setor do turismo, enquanto os demais tiverem mais de cinco estabelecimentos que sugerem a existência de um grupo/conjunto produtivo local (Filho, 2006). Estes dois municípios cearenses (Jijoca de Jericoacoara e Guaramiranga) também registaram QL vínculos formais acima da unidade e geraram mais de 50 postos de trabalho, reforçando a existência de atividades turísticas com adensamento produtivo.
Apenas cinco municípios turísticos das regiões de planejamento do litoral leste e Oeste aparecem no rank dos 16 municípios com QL estabelecimento acima de 1, sendo que o município de Amontada aparece na 3ª posição estadual, enquanto Aracati ocupa a 8ª colocação, seguido de Fortim (9ª), Beberibe (10ª) e Icapuí (14ª). Todos esses municípios citados registaram DA de estabelecimentos acima de cinco unidades produtivas, o que revela a existência de um conjunto produtivo local de turismo nessas localidades (quadro V). Por outro lado, em relação ao QL vínculos, apenas Fortim apresentou valor acima da unidade, revelando-se com especialização relativa no setor turístico. No que diz respeito ao indicador DA de emprego, todos os municípios do litoral Leste e Oeste, que fazem parte do rank dos 16, geraram mais de 50 empregos formais, reforçando, mais uma vez, a existência de uma aglomeração produtiva nestas localidades ligadas ao turismo e que demandam maior atenção de estudos científicos e do poder público para a comprovação ou não da conjuntura turística formal.
O bom desempenho da estrutura produtiva dos municípios costeiros do litoral Leste (Fortim, Beberibe e Aracati) sugere, ainda, que a possibilidade de interações (redes) entre atividades turísticas locais dos municípios, dadas as suas proximidades espaciais, pode ser um fator importante para maior aproveitamento das potencialidades e vocações competitivas da região por meio de parcerias e compartilhamento de recursos (Allen & Arkolakis, 2023; Diniz et al., 2006; Silva & Pascuci, 2020).
Os resultados mostram, portanto, o motivo do turismo atrair atenção dos debates políticos em todos os âmbitos e escalas, pois possuem efeitos spillovers sobre outras atividades económicas que se ligam diretamente e indiretamente, criando emprego, renda e dinamismo das localidades em que estão as concentrações produtivas (Brasileiro, 2012; Viana et al., 2020). Além disso, é possível identificar janelas de oportunidades para o crescimento e desenvolvimento regional por meio da elaboração e implementação de políticas públicas direcionadas às aglomerações de atividades económicas resultantes de forças centrípetas, que levam à concentração espacial, e centrífugas, que provocam efeitos spillovers em outras localidades (Alves et al., 2024; Dias & Coriolano, 2019).
O destaque do turismo litorâneo cearense no cenário regional e nacional - devido à sua distribuição espacial - é resultado não apenas de seus aspectos naturais privilegiados (clima e belezas naturais), mas reflexo da procura por alternativas de desenvolvimento regional. Neste contexto, os novos processos de organização produtiva - os Arranjos Produtivos Locais (APLs) - surgem dentro de um ambiente exigente para as micro e pequenas empresas deste setor económico que demanda maior relação de cooperação/conexão entre essas empresas de um determinado espaço geográfico (Allen & Arkolakis, 2023; Filho, 2002).
A cooperação e o estreitamento de conexão exigidos aos atores destes ambientes de aglomeração produtiva - favorecidos pela proximidade geográfica - mostram o potencial existente para esses polos turísticos fortes e de crescimento (Silva & Pascuci, 2020), pois potencializam o desenvolvimento económico regional ao “puxarem” regiões vizinhas para o centro das sinergias e forças cumulativas geradas pelas relações entre os atores, sendo essa ideia defendida por Perroux (1967). Além disso, quando estas atividades se dinamizam, geram um círculo virtuoso de criação de emprego e renda, tanto para o próprio setor, quanto para outros dentro da mesma cadeia produtiva, devido ao potencial de crescimento do produto (Hirschman, 1961; Myrdal, 1972).
Por este motivo, o governo do estado do Ceará, em 2002, fez um mapeamento de 36 APLs em todo o território estadual, os quais envolvem 48 municípios cearenses (Instituto Centec, 2022; Tahim et al., 2024). Desses APLs identificados, três referem-se ao turismo de “sol, praia, mar e vento”, um deles localizado na região de planejamento do litoral Leste (presentes em Beberibe, Aracati e Icapuí) e outro na região de Planejamento do litoral Oeste do estado (Icaraizinho de Amontada). Ou seja, são preocupações recentes que indicam possibilidades de se compreender a dinâmica destas atividades turísticas nas duas regiões cearenses de planejamento.
Resende (2009) contribui para o entendimento deste quadro ao reforçar que os APLs de turismo, por estarem concentrados nas regiões litorâneas do Ceará em detrimento das regiões interiores, tornaram-se mercadorias imobiliárias com vantagens e desvantagens. O autor considera ser possível encontrar comunidades resistentes a este modelo de organização turística em favor de um turismo de base local - arranjos produtivos de base comunitária - o que as repelem de ações de políticas públicas, uma vez que não são voltados para a exigência do mercado. É esse o caso, por exemplo, do município de Icapuí. Assim, por um lado, essas aglomerações produtivas existentes nas regiões Leste e Oeste cearense é um pilar crucial para a dinamização das economias municipais da região, proporcionando maior competitividade e sinergias entre os agentes locais ligados ao turismo (Krugman, 1991; Tahim et al., 2024). Por outro lado, o aumento da dinâmica económica nestas localidades traz novos desafios para os territórios, em que se tornam necessárias a reorganização e a inovação por parte dos estabelecimentos turísticos, para que elevem a competitividade neste mercado. Além destes desafios, surgem novas preocupações adicionais relacionadas à sustentabilidade territorial dentro de um modelo de crescimento e desenvolvimento econômico local (Oliveira & Knuth, 2024).
Destarte, este artigo não tem a pretensão de esgotar o debate sobre esta temática em questão, mas indicar novas possibilidades a serem discutidas no âmbito acadêmico e nas políticas públicas. As vantagens do crescimento potencial da estrutura produtiva dos municípios turísticos analisados revelam caminhos possíveis a serem analisados e percorridos sob novas perspectivas, sempre considerando a importância dos elementos internos (comunidades e atividades tradicionais) dessas novas organizações produtivas locais, de modo a manter as características naturais e promover um desenvolvimento económico mais equilibrado e sustentável.
Considerações finais
Este artigo teve como principal proposta examinar a dinâmica do emprego formal dos setores turísticos dos municípios costeiros (litoral Leste e Oeste) do Estado do Ceará entre 2010 e 2019. A escolha metodológica de aplicação do método Shift-Share possibilitou que os resultados obtidos permitissem atingir o objetivo e, consequentemente, responder a questão de pesquisa, mostrando a dinâmica do emprego formal nos municípios turísticos selecionados (Amontada, Aracati, Beberibe, Fortim e Icapuí).
No primeiro grupo de resultados, constatou-se a superioridade do litoral Leste na relação entre variáveis económicas, devido à presença de complexos turísticos impulsionados por investimentos privados. No segundo grupo de resultados empíricos, notou-se significativo aumento da participação do setor de serviços na criação de empregos formais nas regiões de planejamento Leste e Oeste do Ceará. Além disso, os municípios turísticos do litoral Leste apresentaram mudanças significativas, em 2019, nos setores económicos como, por exemplo, comércio e serviços.
O método Shift-Share mostrou efeito líquido negativo apenas para o município de Icapuí, o que sugere desempenho abaixo do esperado em termos de emprego formal nos setores turísticos analisados. Em contrapartida, os demais polos turísticos (Amontada, Aracati, Beberibe e Fortim) apresentaram efeitos positivos, ou seja, o crescimento do emprego formal pode ser atribuído à dinâmica do setor ou a vantagem competitiva locacional desses municípios, sabendo que foram regiões turísticas receptoras de capital nacional e estrangeiro. Os indicadores QL e DA, por conseguinte, revelaram a existência de concentrações produtivas nos setores turísticos, demonstrando especialização relativa e densidade de atividade de um conjunto produtivo local de turismo.
Os dados corroboraram a informação da existência de APLs nestas regiões, focados nesses municípios costeiros, e que são considerados centros de crescimento econômico e desenvolvimento regional. Neste contexto, a cooperação e o estreitamento das relações entre os atores locais (micro e pequenas empresas, associações locais e instituições públicas) são primordiais para impulsionar o crescimento e desenvolvimento regional via setor turístico, dado o maior potencial de distribuir resultados por causa de sua capilaridade.
Nesta esteira, apesar dos resultados positivos desta pesquisa, nota-se, ainda, a existência de desigualdades económicas e produtivas entre os municípios. O município de Icapuí, por sua tradicional característica pesqueira, ainda não aderiu ao modelo de turismo direcionado ao mercado, o que pode gerar sua “exclusão” do modelo de desenvolvimento turístico. Outro desafio presente nos resultados se refere à necessidade de cooperação entre os atores para garantir o desenvolvimento local sustentável, uma vez que devem buscar estratégias de crescimento econômico, mas, também, de preservação das características naturais e culturais, inserindo a participação das comunidades locais no planejamento do turismo local.
A limitação deste estudo está na escolha metodológica desta pesquisa, que se baseia em dados de empregos formais gerados pelas atividades turísticas nos municípios selecionados das regiões Leste e Oeste do Ceará. No entanto, essas atividades são impulsionadoras do emprego informal nessas regiões interiores do Ceará, o que dificulta uma avaliação adequada da dinâmica produtiva local por meio do método Shift-Share.
Assim, as especificidades do turismo fazem dele uma estratégica viável para políticas públicas de promoção do desenvolvimento. Contudo, há perspetivas de aprofundamento de novos estudos, tais como: investigar possíveis impactos ambientais e sociais do crescimento do turismo nas regiões costeiras; verificar se ocorreram as modificações da estrutura produtiva no período pós-pandemia da COVID-19, principalmente considerando a geração de emprego informal nos municípios e, realizar estudos específicos com os APLs de turismo dessas regiões litorâneas do estado.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará (PROPGEO/UECE) pelo apoio e acolhida ao estágio pós-doutoral do primeiro autor. Este estudo contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Projeto N◦. 420516/2022-0, Produtividade CNPq PQ 309102/2022-7.























